domingo, 14 de maio de 2023

A metafísica marxista [nova dialética da natureza]

 

 

A METAFÍSICA MARXISTA

Nova dialética da natureza

Uma teoria de tudo

 

Uma mercadoria aparenta ser, à primeira vista, uma coisa óbvia, trivial. Mas sua análise a revela como uma coisa muito intricada, plena de sutilezas metafísicas e caprichos teológicos.

 (Marx, O capital I, 2013, p. 146)

 

No entanto, a mesa continua sendo mesa, uma coisa sensível e banal. Mas tão logo aparece como mercadoria, ela se transforma numa coisa sensível-suprassensível.

(Idem, ibidem)

 

O valor do ferro, do linho, do trigo etc., apesar de invisível, existe nessas próprias coisas…

(Idem, p. 170)

 

Aqueles que acham que atribuir ao valor existência independente é mera abstração esquecem que o movimento do capital industrial é essa abstração como realidade operante (in actu).

(Marx, O Capital - livro 2, 2014, pp. 119, 120)

 

Mais-valia e taxa de mais-valia são, em termos relativos, o invisível e o essencial a ser pesquisado, enquanto a taxa de lucro e, portanto, a forma da mais-valia como lucro se mostram na superfície do fenômeno.

(Marx, O capital 3, 2008, p. 34)

 

Tem que se deixar de lado a opinião de que a verdade tem que ser algo palpável.

(Hegel G. W., 2016, p. 53)

J. P.

 

 


 

ALERTA AO LEITOR

 

Embora não saiba, tu tens necessidade de uma obra qualitativa, que mude teu modo de pensar ou, se jovem for, o faça dar um salto necessário. Sentes, mas não percebes. Os livros comuns apenas fazem digressão, contribuem pouco, repetem os ritos e as palavras já postas etc. O texto adiante é uma ruptura com a tradição até aqui, mesmo. Trará uma visão completa de mundo, base para a ciência-filosofia geral. Se duvidas, leia-o! Aqui, não cultivamos falsas humildades, pois temos de dizer a verdade na sua medida tão exata quanto possível: um novo paradigma surge. Com esta obra, concluímos a história da ciência e da filosofia nos seus aspectos gerais e essenciais. Parece muito, algo impressionista e megalomaníaco, talvez delirante – porém estás avisado dos desafios e da aventura das próximas páginas.

 

 

 

 

 

GLOSSÁRIO

 

Prefácio

 

Seção um

O ser, o cosmo

A história da e na ciência

A igualdade de tudo

O cosmo, o ser

As leis gerais da metafísica materialista

O ser e o socialismo

O ser e a natureza humana

O ser e a dialética

O “outro lado” metafísico

O abstrato é o concreto em processo

O absoluto

A vitória do materialismo

Antinomias de kant contra o materialismo

Gnosiologia ou ontologia?

Materialismo ou idealismo?

A liberdade objetiva ou dialética

Teleologia objetiva

As causas

O que é a conciência, a mente?

 

Seção dois

Teses sobre questões abertas nas ciências naturais

As questões abertas na física moderna

Biologia e dialética

 

Seção três

O método dialético empírico dedutivo

Leis e categorias da dialética

Os métodos científicos

 

Seção quatro

A filosofia e a ciência

A filosofia científica, da ciência

Força, átomo e campo

Matemática

Teoria do caos

Tempo

Causalidade

O fim do paradigma aristotélico

Trabalho, linguagem e sociabilidade

Críticas contemporâneas à metafísica

As duas oposições científicas

Platão e nietzche

Dialética

As feridas narcísicas da humanidade

A teoria de tudo

Ideologia

A duplicação dos mundos moderna

Extra: os paradoxos

O colapso ambiental

Marxismo e metafísica

Tecnologia moderna

Educação

Teoria marxista da alienação

 

 PREFÁCIO

 

Hegel alertou que uma introdução de obra, um prefácio, precisa evitar ser um resumo do conteúdo logo em seguida. Sigo tal norma dialética. No entanto, alguns esclarecimentos e reforços continuam necessários. Vejamos juntos.

