APÊNDICE III
COMO
ELABORAR POLÍTICA MARXISTA
Minimanual
do revolucionário
Crítica à
direção do PSTU
Ao leitor,
tentei escrever um texto mais claro direto e, em principal, mais curto
possível. A diagramação original dava algo como apenas 30 páginas, mas, para a
leitura tornar-se agradável, tivermos que mudá-la. Foi necessário ceder ao
conteúdo, aumentando a extensão do material. Aproveite-o: se eu tivesse uma
introdução tal como esta no início da minha ação política, tudo seria melhor e
mais rápido.
Veja-se que
os intelectuais marxistas e de esquerda quase nada sabem das palavras neste
livro; se pedirmos que falem sobre teoria, descrevem por horas seus
conhecimentos, como se máquinas; mas se pedirmos uma política para a atual
situação nacional, paralisam, gaguejam, justificam-se etc. Tal fenômeno é
antigo no nosso movimento. E leva-nos à seguinte observação: os melhores
marxistas teóricos são, via de regra, os melhores elaboradores de política.
Deixar de saber elaborar impede, na maioria dos casos, uma boa elaboração
teórica. O mundo é concreto.
Em meus
escritos, costumo passar longe de polêmicas diretas; mas, diz Moreno, a
história de nossa corrente é a história de nossos erros. Portanto, neste caso,
precisamos encarar as coisas mais de frente, sem rodeios. No avançar do texto,
destaco o mar de erros – sem exagero – de meu antigo partido, o PSTU, que foi o
maior partido comunista do mundo. Ao sair da organização, tive de me reeducar
ainda mais para perceber os equívocos, a causa das crises partidárias, as
paralizações políticas, as perseguições etc. Isso demorou, mas valeu a pena.
Algumas
palavras de introdução são necessárias. Faça, treine, tente. Erre, mas tentando
ao máximo acertar. Faça balanço claro dos acertos e erros. Saiba porquê errou,
porquê acertou. Não tenha medo de reconhecer que falhou, que cometeu um erro,
que desleixou. Estamos todos aprendendo, tentando acertar. Aceite críticas,
ainda que discorde totalmente delas. Um gênio solitário e correto nada pode sem
um grupo coletivo – as vitórias são coletivas e democráticas. Nunca imponha pelo grito, pela manobra, pela
teimosia, pelo cargo etc. suas ideias e políticas porque elas soam muito
melhores que as demais. Conviva com pessoas de perfis diferentes dos seus na
elaboração política. Ouça as pessoas comuns próximas de si, do seu cotidiano, o
que elas pensam e deixam de pensar sem tentar ganhá-las para suas posições. Seja
rigoroso, rigoroso e rigoroso. Quando começar a acertar muito, não baixe a guarda.
Se você está convencido de uma proposta, não recue – seja teimoso. É preciso
ser insistente para se tornar maioria.
GLOSSÁRIO
Análise de
conjuntura
Totalidade
Uma visão
dialética
A questão
internacional
Uma proposta
Caracterização
Mais um
exemplo
Erros comuns
Ser maleável
ao máximo
Simplicidade
e erro
A arte de
prever
O caso das
reformas
Situação,
etapa, época
Programa de
transição
Estado,
regime, governo
Noções
básicas de economia para elaborar política
Crise de
superprodução de capital – e mercadorias
Capital
produtor de juros
Política e
classes
Política e
questão militar
Política de
guerra
Independência
nacional
Política,
alienação e moral
Política e
organização partidária
Regra de
ouro
Em caso de
governo forte
Em caso de
ditadura
Como impedir
e combater o fascismo
Quando
chamar o “fora governo” ou “fora ministros burgueses”
Quando
chamar pela tomada de poder
Saber ouvir
Eleições e
política
Atividades
artificiais
Política
organizacional
Centrismo
Deixar
amadurecer
Lutar
juntos, marchar separados
Ousadia!
Dialética –
primeiros passos
Como será o
socialismo?
ANÁLISE DE
CONJUNTURA
Como os
marxistas elaboraram suas políticas? Para isso, faz-se necessário ter uma
avaliação tão profunda quanto possível da realidade, ainda que imperfeita. Uma
intepretação errada dos fatos leva a uma ação também errada ou ao improviso.
Traduzir o real da conjuntura exige algum conhecimento amplo dos diferentes
fatores das ciências humanas, portanto demanda algum esforço. Nosso papel,
aqui, é facilitar tal aprendizagem.
ANÁLISE
Analisar
começa por colher o máximo de dados da realidade que queremos compreender (um
país, uma fábrica, etc.). Toda fonte é válida: estatísticas, vídeos, relatos,
etc. Com o tempo, vamos aprendendo aonde encontrar as informações necessárias
(IBGE, Banco Central, FGV, etc.).
Para o
sucesso da análise, o analista deve evitar ao máximo trabalhar a partir de
hipóteses, de teses, de pré-avaliações. Os fatos imediatos causam fortes
impressões sobre nós, muitas vezes levando-nos a erros de interpretação (porque
ainda vemos a parte, não o todo). Por isso devemos evitar a
“análise-justificativa”, da qual fala o argentino Moreno, quando apenas
justificamos artificialmente uma posição elaborada sem critério, feita por
“instinto”.
Na análise,
consideramos a TOTALIDADE do social. Vejamos um por um, elemento por elemento:
1. Infraestrutura, economia, forças
produtivas
O econômico
é o fundamento da realidade – embora, lembramos, seja insuficiente. No país,
devemos ver a situação da indústria, do comércio, dos serviços, como estão as
importações e exportações, a situação do câmbio e a inflação também devem ser
listadas etc.
Nos próprios
debates entre militantes, nos jornais, na sociedade, aparecem as questões
centrais a serem observados naquela dada conjuntura. Por exemplo: se a inflação
dos produtos centrais cresce muito na própria realidade, isso “naturalmente”
empurra a avaliar as causas dos aumentos do preço e suas futuras tendências.
Na fábrica,
avaliamos como estão os estoques, se o ritmo de trabalho aumentou, como anda a
lucratividade da empresa, etc. Há
algumas perguntas que surgem, por exemplo, ao se pensar em propor uma greve.
2. Estrutura, classes sociais, relações de
produção
Precisamos
avaliar qual a relação de forças de cada classe social, entre as classes
sociais. Em resumo, temos três classes principais na sociedade: operários,
patrões, classe média. De modo geral, a classe que se demonstrar mais forte, a
patronal ou o operariado, tende a atrair o apoio da classe que está no meio,
dos setores médios.
Dentro da
mesma classe, comumente é preciso ver a situação das divisões internas. Por
exemplo: temos a burguesia comercial, financeira, industrial e dos serviços;
elas podem ter discordâncias internas entre si sobre o que fazer diante dos
problemas práticos da realidade.
Na fábrica,
avaliamos a situação dos patrões e do executivo da empresa. Também perguntamos
se os gerentes de patente mais baixa estão do lado dos trabalhadores ou dos
chefes, por exemplo, diante da ameaça de fechar a empresa. Entre os operários,
como está aquele setor que não participou ativamente da última greve? E os
demais turnos? Quão numerosos têm sido os protestos, a paralização e os
piquetes?
Observação:
a união das forças produtivas com as relações de produção formam uma BASE socioeconômica
da qual se ergue uma SUPERESTRUTURA, que trataremos a seguir.
3. Subjetividade, mentalidade,
superestrutura subjetiva
Embora a
base econômica seja central para compreender a realidade, quem faz a história
são os homens, que ainda são organizados em classes. A superestrutura subjetiva
é tudo relativo à mente humana: moral, vontade, fé, cresças, pensamentos,
valores, filosofias, etc. Para uma análise completa da situação, as
mentalidades devem ser levadas em conta.
Aqui, vemos
que as acusações de “determinismo econômico” do marxismo é um erro completo.
Faz diferença, por exemplo, se a classe trabalhadora de certo país tem tradição
de valores pacifistas ou de luta. Na fábrica, devemos saber como os
trabalhadores avaliaram a última greve, que nível de confiança têm no
sindicato, se estão com raiva ou apenas tristes com as demissões, etc. No país,
avaliamos o quanto o governo é apoiado, se está vivo na memória dos
trabalhadores grandes conquistas ou grandes derrotas, etc.
Em resumo, o
objetivo da política comunista é ganhar a consciência da maioria dos
trabalhadores – disputar essa consciência. Há sempre uma guerra de política na
sociedade, por isso devemos tentar convencer que nossas propostas são as
melhores para nossa classe social, o operariado, e para os setores médios.
4. Instituições, organizações,
superestrutura objetiva
Na análise,
devemos observar as organizações. A organização central a ser avaliada é o
Estado, ou seja, a situação do governo, do regime, a relação entre os
poderes, as leis, etc. Aqui, também
analisamos a geopolítica, a luta entre Estados e governos.
Em uma
consideração rápida, a subjetividade (superestrutura subjetiva) gera várias
instituições, como partidos, igrejas, clubes, etc. Mas, uma vez criadas, tais
tipos de organizações influenciam, ao inverso, também a mentalidade dos homens.
No país,
devemos avaliar a situação dos partidos, das instituições religiosas, do
movimento sindical, das forças armadas, dos sindicatos patronais, da relação
com governos de outros países, etc. Na fábrica, é preciso ver a força do
sindicato da categoria (incluso nas finanças), se há comitês de fábrica, ver se
o governo regional é forte para reprimir a greve, etc.
TOTALIDADE
A economia é
o principal fator, o motor central que opera para a mudança dos outros três
elementos – mas ele é isso apenas em última instância, em último caso, no
limite. É verdade que a economia influencia decisivamente as instituições,
porém também é verdadeiro que o Estado, por exemplo, influencia muito a
economia. As partes da totalidade influenciam uns aos outros, e vice-versa. Os
quatro fatores estão como se misturados na realidade, então o pensamento
separa-os na análise, avalia-os e depois reintegra-os, reuni-os.
UMA VISÃO
DIALÉTICA
Se olharmos
com atenção, os países com a economia mais desenvolvida são os mesmos países
que têm os melhores cientistas, os melhores esportistas, etc. O nível de
desenvolvimento permite menos ou mais recursos para funções não produtivas,
para o desenvolvimento humano. Países atrasados têm dificuldade de ter um Nobel
de física ou de literatura em comparação a países avançados. Esse é o
raciocínio correto em si, muito usado por marxistas, mas também insuficiente,
incompleto.
A Alemanha
dos séculos 18 e começo do 19 era uma nação atrasada em comparação a outras
potências da Europa: tinha elementos ainda feudais, o território ainda não
unificado – o velho e o novo misturavam-se naquele “país”. Mesmo assim,
produziu Kant, Hegel e depois Marx, três maiores gênios. Por quê? Tais grandes
pensadores surgiram porque surgiram em uma sociedade que precisava de grandes
pensadores já que era muito contraditória, combinando elemento avançados e
atrasados. Algo semelhante ocorre na Rússia nos final do século 19 e início do
20: produziu grandes artistas universais e parte significativa dos melhores
pensadores sociais (Lenin, Trotsky, etc.). Por quê? Porque unia em si o mais
atrasado, como o governo de origem feudal e o atraso do campo, com o mais
avançado, como a moderna indústria e ideias novas vindas da Europa avançada,
unindo cultura entre o oriente e o ocidente.
Além do
desenvolvimento do país, o grau de contradição interna da base social e
econômica conta na formação da superestrutura, das ideias, das criações. A
necessidade, aqui, faz a criatividade; ali, a oportunidade faz a criatividade.
