UMA ABSURDA TEORIA DO VALOR (VALOR-MATÉRIA)
Marx convida
a duvidar de tudo, de todas as certezas – incluso as de sua poderosa produção.
Dito isso, José Paulo Netto afirma que, quando se quer atacar ou adaptar o
marxismo, foca-se em três eixos: contra a dialética, contra a teoria da
revolução e contra a teoria do valor-trabalho. Nosso foco será a questão do
último elemento.
Todas as
tentativas de negar ou ver contradição na teoria marxista do valor são, quando
muito, risíveis. Isso ocorre, simplesmente, porque ela está certa, completa e
correspondente em alto grau à realidade. Os críticos confundem, por exemplo,
valor e preço. Ora, por que a água, com a altíssima utilidade, apresenta-se tão
barata – mas o ouro, carente de utilidade, tão caro? Eis contradição da teoria
do valor subjetivo, do utilitarismo. Resposta: um exige mais trabalho social e
humano para produzir em relação ao outro, muito mais.
Mas é
possível afirmar totalmente a teoria marxista do valor e, ao mesmo tempo,
superá-la? Façamos a digressão e o exercício apenas para fins filosóficos, pois
é uma teoria de todo correta. Apresento, agora, minha própria teoria, que eu
mesmo a nego!, do valor-matéria.
Marx começa
sua obra coma seguinte pergunta: se duas mercadorias são qualitativamente,
completamente, diferentes – como elas são igualadas? Como isso é possível? Ora,
responde ele, são iguais porque são frutos iguais de trabalho humano! O tanto
de trabalho gasto gera um tanto de valor, que as iguala no mercado. Mas, porém,
todavia: elas não são completamente qualitativamente diferentes! Elas, as
mercadorias, ou melhor, os valores de uso, são átomos concentrados, ou seja: –
prótons, elétrons e nêutrons. São matéria e material igual, massa igual, ou
seja, peso igual (com a gravidade). O que lhes iguala são suas matérias. Se o
valor é energia, temos de ver que energia é massa (E=mc²), segundo Einstein.
Entremos
mais no absurdo.
Primeiro. A
máquina perde valor ao desgastar-se, ao desmaterializar-se.
Segundo. O
dinheiro ganha valor ao materializar-se na forma ímpar, o ouro (átomo pesado);
depois, perde valor ao desmaterializar-se (prata, cobre, papel, bits.).
Terceiro. Lamentamos
muito mais a morte de um grande elefante contra a morte de uma reles formiga.
Por instinto, associamos valor com materialidade – mais materialidade, aliás,
mais raro, além e mais trabalho e energia exigir.
Quarto. Uma
pedra mais material é, via de regra, mais útil e tem mais valor relativo a
outra pedra inferior materialmente de mesmo tamanho.
Quinto. O
ouro é difícil produzir nas estrelas, concentra muitos átomos.
Sexto. Tenta-se
tirar componentes “desnecessários” da máquina para diminuir, assim, seu valor.
Sétimo. A
deterioração de certa mercadoria também é sua perda de valor.
Oitavo. A
abundância material é a base da liberdade e da felicidade.
Novo. Valor
só pode existir dentro e junto de algo, de certa matéria.
Décimo. O
que tem mais massa, em geral, mais matéria, tende a ter valor e preço maiores.
Décimo primeiro.
A redução do valor e do preço da mercadoria está, hoje, ligada à redução de sua
materialidade, ou seja, os produtor estão mais frágeis. Ou seja: valor-matéria.
Décimo
segundo. Marx afirma que o valor de certa mercadoria (forma relativa) se
expressa na materialidade de outra (forma equivalente). Assim, sua separação
por um abismo entre valor de uso e valor cai e desaba para dentro de si: a
medida dos valores e o padrão de preços, por exemplo, fundem-se, ainda que de
modo a abarcar a diferença etc.
Décimo
terceiro, enfim. A água é barata por sua molécula ser fácil de se formar,
precisa de átomos simples e “leves”, pouco materiais, oxigênio e hidrogênio,
abundantes por facilidade relativa de produzir. O ouro é caro porque, como
observamos, seus átomos unidos são “pesados”, complexos, com mais matéria-massa
concentrado, lago mais raro, logo mais trabalho para produzir na estrela e
extrair da terra, logo mais caro via de regra e tendencialmente.