O tempo da filosofia profunda parecia ter passado em nossa época de distração e modos rasos. Nada pode ser maior. Até na política, interrompeu-se a noção de projeto, pois o muro de Berlim caiu sobre nossas consciências. Assim, no fragmentado soa como algo distante qualquer projeto sistemático. Mas a necessidade por conclusões gerais hora ou outra iria impor-se, de um modo ou de outro. Uma possibilidade crescente amadureceu no real, exigindo tradução e organização teórica.

 

O PAPEL DE ENGELS

Quando um pensador meio marxista quer negar Marx de algum modo, costuma atacar de maneira covarde, indireto, culpando Engels de todos os pecados mortais. Se há o “erro” da dialética, a suposta farsante caluniada, cabe a este o peso do uso dessa filosofia… Para mim, no entanto, ele é um mestre imenso. Cabe lembrar que Marx aprovou, em cartas, a busca de Engels por uma dialética da natureza e apoiou em vida a obra Anti-During, escrita por seu amigo, onde este expôs de modo claro sua visão do não social como dialético.

Mas também evitamos a visão dogmática dos mestres, que cometeram alguns erros ou pararam em limites parciais, em grande medida empostas por suas épocas. Minha dialética é um desenvolvimento qualitativo da dialética desses materialistas; além disso, discordo em profundidade da afirmação engelsiana de que dialética e metafísica são totalmente diversos, água e óleo. Dialética é certa e correta metafísica dinâmica. Por isso, nesta obra, permito-me a ousadia de tentar responder várias lacunas da filosofia e da ciência, mais do que demonstrar que a concepção dialeticista é confirmada pela ciência moderna.

 

A CIÊNCIA MODERNA

Após Engels, apenas Lenin tentou pesquisar sobre o mundo não social, oferecendo alguma conclusão sobre. Porém, ao fazê-lo, o líder russo ainda não havia estudado a Ciência da Lógica de Hegel, que tanto o transformará nos anos da grande guerra. De qualquer modo, mais de 100 anos depois, sua contribuição está desatualizada.

A física quântica travou-se numa quase revolução, quase respostas. A física moderna foi longe, muito, recentemente descobrindo que o universo está em expansão acelerada, por exemplo (até tal expansão tem história, modifica-se!). A química também avançou, e continua motor vital para o desenvolvimento da indústria. A biologia impulsionou a genética e avançou para sua unificação coma teoria de Darwin, a nova síntese evolutiva. Os exemplos são muitos, e precisam de uma visão filosófica unificadora.

Nesse sentido, muita pressão recebi do meio ambiente hiperespecializado de nossa época. Mas o perfil pessoal de querer o impossível, saber de tudo, ao menos nos aspectos gerais corretos, levou-me de modo inconsciente a uma concepção geral. Via de regra, o filósofo tem uma premissa ou visão de mundo do qual deriva suas conclusões, seguindo seu sistemismo. Tive de fazer diferente, o oposto: primeiro, cheguei a conclusões relativamente separadas na arte militar, na psicologia e na essência humana, na física, na filosofia, na história etc. para, apenas então, derivar, perceber, que havia um fio condutor comum, que unificava numa teoria de tudo a realidade. O sistema filosófico-científico é, portanto, conclusão, não o começo ou o primeiro.

É comum que os marxistas e pessoas das chamadas “humanidades” entendam pouco de ciências da natureza e da matemática. Meu caso não era diferente, por isso fiz todo um programa de estudo e pesquisa que partia do básico, matemática básica, para evitar qualquer lacuna, até a matemática e ciências avançadas. É raríssimo encontrar marxistas que dominam bem as ciências humanas de um modo geral, da economia até a ciência militar passando pela psicologia, e, ao mesmo tempo, uma visão estável da moderna ciência natural. A especialização excessiva cobra muito caro.

