COMPREENDER AS VARIAÇÕES
DA LUTA DE CLASSES: CATEGORIA “MOMENTO”
A decadência atual do capitalismo,
apresentado nas teses anteriores, impede reformas estáveis e duradouras.
Problemas conjunturais tornam-se estruturais; há um divórcio cada vez maior
entre “crescimento econômico” e desenvolvimento da sociedade. Em síntese: a
realidade e a luta de classes são mais fluídas e instáveis, alterando parcial e
continuadamente, desigual e mutável, a relação de forças entre as classes
sociais. Isso faz com que a ondulação da luta de classes, hoje, seja muito mais
móvel.
A relação entre momentos de avanço e de
recuo da luta de classes – já existente antes – em uma determinada situação
ganha nesta época novas, maiores e mais instáveis dimensões. Aqui, apresentamos
um conceito, momento, subdividido em
dois:
1. Momento de refluxo, recuo, defensivo
ou regressivo;
2. Momento de ascenso, avanço,
progressivo ou ofensivo.
O pano de fundo é a chamada crise
sistêmica do capital, debatida nesta obra. Tal conceito deve ser observado
dentro das “situações”: em situações não revolucionárias, por exemplo, teremos “momentos
ofensivos” e “momentos defensivos”.
Apesar de os temos autoexplicativos serem,
merecem atenção na medida em que mostram erros entre marxistas. Dentro de uma
situação “não revolucionária” nacional, por exemplo, pode haver momentos em que
as classes oprimidas agem na ofensiva. Ou seja: mesmo desprovido de “crise
estrutural da democracia burguesa”, da economia ou do regime pode haver um
processo de avanço progressivo nas lutas. Isso acontece sem alterar a
caracterização geral da situação que é, neste exemplo específico, “não
revolucionária”.
Uma vitória parcial, uma forte
repressão, um erro do movimento, o cansaço e esgotamento ao não obter resultado
podem readequar e promover, de forma mais ou menos longa, uma mudança de um
momento de fluxo para um de refluxo; e vice versa. Um “gatilho” pode acionar
também momentos opostos; no geral, o “gatilho para a ofensividade” é a explosão
de energia da insatisfação social acumulada passivamente. Ao mesmo tempo, temos
de dimensionar os movimentos de uma classe ou setor de classe em relação às
outras; se, por exemplo, as classes médias, dirigidas ou não pela burguesia, se
movem, protestam pela direita, paralisando os trabalhadores, então temos um
momento defensivo dentro de uma mesma situação.
Em situações pré-revolucionárias pode
acontecer, com mais frequência, um recuo passageiro da classe trabalhadora. Por
medo, por desorganização, por uma frente popular, por uma derrota parcial ou
por ser convencida; ela pode ficar paralisada por algum tempo dentro de uma
mesma situação geral, o que inaugura um “momento de refluxo”, por exemplo.
Especialmente em situações “não revolucionárias”
a soma de crescimento econômico e estabilidade social pode levar aos de baixo a
sensação de que podem obter vitórias, reformas e conquistas e que devem
arrancá-las – as greves multiplicam-se. Isso parte de uma importante
contradição entre crescimento econômico somado às precariedades em diferentes
pontos da vida da classe trabalhadora (violência, machismo, baixo salários,
serviços públicos ruins, etc.). Já em situações “pré-revolucionárias” pode
haver “momentos defensivos” por medo do desemprego, desconfiança com suas
direções, desmoralização, frente populares, derrotas parciais fortes, etc.
especialmente no início desses processos.
O marxismo oferece as ferramentas para
calibrar a análise da relação social de forças; esses elementos podem, em sua
maioria, ser aplicados e adaptados a outras situações da luta de classes. Para
além de sua atual fluidez, a necessidade de explorar esse conceito deve-se à
observação de ser aí onde os marxistas tendem à maior confusão, mais
impressionismo, menos clareza do que se passa. Momentos de (re)fluxo são da
realidade social, não são algo novo. A real novidade, merecedora de maior
atenção, é que a constância da variação entre o fluxo e o refluxo dentro de uma
mesma situação é, hoje, bem mais presente pela evolução da decadência do
capitalismo. Ter, portanto, a clareza desse fenômeno permite às organizações
marxistas maior preparação.
Assim:
1)
Época:
desenvolvimento das forças produtivas em confluência ou, ao contrário, em
contradição com as relações de produção vigentes – época de reforma e reação ou,
oposto e depois, época de revolução;
2)
Etapa:
estado da relação de forças na superestrutura objetiva – em principal, Estado e
regime –, agregando-se, em complemento, a superestrutura subjetiva e demais
fatores sociais (economia, etc.);
3)
Situação:
análise de conjuntura avalia todos os aspectos – economia, relação de classes,
superestruturas subjetiva e objetiva;
Assim como nas etapas, temos as
seguintes situações gerais possíveis: não revolucionária, pré-revolucionária, revolucionária,
contrarrevolucionária e reacionária.
4)
Momento:
dentro das situações, relaciona-se com a luta de classes e a superestrutura
subjetiva, agregando a objetiva. Alterna-se entre momentos defensivos e
momentos ofensivos[1].
Tratemos
do exemplo mais popular. A revolução permanente na Rússia, de fevereiro a
outubro de 1917, sustentou uma situação revolucionária. Neste processo, a
burguesia e os trabalhadores, com interesses antagônicos de fundo, variaram
sobre quem estava na ofensiva ou na defensiva. A revolução de fevereiro colocou
a classe operária na ofensiva; o fracasso das jornadas de julho a colocou na
defensiva; a tentativa de golpe de Kornilov a colocou na ofensiva. A situação
revolucionária resolveu-se com a ofensiva de outubro.
Assim
como uma determinada situação pode marcar uma mudança de etapa, um novo momento
pode marcar a mudança de situação. Exemplo: uma situação de pleno emprego,
antessala da crise, pode gerar muita luta de classes por pautas parciais dentro
de uma situação não revolucionária e imediatamente antes de uma situação
reacionária, recuo das lutas por desemprego alto (entra-se num momento
defensivo), ou pré-revolucionária, avanço das lutas como reação à quebra
econômica.
Com
a descoberta deste conceito, conclui-se o tratamento de todas as instâncias do
real: época, etapa, situação – e momento. Todas as dimensões e aspectos passam
a ser considerados na análise de conjuntura ou teórica. Nenhum acréscimo
categorias precisa ser feita aí, por isso a contribuição deste capítulo tem aspecto
de conclusão.
[1]
Hipotéticos momentos de paralisia ou de equilíbrio são efêmeros e podem ser
desprezados pela teoria.
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