sábado, 24 de fevereiro de 2024

Crise sistêmica - teses

 J. P.

Do livro A crise sistêmica

TESES SOBRE A CRISE DE ABSTRAÇÃO


1.      Os diferentes capitais e suas formas tendem à unificação parcial e total.

2.      O capital fictício rompe sua medida, ainda que de modo relativo, hiperinflaciona-se, ganha autonomia artificial.

3.      Sinal de integração socialista facilitada, capitais se abstraem como com o comércio virtual.

4.      O trabalhador é afastado ou alienado de seu trabalho alienado por robotização, automação. Há crise por redução do valor, do trabalho abstrato (Kurz).

5.      O dinheiro desloca-se de sua relação direta com sua base material, perde sua medida.

6.      Pela dívida, o consumo imediato abstrai-se da realização imediata do valor da mercadoria.

7.      A união urbana agrega os antes separados, mas isolada o indivíduo.

8.      Os estados nacionais mal resistem à tendência de integração.

9.      O homem rompe com a natureza.

10.  O isolamento do homem da comunidade, dos outros e de si o adoece.

11.  O estado abstrai-se de sua sociedade como com a profissionalização das forças militares.

12.  A arte deixa de ter matéria-forma-conteúdo – torna-se arte abstrata, falsa arte.

13.  A moral torna-se abstrata, abstrai-se.

14.  A mercadoria abstrai-se, perde materialidade, perde conteúdo, há fusão concreta de valores de uso exigindo menos valor e trabalho.

15.  A burguesia afasta-se do capital a partir do qual tem lucro.

16.  A realidade posta, hoje, afeta a capacidade de abstração mental dos indivíduos.

17.  A linguagem abstrai-se em demasia da realidade concreta, cai em engodo e falsidade.

18.  A crise de abstração é, generalização e totalidade, muito maior do que somente a crise singular do trabalho manual abstrato, condição do socialismo.

 

Não são todos os casos nem todos os tratados nesta obra – mas servem de referência e aproximação. É dificílimo explicar algo como crise de abstração para um sindicalista lutador ou em panfleto operário. A abstração elevada exige, por sua vez, imensa abstração. Isso atrapalha o sucesso e popularização da tese, mas a vanguarda socialista pode lidar com ela de modo rico e estável. Com a maioria, traduzimos a teoria em propostas políticas práticas, concretas.

Por abstração: 1) separação, 2) tornar menos material, 3) tornar mais ou mero conceito, 4) “purificar”. A crise pode ser, portanto, por separação (do Estado etc.), ou por, oposto, integração concreta (do capital etc.). Ou por tornar menos material (do Estado: privatizações, limite de orçamento etc.), etc.; ou, oposto, excesso material (como máquinas de guerra grandes e caras fáceis de inutilizar por materiais baratos como drones etc.). O abstrato é o concreto em processo.


TESES SOBRE A CRISE DO VALOR, DOS VALORES, DO VALOR EM GERAL

 

1.      Reduz-se o valor econômico da sociedade do próprio valor econômico por redução do trabalho manual abstrato (Kurz). Mas a crise é do valor em geral, não apenas crise de um tipo singular de valoração.

2.      Parte da crise está na contratendência dos baixos salários etc. ao movimento de implementação, logo, da automação.

3.      Há contradição entre valor e capital.

4.      Há contradição entre estrutura e processo.

5.      O capital, em geral, em geral torna-se fictício.

6.      Os serviços, improdutivos, sugam valor da produção, via mercado, por meio de preços maiores e demanda maior.

7.      Há aumento geral em geral dos custos improdutivos sociais como polícia urbana e, na empresa, espionagem industrial etc.

8.      O valor de uso da natureza decai, degenera – crise ambiental.

9.      Com o desenvolvimento técnico, boa parte da arte entra em crise por falta de público, girado para outros meios (cinema, internet etc.). Abandona-se, portanto, o esforço artístico, causa central de sua valoração.

10.  A decadência da sociabilidade burguesa leva à decadência moral, de seu valor.

11.  O homem perde valor psíquico por sua desvalorização social.

12.  A desmaterialização das mercadorias, ademais de suas fusões de valores de uso, rompe com o valor econômico.

13.  A crise central do valor econômico como centro da crise dos valores em geral leva à crise da teoria, abstração, do valor – que passa para, também, o valor-matéria.

14.  O valor de uso entra em crise para garantir venda por meio da sua queda abismal de qualidade, de sua fragilização (Mèszáros), de sua troca de matéria, por seu equivalente fictício, de seu desuso (produto força de trabalho etc.), da produção destrutiva (Mèszáos) etc.

15.  Do ponto de vista social, há superprodução crônica, mas, latente de produtos, incluso produto-capital, que se apresenta (Mèszáros) como contradição vital entre produção e circulação.

16.  Ao se desmaterializar, fácil de criar e destruir, o dinheiro perde valor.

17.  A crise do valor é uma só, outro lado da moeda, com a crise de abstração.

18.  A crise do valor, tal qual a crise de abstração, externaliza-se como crise de medida, da medida, de desmedida.

19.  O valor de uso e o valor são apenas um, opostos apenas externos, são o mesmo – valor. O valor-matéria cristaliza o valor-trabalho. Por sua vez, o valor-trabalho é resultado do valor-matéria. Por valor-matéria temos sua materialidade, suas propriedades e seu contexto.