Isso nos leva à questão da metodologia. Aqui, exponho de modo resumido o método empírico-dedutivo junto com um desenrolar da dialética para nosso tempo. Tal método nada mais é que o dialético sob nova roupagem, em oposição, real e conceitual, ao limitado hipotético-dedutivo.

 

A FILOSOFIA

Com este material, quero resolver com um ponto final, e como ponto de partida, a milenar disputa sobre a questão do Ser. A filosofia de nossa época ou rejeitou a questão a priori, diante da enorme dificuldade, ou deu passos ruins nessa direção. Lukács poderia ter resolvido a polêmica já na década de 1960, mas limitou-se à ontologia, metafísica, apenas do ser social. Ver-se-á nas próximas páginas como sua ontologia, correta, está abaixo da nossa, mais geral e profunda. A questão do Ser mobilizou os melhores filósofos não marxistas nos últimos 200 anos, mas que se perderam na sua pureza suposta, na negação do ente, na falta de domínio da ciência natural etc. Os marxistas antimetafísicos estão com Kant e com os positivistas, em má companhia. Kant contrapôs os avanços da física contra a estagnação da metafísica; ora, deixou de ver que a metafísica correta deve surgir da física contemporânea e da ciência; eis o segredo.

Se esta obra apresentar algo correto nos seus aspectos gerais, trata-se, junto com a obra A crise sistêmica, de uma revolução copernicana na ciência e na filosofia, logo precisa ser reconhecida como tal. Dois limites subjetivos atrapalham tal reconhecimento: 1) acadêmicos sentem-se na obrigação de sempre discordar, nunca entrar em acordo; 2) esta obra foi escrita por um autodidata, sem prestígio e cargos. Algo novo tende a causar, quando não a cínica indiferença, a rejeição inicial.

Eis que entra em questão os pares. Nunca tivemos tantos doutores em filosofia, e nunca eles foram tão inúteis. Em geral, apenas comparam um autor com outro, criando relações artificiais entre eles, ou tornam-se interpretes oficiais de algum pensador europeu ou americano, ou usam o jogo de linguagem e “conceitos” para disfarçar a baixa criatividade e ausência de ousadia, ou aumentam apenas uma vírgula e um ponto a mais no pensamento geral. A situação é deplorável. No entanto, exato a falta de gênios entre nós deve exigir mais criação, mais riscos – e que seja posto sob crítica para novos apoios e aperfeiçoamentos. Os filósofos oficiais, se fazem filosofia ou ciência, trata-se de algo colateral, quase um acidente, pois o que importa é um texto de doutorado comportado, que garanta aquela vaga de professor estável.

Enfim, para concluir, sou repetitivo em certos temas na obra. Ao menos isso ajuda a fixar o conteúdo, mas sua razão central é que o objeto exposto exige tal insistência. Há que ser rigoroso. Por outro lado, ganhamos em clareza, herança que guardo da letra de Engels, com quem aprendi a simplicidade da escrita para o público popular potencial.

Peço a indulgência do leitor, incluso do especializado, pois tive de abarcar literalmente o mundo na busca das verdades primeiras. A riqueza de material, inesgotável, impõe certos limites. A questão sobre se há ou não certa metafísica real, material, apenas poderia ser solucionada na sua busca, nunca por críticas externas ou de princípio do tipo feito por Adorno. Ademais, ao lidar com aqueles a confundir metafísica e religião, faço certas “metáforas” com o mundo religioso apenas para reforçar a riqueza do materialismo dialético. A incapacidade de suportar o materialismo na ideia é a incapacidade de suportar o materialismo na matéria.

