sábado, 8 de julho de 2023

A teoria do valor-matéria

UMA ABSURDA TEORIA DO VALOR (VALOR-MATÉRIA)


J.P.

 

Marx convida a duvidar de tudo, de todas as certezas – incluso as de sua poderosa produção. Dito isso, José Paulo Netto afirma que, quando se quer atacar ou adaptar o marxismo, foca-se em três eixos: contra a dialética, contra a teoria da revolução e contra a teoria do valor-trabalho. Nosso foco será a questão do último elemento.


Todas as tentativas de negar ou ver contradição na teoria marxista do valor são, quando muito, risíveis. Isso ocorre, simplesmente, porque ela está certa, completa e correspondente em alto grau à realidade. Os críticos confundem, por exemplo, valor e preço. Ora, por que a água, com a altíssima utilidade, apresenta-se tão barata – mas o ouro, carente de utilidade, tão caro? Eis contradição da teoria do valor subjetivo, do utilitarismo. Resposta: um exige mais trabalho social e humano para produzir em relação ao outro, muito mais.


Mas é possível afirmar totalmente a teoria marxista do valor e, ao mesmo tempo, superá-la? Façamos a digressão e o exercício apenas para fins filosóficos, pois é uma teoria de todo correta. Apresento, agora, minha própria teoria, que eu mesmo a nego!, do valor-matéria.


Marx começa sua obra coma seguinte pergunta: se duas mercadorias são qualitativamente, completamente, diferentes – como elas são igualadas? Como isso é possível? Ora, responde ele, são iguais porque são frutos iguais de trabalho humano! O tanto de trabalho gasto gera um tanto de valor, que as iguala no mercado. Mas, porém, todavia: elas não são completamente qualitativamente diferentes! Elas, as mercadorias, ou melhor, os valores de uso, são átomos concentrados, ou seja: – prótons, elétrons e nêutrons. São matéria e material igual, massa igual, ou seja, peso igual (com a gravidade). O que lhes iguala são suas matérias. Se o valor é energia, temos de ver que energia é massa (E=mc²), segundo Einstein.


Entremos mais no absurdo.


Primeiro. A máquina perde valor ao desgastar-se, ao desmaterializar-se.

Segundo. O dinheiro ganha valor ao materializar-se na forma ímpar, o ouro (átomo pesado); depois, perde valor ao desmaterializar-se (prata, cobre, papel, bits.).

Terceiro. Lamentamos muito mais a morte de um grande elefante contra a morte de uma reles formiga. Por instinto, associamos valor com materialidade – mais materialidade, aliás, mais raro, além e mais trabalho e energia exigir.

Quarto. Uma pedra mais material é, via de regra, mais útil e tem mais valor relativo a outra pedra inferior materialmente de mesmo tamanho.

Quinto. O ouro é difícil produzir nas estrelas, concentra muitos átomos.

Sexto. Tenta-se tirar componentes “desnecessários” da máquina para diminuir, assim, seu valor.

Sétimo. A deterioração de certa mercadoria também é sua perda de valor.

Oitavo. A abundância material é a base da liberdade e da felicidade.

Novo. Valor só pode existir dentro e junto de algo, de certa matéria.

Décimo. O que tem mais massa, em geral, mais matéria, tende a ter valor e preço maiores.

Décimo primeiro. A redução do valor e do preço da mercadoria está, hoje, ligada à redução de sua materialidade, ou seja, os produtor estão mais frágeis. Ou seja: valor-matéria.


Décimo segundo. Marx afirma que o valor de certa mercadoria (forma relativa) se expressa na materialidade de outra (forma equivalente). Assim, sua separação por um abismo entre valor de uso e valor cai e desaba para dentro de si: a medida dos valores e o padrão de preços, por exemplo, fundem-se, ainda que de modo a abarcar a diferença etc.


Décimo terceiro, enfim. A água é barata por sua molécula ser fácil de se formar, precisa de átomos simples e “leves”, pouco materiais, oxigênio e hidrogênio, abundantes por facilidade relativa de produzir. O ouro é caro porque, como observamos, seus átomos unidos são “pesados”, complexos, com mais matéria-massa concentrado, lago mais raro, logo mais trabalho para produzir na estrela e extrair da terra, logo mais caro via de regra e tendencialmente.


