domingo, 28 de janeiro de 2024

A crise sistêmica - cap. 33 - A ETAPA HISTÓRICA PÓS-QUEDA DO MURO: EM QUAL ETAPA HISTÓRICA ESTAMOS?

 

A ETAPA HISTÓRICA PÓS-QUEDA DO MURO: EM QUAL ETAPA HISTÓRICA ESTAMOS? 

É verdade que a década de 1990 marca uma derrota com o fim dos Estados operários degenerados e, por consequência, recuo na consciência das massas e degeneração dos partidos vermelhos. Também é verdade, por outro lado, que se liberaram possibilidades contidas pelo aparato estalinista em todo o mundo e a história deu razão ao trotskismo. Como resolver esta equação? A resposta que oferecemos é esta: abriu-se uma etapa reacionária mundial. A hipótese alternativa é a de que, além das etapas revolucionárias e contrarrevolucionárias, há outros tipos perceptíveis. Um exemplo no nível de nação em Moreno:

 

Por exemplo, nesta etapa de revolução iminente que vivemos a nível mundial desde 1943, muitos países atravessaram ou atravessam etapas contra-revolucionárias a nível nacional (Indonésia, o Cone Sul latino-americano, a URSS, etc.). Outros países mantiveram-se em etapas de pouca luta de classes, de equilíbrio na relação de forças entre o proletariado e a burguesia, quer dizer, etapas não-revolucionárias (quase todos os países imperialistas e muitos semicoloniais). E outros que já mencionamos, finalmente, que são os que marcam a dinâmica, o signo da etapa revolucionária, atravessaram etapas revolucionárias que levaram ao triunfo da revolução, que foi abortada ou congelada, ou que foi derrotada. (Moreno, As Revoluções do Século XX, 2009)

 

 

Assim, não estamos numa etapa não revolucionária, revolucionária ou contrarrevolucionária, mas numa derrota gerando forte recuo reacionário. Para que o leitor melhor abstraia uma possível etapa reacionária, damos um exemplo comparativo em outra escala, de situação reacionária:

 

Da mesma forma, dentro de uma etapa podemos encontrar diferentes tipos de situações. Uma etapa revolucionária não pode deixar de sê-lo se a burguesia não derrotar duramente, na luta, nas ruas, o movimento operário. Porém, a burguesia, se tiver margem, pode manobrar, pode convencer o movimento operário que deixe de lutar. Assim se abriria uma situação não-revolucionária, porém a etapa continuaria sendo revolucionária, porque o movimento operário não foi derrotado. Inclusive, a burguesia pode reprimir, sem chegar aos métodos de guerra civil, o movimento operário e impor derrotas que o fazem retroceder, abrindo uma situação reacionária, porém continuaria estando dentro da etapa revolucionária. Por exemplo, o governo de Gil Robles, que ocorreu no meio da revolução espanhola, iniciada em 1931, foi um governo reacionário que reprimiu duramente o proletariado e criou uma situação reacionária. Porém, ao não ser derrotado o conjunto do movimento operário espanhol, a etapa continuou sendo revolucionária. A melhor prova disso é que poucos anos depois estourou a guerra civil. (Idem.)

 

Fomos duramente derrotados, entretanto não anulados por nazismos, invasões imperialistas à URSS, etc. Disto vale recordar: os movimentos anti-restauração, como a confusa e heroica luta chinesa, que se encerrou no massacre na Praça da Paz Celestial, nem sempre geraram democracia burguesa, não mudaram o regime político. Mesmo a Rússia fechou seu regime, de democracia para semibonapartismo, pouco após seu retorno ao capital.

A etapa é determinada, em primeiro, pela relação de superestrutura objetiva – instituições, Estado, partidos, organização etc. – derivada de uma determina correlação de forças entre burguesia e proletariado. Ao lado da queda do aparato stalinista ocorreu a restauração do capitalismo – a queda do caráter de transição ao socialismo do Estado –, mecanismo que fez recuar a consciência das massas, degenerou e fragilizou organizações, fortaleceu a posição da burguesia no cenário mundial, impôs-se derrotas a movimentos contra o neoliberalismo.

Vejamos a oposição unilateral em lista:

 

Etapa revolucionária

Etapa contrarrevolucionária

Caiu o estalinismo de Estado

Caiu o caráter operário do Estado

Aconteceram reações revolucionárias

As revoluções do Leste não salvaram o socialismo, nem foram sempre vitoriosas ao mudar o regime de Estado

Liberou-se espaço político para o trotskismo, a LIT cresceu

A LIT entrou em crise, partidos e ativistas honestos degeneraram em todo o mundo

Há espaço novo para a verdadeira ideologia socialista

A consciência das massas recuou pesadamente em todo o planeta

Aconteceram revoluções após a queda do Muro de Berlim

A burguesia foi para a ofensiva, conseguiu impor o neoliberalismo em todo o mundo e nenhuma revolução socialista vitoriosa surgiu nestes tempos

O imperialismo perde guerras

O imperialismo tem condições de impor guerras

 

As duas posições apenas são explicadas se a etapa for, na verdade, reacionária, nem um nem outro. Dura derrota, mas que não fechou por longo período nosso espaço.

A caracterização de etapa reacionária desde a queda do muro de Berlim pretende resolver a polêmica entre duas posições opostas, se estamos numa etapa revolucionária ou contrarrevolucionária. Ambas as posições destacaram na análise aspectos unilaterais da realidade.

A crise desde 2008, porém, obrigará novas caracterizações[1]. Após mais de 30 anos da queda do socialismo “real” e mais de 40 anos sem uma revolução socialista vitoriosa, parece que finalmente podemos sair da ressaca histórica. Para isso, a renovação geracional muito ajuda. O central é que a crise sistêmica, que deu um salto de qualidade em 2008, fará seu papel de pressionar as mentalidades, tendencialmente, para saídas revolucionárias entre os oprimidos.

Dizer que após a queda do socialismo real, tal como foi, gerou-se uma etapa revolucionária ou contrarrevolucionária torna incompreensível a natureza do visível salto qualitativo desde 2008. Ao que parece, a partir dessa crise, entramos numa etapa, e numa situação, pré-revolucionária, superando a etapa reacionária anterior. A vitória socialista em alguma nação de peso certamente mudará mais uma vez a etapa.

Organização internacional à qual reivindico, a LIT erra com a posição majoritária de etapa revolucionária após a queda do Muro de Berlim. Além da unilateralidade, de causas mais profundas, há duas causas imediatas: 1) centrismo, que vê sempre balanço positivo nas situações e ações, se não for um desastre completo, desejoso por estimular a psicologia dos militantes; 2) incapacidade de reconhecer erros, de voltar atrás, fazer balanço e perceber as causas do engano, com os militantes agindo como religiosos, adotando de pronto a posição oficial, sem grandes críticas – assim sem retorno ou mudança de posição. Mas creio que ainda há tempo de aprender.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



[1] Diga-se de passagem, os comunistas tiveram sorte ao o Estado amortecer o peso da crise mundial de 2008. Nossas organizações estavam, na prática e na teoria, despreparadas para uma implosão econômica como aquela que quase ocorreu a partir daquele ano. Agora, pode-se amadurecer os partidos vermelhos com algum tempo para experiência, acumular forças e obter posições mínimas para quando houver as próximas crises. A base real para a fermentação e a consolidação de partidos de fato revolucionários passa a existir.

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