 

      

SEÇÃO UM

O SER, O COSMO

 


 

 

 

 

A HISTÓRIA DA E NA CIÊNCIA

 

A grande preocupação dos idealistas gregos era saber daquilo imóvel, sem mudança e movimento. Assim, a antiga metafísica supôs um mundo das Ideias e das formas (Platão), um Ser absoluto (Parmênides), o primeiro motor imóvel (Aristóteles). O que lhes faltou é saber que há as leis da mudança, além das leis da regularidade, algo apenas resolvido na moderna dialética. Até o gigante Heráclito orientava descartar os sentidos, pois no empírico reinava apenas o caos e o acaso – tema que aprofundaremos em outro capítulo. Para o filósofo escravista grego, era necessário negar a historicidade do mundo, pois queria a estabilidade e a perpetuação do seu modo de vida. A filosofia medieval, desde Agostinho, tratou de manter o império da rotina, da tradição, como com a cidade de Deus perfeita e estática e a cidade dos homens imperfeita e alterável.

Então, veio o capitalismo e sua necessidade de saber como, não o porquê, o mundo funciona. O princípio da tradição cai por terra, a novidade ocorre sempre, nada é estável. O objetivo é econômico: saber navegar bem, produzir novas ferramentas. Assim, toda a filosofia antiga, a aristotélica em principal, é atingida de morte: as leis da terra são as leis do céu!

Mas para Newton o espaço era absoluto, independente e imóvel como o palco de um teatro. Também o tempo era inalterado em seu movimento. E esse foi o paradigma por séculos. O universo, criado por Deus, ainda era eterno e imóvel, além de sem limites, como pensavam já os gregos.

Newton foi, após seu grande sucesso teórico, desafiado: se sua fórmula estava correta, logo o universo deveria colapsar! Por que isso não acontecia? Ele pensou: porque o universo é infinito e as gravidades, no geral, em ampla escala, assim, se anulam de um ponto para outros. Mais uma vez, a história saiu do caminho!

Os químicos, por sua vez, pensavam que os elementos sempre existiram e sempre existirão – sem criação, sem destruição. O papel seria, assim, descobri-los, isolá-los, classificá-los e dar-lhes bom uso industrial. E pronto.

Algo análogo tinha-se na biologia. Os materialistas sempre ensaiavam formas de fazer alguns animais surgirem de outros, mas falhavam. Os idealistas, por sua vez, diziam que os seres sempre existiram e sempre existirão.

 A primeira etapa da ciência é conhecer, reconhecer e classificar os seres; isso é o seu começo. Mas logo sente sinais de que há um filme sendo contado ali, pistas surgem, especulações ainda tímidas ocorrem aqui e acolá.

Hegel inicia a ideia de que o homem tem uma história, que o passado é a causa do futuro, que há um caminho a percorrer. Antes, a história de Roma era tratada como indiferente à história atual, sem progressão e progresso. Mas foi em Marx que a história humana foi materialisticamente explicada: com a necessidade de satisfazer necessidades materiais, os homens produzem objetos e relações sociais novos; assim, a produtividade crescente muda as coisas, o ambiente – e os próprios homens. Então, Marx generalizou: o inorgânico, a biologia e a sociedade são históricos, possuem um processo! Ele o fez de modo filosófico, resolvendo a charada apenas na história humana. Depois, Darwin deu forma científica à conclusão marxista: a vida e as espécies têm uma origem e um desenvolvimento, como dos seres simples aos mais complexos, menos diferenciados aos mais diferenciados. Algumas espécies e indivíduos prosperam se bem se adaptam e outros definham se mal sobrevivem.

Apesar de ser o mais simples, o inorgânico e o cosmos foi o mais difícil de saber de sua historicidade. Nossa geração já cresce tendo contato com a teoria do Big Bang, logo perdemos a noção de quã recentíssima é tal concepção de mundo. Mas o próprio Einstein demonstrou resistência à ideia, com sua concepção estática – a constante cosmológica! – de universo. Ele teve de lidar com a mesma contradição de Newton, ou seja, por que o universo não colapsava para dentro de si ou, ao contrário, não se expandia?