Décimo
quarto. Vejamos a relação com a dialética. Marx exclui todas as propriedades
físicas da mercadoria para chegar numa coisa-em-si invisível, o valor, a
gelatina de trabalho dentro da coisa. Mas, contra Kant, Hegel afirmou, embora
não tenha sido o único, que a coisa sem suas propriedades nada é – e que tais
propriedades são, veja só, matérias ou materiais. Assim, a coisa-em-si valor
nada mais seria que suas próprias propriedades, ou seja, sua materialidade. A
coisa-em-si, o valor, é a coisa.
Décimo
quinto. Tanto no mundo inorgânico (Sol, buracos negros etc.), passando pelo
biológico (macho dominante, o mais alto etc.), quanto no social (concentração
de capital, ter mais dinheiro, ter maior população etc.; ter grande casa ou
carro, mais dinheiro etc.) ocorre o seguinte processo: mais matéria-massa
concentrada, em relação aos demais e à média, logo, tende a ser a causa de
atração, de ser orbitado, de agregar para si.
Assim,
também, conectamos a teoria do valor-trabalho com a teoria da oferta e da
demanda (procura). Algo é raro, logo, com muito valor por ser difícil de
extrair ou produzir, porque tem mais materialidade – porque tem mais
materialidade, é muito mais difícil. Por isso o ouro tem valor, sua raridade,
ao exigir mais átomos para existir, exige trabalho extra.
A matéria é
a própria realidade – por isso seu valor, sua base de valor. Quando dizemos que
movimento = energia = tempo = espaço (meio) = matéria – dizemos, portanto, que
a energia-valor nada mais é que a matéria. Assim fazemos a unidade, ainda que
ainda contraditória, entre valor e valor de uso. Não mais externos um ao outro,
não mais apenas estranhos.
Vejamos o
parágrafo anterior. Marx diz que o preço da terra virgem não tem valor, pois
não há trabalho gasto em sua produção, portanto, capital fictício; apenas há
preço. Mas a terra, primeiro, tende a valer mais se ela é melhor, mais
produtiva, então, mais rica materialmente! E, segundo, o
oposto-idêntico-diferente de matéria é espaço ou movimento, logo, a terra mais
distante tende a perder valor, preço. Portanto: a matéria é a medida de todas as
coisas!
Vale uma
comparação histórica. Platão teve de dividir o mundo em dois opostos e
separados: o mundo das ideias ou formas e o mundo da aparência ou material.
Depois, em oposição, Aristóteles – ainda idealista, mas com toque materialista
evidente – defendeu um só mundo, aqui, onde está a própria substância, a
essência, o conteúdo, a forma etc. Marx dividiu economia em dois: mundo do
valor de uso e mundo do valor. Agora, unifico ambos os mundos no
valor-material.
Assim, o
valor dado está ligado à sua
1)
Raridade
Que nada
mais expressa além do
2)
Trabalho
médio – social ou natural – exigido para sua produção ou economizado
Que é um
dado gasto de energia expresso de maneira imperfeita no
3)
Tempo médio
exigido em sua criação
Ligado,
portanto, à sua
4)
Utilidade
Que é, por
sua vez e em cadeia, expressão pobre de sua
5. Materialidade (valor-matéria)
Tanto no sentido quantitativo quanto, em principal,
qualitativo.
Isso
afastaria um tanto, como solução, o marxismo de sua necessária metafísica do
valor – tão rejeitada pelos próprios marxistas, contra Marx. No entanto, não
estou disposto a brigar essa luta, que é a raiz de 2 do marxismo. Uma ideia tão
absurda, revisionista e pouco ortodoxa me levaria ao isolamento completo e
final do movimento marxista, do qual dependo para mudar o mundo de vez e de
fato. Recuo, portanto. Quem quiser correr o risco, deixo a base para o
desenvolvimento posterior da ideia, seu desdobramento e suas deduções. Mas
nada, absolutamente nada, garante que ela está correta ou sustenta-se na
realidade, no argumento e na teoria. Incluso, pensa-se dela, a partir, parte do
valor moral e do valor em geral. Mas um ponto de apoio seria que a empiria é
suja, impura, concreta, impedindo a manifestação exata da lei do valor-matéria.