A QUESTÃO
INTERNACIONAL
Destacamos
um país e uma fábrica na análise, mas analisar a conjuntura deve ser a partir
da totalidade, ou seja, do mundo. O mesmo procedimento deve ser feito, antes,
para a situação mundial: avaliamos como está a economia, a luta de classes, a
subjetividade, as instituições no mundo e nos continentes. Só a partir daí
podemos ter clara a localização e o papel de nosso país na economia global, na
geopolítica, na luta entre Estados, etc. Com a avaliação internacional feita,
partimos para o nacional.
UMA PROPOSTA
Pode
acontecer de se fazer uma análise de conjuntura com dados, porém com alguma
pressa de encontrar respostas… Por isso é importante dar um “duplo mergulho” na
avaliação – ver, rever e aprofundar com toda atenção. São muitas as
organizações que fazem avaliação apressada da situação concreta e, por isso,
erram.
CARACTERIZAÇÃO
Primeiro,
permita-me apresentar algo mais direto e rápido, baseado na conjuntura em que
estou escrevendo:
1. Economia
Crise
econômica que dura anos, com crescimento fraco. O que mais se destaque:
1) com o
desemprego e como estímulo do governo ao consumo pelo crédito, o povo está
endividado – logo devemos exigir cancelamento total da dívida dos trabalhadores
e pequenos empresários (isso tem força socialista, pode forçar a estatização
dos bancos e do sistema financeiro).
2) o
desemprego é crônico, há mais desempregados reais (incluso “autônomos” e os que
desistiram de procurar trabalho) do que o número de assalariados com carteira
assinada – logo devemos exigir redução da jornada de trabalho para 30 horas
semanais, com o mesmo salário, para forçar o pleno emprego, para forçar novas
contratações, para que o desemprego seja baixo; assim, campanha será
“Desemprego zero! Escala móvel de jornada de trabalho!”
3) Exigir
“redução e congelamento do preço dos combustíveis” já que seu preço de
monopólio está artificialmente alto.
4) exigir
“fora governo” na forma melhor de “eleições gerais já” apenas e somente apenas
se o governo se desmoralizar, perder apoio da maioria.
2. Classes
Os
trabalhadores fizeram muitas e longas greves de 2012 até 2016, mas agora
estamos na defensiva. A classe média adota posições de direita. A burguesia
está unificada. Logo:
1) Para a luta dos trabalhadores, um
frente única dos partidos e movimentos de esquerda para lutar por pautas claras;
por causa da defensiva, precisamos nos unir parcialmente.
2) A proposta de redução do preço dos
combustíveis e, em principal, pelo cancelamento de suas dívidas – atrairá a
parte mais pobre da classe média para o lado da esquerda, ao menos uma simpatia,
unificando com os trabalhadores.
3) Parte da burguesia odeia o custo maior
com o preço dos combustíveis, logo a burguesia rachará se as massas
trabalhadoras e de classe média adotarem a proposta de redução, por exemplo, em
40% com congelamento do preço.
O PSTU,
partido que, por sua importância, será a fonte de nossas críticas centrais,
chamou o “fora governo” quando este tinha máximo apoio, assim que assumiu o
cargo! Um erro de amador feito por militantes com décadas de experiência. Mas
por quê? Porque a intensão era se destacar de modo artificial e ganhar para si
ativistas ultraesquerdistas por inexperiência. Ao mesmo tempo, mesmo estando
diante de uma severa crítica, não chamou pelo pelo emprego, desemprego zero,
porque seus militantes são funcionários públicos e líderes sindicais; o
sindicalismo exagerado leva a considerar apenas os trabalhadores ativos. O
chamado precipitado pelo “fora governo” tem como uma das fontes o fato de o
partido ser formado por servidores públicos, cuja preocupação é mais quem
dirige o estado, ou seja, quem é seu patrão do que as questões econômicas.
3. Superestrutura
Os
trabalhadores estão angustiados, mas sem esperança. Devemos 1) mostrar força
com frentes de esquerda; 2) sermos teimosos e insistente, em nossas propostas
até que elas se tornem populares, após certa rejeição. Como a situação não
melhorará tanto, o povo pode se radicalizar e se aproximar de nós.
A maior
parte das organizações são pelegas, oportunistas e são maioria. Nós devemos
fazer uma campanha nacional pelo pleno emprego. Quando ela ganhar força,
dobramos aposta: fazemos um encontro nacional pelo pleno emprego, exigindo uma
frente única por tal pauta com proposta claras. Como o Brasil é continental,
tal encontro deve ser em todo o país ao mesmo tempo.
MAIS UM
EXEMPLO
Caracterização
é o resultado da análise. Vejamos um caso de modo muito resumido.
A economia
mundial passa por uma superprodução de capital e mercadoria. A China estimulou
sua economia artificialmente com investimentos, obras, etc., o que aumentou a
busca por produtos brasileiros (minério de ferro, etc.) – mas a demanda alta
acabou com a redução da produção industrial chinesa. Isso pressiona o câmbio a
aumentar dos mais ou menos 2 reais para acima de 4, tornando mais caros os
importados, o que gera inflação aos trabalhadores e à classe média. O Brasil
também investiu artificialmente na economia para evitar a crise de 2008. O alto
nível de emprego gerou lutas sociais fortes e confiantes, com muitas vitórias –
isso tira o lucro dos patrões. O aumento dos juros e o problema de demanda
gerou novo desemprego alto, que por sua vez “quebrou” a onda grevista (que era
baseada no baixo desemprego). O apoio ao governo reeleito de Dilma derreteu
completamente, perdendo qualquer base social. A classe média aristocrática
coloca-se contra o governo pela direita, pedindo o impedimento da presidente
com grandes protestos de rua. Como o governo de “esquerda” foi incapaz de
aprovar ataques novos aos trabalhadores (já que tinha perdido base social, de
apoio), a burguesia se uniu para derrubar Dilma. A proposta de derrubar o
governo não tem apoio nas camadas mais pobres, embora esteja descontente com a
governança, desconfiada com os protestos da alta classe média. O PSDB, há muito
fora do poder, quase ganha as últimas eleições, por isso está inconformado com
o resultado. O PMDB quer derrubar a presidenta para seu vice assumir. A
esquerda divide-se entre ser contra ou a favor da derrubada. O ministério
público e parte do judiciário unem-se para impedir que Lula seja eleito de novo
nas próximas eleições, formando uma farsa judiciária.
Como o
parágrafo ficou longo, mas inda longe de esgotar aquela situação, vamos direto
para a caracterização. Temos: 1) crise econômica, 2) recuo forte das lutas
trabalhistas – burguesia e classe média na ofensiva; 3) ódio ao governo e certo
desapontamento desconfiado nas classes trabalhadoras; 4) PT em crise, PSDB
tentando voltar ao poder a qualquer custo, PMDB tentando tomar o poder, a
esquerda dividida – o judiciário pressionando pela queda do governo e fechando
o espaço do PT para a eleição seguinte com a prisão de Lula. Temos, então, uma
situação reacionária (tema de outro capítulo); 5) o imperialismo quer tomar o
petróleo e o setor de construção civil ocupados por empresas brasileiras.
Qual a
política para essa situação? Na economia, queremos derrotar o desemprego –
exigimos redução da jornada de trabalho com o mesmo salário; a classe está na
defensiva e a esquerda dividida – defendemos uma frente única da esquerda pelos
direitos que estão sendo atracados; para ganhar a consciência dos
trabalhadores, preparamos panfletagens e demais materiais para esclarecer o que
ocorre e propor nossas medidas (pressionando também as demais organizações de
esquerda a fazer unidade). A esquerda divide-se entre ser contra o golpe,
porque é uma armação da burguesia para mais facilmente atacar os trabalhadores,
ou ser pelo “Fora Dilma”, porque fez medidas ruins, contra a classe
trabalhadora. Entre essas duas posições, há a posição comunista: o governo merece
cair, mas não por um golpe – logo exigimos “Eleições gerais antecipadas já!”.
ERROS COMUNS
Os erros
normalmente ocorrem por deixar de avaliar a partir da totalidade ou considerar
demais apenas um aspecto. Vejamos exemplos. É importante ver a luta geopolítica
entre Estados, mas é um erro enorme tratar como luta central e “esquecer” a
luta de classes. Na guerra atual entre o imperialismo americano e o candidato a
novo imperialismo da China, devemos tomar o lado dos trabalhadores contra os
governos dos EUA e chinês.
Outro erro
comum é defender a proposta mais radical possível para atrair os ativistas para
sua organização. No lugar de propor algo correto segundo a conjuntura, nem mais
nem menos profunda, segundo uma análise rigorosa, pensa-se em qual proposta dá
“melhor localização” ao partido, corrente, etc. É uma tática oportunista. Se a
proposta for errada, leva depois à desmoralização dos militantes.
O oposto ao
parágrafo anterior é a supervalorização do fator subjetivo. Devemos elaborar
propostas políticas para problemas objetivos, materiais; se a situação é de
estabilidade, propomos algo correspondente – se é de instabilidade, pensamos
propostas mais radicais. No entanto, muitos evitam propostas mais profundas
porque “a consciência da classe ainda é atrasada”, “os trabalhadores não vão
aceitar”. Nossa meta é ganhar os operários e setores populares para nossas
propostas por meio de uma disputa social. Devemos considerar o nível de
consciência das massas assalariadas quando pensarmos as propostas centrais, a
estética, a linguagem – mas são as condições reais não subjetivas que
determinam o caminho de nossas exigências políticas (embora o fator subjetivo
importe muito).
SER MALEÁVEL
AO MÁXIMO
Na guerra,
toda tática é válida: qualquer forma de chegar ao objetivo é usada sem
preconceitos contanto que funcione bem para aquela situação. Assim deve ser
também a tática política. Aqui, os comunistas participam das eleições para
tentar aumentar a simpatia social; ali, defendemos voto nulo e nossos
parlamentares renunciam ao cargo; em outra situação, defendemos o voto em outro
partido para aproveitar a popularidade dele.
Para vermos
o quanto central é a plasticidade, variedade, da tática, vejamos Lenin na obra
“Esquerdismo – Doença Infantil do Comunismo”. Os comunistas ingleses eram
contra qualquer apoio ao partido trabalhista (PT); Lenin diz que o melhor é
fazer campanha e ajudar aquele partido traidor a se eleger tão rápido quanto
possível – pois um governo do PT aceleraria a experiência da massa de
trabalhadores com a organização inimiga. Veja: faz toda diferença se numa
situação revolucionária os trabalhadores já têm alguma experiência com o
partido traidor no poder ou ainda têm largas esperanças em seu futuro governo.
Isso é um pensamento realmente sofisticado, esperto no bom sentido.
Vejamos como
isso deve ser sério. Na revolução russa de 1917, o partido comunista
Bolchevique já poderia tomar o poder em junho daquele ano, mas não o fez, adiou
ao máximo tal medida… Por quê? Porque era necessário acumular forças para que a
ação fosse a mais perfeita possível, a mais madura, com mais chances de
vitória, como com a necessária radicalização dos camponeses que aconteceu meses
depois. Por outro lado, se esperasse muito mais, a situação degeneraria e a
oportunidade seria perdida, um fracasso. Quando os desempregados, por estarem
em uma situação mais frágil, ficaram impacientes e começaram a se afastar do
partido, a direção partidária percebeu que era impossível, a partir dali,
esperar uma condição ainda melhor – então começou a ação imediata de
implementar o poder operário, a segunda revolução, em outubro, nem antes nem
depois. Se um general bom de manobras tivesse provocado os revolucionários em
junho e estes tivessem caído na provocação tentando, em resposta, tomar o poder
antes das melhores condições, a revolução estaria perdida (foi o que aconteceu
na revolução dos cravos em Portugal).