Descobrimos que o nosso universo teve um início, uma expansão rápida (não explosão) quando o “átomo primordial”, imensamente concentrado em si mesmo, decaiu em partículas cada vez menores, fundamentais. Tal teoria leva à concepção termodinâmica de Engels; o universo acabar-se-á frio, morto e estático. Mas a teoria nunca poderá parar aí. Para uns, o universo “esquecerá” que se expandiu ao máximo e fará um novo big bang. Para outros, ele é como um pulmão indiano, expande-se para depois contrair-se, sabe-se lá como – embora isso seja muito mais dialético, tal como veremos. Outros tantos defendem que há muitos universos depois deste, infinitos. Em geral, temos duas teorias: o multiverso no tempo, que se expande e se contrai; o multiverso no espaço, uns ao lado dos outros. Aqui, proponho o universo no espaço-tempo, uma fusão: a expansão ou contração de um universo se dá junto e porque outros expandem-se ou contraem-se. Mas suponhamos que exista apenas o nosso universo, não o cosmos como união de todos os universos existentes – qual a solução? Alguns físicos defendem que a próxima era cósmica, a dos buracos negros, gerará a fusão e atração destes, reiniciando o universo inteiro. Tudo bem, mas como? Há aí apenas descrição, não explicação. Na verdade, ao que me parece, apresento a hipótese, os buracos negros – maiores, ao menos – sugam espaço (que, debateremos, torna-se provavelmente matéria e luz), são produtivos, por isso não há buracos negros intermediários, nem observados no número necessário. Outro problema: se o espaço expande-se mais rápido do que a luz, o que ele é? Ora, matéria e espaço – nossa terceira hipótese – são o mesmo, sendo ainda diferentes, a matéria inicial em parte decaiu e decai em espaço. O próprio espaço tem história, modifica-se e nasce! Ainda outros, dizem que até o tempo tem uma história, que teve um início.

Há, ademais, uma versão científica e pouco ortodoxa que diz: as leis da física são históricas, não permanentes, segundo a fase e configuração do universo. A dialética nem rejeita nem corrobora esta tese, penso. Vejamos: a história humana tem leis universais e tem leis que pertencem somente e tão somente àquela época específica, capitalismo ou feudalismo etc., ao modo de vida de um determinado tempo e sistema. Mas isso não significa, mecanicamente, que é assim também na biologia e na física, pois ambos são mais simples e menos dinâmicos que o sistema social humano. Para a dialética, no entanto, importa o contexto; por exemplo, um material não condutor em temperatura ambiente torna-se condutor em temperatura elevada. Fica, portanto, esta máxima: o mundo total vai do menos para o mais dialético – muito acima da lei de ir do menos ao mais perfeito.

Agora, entramos de novo na química. Apenas hoje, há pouco tempo, soubemos que os elementos mais pesados surgem da fusão dos elementos químicos mais leves nas estrelas, como o Sol. Há fusão nuclear. Os elementos ainda mais pesados, por outro lado, exigem ainda mais energia para seus surgimentos, frutos das explosões estelares. A mera descrição da tabela periódica teve de dar espaço para uma narração épica!

A revolução espácio-historicista da ciência ainda está incompleta, mas avançou de maneira qualitativa, contra a mentalidade estática dos próprios cientistas, que cederam à realidade. Os gregos, como os iniciadores dessa história, tinham o direito de errar – nós temos o dever de acertar.