Décimo quarto. Vejamos a relação com a dialética. Marx exclui todas as propriedades físicas da mercadoria para chegar numa coisa-em-si invisível, o valor, a gelatina de trabalho dentro da coisa. Mas, contra Kant, Hegel afirmou, embora não tenha sido o único, que a coisa sem suas propriedades nada é – e que tais propriedades são, veja só, matérias ou materiais. Assim, a coisa-em-si valor nada mais seria que suas próprias propriedades, ou seja, sua materialidade. A coisa-em-si, o valor, é a coisa.


Décimo quinto. Tanto no mundo inorgânico (Sol, buracos negros etc.), passando pelo biológico (macho dominante, o mais alto etc.), quanto no social (concentração de capital, ter mais dinheiro, ter maior população etc.; ter grande casa ou carro, mais dinheiro etc.) ocorre o seguinte processo: mais matéria-massa concentrada, em relação aos demais e à média, logo, tende a ser a causa de atração, de ser orbitado, de agregar para si.


Assim, também, conectamos a teoria do valor-trabalho com a teoria da oferta e da demanda (procura). Algo é raro, logo, com muito valor por ser difícil de extrair ou produzir, porque tem mais materialidade – porque tem mais materialidade, é muito mais difícil. Por isso o ouro tem valor, sua raridade, ao exigir mais átomos para existir, exige trabalho extra.


A matéria é a própria realidade – por isso seu valor, sua base de valor. Quando dizemos que movimento = energia = tempo = espaço (meio) = matéria – dizemos, portanto, que a energia-valor nada mais é que a matéria. Assim fazemos a unidade, ainda que ainda contraditória, entre valor e valor de uso. Não mais externos um ao outro, não mais apenas estranhos.


Vejamos o parágrafo anterior. Marx diz que o preço da terra virgem não tem valor, pois não há trabalho gasto em sua produção, portanto, capital fictício; apenas há preço. Mas a terra, primeiro, tende a valer mais se ela é melhor, mais produtiva, então, mais rica materialmente! E, segundo, o oposto-idêntico-diferente de matéria é espaço ou movimento, logo, a terra mais distante tende a perder valor, preço. Portanto: a matéria é a medida de todas as coisas!


Vale uma comparação histórica. Platão teve de dividir o mundo em dois opostos e separados: o mundo das ideias ou formas e o mundo da aparência ou material. Depois, em oposição, Aristóteles – ainda idealista, mas com toque materialista evidente – defendeu um só mundo, aqui, onde está a própria substância, a essência, o conteúdo, a forma etc. Marx dividiu economia em dois: mundo do valor de uso e mundo do valor. Agora, unifico ambos os mundos no valor-material.


Assim, o valor dado está ligado à sua

 

1)      Raridade

Que nada mais expressa além do

2)      Trabalho médio – social ou natural – exigido para sua produção ou economizado

Que é um dado gasto de energia expresso de maneira imperfeita no

3)      Tempo médio exigido em sua criação

Ligado, portanto, à sua

4)      Utilidade

Que é, por sua vez e em cadeia, expressão pobre de sua


5. Materialidade (valor-matéria)


Tanto no sentido quantitativo quanto, em principal, qualitativo.

 

Isso afastaria um tanto, como solução, o marxismo de sua necessária metafísica do valor – tão rejeitada pelos próprios marxistas, contra Marx. No entanto, não estou disposto a brigar essa luta, que é a raiz de 2 do marxismo. Uma ideia tão absurda, revisionista e pouco ortodoxa me levaria ao isolamento completo e final do movimento marxista, do qual dependo para mudar o mundo de vez e de fato. Recuo, portanto. Quem quiser correr o risco, deixo a base para o desenvolvimento posterior da ideia, seu desdobramento e suas deduções. Mas nada, absolutamente nada, garante que ela está correta ou sustenta-se na realidade, no argumento e na teoria. Incluso, pensa-se dela, a partir, parte do valor moral e do valor em geral. Mas um ponto de apoio seria que a empiria é suja, impura, concreta, impedindo a manifestação exata da lei do valor-matéria. Tal visão, enfim, reconecta o mundo dos homens com o mundo natural. Marx nunca poderia, ou teria imensa dificuldade de, criar a teoria do valor-matéria, que, grosso modo, afirma que o valor deriva de maior materialidade relativa. Isso ocorre porque a ciência, a metafísica (a verdade está no todo), a física, a filosofia, a Dialética da natureza e a sociedade ainda não haviam atingido seus ápices, de origem comum, durante sua vida. Quando Marx diz que se pode virar e desvirar a mercadoria, mas nela não se encontrará nenhum átomo de valor; esquece que a matéria, representada no átomo, é o próprio valor.