É preciso
que os comunistas sejam ousados na política. Quais ações práticas e propostas
mais ousadas podemos de fato apoiar? Em certas situações, a altíssima ousadia é
o que existe de mais sensato. Temos de ter, ao mesmo tempo, cuidado máximo e
ousadia tão alta quanto possível.
SIMPLICIDADE
E ERRO
Nahuel
Moreno descreve a simplicidade de propor política: se há inflação, logo
exigimos aumento salarial; se o governo perdeu o apoio, exigir a queda do
governo, etc. Porém é comum seitas políticas errarem nesse aspecto. Ou exigem
as propostas mais radicais independente da conjuntura real (em outro capítulo,
falamos do programa de transição) ou cometem erros simples. Vejamos o caso da
conjuntura atual do autor. Desde o primeiro dia do novo governo, de Bolsonaro,
parte da esquerda chamou apressada o “Fora Bolsonaro”; isso é uma
irresponsabilidade, pois não se chama a queda do governo, por pior que ele
seja, enquanto ele tem grande apoio popular; os ativistas um tanto desesperados
e sem educação militante e científica podem cometer tal erro, não os
comunistas. O fato de ser um governo horrível de modo algum justifica o
equívoco. A tarefa é desgastar o governo, ainda não derrubá-lo, até termos
condições de pô-lo fora do poder.
Moreno fala
o seguinte: se há várias greves por aumento salariais, unificamos as greves
numa greve geral – o sistema, então, cai. Isso é um erro. Na década de 1930, os
franceses fizeram uma greve geral pelo simples aumento salarial diante da
hiperinflação – o governo e os patrões cederam a vitória simples… para depois a
inflação comer de novo os salários… Trotsky aprendeu com o erro: em caso de
inflação descontrolada, devemos exigir mais, “escala móvel de tempo de
trabalho!”, ou seja, aumentar o salário sempre que a inflação aumentar, mês a
mês, gatilho salarial. Como a burguesia não aceitará isso, pois lhe tirará o
lucro, o sistema, agora sim, pode cair.
A ARTE DE
PREVER
Trotsky
afirmou que a política é a arte de prever. Moreno afirmou que elaborar palavras
de ordem, políticas, é uma verdadeira arte. Na análise, devemos caracterizar
quais as possibilidades limitadas de futuro que a realidade impõe de acordo com
as decisões humanas e as circunstâncias. Incluímos aí a tendência de mudança
que desejamos fazer acontecer como resultado de nossa militância política.
Podemos, por exemplo, prever que um governo cairá, havendo duas formas de cair,
por golpe ou, ao contrário, por revolução.
O CASO DAS
REFORMAS
Em nossa
época, o tempo das reformas acabou. Mas pode acontece de um governo frágil ou
pressionado pelas grandes mobilizações, ou ainda diante de um crescimento
econômico extra, fazer algumas reformas para ter apoio popular. Marx ensina
que, diante de boas reformas, devemos fazer uma “revolução permanente”: sempre
exigir mais, mais reformas, melhoria das medidas. Se vem uma reforma, exigirmos
uma reforma e meia, aprofundamento.
O PSTU
cometeu erros grosseiros nesse sentido. O governo do PT fez uma reforma,
médicos cubanos para o povo, que prejudicava a classe média aristocrática dos
médicos. Numa posição sindicalista e sectária, o partido colocou-se contra o
programa. Assim fez com o RUNI, Minha casa Minha vida etc. Não viram a reforma,
isolando-se mais do povo. Várias vezes, o partido quase apenas traduziu
posições da classe média para a linguagem marxista e de esquerda, pois seus
membros também são de classe média.
SITUAÇÃO,
ETAPA, ÉPOCA
Para fazer
uma análise de conjuntura, faz-se necessário saber os tipos mais gerais de
circunstâncias, de como a realidade está. Apresentaremos de modo resumido os
tipos de condições existentes. Aqui, entra o tema da longa duração na história,
como interpretar a sociedade. Teóricos como Lenin, Trotsky e Moreno
dedicaram-se às classificações a seguir.
SITUAÇÃO
A conjuntura
política pode ter as seguintes situações: revolucionária, não revolucionária,
reacionária, contrarrevolucionária e pré-revolucionária. Vejamos cada uma em
comparação à situação revolucionária.
Lenin chama
a situação revolucionária como a conjuntura quando os trabalhadores já não
suportam viver como antes e os de cima são incapazes de manter a ordem. Essa é
uma forma resumida de expressar. Para complementarmos, mostremos a tempestade
perfeita:
1. Crise econômica
É necessário
que a economia esteja em depressão ou em crescimento fraco após uma forte
quebra. Isso motiva as demais mudanças.
2. Luta de classes
A classe
operária vai à luta com radicalidade e unidade. A parte mais pobre da classe
média vai para a esquerda. A burguesia divide-se.
3. Instituições
Os partidos
tradicionais, incluso de esquerda não revolucionária, são desmoralizados
perante a maioria do país. Pode ocorrer de o partido revolucionário crescer. A
gestão do Estado tem dificuldade de fazer o instrumento agir em defesa da
“ordem”. Surgem organizações de poder socialista, conselhos operários e
populares.
A situação
pré-revolucionária ocorre quando pelo menos um desses fatores ainda falta
amadurecer ou o conjunto dos elementos ainda está desenvolvendo-se,
amadurecendo.
A situação
reacionária ocorre, por exemplo, quando há crise econômica ou crescimento
fraco, mas baixíssima luta dos trabalhadores. Por exemplo: até 2016, houve uma
onda de lutas e greves no Brasil, porém as manifestações e protestos recuaram
imensamente por causa da volta do desemprego durante a crise iniciada em 2015,
logo a situação tornou-se reacionária – a burguesia e o Estado brasileiros
foram, unidos, para o ataque contra os trabalhadores.
A situação
não revolucionária é a de estabilidade econômica relativa e baixas lutas
sociais. Nesse período, pode até haver algumas reformas positivas por parte do
Estado. Aqui, a burguesia domina com alguma tranquilidade.
A situação
contrarrevolucionária ocorre quando há crise e a burguesia destrói a luta
operária e popular com métodos de guerra civil. Aí surge uma ditadura, o regime
político fecha-se.
ETAPA
Dentro da
etapa ocorrem diferentes situações. Os 24 anos de ditadura no Brasil foram uma
etapa contrarrevolucionária; dentro dela, ocorreram várias situações
(contrarrevolucionária, reacionária, não revolucionária e pré-revolucionária).
Os chamados anos dourados do capitalismo na Europa, do fim da segunda guerra em
1945 até a década de 1970, constituíram uma etapa não revolucionária, de
relativa estabilidade. Como vemos, a etapa é mais longa que a situação.
ÉPOCA
Há duas
épocas: 1) a de reforma e reação; 2) a de revolução. Enquanto a economia se
desenvolve mais ou menos bem – em termos teóricos: em combinação não
contraditória das forças produtivas com as relações de produção –, estamos numa
época próspera para o sistema (época de reforma e reação). Mas quando ocorre de
o desenvolvimento social e econômico chegar ao ponto em que precisa
revolucionar a sociedade inteira para continuar a desenvolver-se, então, só
então, chegamos à época de revoluções, de substituição de um sistema por outro.
Dentro das épocas ocorrem as etapas.
PROPOSTA DE
ATUALIZAÇÃO
Dentro de
uma situação, ocorrem momentos de recuo ou de avanço. Isso é orientado pela
luta de classes, se os trabalhadores estão na ofensiva ou na defensiva, se o
governo está com apoio ou sem, pela consciência geral e pela situação da
superestrutura. Em uma situação não revolucionária, por exemplo, uma baixíssima
taxa de desemprego pode levar os operários para a ofensiva, para greves cada
vez mais duras e longas, porque o medo de perder o emprego é menor – o momento
é de avanço. Mas a ofensiva das lutas aí é relativa, não muda a situação, que é
não revolucionária. Assim, temos quatro tipos de abstração: época, etapa,
situação, momento.
Por várias
vezes, o PSTU afirmou que a situação do Brasil era pré-revolucionária, quando
era um exagero, um impressionismo. Dizer, na prática, que “a nossa hora está
chegando” ajudava a manter o partido junto, disciplinado e acrítico com a
direção partidária – mas foi um erro permanente.
PROGRAMA DE
TRANSIÇÃO
Momentos
radicais exigem propostas radicais; momentos de paz social, propostas mais
leves e reformistas. É um absurdo levantar palavras de ordem de poder ou
profundas quando fora de uma crise econômica e social maduras. As seitas
levantam propostas radicais sempre, faça chuva, faça Sol – por quê? Porque são
inexperientes, porque querem se sentir revolucionárias, porque querem se diferenciar
dos demais partidos, porque caem no oportunismo de tentar ganhar ativistas
radicalizados para si de maneira artificial e errada etc. Nas lutas e nas
eleições, apresentamos duas ou três propostas gerais que estão de acordo com o
momento do país, além de um programa de governo completo com planos de médio e
longo prazos, o que fazer e sua fonte de financiamento.
Em resumo,
nos momentos de crise, nosso programa é este:
1) Caso de alto desemprego. Plano de obras
públicas para gerar empregos; redução drástica da jornada de trabalho como de
44 para 30 horas semanais; escala móvel de tempo de trabalho, ou seja, a
jornada durar o tanto, como entre 30 e 44 horas, que faça com que todos tenham
emprego e atendamos a demanda por força de trabalho na sociedade.
2) Caso de alta inflação. O limitado
congelamento de alguns preços, útil em certas circunstâncias, deve dar lugar ao
gatilho salarial ou escala móvel de salário, isto é, aumentar o salário
automaticamente com o aumento dos preços.
3) Empresa em crise. Os trabalhadores
devem fazer uma “inspeção operária da empresa”, para saber como andam as
finanças e a produção na fábrica – e exigir o “fim do segredo comercial”, saber
das contas empresariais para análise rigorosa. Nessa luta, devem consolidar um
“comitê de fábrica” para cuidar dos interesses dos funcionários. Caso os donos
da fábrica queiram demitir ou fechar a empresa, os trabalhadores devem exigir o
“controle operário da produção”, a “gestão operária da produção” – e a
estatização da empresa sem indenizações.
4) Máfia dos Bancos. O capitalismo
endividou os trabalhadores para poder escoar as mercadorias; portanto, exigimos
a anulação total e irrestrita da dívida dos trabalhadores e pequenos
empresários. Se preciso, estatizaremos os bancos e o capital financeiro para
garantir a qualidade de vida da maioria – um banco único do Estado.
5) Economia. As empresas centrais do país,
aquelas que determinam os ciclos do capital, devem ser estatizadas, sem
indenização, sob gestão dos operários.
6) Deve-se formar uma rede única e estatal
de grande comércio de atacado e de varejo, incluso estoques sociais contra a
oferta baixa e a especulação. Nessa empresa, os grandes transportes também
estarão sob sua gestão. Tal medida não deve mexer no pequeno comércio, antes
irá oferecer produtos mais baratos para sua revenda.
7) Combate ao fascismo. Os trabalhadores
defendem-se com piquetes de greve, quando usam da força para impedir a produção
e a repressão; para enfrentar o fascismo e suas milícias, organizamos os
destacamentos de combate defensivos; à beira da revolução, surge a necessidade
de as armas deixarem de ser um privilégio de poucos, por isso o povo armado
deve formar milícias operárias.