 

 

 

A IGUALDADE DE TUDO

 

O início da filosofia grega foi a intuição da igualdade universal. Assim, buscavam apenas o geral e o único, esqueciam o papel da diversidade. Tales, o primeiro físico, afirmou, pela primeira vez na história, que tudo é um porque tudo é, vem da, água. A dedução tem sua lógica, pois todos os seres vivos precisam beber, precisam retornar às suas origens. Seu primeiro passo permitiu ao discípulo Anaximandro ir ainda mais longe: o princípio de todas as coisas não é algo específico, mas alguma coisa não empírica, no fundo do fundo, sem qualidades ou limites, que ele nomeou Apeíron. Também Heráclito algo propôs, o fogo como origem e causa de transformação de tudo. Anaxímenes, o ar. Logo surgiria a ideia natural de que o terra, o fogo, a água e o ar mudam-se uns para os outros, além de combinação e separação. Mas eles, em geral, ficaram muito presos ao sensível. Um dos pontos alto é o atomismo de Demócrito, de que o mundo é feito de átomos e vazio, muito depois seguido por Epicuro.

A física clássica, além de outras ciências, tratou, primeiro, de separar, clarear e destacar a diferença no mundo e nos conceitos. Mas logo, com a ajuda da matematização, ensaiou a unidade ou identidade dos diversos, como v = s/t, velocidade é igual ao espaço dividido pelo tempo; dirá Hegel, o movimento é a unidade de espaço e tempo.

Maxwell deu um gigantesco passo ao perceber que seus 4 cálculos poderiam ser unificados, formando a união do magnetismo e da eletricidade em eletromagnetismo – logo percebeu que a luz caberia dentro de tal descrição.

Mas foi Einstein quem deu o passo imenso na unidade de tudo. Ele disse que massa e energia são um, são diferentes manifestações de algo comum (já debateremos o que é, para nós, este objeto comum). E foi ainda mais longe ao perceber que espaço e tempo são espaço-tempo, pois tempo é espaço! Mais: as duas formas de massa são um! Gravidade e aceleração são iguais!

Hegel diz, inspirado no começo da filosofia:

 

Entretanto, por meio do conceito de diferença interior, esse desigual e indiferente, espaço e tempo etc. são uma diferença que não é diferença nenhuma, ou somente uma diferença de homônimo. E sua essência é a unidade. Em sua relação recíproca são animados como o positivo e o negativo; mas seu ser consiste antes em pôr-se como não ser, em suprassumir-se na unidade. Subsistem ambos [os termos] diferentes, são em si como opostos; isto é, cada qual é o oposto de si mesmo, tem o seu outro nele, e os dois são apenas uma unidade. (Hegel, Fenomenologia do espírito, 1992, 2002, p. 127)

 

Veja-se que Hegel antecipou o princípio da ciência moderna! Não foi algo vago, mera intuição, mas afirmado com clareza como espaço e tempo enquanto apenas em unidade.

E se levarmos unidade até as últimas consequências, por generalização? Surge esta fórmula qualitativa:

 

Movimento = energia = tempo = espaço = matéria  (= massa = luz = campo)[1]

 

Chegamos à teoria de tudo! Ao leitor especializado, pedimos que avance neste e nos próximos capítulos, que daremos as provas necessárias de nossa formulação. A busca de uma teoria do todo, como fórmula que unifique o micro e, por meio do meso, o macro, a relatividade e a quântica, tem uma proposta clara nesta obra.

Isso passa por unificar as 4 forças fundamentais: a nuclear forte, que mantém o núcleo do átomo unido; a nuclear fraca, que é responsável pelo decaimento do átomo; a eletromagnética, que trata da relação de elétrons; a gravidade, que cuida da atração da matéria. Mas o conceito “força”, com seu quase misticismo, entra em crise, não corresponde a um objeto real. A gravidade não é uma força, mas uma curvatura do espaço-tempo. Podemos deduzir, por generalização, que as demais 3 “forças” também não são forças de modo nenhum. Os físicos unificaram as três forças, menos a gravidade – meio caminho andado, portanto. Mas talvez trata-se de olhar por outro ângulo. Tudo é energia (em busca de mais de si), a matéria-luz decai em espaço; por outro ângulo, tudo é espaço condensado, concentrado, para dentro de si! Assim, a mesma “força” que mantém o núcleo do átomo unido, por exemplo, é a energia produzindo uma gravidade, uma queda para adentro de si no espaço. Nossa formulação, junto com a equação acima, reduzir tudo a espaço, formas de espaço, resolverá em outro capítulo todas as polêmicas científicas da física.