20.  A máquina, tanto mais hoje e no socialismo, faz trabalho como trabalho, agora, objetivo, trabalho objetivo – em oposição superante, tanto quanto possível, do trabalho manual subjetivo.

 

Há ainda aspectos não tratados nessas teses, mas ao longo do livro.

 

 

 

SOBRE A ALIENAÇÃO HOJE

 

Há:

 

1)  Domínio do mundo das coisas sobre o mundo dos homens;

2) Humanização das coisas na proporção da coisificação dos homens;

3)  Valorização das coisas na proporção da desvalorização dos homens;

4)  Integração das coisas – a internet! – na proporção da fragmentação dos homens;

5)  Ganho de características das coisas na proporção da unilateralização dos homens e de seus pensamentos;

6)  Poetização, estetização, das coisas na proporção da brutalização dos homens;

7)  Ganho de cognição das coisas na proporção da perda cognitiva dos homens.

 

Cognição tem, aqui, sentido amplo. Por exemplo: a robótica dá sensibilidade artificial às máquinas, o que desemprega e dessensibiliza o operário.

Nem todas essas afirmações são novas, as primeiras em destaque são de Marx. Mas servem de guia para a obra a seguir, pois ganham profundidade enorme em nosso tempo.

Em resumo, grosso modo, em geral – há processo de concreção das coisas na medida da abstração dos homens. Dialética do abstrato e do concreto.

Coisificação (reificação) não é apenas o homem – e a subjetividade – ser coisificado, ou, ainda, relações sociais aparecerem como coisa e relação entre coisas; mas também o desenvolvimento, às nossas custas, do mundo coisal. A sociedade passa a servir às coisas e ao seu mundo. O capitalismo é a sociedade das coisas, em especial, da coisa-dinheiro. A coisidade explora-nos. Assim como o homem humanizou a natureza, a coisidade coisificou o homem e o social. Não é um engano ou um “como se”. Há de fato uma relação social entre coisas com o ser humano enquanto ferramenta, meio e apêndice – não somente uma relação social humana que aparece, por quiprocó, enquanto relação coisal. Isso é claro do ponto de vista da totalidade. O erro completo de pensar que fetiche em Marx é tara por mercadoria e consumismo passa a ter um grão salgado de verdade.

Marx chega a afirmar n’O Capital que o processo de produção domina o trabalhador, não o inverso, o trabalhador dominar o processo de produção. Mas faltou um passo, a pergunta: Por quê? Para quê? Há uma teleologia objetiva como fim em si mesmo de manutenção e ampliação do reino das coisas, da coisificação. Eis a “intenção” desse reinado.

Também, trataremos de outras alienações como a separação do homem da natureza.


TESES SOBRE A CRISE DAS CATEGORIAS

 

1)  A categoria de valor econômico entra em crise (Kurz) por redução do trabalho manual abstrato na produção; mas não só: a crise se dá por contradição com o capital (outro de si), desmaterialização das mercadorias e do dinheiro etc.

2)  A crise da categoria de valor-trabalho dá-se, também, como crise teórica, de seu valor teórico desde a descoberta, nesta obra, do valor-matéria.

3)  As categorias da Ciência da Lógica de Hegel, categorias da ontologia, entram, em conjunto, em crise na atual sociedade, na sua atual fase – qualidade contra quantidade (Mèszáros)  e medida, interno contra o externo etc.

4)  Assim, a própria Lógica de Hegel adentra, enfim, em crise, suprassumida nesta obra em nova lógica ontológica, metafísica.

5)  A categoria geral de valor, não apenas econômico, entra em crise geral.

6)  Todas as categorias concretas do capitalismo entram em crise: classes, capital, valor, exército industrial de reserva, nação etc. A burguesia, por exemplo, ao se afastar da concretude da empresa, via ações, torna-se uma classe que já não é classe alguma, ou seja, superação das classes por dentro da própria existência classista.

7)  Na ciência, partir, a priori, de categorias e de categorias fixas entra em crise – elas, os conceitos, devem ser o final, o ponto de chegada, não o começo onde a realidade deve caber de modo artificial e forçado, além de serem criticadas e avaliadas quando de uso comum.

8)  Surge a condição, enfim, de metafísica final, materialista e dialética, como ponto de chegada e real ponto de partida novo.

9)  As categorias sistêmicas-concretas tornam-se, cada vez mais, meras categorias como, por ex., o dinheiro enquanto mero dinheiro. Tornam-se abstrações. Tornam-se menos materiais.

10) Em nosso tempo de aceleração, a categoria de tempo entra em crise.

 

Meu primeiro contato com a expressão “crise categorial” foi por palestra de Kurz no Brasil, disponível na internet. Porém, ele não generalizou: a crise categorial é geral, universal, ampla – não apenas o esperado pela crítica do valor (econômico), crítica do trabalho abstrato e manual. Ele retira tal ideia – de modo correto, mas contrito – dos pensadores não marxistas, dando-lhe vestido vermelho. Os pós-modernos perceberam crise do trabalho, crise da “ideia” de classes etc. Mas eles foram apressados, impressionistas, simplistas, demasiado europeus, sem conceito, idealistas, sem noção de totalidade, sem mediação – e assim por diante. A crise das categorias concretas é a quarta dimensão da mesma moeda das crises tratadas nas teses anteriores. 

 


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