8) Poder operário e popular. Apenas em
situações de grave crise, próximo de ou durante uma situação revolucionária,
surgem organismos de poder paralelos, as assembleias ou os conselhos que
aparecem nos locais de trabalho e nos bairros populares. Em alguns casos, o
partido marxista chama pela criação de tais organismos ou os amplia por todo o país.
Todo poder aos conselhos! Todo poder aos comitês de fábrica!
Exigências
como maiores impostos sobre lucros e heranças com redução dos impostos sobre os
trabalhadores e a classe média são importantes, devem ser defendidas; porém não
resolvem o problema global.
As propostas
acima são nomeadas “transicionais”, ou seja, soam como reformas viáveis, ainda
que difíceis, mas empurram para o revolucionamento total do modo de vida já que
enfrentam as leis do atual sistema. Por exemplo: o capitalismo precisa de
desemprego para reduzir os salários e a luta social, em especial em momentos de
crise, logo, impor o pleno emprego permanente com a escala móvel de tempo de
trabalho é inaceitável para a burguesia, necessária e urgente aos
trabalhadores.
Duas considerações
ainda precisam ser feitas.
Os partidos
centristas, por serem formados por militantes de classe média servidora
pública, defendem, sem perceber, o fortalecimento do Estado burguês como com o
fim do pagamento da dívida estatal, ruptura com o Euro/EU, “fora governo” de
plantão, estatização indiscriminada etc. São propostas em si corretas, mas
apenas terão toda força se combinadas com propostas de transição prioritárias
para o momento político.
Outro ponto,
as grandes empresas de agronegócio e do campo serão estatizadas pelo governo
socialista. A pauta da reforma agrária é da revolução burguesa, não da
socialista, contra a poder agrário feudal. Os comunistas tiveram de defender
tal exigência porque no século 20 o campesinato ainda era muito forte, porque o
tempo da revolução socialista ainda faltava chegar. A situação agora é outra. O
Estado operário e popular fará uma reforma agrária secundária, mas manterá,
agora unificada e estatizada sob gestão de seus funcionários, a grande terra, a
grande propriedade. Isso tem pelo menos dois motivos: 1) por escala de produção
superior, a fome será apenas lembrança de um passado bárbaro, 2) a exportação
de grãos e outros derivados ajudará na manutenção das necessárias importações.
ESTADO,
REGIME, GOVERNO
Como dissemos,
o Estado sempre serve a alguma classe, servindo para o funcionamento tão bom
quanto possível de uma sociedade baseada na exploração do homem pelo homem. A
ferramenta, então, define-se para qual projeto de sociedade ela funciona.
O regime de
um Estado é a forma como as instituições são organizadas – qual instituição
lidera o aparato? Vamos aos exemplos práticos. Se as forças armadas controlam
com mão de ferro o Estado em uma ditadura que permite um parlamento com apenas
dois partidos oficiais, então temos um regime bonapartista ou uma ditadura
militar. Se o parlamento e a presidência são eleitos por voto universal, então
temos um regime democrático burguês. Se um exército partidário liderado por um
partido fascista concentra o poder para si impedindo a existência de qualquer
outro partido, então temos um regime fascista. Se o regime militar fecha-se ao
ponto de alta repressão, censura e mesmo a proibição de um parlamento, então
temos um regime semifascista.
Há inúmeros
tipos de regime de Estado classificáveis; o que importa é evitar confundir
regime e Estado. Por exemplo: um Estado pode ser socialista, porém ter um
regime indesejável, sem democracia socialista, ou seja, uma ditadura
estalinista; nesse caso, defendemos o tipo de Estado – e lutamos contra o tipo
de regime porque há aí uma contradição.
Já o governo
é formado pelos grupos que assumem a direção do Estado no regime. É um conceito
mais simples e direto. Merece destaque os complicados “governos de frente
popular”, que são tema de outro capítulo.
A DEMOCRACIA
Assim como o
Estado, a democracia também é de classe. Na sociedade escravocrata da Grécia,
surgiu a democracia escravista ou grega, onde os homens livres, ou seja,
senhores de escravos e comerciantes, poderiam debater e votar os rumos da cidade
de Atenas. Escravos, estrangeiros e mulheres ficavam de fora dessa forma
democrática bastante limitada.
Com o
capitalismo, surgiu a democracia burguesa. O projeto inicial dos patrões era o
modelo de Atenas, apenas homens ricos votando, mas tiveram que abrir o voto
para trabalhadores e mulheres tão devagar quanto possível.
A democracia
burguesa é uma farsa bem armada: os trabalhadores, que são maioria, votam, mas
não decidem. Essa democracia elege supostos representantes que agem como querem
depois de eleitos. Em geral, os políticos são financiados por empresários para
que ganhem as eleições e depois lhes deem vantagens. A estrutura das eleições é
feita para direcionar o voto popular para candidatos da ordem como o fato de
partidos maiores terem mais tempo de TV para propaganda eleitoral. É claro: a
função é iludir aqueles a viver de salário de que alguma mudança é possível de
forma passiva, sem luta, apenas “votando certo”. O modelo formalmente
democrático é melhor do que uma ditadura, pois facilita a classe trabalhadora
grevar, organizar-se, organizar um partido para si, etc. Porém evitamos a
ilusão: se for preciso, até os melhores democratas usarão a força, até o
exército, para garantir a exploração de classe trabalhadora.
A democracia
socialista ou a ditadura do proletariado é a democracia real, da maioria. É uma
democracia participativa e direta: nos locais de trabalho e nos bairros
populares formam-se assembleias de base que debatem todos os assuntos
necessários e votam qual decisão tomar, então se elege um comitê de
representantes responsáveis por garantir a aplicação daquilo votado e
encaminhar questões de rotina. Esses representantes não têm privilégios,
evita-se dar “vantagens” aos que ocupam o cargo para afastar oportunistas ou
mesmo a acomodação daqueles honestos. Os diferentes partidos que aceitarem o
novo poder levarão aos trabalhadores suas propostas por meio de debates abertos
físicos, via TV e internet – poderão disputar os cargos dispostos pela
sociedade. Os mandatos públicos em tal sociedade serão perdíveis, revogáveis, a
qualquer momento se assim os representados o quiserem – se o político
desagradar seus representados, ele pode ser imediatamente substituído por outro
através de uma votação nova. Por meio das assembleias gerais ou por meio dos
representantes, são eleitos os cargos mais altos, os representantes da cidade,
do estado, do país. Além do mais, votações via internet permitirão ações ainda
mais diretas da maioria da população sobre seu Estado.
O Estado
socialista é uma “ditadura” porque impede que os ricos retornem ao poder;
assim, é também a dominação de uma classe sobre outra.
PELO FIM DO
ESTADO!
O Estado
socialista ainda é uma influência de gestão sobre coisas e sobre homens; além
disso, o exército regular será mantido por algumas décadas (já no início do
socialismo, todos os trabalhadores terão direito de armar-se, de ter armas e
saber manejá-las, tirando o controle da força das mãos uma casta estatal, de um
grupo, etc.). Isso muda na próxima fase, depois do socialismo, no comunismo.
Quando a nova sociedade consolidar-se por todo o mundo, um grupo destacado de
militares será desnecessário e até mesmo o armamento popular será algo em
desuso. Com o avanço da ciência, da tecnologia e da sociedade, as classes
sociais deixarão de existir, havendo então apenas indivíduos integrados nas
suas comunidades. A gestão será somente sobre as coisas enquanto os homens
terão ainda mais autonomia de ação. Como todos viverão bem, não haverá
necessidade de sindicatos e partidos. As diferentes organizações sociais se
fundirão em uma organização geral única que dispensará a força bruta. Isso
levará um bom tempo, por isso nossa geração não verá isso acontecer,
infelizmente – porém podemos dar os primeiros passos.
NOÇÕES
BÁSICAS DE ECONOMIA PARA ELABORAR POLÍTICA
CRISE DE
SUPERPRODUÇÃO DE CAPITAL – E MERCADORIAS
Mais ou
menos de 10 em 10 anos, ocorre uma crise econômica no capitalismo. Em geral, a
causa de fundo de tais explosões é a chamada superprodução de capitais
(máquinas, matérias-primas, etc.) que produz uma superprodução de mercadorias.
Isso merece máximo destaque. No feudalismo ou no escravismo antigo, as crises
eram de baixa produção, de subprodução, pois, se acontecia uma seca anormal ou
inverno rigoroso, a produção no campo caía a níveis muito baixos e perigosos.
Sob o atual sistema, isso é diferente, pois a crise – e sua miséria – ocorre
por haver máquinas demais, matéria-prima demais, empresas demais, mercadorias
demais, etc.
Vejamos,
parágrafo a parágrafo, os fatores que produzem as crises periódicas.
Na busca de
lucro, novos e velhos patrões investem em meios de produção e em força de
trabalho. A quantidade de empresas e de máquinas aumenta, a lucratividade é
disputada a ferro e fogo. Mas se há ainda mais investimentos, ocorre um problema:
a população trabalhadora nunca cresce na mesma velocidade do crescimento das
fábricas e do número delas. O desemprego cai ao ponto de quase faltar mão de
obra disponível; então as greves aumentam e ficam cada vez mais fortes, os
trabalhadores têm aumento real de salários. Isso arranca dos patrões parte de
seu lucro, que passa a pagar os funcionários. Cai a taxa e a massa de lucro.
A euforia da
fase de crescimento da economia produz muitos investimentos, por isso aumenta o
número de concorrentes. Como todos estão disputando mercado, os lucros caem,
são mais divididos – e o preço das mercadorias caem ainda mais com a grande
oferta.
Em geral,
tem-se a tendência à deflação dos preços, menos o preço da força de trabalho,
que cresce. Mas tal pleno emprego é muito diferente de equilíbrio. Enquanto as
mercadorias de algumas empresas ficam mais baratas, as de outras ficam mais
caras por causa da demanda aumentada. Por exemplo: duplica ou triplica o número
de fábricas de fiação, mas as empresas no campo que vendem o algodão para elas
não conseguem aumentar na mesma proporção a oferta dessa matéria-prima da
fiação – leva um tempo para cultivar mais plantações algodoeiras. Os preços aí
sobem: por mais um meio, o lucro cai para vários capitalistas.
Um pouco
antes das crises, o mercado está no seu máximo, por isso a demanda de dinheiro
cresce. Além do mais, os capitalistas investem mais em busca de novos lucros,
fazendo empréstimos novos. Quando as mercadorias acumulam-se demais no mercado,
sem serem vendidas ou vendidas abaixo do preço comum, os empréstimos encontram
dificuldade de ser pagos. Esses fatores fazem subir a taxa de juros, fazem com
que o capitalista industrial passe uma parte maior do mais-valor, do lucro,
para o banqueiro. Os economistas vulgares pensam que a crise vem porque sobem
os juros, já que sempre sobe os juros antes das crises se revelem em suas
formas destrutivas. Eles veem apenas a aparência, então invertem causa e
efeito. É porque a crise está dando seus primeiros sinais que os juros sobem.
CRISE E
CONTRATENDÊNCIA
Do ponto de
vista do capital, a crise é, na verdade, uma solução temporária – e o pleno
emprego, ou seja, a economia a todo vapor, é, na verdade, uma crise. Isso faz
sentido, embora seja a quebra econômica uma tragédia aos trabalhadores. Vejamos
as contratendências à tendência destrutiva das crises de superprodução de
capital:
1. Baixa do preço;
Com as
falências e com o desemprego, o consumo geral cai – a demanda cai em relação à
oferta de mercadorias. As empresas que resistem à quebradeira, normalmente as
maiores, podem comprar matéria-prima, máquinas, etc. por um preço mais
vantajoso.