Tal visão, enfim, reconecta o mundo dos homens com o mundo natural. Marx nunca
poderia, ou teria imensa dificuldade de, criar a teoria do valor-matéria, que,
grosso modo, afirma que o valor deriva de maior materialidade relativa. Isso
ocorre porque a ciência, a metafísica (a verdade está no todo), a física, a
filosofia, a Dialética da natureza e a sociedade ainda não haviam atingido seus
ápices, de origem comum, durante sua vida. Quando Marx diz que se pode virar e
desvirar a mercadoria, mas nela não se encontrará nenhum átomo de valor;
esquece que a matéria, representada no átomo, é o próprio valor.
Piero Sraffa
estaria orgulhoso por ser tão positivamente inspirado e superado.
SOBRE OS
VALORES
O homem
primitivo necessitou compreender cada vez mais as propriedades do mundo, ou
seja, de modo rústico, já fazia ciência. Ao analisar o mundo, teve de descobrir
– não criar – valores, valorizar; esta pedra é ruim para este machado, mas bom
para tal tarefa. Pois bem; grosso modo, isso está em Lukács, então apenas vale
tratarmos do assunto se algo novo houver para ser dito.
O valor
artístico, por exemplo, dar-se pelo quanto de trabalho útil foi destinado na
sua produção, incluso o ganho de habilidade do artista. Mas o guia é o valor de
uso da arte, a mensagem. Se um “artista” dedica mil horas para pintar um quadro
preto de preto, perdeu seu tempo.
Lukács diz
da valoração com o exemplo do valor positivo de um bom vento para a embarcação.
Ora, a diferença atmosférica deslocou ar de um ponto para outro, logo trabalho
realizado. Na verdade, o valor tem origem direta em dois fatores opostos e
complementares, unidos: o trabalho exigido e o trabalho economizado. Um mau
vento exige mais trabalho, gasto extra – menos valor tem, menos bom é ele.
Considerado
isso, que trabalho e economia de trabalho são ambos base da valoração, o que os
unifica? O objetivo, a finalidade, o valor de uso – eis a medida, ou melhor, o
lastro da valoração. Uma arte somente é arte se tem mensagem fictícia (podendo
ser afirmada como bom, bem, ou mau, mal, elaborada).
Na relação
homem e objeto, ou no trabalho-produção, a valoração divide-se, no contexto, em
bom e ruim. Nas relações humanas, relações de produção e sociais ou pessoais, em
bom e mau. Nada nisso de maniqueísmos, pois, por exemplo, um operário lutador
da causa operária, logo bom, pode ser machista, logo mau. O que guia é o rumo
da humanização da humanidade, o fim da alienação – a finalidade.
Assim, a
valoração dos valores está lastreada, no trabalho, por isso, na história, por
isso, nas relações contextuais, logo, na finalidade.
Já dissemos
em outro lugar que o ouro vale muito porque se exige imenso trabalho para
extraí-lo da terra. Mas tal imenso trabalho é exigido porque se exige muita
energia-tempo-trabalho para produzi-lo nas estrelas, nas explosões estelares.
No social, o
trabalho está ligado de modo direto e central com o problema da alienação, ou
seja, da desumanização da humanidade. É moral o que economiza o trabalho e, ao
mesmo tempo, preserva o trabalhador, algo que exige novas relações sociais de
produção e novas superestruturas (instituições etc.). Tem valor, tem moral,
aquilo que liberta o homem do trabalho manual e lhe dá saldável tempo livre,
isto é, socialismo. O socialismo, a liberdade humana, a humanização do homem, é
o valor dos valores – a meta inconsciente e, depois, consciente da humanidade.
MORAL E METAFÍSICA
Platão
ascende a conceitos cada vez mais gerais e abstratos até alcançar o Belo, o Bom
e o Bem. Para ele, os mais puros. Ora, existe um conceito ainda mais puro,
geral e abstrato. O belo, o bom e o bem são o quê? São valor! Com tal conceito,
na economia Marx foi de fato ao mais abstrato. O bem (coisa privada) não é o
mais profundo ou, se quisermos, o mais etéreo: isso é o que está dentro do
valor de uso, o bem, ou seja, seu valor invisível dentro de si. Marx poderia
dar qualquer nome ao valor, já que é descoberta sua, mas lastreou a palavra na
metafísica.
J. P.
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