TRÊS CRÍTICAS À CRÍTICA MARXISTA DO FETICHE
Uma teoria geral, mais geral,
correta costuma abarcar e explicar dentro de si a teoria por ela superada.
Penso que seja o caso do ponto que iremos tratar agora. Todos os aspectos do
marxismo foram atualizados ou reformulados em minha obra; o mesmo vale para a
teoria do fetiche, que ganha natureza nova e mais objetiva. Vejamos as teses
críticas.
1. O
valor é, de fato, seu valor de uso
Ao criticar o fetiche da
mercadoria, Marx afirma que uma relação social entre homens aparece coisificada
e enquanto relação social entre coisas. Parece, de parecer, que 1 quilo de
arroz é igual a um tanto certo de feijão, como se iguais e trocáveis por si,
entre si.
Ora, o processo cristaliza-se na
estrutura. Essa afirmação produz um valor-matéria, pois o processo de trabalho
cristaliza-se na mercadoria, na materialidade. O valor-matéria depende de três
fatores: material, propriedades e contexto. São três elementos materiais, que
dizem o valor do objeto. O material é o mais claro e evidente relativo aos
demais, daí a dificuldade teórica. Mas a perecibilidade do objeto, por exemplo,
propriedade, também tem relação com seu valor.
Assim como Platão está para
Sócrates, esta teoria – e as obras que a sustentam – está para Marx. Ou como
Aristóteles está para Platão. Marx duplica o mundo em valor e valor de uso,
mercadoria e dinheiro, capital fixo e circulante, trabalho por peça e por tempo
etc. Reunifico-os: a alma é o próprio corpo. Há relação direta e identidade
entre materialidade e valor. Mais materialidade, no sentido amplo, mais valor
tem.
Assim, o professor produz valor
porque produz um valor de uso, o novo trabalhador especializado, mas produz
pouco porque produz um valor de baixa materialidade. Como, antes, o valor era
tratado como algo separado e invisível, todo tipo de teoria surgiu. Uma
confusão geral. Mas sua fusão, do valor, com o valor de uso, o valor-matéria,
resolve tudo.
Ainda sobre o fetiche do
dinheiro, do ouro. É claro que o ouro em si não é dinheiro, mas apenas numa
sociedade, mas ele é em si o melhor como dinheiro, em potência. O ouro exige
muito trabalho e tempo, muita matéria, para ser produzida nas estrelas – daí
sua raridade. Sim: o valor da mercadoria depende até do trabalho e da
materialidade natural, além do contexto e das propriedades. Ele é materialmente
“pesado”. As propriedades do ouro fazem ele ter seu valor singular: raro,
imperecível, pode ser separado e fundido à vontade, maleabilidade certa etc. Do
mesmo modo, o petróleo é tão importante hoje, até lastro do dinheiro, por suas
propriedades – vários valores de uso de base surgem dele.
Valor de uso é o valor.
2) Há, sim, relação “social”
entre coisas
Para Marx, um processo objetivo
produz a ilusão subjetiva de relação entre coisas. Para mim, isso também é
objetivo: há uma relação social entre coisas, de fato. O capitalismo é a
sociedade das coisas, a sociedade secreta e conflituosa coisal. Visto de modo
individual, consumismo e usamos-destruímos as coisas; mas, no todo, a coisidade
domina-nos, explora-nos. Nós somos coisificados na sociedade capitalista porque
esta é uma sociedade delas, coisificante.
O dinheiro que gera mais dinheiro,
em busca de mais de si, não é uma ilusão, mas uma realização, que tem o
trabalhador como fardo necessário assim como precisamos da gravidade que pesa
sobre nossos ombros. Não é uma relação social que parece como relação coisal –
não é mero aparecer, pois assim é de vez. Cabe-nos domar o mundo das coisas.
O capitalismo é nossa matrix.
3) O fetiche não é apenas um
reflexo subjetivo
Com Lukács, buscou-se focar no
aspecto subjetivo do fetichismo. Mas ele é objetivo, primeiro, acontece; e
ontológico. Para Marx, há um engano, um quiproquó, uma ilusão. Está certo, mas
está errado. O fetiche é uma realidade: o mundo das coisas quer manter-se,
dominar e ampliar-se. Isso assim como o inorgânico, o biológico e o social –
temos uma quarta e falsa modalidade de ser, o coisal, um colateral. Assim como
o homem humanizou a natureza, o ser coisal coisifica o homem e o mundo.
Deve-se, portanto, destruir o
fetiche concreto, não apenas abstrato. O fetiche abstrato revela-se fetiche
concreto. O erro total de pensar fetiche em Marx como tara por mercadorias e
consumismo, ou tara por dinheiro, passa a ter certa verdade.
Nada há aqui de discordância de
tudo como um vício opositor: afirmarmos a teoria de Marx ao superá-la. Temos
nova teoria do fetiche.
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