2. Redução dos salários;
Na crise, o
desemprego aumenta, por isso as greves param de ter força, o medo da miséria
volta. O patrão consegue novamente impor baixos salários, maior jornada de
trabalho e mais intensidade do trabalho. Além do mais, como a crise é
superprodução e há queda da demanda por desemprego, as mercadorias que o
operário compra com seu salário ficam mais baratas.
3. Falências;
A falência
de muitas empresas, especialmente as menores, faz com que a concorrência reduza
e, então, menor quantidade de capitalistas embolsa o lucro total da sociedade.
4. Novas mercadorias;
Finalmente,
as mercadorias acumuladas nos mercados são vendidas ou perdem validade. Então
demanda-se nova produção.
SUBCONSUMO?
A economia
vulgar diz o quase óbvio fato de que as crises são por demanda baixa, por
subconsumo. Eles deixam de observar que a estrutura de classes da sociedade
capitalista limita o consumo geral inevitavelmente. E mais. Logo antes da
crise, o consumo dos trabalhadores aumenta, não se reduz, porque o pleno
emprego, mais demanda que oferta de força de trabalho, empurra para a elevação
dos salários – ocorre que, mesmo assim, a oferta cresce ainda muito mais
rapidamente. O problema não é a falta de demanda, mas vender as mercadorias a
preços que compensem. Daí a crise. Mais ainda: as crises ocorrem porque a queda
da taxa de lucro, tema de capítulo anterior, depois afeta negativamente a massa
de lucro porque o pleno emprego suga lucro do empresário com os aumentos
salariais, etc.
CAPITAL
PRODUTOR DE JUROS
Todos odeiam
os bancos. Tanto trabalhadores quanto empresários produtivos chamam os
banqueiros parasitas, oportunistas, aqueles que vivem da desgraça alheia sem
nada de fato contribuir. A rejeição tem justificativa, no entanto os bancos são
vitais ao sistema capitalista na medida em que reúnem quantidade de dinheiro
enorme capaz de financiar novos e grandes investimentos na economia real.
De início,
lembramos que há várias formas de produzir juros. Um comerciante pode adiantar
mercadorias a outro comerciante em troca de juros sobre o preço delas – juro
comercial; quando um capitalista aluga sua máquina a outro capitalista, há
também relação de juros. Mas o destaque deste capítulo é o capital financeiro.
CICLO DE
JUROS
O mais
evidente sobre a taxa de juros é sua dependência entre oferta e demanda de
dinheiro. Se os capitalistas industriais compram mais barato a matéria-prima e
a força de trabalho, logo sobra dinheiro, que é guardado no banco até ser
novamente necessário ou até acumular numa quantidade alta o bastante para
comprar nova máquina, etc. – com maior quantidade de dinheiro no banco, os
juros caem.
Há uma luta
social entre os empresários, industriais e comerciantes, e os banqueiros por
qual será a taxa de juros. Observado em ciclos longos da economia, de
crescimento e crise, para além dessa luta, percebemos um movimento comum, geral
e tendencial.
No início
dos ciclos econômicos, depois da crise, com crescimento inicial, os juros são
baixos; com o crescimento maior da economia, os juros sobem, mas ainda são
baixos; com o altíssimo aquecimento da economia, os juros sobem, são altos; com
a quebra súbita da economia, com a crise, os juros atingem o ponto máximo para
o alto; após a destruição da crise, os juros caem aos níveis mais baixos. E o
ciclo se repete novamente, novamente, etc. Expliquemos o motivo desse
movimento. Logo depois da crise, o juro é muito baixo porque há poucas
empresas, gasta-se menos com salários e matéria-prima, demandando menos
dinheiro, investe-se pouco, os preços das mercadorias são baixos; com o
aquecimento da economia, demanda-se mais dinheiro, mas ainda um tanto limitado;
com a euforia do grande crescimento, há investimento em todo canto, demandando
cada vez mais dinheiro, e os juros sobem; com a crise, todos correm nervosos
aos bancos para pagar suas dívidas, suas contas, e os empréstimos se tornam
mais arriscados, os juros atingem o máximo; após a destruição da crise, a demanda
por dinheiro desaba, caindo os juros ao mínimo.
JUROS E
DÍVIDA PÚBLICA
Com a
existência moderna de bancos centrais, formalmente as taxas de juros são
determinados pelo Estado. Apenas formalmente, repito. Eles são obrigados,
geralmente, a seguir os ciclos dos juros como parte do ciclo da economia real.
Se o governo, banco central, emite dívida nova, ele tira dinheiro dos bancos,
que compram os títulos da dívida pública, os juros sobem por isso; se o governo
compra de volta os títulos da dívida pública, retirando-os do mercado, ele joga
dinheiro no mercado financeiro, logo os juros caem.
Se os juros
da dívida pública sobem, os bancos correm para comprar mais títulos, gastando
dinheiro, por isso os juros bancários também sobem. Se os juros da dívida pública
caem, tornando-se menos atraente, os bancos investem menos nesses títulos, e os
juros caem. Tal movimento com títulos da dívida se deve porque é um
investimento seguro, garantido, pago com impostos ou com novas dívidas.
Essa relação
entre taxa de juros e dívida pública não está no livro III de O Capital de
Marx, sendo um acréscimo comum sobre o mundo financeiro hoje.
TAXA DE
LUCRO E TAXA DE JUROS
O juro vem
do trabalho não pago do operário, o mais-valor (a mais-valia), vindo de modo
indireto ao bolso do banqueiro quando o comerciante e o industrial têm de pagar
suas dívidas. Dessa forma, a taxa de juros é regulada e limitada pela taxa de
lucro. Ora, vimos em outro capítulo, com o desenvolvimento do capitalismo, a
tendência é cair cada vez mais a taxa de lucro. Logo a taxa de juros também
tende a cair ao mínimo!
Em nossa
época, tornou-se comum taxa de juros real próximo de zero como sintoma da queda
da taxa de lucro aos atuais níveis. Com o crédito muito barato, especuladores e
investidores aventureiros têm levado dinheiro para o cassino da bolsa de
valores, gerando uma hiperinflação de ações das empresas.
CAPITAL
FICTÍCIO
Há duas
formas principais de capital fictício: dívida pública e ações. No caso da
dívida pública, o capital é fictício porque o Estado simplesmente gasta o
dinheiro; ao juro recebido pelo título da dívida acrescenta-se que o
emprestador nada perde, nada de fato dá, pois os próprios títulos podem ser
usados como dinheiro.
Já as ações
são um título de direito sobre a propriedade ou sobre o lucro futuro de uma
empresa. Uma ação pode dar direito a, por exemplo, 1% da empresa, logo, 1% do
lucro. É como se o mesmo capital se
duplicasse, mantendo seu lado real e físico e, por outro lado, como um título de
direito. Essas chamadas ações podem ser vendidas no mercado, podendo ficar até
mais caras do que o lucro que realmente podem render (o que produz uma crise).
Hoje, com o crédito barato, a procura por ações em um verdadeiro jogo alucinado
atingiu um ponto máximo e absurdo.
TAXA DE
JUROS E TAXA DE CÂMBIO
Quando o
Brasil exporta muito e, principalmente, por altos preços, os exportadores
vendem em dólar ao mercado mundial. Depois, trocam esse dinheiro mundial por
dinheiro da nação, o real, com o governo, com o Banco Central. Assim, se faltar
dólar porque vendeu pouco e/ou barato aos outros países, o preço do dólar em
real sobe (precisa de 4 reais para comprar 1 dólar, por exemplo); quando vende
muito e a preços altos, o dólar fica mais barato por ele ser mais abundante no
Banco Central.
Esse dólar
acumulado tende a ir, a maior parte, para uma conta nos bancos e na dívida
pública dos EUA. São nossas reservas internacionais.
Quando a
taxa de juros da dívida pública sobe, aumenta também a entrada de dólar, pois
os investidores internacionais do capital especulativo querem investir nos
títulos da dívida em busca de um lucro extra qualquer. Com mais dólar, fica
mais barato importar – isso derruba os preços, empurra para reduzir a inflação
(Marx não percebeu isso, que é uma contribuição de Serrano).
BANCOS E
SOCIALISMO
Há dois
fatores que fazem dos bancos um aviso do socialismo. Primeiro, eles forçam o
desenvolvimento da indústria e da economia até o limite do sistema, dando base
para a abundância socialista e as duras crises do capital. Segundo, ao controlar
empresas e o dinheiro, serão a base para a futura contabilidade geral da
sociedade com economia planejada socialista.
POLÍTICA E
CLASSES
É preciso
ter clareza que quase toda medida de governo busca ou mais lucro ou diminuir a
luta de classes, contra o nosso lado. Mas eles dirão que suas medidas são “pelo
bem país”.
POLÍTICA E
QUESTÃO MILITAR
Se o leitor
quer saber elaborar política apenas na sua empresa, tudo bem. Mas se há o risco
de se tornar dirigente político em nível de cidade, estado país, ou mundo –
então tem que saber o básico do básico de arte militar. Lembre-se que o
marxismo foca na totalidade do real. Se vais fazer uma análise internacional,
provavelmente a situação de alguma guerra terá de ser compreendida. De começo,
indico o canal de notícias e análises militares “Hoje no mundo militar”, no
youtube, com vídeos novos todos os dias. Quando com tempo livre e sobrando,
assista documentários sobre guerras e, em principal, lenha livros sobre. O Da
guerra, de clausewitz, apesar de desatualizado, é merlhor para entender os
princípios gerais. Aqui, vamos fazer um exposição breve dos elementos, para
ajudar a organizar e desenvolver teus pensamentos:
PARA UM
MANUAL MILITAR
Existem
regras gerais, universais, para a arte da guerra? Há, pelo menos, afirmações
que são encontradas de modo semelhante entre os principais tratados militares
da história. Aqui, como um glossário geral, apresentamos certas “leis” que se
repetem mesmo com alterações significativas na concretude dos conflitos.
Abaixo, desenvolveremos cada um dos pontos.
1. A guerra é resultado da economia
Razão
militar
Os filmes
costumam afirmar a luta do poder pelo… poder, como algo abstrato e vazio. É um
grande engano; via de regra, a guerra tem objetivo de gerar riquezas ao
vencedor ou ao agressor. Pode-se invadir uma ilha próxima para ter apenas
melhor localização militar, mas mesmo indiretamente há o objetivo lucrativo.
O Estado
socialista, que visa ao bem-estar da maioria, com economia planejada e
centralizada, tem mais facilidade de girar recursos para o conflito, rumo à
vitória.
Cada época
com sua forma de guerra
Cada época
exige uma forma de fazer guerra. O problema, então, é que se cristaliza um modo
militar obsoleto, mas que teima em manter-se até o último grão de minuto.
O escravismo
no início tem um modo militar diferente de seu auge-crise. Via de regra, quando
a força militar deixa de ser feita com os cidadãos livres armados, quando se
profissionaliza a força de guerra, a decadência ocorre; foi assim no escravismo
e é assim hoje, no capitalismo. Uma casta com desejos próprios surge e
desestabiliza o estado.