Piero Sraffa estaria orgulhoso por ser tão positivamente inspirado e superado.


SOBRE OS VALORES

 

O homem primitivo necessitou compreender cada vez mais as propriedades do mundo, ou seja, de modo rústico, já fazia ciência. Ao analisar o mundo, teve de descobrir – não criar – valores, valorizar; esta pedra é ruim para este machado, mas bom para tal tarefa. Pois bem; grosso modo, isso está em Lukács, então apenas vale tratarmos do assunto se algo novo houver para ser dito.


O valor artístico, por exemplo, dar-se pelo quanto de trabalho útil foi destinado na sua produção, incluso o ganho de habilidade do artista. Mas o guia é o valor de uso da arte, a mensagem. Se um “artista” dedica mil horas para pintar um quadro preto de preto, perdeu seu tempo.


Lukács diz da valoração com o exemplo do valor positivo de um bom vento para a embarcação. Ora, a diferença atmosférica deslocou ar de um ponto para outro, logo trabalho realizado. Na verdade, o valor tem origem direta em dois fatores opostos e complementares, unidos: o trabalho exigido e o trabalho economizado. Um mau vento exige mais trabalho, gasto extra – menos valor tem, menos bom é ele.


Considerado isso, que trabalho e economia de trabalho são ambos base da valoração, o que os unifica? O objetivo, a finalidade, o valor de uso – eis a medida, ou melhor, o lastro da valoração. Uma arte somente é arte se tem mensagem fictícia (podendo ser afirmada como bom, bem, ou mau, mal, elaborada).


Na relação homem e objeto, ou no trabalho-produção, a valoração divide-se, no contexto, em bom e ruim. Nas relações humanas, relações de produção e sociais ou pessoais, em bom e mau. Nada nisso de maniqueísmos, pois, por exemplo, um operário lutador da causa operária, logo bom, pode ser machista, logo mau. O que guia é o rumo da humanização da humanidade, o fim da alienação – a finalidade.


Assim, a valoração dos valores está lastreada, no trabalho, por isso, na história, por isso, nas relações contextuais, logo, na finalidade.


Já dissemos em outro lugar que o ouro vale muito porque se exige imenso trabalho para extraí-lo da terra. Mas tal imenso trabalho é exigido porque se exige muita energia-tempo-trabalho para produzi-lo nas estrelas, nas explosões estelares.


No social, o trabalho está ligado de modo direto e central com o problema da alienação, ou seja, da desumanização da humanidade. É moral o que economiza o trabalho e, ao mesmo tempo, preserva o trabalhador, algo que exige novas relações sociais de produção e novas superestruturas (instituições etc.). Tem valor, tem moral, aquilo que liberta o homem do trabalho manual e lhe dá saldável tempo livre, isto é, socialismo. O socialismo, a liberdade humana, a humanização do homem, é o valor dos valores – a meta inconsciente e, depois, consciente da humanidade.

 

MORAL E METAFÍSICA


Platão ascende a conceitos cada vez mais gerais e abstratos até alcançar o Belo, o Bom e o Bem. Para ele, os mais puros. Ora, existe um conceito ainda mais puro, geral e abstrato. O belo, o bom e o bem são o quê? São valor! Com tal conceito, na economia Marx foi de fato ao mais abstrato. O bem (coisa privada) não é o mais profundo ou, se quisermos, o mais etéreo: isso é o que está dentro do valor de uso, o bem, ou seja, seu valor invisível dentro de si. Marx poderia dar qualquer nome ao valor, já que é descoberta sua, mas lastreou a palavra na metafísica.

J. P.




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