O modo
militar feudal baseava-se no feudo isolado, em autodefesa desde os cavaleiros
em postos de comando. Ora, isso resolveu a crise militar anterior, do
escravismo romano – mas também se tornou atrasado. Os novos exércitos inglês e
francês mudaram radicalmente o modo de guerrear, de acordo com o mundo novo,
burguês; por exemplo, o cargo de comando passou a ser dado por mérito, não mais
por origem de sangue; com o crescimento das cidades, o abastecimento das tropas
passou a ocorrer nos locais urbanos por onde se passava por meio de compras,
confisco ou em harmonia com o poder local.
O socialismo
substituirá progressivamente, desde seu começo, o exército por o povo armado,
com leves e pesados calibres, e com treinamento básico, até que o comunismo
tenha armas apenas para jogos e esportes, numa humanidade unificada. Isso é
condição da democracia, do bom governo, da segurança e da superioridade militar
socialista em seu começo, quando ainda haverá países capitalistas. Diz
Maquiavel: apenas o mau governante teme seu povo armado.
De qualquer
modo, vale destacar a regra geral: raramente o objetivo é destruir totalmente o
inimigo, mas tornar para ele demasiado custoso manter o conflito.
Empresas de
guerra
Se a guerra
em si, de modo direto, passa a ser fonte de lucro, seja do infante ou seja do
exército, então o Estado ou o governo cai. Se o capitalismo hoje se levasse a
sério, proibiria empresas de mercenários, empresas privadas de produção para
guerra etc. Mas o caminho é, agora, o oposto: até pseudoestados como o de
Israel dependem da construção civil e da empresa militar para sua economia,
logo necessita de guerra para tomar terras, reconstruir e aumentar as ações na
bolsa de suas empresas militares.
A guerra, se
injusta em especial, tantas vezes derruba o governo ou mesmo o sistema nos
países em conflito.
2. A guerra é a continuação da política
A máxima
acima vem de Von Clausewitz, de imediato apropriado pelo marxismo. O silogismo
torna-se este:
A guerra é a
continuação da política (por outros meios),
A política é
economia concentrada;
Logo, a
guerra é a continuação da economia.
Desenvolvamos,
portanto, as reflexões necessárias sobre.
Vejamos a
guerra do Vietnã. Os EUA venceram quase todos os conflitos militares naquele
país asiático, mas perdeu a guerra porque o seu prolongamento do conflito fez o
governo perder apoio de sua população. Também os EUA não invadem sua vizinha
Cuba por fala de condições políticas, não militares.
Há vantagens
em estar de acordo com a história
Estar do
lado certo, junto ao futuro, dá alguma força; mas não absoluta, nenhuma
garantia de vitória certa. Diante da superioridade militar do lado sul na
guerra civil americana, Marx, ainda assim, apostou no norte industrial por
estar de acordo com as leis do desenvolvimento capitalista.
Che Guevara
cometeu um pesado erro vanguardista e blanquista ao pensar que, em geral, pode
uma pequena guerrilha vencer um exército nacional sem as devidas condições
econômicas e políticas favoráveis. Para ele, a própria guerrilha faz suas
condições. É um grande erro, que levou a perdemos muitos lutadores.
O programa
O primeiro
passo para vencer uma guerra é convencer cidadãos, na prática, de sua justa
luta. Quando os operários russos conquistaram jornada de 8 horas diárias e os
camponeses ganharam terras novas, eles foram com máxima disciplina para a luta
contra 14 – 14! – exércitos entre os mais poderosos do mundo. E venceram. Na
guerra civil americana, o general do norte decretou: está abolida a escravidão
em todo o território. Isso atuou para desestabilizar o sul escravista,
facilitando a vitória.
Como o
perfil afeta o perfil da guerra
Na guerra
civil russa, os 14 exércitos invasores agiram cada um por si, em disciplina
nacional, em busca de um pedaço próprio do território russo. Na outra ponta, o
exército vermelho reuniu sob sua força, desta vez, unificada 5 milhões de
combatentes. Veja-se que causas econômicas e políticas afetaram o perfil dos
exércitos e da guerra, pendendo para a vitória de um lado contra o outro. O
grande exército da URSS Pôde, assim, enfrentar um por um os invasores
separados.
Ainda na
revolução russa, uma nova guerra “mundial” logo em seguida da primeira grande
guerra, somado com a nova pátria socialista, levou a uma onda de greves e
protestos nos países invasores, em solidariedade com a URSS, o que desestimulou
o conflito.
Educação
política
Os soldados
e o povo devem ser convencidos. Portanto, uma luta por suas consciências deve
ser permanente. Não basta fé, pois é preciso ter clareza do motivo de estar
lutando.
Evitar
sentimento de “vitória antecipada”
Dizer, por
exemplo, “fascistas não passarão!” revela mais o medo de que passem – e podem
passar, mesmo – do que uma palavra de ordem útil; ela, na verdade, desarma o
lado antifascista. A arrogância de vitória certa já foi a ruína de muitos em
batalha. Por isso, deve-se manter o sinal de alerta, sempre e sempre. Em geral,
o exército mais fraco é o mais criativo e ousado exato por medo da derrota.
O desânimo e
o medo total devem igualmente ser evitados. A esperança de vencer, portanto,
deve ergue o moral dos soldados.
3. A quantidade de soldados importa
Muitos
soldados, ainda que medianos, ganham de poucos soldados bem treinados. O número
tem grande peso. Um exército gigantesco contra um pequeno pode, ainda assim,
perder, pois o defeito da força é confiar apenas na força. Assim, a tática
fabiana de evitar conflito direto e cortar, em ataques surpresa, a comunicação
e a logística do poderoso (e custoso) inimigo pode levar à vitória. A
concentração alta de um exército leva à fragmentação guerrilheira de outro
pequeno. Nem tudo é número: quem é dono de fato do território também tem certa
vantagem, mesmo que em minoria.
Nos países,
aqueles exércitos que não têm grande tecnologia investem na quantidade maior de
materiais menos avançados e de soldados.
A quantidade
é, ela mesma, uma qualidade.
4. A qualidade dos militares importa
Engels, ao
tratar das primeiras e fracassadas revoluções burguesas, toma nota que
mendigos, vagabundos, ladrões etc. participarem de exércitos, o que atrapalhou,
por exemplo, a disciplina.
Na guerra,
basta um treinamento médio, mas com alguns grupos de “elite” melhor preparados.
Classe dos
soldados
Trotsky, ao
fundar o Exército Vermelho, fez questão que a primeira leva de oficiais e
soldados fossem operários, base social do novo Estado. Só então chamou os
camponeses, mas apenas aqueles que não exploravam trabalho alheio.
Os
operários, e os camponeses, são gente prática, disciplinada “naturalmente” no
trabalho duro, acostuma com pouco e tensão, útil para diferentes serviços. Já
os membros da classe média, em geral, não têm tais características e
psicologia.
Comandante
O perfil do
comandante, sua personalidade, afeta o perfil geral do seu exército e da
guerra. Se for, por exemplo, um homem disciplinado, mas, ou por isso, sem
criatividade, afeta toda a operação.
Perfil
nacional
Euclides da
Cunha observou que o soldado brasileiro não serve para manobras complexas, logo
seu comandante, além de demonstrar vigor, deve dar instruções gerais aos
subordinados e, então, confiar em suas iniciativas próprias. Cada país tem,
assim, uma cultura particular que deve ser levada em conta no perfil do
soldado.
Soldados dos
países ricos e pobres
Um soldado
brasileiro é, via de regra, mais tolerante à tensão do que um suíço. São vidas
reais muito diferentes, um deles precário desde o nascimento. Eis uma armadilha
para os imperialistas.
Higiene
Tantas
vezes, a principal causa de baixas no exército são as doenças, evitáveis
algumas delas. Por isso, manuais simples sobre como ferver ou filtrar a água
são muito úteis e devem ser seguidos à risca.
5. Priorizar outros setores que não a
infantaria costuma levar à derrota
Os EUA no
Vietinã, a URSS no Afeganistão – ambos priorizaram a maquinaria sobre a
infantaria, e perderam. É irresistível a um comandante usar sua vantagem, seus
tanques etc. Isso é uma lei poderosa: deve-se priorizar a infantaria, os
soldados.
Veja-se que
com a alta urbanização e a guerra urbana, a infantaria ganha ainda maior
importância para manobras de terreno (os soldados lidam melhor com o caos da
cidade em guerra do que as máquinas). Já o maquinário pesado exige muito custo
de manutenção e conserto, além de exigir muita energia, o que por também exige
ainda mais da logística. Os custos necessários, como manter operadores
especializados no uso e no trato do material tecnológico, multiplicam-se. Nas
batalhas, armas baratas ou semicaseiras podem prejudicar meios pesados. A
máquina é necessária ao combate, mas sua prioridade é causa comum de derrotas.
6. É necessário desestimular o inimigo
Tratar bem
quem desiste no outro lado – punir com a morte quem do seu lado desiste. Eis
uma regra de ouro, pois evita que se lute até o limite.
Aqui, propagandas
sobre os soldados do inimigo também são válidos.
Nunca cercar
totalmente o inimigo, sempre deixar uma brecha para ele fugir – ou, então,
sempre lutará com máxima disciplina e heroísmo.
7. Sempre que possível e útil, engane o
adversário
Sun Tzu diz
algo do tipo: 1) se és mais forte, pareça mais fraco para o inimigo tomar uma
ação precipitada; 2) se és mais fraco, pareça mais forte para o inimigo ter
dúvidas, hesitar.
Deve-se ter
a sabedoria de enganar quando necessário, de modo criativo, ou ocultar
informações. Na guerra da Ucrânia o exército ucraniano deu a intender que
atacaria uma cidade para fazer os russos esvaziarem outra, o que deu certo,
permitindo retomar o território em outro ponto.
8. Sem fórmulas fixas, deve-se avaliar
sempre a situação concreta e o todo
Inexiste
norma ou modo de combate exemplar. Um bom comandante primeiro colhe todos os
dados possíveis, trata de adivinhar as ações do inimigo e toma postura ativa,
iniciativa.
9. A guerra é uma otimização do uso de
energia
É preciso não
esgotar, extensiva ou intensivamente, seus soldados, ainda que se exija grande
disciplina deles. Nesse sentido, a logística é importantíssima para abastecer
as tropas. Um comandante tem de pensar em termos energéticos.
10. A defesa territorial ativa costuma ser
superior ao ataque
Pensa-se a
defesa como passivo e o ataque como ativo. Mas, por exemplo, quem está na
defensiva, pode tomar a iniciativa de cercar o inimigo ou operar surpresas.
Dito isso, de imediato, temos esta lei: a vantagem defensiva, como defender o
próprio território, usada em geral pelo mais fraco, serve para, assim que
possível, ir, mudar, para a ofensiva.
A coisa
acontece muito assim: o lado invasor, ofensivo, vai pra luta com força máxima,
arrasa cidades e avança com força imensa por boa parte ou quase todo o
território do inimigo. Parece que ele vai ganhar fácil, mas há um engano: 1)
ficou mais longe de seu próprio país, logo tem custos maiores de manter o
exército por causa da distância; 2) logo, sabotadores podem cortar seus transportes
e comunicações; 3) logo, o povo do país invadido é hostil e os sabota; 4) logo,
concentrou-se os soldados inimigos em um pequeno território, o que lhes dá uma
vantagem, mais força; etc. Então, começam as demissões de generais do país
invasor, pois seu exército começa, passo a passo, a perder o território antes
conquistado. Veja-se: o atacante invasor vai com máxima força, mas essa força
vai caindo cada vez mais por morte, por doença, por cansaço, por falta de
recursos, por desgaste político etc.
Terreno
Quem está na
defensiva tem a vantagem de posicionar-se em pontos vantajosos antes, como
locais altos (por onde vê, atira e localiza-se melhor – mas, em si, não é uma
vantagem absoluta, mistificada).
Uma das
vantagens é, assim, ao conhecer o cenário, poder operar surpresas contra o
invasor.
Povo
O apoio
popular na marcha, na logística, na moral, na camuflagem entre o povo fortalece
o exército que está defendendo o território. Franco atiradores, selecionados
para matar alvos específicos, podem misturar-se na população, por exemplo.
O povo
armado em milícias pode ser condição da vitória da defesa, antes de ir ao
ataque. Pequenos grupos de cidadãos armados podem ter a iniciativa, com apoio
simpels do exército, de atacar e recuar os flancos (lados) do exército invasor
Logística
Quem defende
território pode ter facilidade de comunicação e transporte. Já quem avança
sobre outro país, tem este custo aumentado. Na II Guerra, a Alemanha avançou
por demais na grande Rússia, o que dificultou a retaguarda e a manutenção das
tropas; além disso, permitiu que grupos especiais atacassem suas provisões a
caminho.
Desgaste
O exército
que avança, que invade, na ofensiva tem desgaste maior. Uma defesa ativa, não
passiva, aumentar ainda mais o desgaste militar. Assim, na guerra assimétrica,
de um grande exército contra um pequeno, este aposta no prolongamento do
conflito, tornando muito custoso ao inimigo.
11. Davi pode vencer Golias – não há situação
completamente sem saída
O século 20
é cheio de exemplos em que o lado mais fraco derrota o mais forte, usando, por
exemplo, de sua leveza, de seu agilidade, ou seja, do movimento.
Os elementos
são estes: movimento e energia – tempo e espaço, campo – matéria e massa. O
comandante pensa sobre tais aspectos. Se não tem matéria e massa, deve
compensar com outro, equivalente, como a mobilidade, movimento. Exércitos
pequenos (matéria) em grandes territórios (espaços) apostam na manobra e na
velocidade (movimento); uma pequena guerrilha contra um grande exército
(matéria, massa) aposta na mobilidade (movimento); um exército sem grande
tecnologia (matéria) aposta em maior infantaria (matéria); um pequeno grupo
militar (matéria) pode vencer ou repelir outro grande (matéria, massa) se se
localiza numa montanha (espaço-matéria) embora um terreno elevado não seja uma
vantagem absoluta ou garantia.
A
pequeníssima Chechênia venceu da grande Rússia compensando com mobilidade e uso
do terreno montanhoso. Os comboios com tanques russos teriam de passar por
regiões montanhosas com estradas estreitas, então a guerrilha inimiga quebrava
alguns carros de combate russos para inutilizar toda a estrada, impedindo
aproximação. Além disso, a aviação russa destruiu a capital chechena, mas isso
facilitou o movimento de infantaria e dos guerrilheiros no ambiente urbano, não
do pesado exército russo, o que facilitou ataques e manobras. Davi, de fato,
pode vencer Golias.
12. Ousadia, ousadia, ousadia!
Às vezes, é
preciso a defensiva ativa ou mesmo recuar, nada de ofensiva permanente
artificial. Clausewitz diz que a máxima ousadia às vezes é o que há de mais
sensato. Tal afirmação tem reforço nos comandantes do Exército Vermelho, como
Tukachev. Na origem, a palavra de ordem vem dos revolucionários da revolução
Francesa, os jacobinos. E a história comprovou que ousadia imensa, bem
calculada, muitas vezes define resultados. Portanto, ousadia!
POLÍTICA DE
GUERRA
A guerra
entre candidatos a império deve ser boicotada. Outro caso, exceção clara se for
uma luta de países socialistas contra países capitalistas, pois sempre
defendemos a sociedade com traços socialistas. Se os países nazistas
imperialistas se unem contra os imperialismos “democráticos”, cabe analisar se
tomamos os lados contra as nações fascistas ou o boicote total ao conflito. Se
um país dominante entra em guerra contra um país atrasado, sempre apoiamos este
contra aquele. Se dois países fracos e dominados entram em guerra, tomamos o
lado do invadido contra o invasor, contra o atacante.
INDEPENDÊNCIA
NACIONAL
Neste campo,
seguimos o seguinte princípio: 1) queremos unidade humana, logo militamos
contra a separação dos povos; mas, 1) se um povo decide livremente por
separar-se, logo defendemos com unhas e dentes seu direito de independência.
POLÍTICA,
ALIENAÇÃO E MORAL
Por que
fazemos uma festa do sindicato? Não é apenas para aumentar o prestígio da
direção da entidade. Fazemos isso porque o capitalismo nunca garante o lazer
como se deve – isso é alienação. Os comunistas sempre dizem a verdade aos
trabalhadores, mesmo que seja difícil, mesmo que nos isole por algum tempo.
Fazemos assembleias democráticas dos sindicatos porque queremos o fim da
alienação, o socialismo, logo devemos “ensaiar”, “treinar” o futuro livre por
meio do poder dos trabalhadores do sindicato decidir os rumos de seu sindicato,
que tem um minipoder. Não roubamos, nem deixamos roubar. Assim, toda nossa
elaboração política tem um sentido: o socialismo, a liberdade humana, o fim da
alienação – e praticamos isso desde já. Nosso objetivo, e o praticamos em toda
ação política, é a humanização da humanidade. Por exemplo: se fazemos uma greve
que ganha o aumento salarial, mas lideramos o sindicato sem assembleias, de
modo ditatorial e burocrático, logo o resultado é negativo.
POLÍTICA E
ORGANIZAÇÃO PARTIDÁRIA
O processo é
simples. A política nacional, elabora o congresso e a direção nacional do
partido; política da fábrica, elabora a célula da fábrica. O processo no geral
é o seguinte: 1) acontece um fato importante novo; 2) após debate, o partido
prepara uma política; 3) essa política vai para todo o partido por meio de seu
jornal e boletins internos; 4) então, cada célula de base debate o texto e vê
como pôr em prática a proposta na sua categoria, no seu local de trabalho.
De novo,
devemos dar o exemplo do PSTU. De modo ultraesquerdista, a direção do partido
elabora a proposta mais radical possível; Se há alguma inflação, deve exigir
“todos às greves por reposição dos salários reais!”. Mas a direção chama logo:
“Escala móvel de salários!” ou “salário mínimo do DIEESE, 6000 reais!” Então,
os militantes de base, coitados, leem o texto e encontram conexão alguma com a
realidade deles. Eles leem o jornal com a política votada, adoram se sentir
radicais e revolucionários, depois vão para casa ou o local de trabalho falar
algo completamente diferente daquilo que está escrito. O erro nunca é deles,
mas da direção nacional.
Outro erro
comum, também de décadas. O congresso do partido tem uma pauta chama política.
Ela deve: 1) dizer qual situação estamos; 2) qual tipo de proposta é central –
econômicas, mínimas, democráticas, de transição ou de poder? 3) votar a tática
eleitoral; 4) definir quais as propostas práticas de política para um ou dois
anos. Exceção de 1 e 3, o resto nunca ocorre. No lugar de definir quais as
palavras de ordem da situação política do país, o documento político do partido
faz uma lista de bolo enorme com quase todas as propostas possíveis para um
partido de esquerda radica. E ponto. Nada é aprovado, nenhuma proposta de
agitação política específica do tipo” abaixo o governo”, “cancelamento da
dívida dos trabalhadores” etc.
REGRA DE
OURO
Nós,
comunistas, somos inimigos inevitáveis de todos os governos do mundo – contra
eles declaramos guerra permanente. Apoiar um governo “contra o fascismo” ou
porque ele é “anti-imperialista” e “progressista” é trair a tradição marxista.
Nenhum governo é capaz de controlar o capitalismo para os trabalhadores – o
sistema deve ser derrubado.
Podemos, no
máximo, fazer uma unidade, não frente, de ação com o governo, por exemplo, para
lutar contra a invasão de nosso país, para derrubar uma tentativa de golpe de
estado etc. Mas nunca entramos no governo, sequer o apoiamos criticamente.
Nossa
estratégia é derrubar o Estado dos ricos, mesmo que isso demore, mesmo que isso
exija certo isolamento por algum tempo – resistimos, preparamo-nos para vitória
futura, não tão longe quanto parece.
EM CASO DE
GOVERNO FORTE
Caso o
governo seja muito forte, fazemos ainda a crítica, mas somos mais maleáveis.
Fazemos exigências ao governo: Faça isso, impeça tal demissão, reestatize tal
empresa etc. Os trabalhadores concordarão com as nossas exigências e esperarão
do governo uma boa resposta – mas, em geral, se frutarão ou terão de lutar com
dureza. Isso acelera a experiência deles como governo, tornam-se mais críticos
e, então, nós ganhamos moral.
O PSTU fez
isso, mas deixou de fazer a outra etapa, a segunda etapa: a denúncia. Caso o
governo traia, recue ou negue a proposta – devemos, com linguagem cuidadosa,
denunciar o governo aos mesmos trabalhadores.
EM CASO DE
DITADURA
Nesse caso,
temos que focar, durante a rotina, nas propostas mínimas (salário etc.) e
democráticas (eleições etc.). Numa crise
do regime ditatorial, levantamos propostas como “Assembleia constituinte!” ao
mesmo tempo em que levantamos propostas mais socialistas, mais radicais como
“contra o desemprego, escala móvel de tempo de trabalho!”
Nossos
partidos se tornam pequenos e devem ter células muito independentes e ocultas
umas das outras.
COMO IMPEDIR
E COMBATER O FASCISMO
Se o
fascismo cresce, quer dizer que a esquerda está frágil e cometeu muitos erros.
Por isso, devemos chamar uma frente única antifascista com toda a esquerda.
Devemos organizar grupos de defesa dos sindicatos, partidos, greves e protestos
– que serão atacados por bandos nazistas. No Brasil, os trotskista liderados
por Mário Pedrosa chamo a frente única e promoveu um ataque contra o desfile
dos fascistas brasileiros, os integralistas. Depois desse ataque, tal movimento
sombrio nunca mais se reergueu. Além disso, temos que ter política, propostas
práticas, que atraiam os trabalhadores e, pela força de sua luta, parte da
classe média. Em geral, se há um risco fascista, há, oposto, um risco de
socialismo – o parlamento corrupto burguês pode ser destruído por uma ditadura
totalitária, ou, ao contrário, por uma democracia superior e verdadeira. Nesse
sentido, não defendemos em exato a democracia corrupta atual, pois focamos nos
problemas econômicos centrais dos trabalhadores na crise. Claro, a pior
democracia é mil vezes melhor que a mais leve ditadura.
Mais um
detalhe: chamamos por uma frente de combate físico antifascistas. Se os
reformistas aceitam, a luta cresce; se os reformistas negam, seus liderem se
desmoralizam, então os comunistas crescem. Dos dois modos, ganhamos.
O PSTU
chamou uma frente apenas com revolucionários para combater o fascismo, o
governo de extrema-direita. Assim, seu movimento agregou apenas eles, alguns
centristas e todas as seitas lunáticas do país. De nada serviu.
QUANDO
CHAMAR O “FORA GOVERNO” OU “FORA MINISTROS BURGUESES”
Apenas
lançamos a proposta de “fora governo”, se chamamos, ou melhor, o “eleições
gerais já!” se o governo perdeu o apoio da maioria ou dos trabalhadores.
Somente, apenas. Quando Lula se elegeu pela primeira vez, o PSTU chamou no seu
jornal “Fora ministros burgueses”. Assim, brincaram – sem exagero – de
revolucionários. Simplesmente, imitaram a mesma proposta levantada pelos
comunistas na revolução russa contra o governo de esquerda. Nesse caso, a
situação era revolucionária, risco de tomar o poder. No caso do petismo, nada
disso.
QUANDO
CHAMAR PELA TOMADA DE PODER
Somente
chamamos a tomada do poder quando isso está tão maduro quanto possível, quando
a oportunidade não puder passar. Na crise da corrupção do mensalão ou na queda
de Dilma, o PSTU chamou, veja só, “Fora todos”, ou seja, a queda do regime
burguês antes da hora, sem condições. Nos grandes protestos de 2013, chamou o
“Nem governo nem PT: Trabalhadores no poder!”, ou seja, quando era hora de
ganhar o povo para nossas propostas práticas para educação saúde e transporte,
a direção do parte chamou a proposta mais radical possível na história do
movimento universal comunista… Mais uma oportunidade perdida. Havia organismo
de poder operário e popular? Não. Havia possibilidade de armar o povo? Não.
Havia crise econômica forte? Não. Enfim, curioso que esse tipo de erro não
tenha gerado uma crise direta na organização.
SABER OUVIR
Sempre há
aqueles sujeitos intuitivos e apressados que fazem análises do que está
acontecendo no mundo e no país. Ouço várias opiniões, algumas contrárias, antes
de tomar uma decisão. Aqui e ali, alguém tem uma sacada que ajuda a pensar a
essência da coisa, do momento. Na reunião do partido ou do sindicato, até
antes, vale a pena ouvir antes de decidir. Parte de colher dados é saber a
interpretação apressada, mas talvez útil, dos outros.
No mais,
importantíssimo: se necessário, consulte um e mais de um especialista sobre
pontos específicos.
ELEIÇÕES E
POLÍTICA
Participar
ou não das eleições? Depende da realidade. Numa situação, participamos; noutra
completamente diferente, pedimos com vigor o voto nulo; noutra, chamamos nossos
deputados a renunciarem. A situação manda. A eleição é nossa oportunidade de
provar a todos que existimos e temos projeto de poder. Por isso: 1)
apresentamos 2 ou 3 propostas centrais; 2) aparecemos como os mais sérios e
preparados, o que levam a política a sério; 3) somos responsáveis com a
estética do material de campanha, ainda que simples; 4) apresentamos um projeto
de governo tão radical quanto radical é o momento político, nem mais nem menos
– programa com começo, meio e fim, de onde virá o dinheiro necessário etc.
Mais uma
vez, o PSTU erra. Tornou-se uma espécie de piada política para a maioria do
povo e a fama de lunáticos deslocados da realidade. Isso se deve aos elementos
citado: 1) apresenta as propostas mais radicais possíveis; 2) não tem propostas
práticas; 3) estética irresponsável; 4) mito improviso. Ora, isso ocorre porque
o objetivo partidário é o sindicato, não o poder real, tornou-se partido
sindicalista; então, para provar aos ativistas ultraesquerditas que não é
reformista, participa das eleições da pior forma possível, incluso com
expressões teatrais e caricaturais.
ATIVIDADES
ARTIFICIAIS
Se o partido
se enche de atividades artificiais, sem sentido real, sem finalidade, sem
projeto, apenas para cumprir datas ou ter o que fazer – os militantes se
afastam aos poucos, pois militar para de fazer sentido. O teatralismo, o como
se, toma conta. Outro erro em que cai o PSTU.
POLÍTICA ORGANIZACIONAL
De modo
algum podemos usar 100% das forças do nosso partido. Tentar isso de modo
permanente quebra militantes, estimula afastamento e gera crise partidária. A
tentativa de parecer muito mais forte do que de fato é paralisa o partido, gera
crise. Um partido revolucionário do Peru entrou em crise porque, no meio de uma
onda de luta, tentou estar em todos os espaços e cantos de protestos ao mesmo
tempo.
O PSTU
esgota seus jovens militantes, depois os substitui por uma nova leva. Só os
militantes de classe média, com tempo e dinheiro, prosperam na organização
porque se exige demais. Vejamos outra causa disso. Os militantes têm que
participar de 3 a 4 células do partido na semana! Só a classe média pode isso,
então cresce dentro do partido. A boa solução do PSTU foi esta: militante que participam
só da direção regional; outros, só da direção zonal; outros, só da célula de
base. Perfeito, mas parece que nunca funcionou por o modo errado é útil para
limitar-se aos sindicatos, ao mero sindicalismo.
O modo como
nos organizamos afeta nossa política, e também é afetado por ela! Sempre
pergunte: qual a real situação da organização e dos militantes? O Moral esta
alto ou baixo? Qual o nível de disciplina? E as finanças? Qual o perfil de
classe dos membros?
CENTRISMO
Se nossa
proposta política é a correta, então devemos ser teimosos e insistentes na sua
defesa – mesmo que, de início, fiquemos isolados ou em minoria. O centrismo faz
diferente, não suporta ficar isolado e perder uma votação; por isso, procura
meios-termos, acordos, mediações etc. Tal postura tem muita relação com
militantes de classe média, menos duros, menos tolerantes ao isolamento. Comum
no PSTU, em especial, na sua juventude.
DEIXAR
AMADURECER
Apenas
aprovamos uma política se todas as suas condições estão maduras, deve-se deixar
a coisa amadurecer. Tomamos o poder apenas na situação melhor possível, para
não sermos derrotados no processo. O PSTU tentou por duas vezes fazer uma nova
entidade nacional estudantil – a CONLUTE antes e a ANEL depois – de modo
precipitado, antes de uma crise séria, entes de uma luta nacional etc. Os dois
projetos, então, faliram.
LUTAR
JUNTOS, MARCHAR SEPARADOS
O que isso
significa? Que nos unimos com outras correntes para fazer um protesto, mas na
luta agimos com nossos próprios grupos, temos nossos próprios panfletos
diferente dos deles etc. Há algo que nos unifica, mas também algo que nos
separa, o eixo político.
OUSADIA!
De nada
serve esperar passivamente a ordem do comando superior, pois temos de ser
criativos. A corrente FT, embora seja uma seita, teve a ideia de fazer uma rede
internacional de sites de esquerda chamada Esquerda diário (até o nome é
ótimo). Foi um sucesso: partidos pequeníssimos passaram a ter grande audiência
para seus artigos. A ideia genial, a iniciativa, passou a dar errado, porém,
porque eles confundiram material de propaganda (feita para militantes) com
material de massa (feita para gente de esquerda que não milita). Assim,
esvaziou-se.
No PSTU, a
criatividade é castrada, pouco incentivada. A iniciativa tem de vir, quando vem,
da direção partidária. Assim, demorou muito para eles terem um único canal
individual no youtube, por exemplo.
Lembramos
que ousadia não é irresponsabilidade, pois planejamos, medimos, meditamos,
debatemos antes. Em 2017, o PSTU estava em crise interna, baixo moral, depois
de uma crise e uma ruptura. O que fez a direção partidária para resolver isso?
Aproveitou um protesto nacional de vanguarda, não de massas, para radicalizar,
para ser utraesquerdista, invadir prédios do governo, depredar (nada contra em
si, mas no contexto). A TV boicotou falar do ato com “violência”, mas teatral…
Assim os seus militantes faziam declaração orgulhosas e emocionadas na internet
do “partido revolucionário”, “de luta”, “o lado certo” etc. Foi um ato liderado
por um dirigente do PSTU, mas no fundo, era uma ação para os militantes do
partido, não para as massas.
DIALÉTICA –
PRIMEIROS PASSOS
É difícil
falar de dialética em poucos passos, mas tentemos. Primeiro, a dialética
descobre que a realidade é, de modo inevitável, contraditória, em conflito – e
tal conflito não é apenas destrutivo, também é construtivo (qual a contradição
na nossa conjuntura?). Segundo, apenas entendemos a realidade se vemos por
todos os ângulos, se vemos o todo e a totalidade. Terceiro, a realidade é movimento,
ou seja, nada é eterno, tudo muda, tudo está em transformação e desenvolvimento
– de onde vem esta realidade e para aonde ela tende a ir? Para aonde queremos
que ela vá na medida do possível?
Em geral, as
aparências enganam, por isso fazemos uma boa pesquisa dos fatos para, só
depois, chegar em alguma conclusão (a essência real da realidade). Não se
prenda à primeira impressão!
Nada é algo
em si, pois depende de seu contexto, de seu entorno, do que está em volta. Uma
proposta de greve geral parece revolucionária, mas ela pode ser
antirrevolucionária, um erro completo, se o correto para a situação concreta
seria chamar já o poder operário, a tomada do poder. Assim, a proposta de greve
geral geraria nossa derrota por décadas! Uma cadeira de bar serve para sentar;
mas, no contexto, durante uma briga, torna-se uma arma de abrir crânios! Um
sindicato pode ser só um sindicato bom, pode ser um sindicato que serve aos
ricos contra a revolução ou pode se tornar até um organismo um Estado
socialista! Uma forma pode ter vários conteúdos!
Via de
regra, entre duas posições políticas opostas e estremas, costuma ter uma
terceira resposta, uma terceira via ou, às vezes, um meio-termo, um caminho do
meio. Entre aqueles que defendiam o “Fora Dilma” e o “Fora todos” contra os que
defendiam “defender o governo contra o golpe”, havia uma terceira resposta, que
superava os dois erros: chamar “Eleições gerais já!” Isso derruba o governo ao
mesmo tempo em que coloca o povo na jogada, força mais democracia (menos
alienação) e impede o golpe.
Cada fase,
cada etapa, tem suas contradições inevitáveis que devem ser resolvidas ou, pelo
menos, bem lidadas, bem convividas. Se meu partido cresce, ele fica mais
diverso, logo ele deve ser democrático de tal modo que diferentes opiniões –
que vêm de diferentes experiências de vida e de classe – sejam toleradas e
organizadas.
Há dois
tipos de salto de qualidade, de natureza: 1) algo muda aos poucos, passo a
passo, até tornar-se outra coisa, como a criança que se torna adulto; 2) algo
muda apenas em quantidade, aos poucos, mas se vê forçado a saltar para outra
natureza, outra qualidade, de repente, como a água que – após ir esfriando – se
torna gelo de uma só vez, não aos poucos. O partido revolucionário cresce, em
geral, de uma vez, por saltos, ganhando, por exemplo, vários ativistas de uma
tacada após uma vitoriosa greve.
O
desenvolvimento é desigual, nunca de modo igual em todas as suas partes. Nós
desenvolvimentos mais habilidade em matemática do que em geografia, por
exemplo. Podemos ser ótimos administradores sindicais, mas péssimos em discurso
– algo normal. Tentamos, então, diminuir tal desigualdade, diferença, do
desenvolvimento das partes em questão. Um setor da economia cresce muito mais
do que outro. Garrincha foi um gênio da bola exato por suas pernas
desigualmente desenvolvidas.
A forma como
vivemos, e nossas experiências práticas, determinam a forma como pensamos. A
classe social à qual pertencemos determina nossa moral, nossas ideias, nossas
simpatias, nossa disciplina etc. A matéria determina a ideia, ou melhor, a
cabeça segue o chão que os pés pisam. O modo de viver faz o modo de pensar.
A noção de
causa antes e feito depois é melhor superada por uma noção de interação, de
causalidade recíproca, de ida e volta. A economia afeta a cultura; a cultura
também afeta a economia.
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