 

PARADOXO DE EINSTEIN

Nesta obra, corremos vários riscos de desmoralização por apostar em ideias e caminhos incomuns, mas que me parecem corretas. Por isso, convido o leitor a insistir no adiante, pois em outro capítulo exporemos melhor nossas ideias, passo a passo, de modo que parecerão muito razoáveis, ainda que estranhos. Penso, como debaterei mais uma vez ao final deste ensaio, que Einstein, além de fazer descobertas geniais, apresentou paradoxos como se fatos fossem – mas a lebre ultrapassa a tartaruga. Por exemplo: o núcleo da Terra está como se 2 anos atrasado no tempo em relação ao resto do planeta. Como isso é possível? Um paradoxo. O núcleo e as demais camadas mais externas da terra relacionam-se direta e imediatamente, sem efeito temporal. Como resolver, ainda que corramos riscos de erros? Para Einstein e para os físicos tempo é o espaço; as coisas viajam no tempo, alteram seu tempo segundo sua velocidade. Veja-se que a matéria, aí, é algo externo ao espaço e ao tempo, não se sabe como. Tempo é espaço, espaço é matéria – tempo é energia. Ao acelerar, ao ganhar velocidade, o objeto reverte ou combate a entropia da decadência, ganha energia, ganha espaço, ganha matéria (massa) – o que aparece como ganho de tempo, mudança de tempo, mas isso é apenas a aparência, não a essência real. A coisa é a si mesma apenas em movimento; quanto mais movimento, mais velocidade, mais é-se (por mais tempo). A medida matemática de tempo é útil enquanto medida indireta da energia (podemos fazer uma analogia com a economia política: o valor-energia não é tempo de trabalho, pois o tempo aí é medida inexata e indireta do gasto de energia no trabalho manual). Porém, não é fácil defender isso, em especial sem o aparato matemático que o sustente. E é um ponto quase de todo consensual na física o paradoxo de Einstein. A filosofia deve apresentar alternativas de modo humilde, para a crítica de especialistas.

 

ENERGIA

Na Lógica de Hegel, pouco há, se algo há, sobre energia. Portanto, sua lógica ontológica não cabe aí. Em nossa ontologia lógica, ontologia da lógica, a realidade é energia, mais precisamente, energia em busca de mais energia. Isso é óbvio na filosofia para o mundo do ser vivo, mas também vale para o inorgânico e para o social. Naquele, como na gravidade enquanto atração por curvatura do espaço-tempo – massa é energia, a energia-massa (ou a “matéria” sem massa que tem energia, como a luz) curva o tecido espaço-temporal; neste, no mundo humano, como com colheitas cada vez melhores, com busca de melhor energia, pela exploração da força (energia) de trabalho do operário. Em geral, quando se considera que o homem também é energia em busca de mais de si, ocorre apenas reduzindo este ser ao biológico, à vida, à sua condição animal; mas ele é mais do que isso.

O Ser é energia em busca de mais energia, logo relação consigo, relação consigo como com um outro. Que tal relação seja instável, que há falha e contradições, veremos no decorrer do texto.

A ciência oficial ainda considera energia apenas um conceito. Mas as diferentes formas de energia, mesmo se as supomos como conceituais, apontam a energia em geral, uma categoria real da realidade, embora não empírica, como é o caso da energia-valor na economia capitalista (vale destacar: a mercadoria é unidade do valor-energia e valor de uso-matéria-espaço-tempo condensado).

Cada modalidade do Ser é, por assim dizer, melhor que a anterior na captação energética; em relação ao biológico, o inorgânico é passivo – o social suprassume aquele. Mas energia é insuficiente, pois, como o movimento, seu igual, não se sustenta sozinha.

 

ESPAÇO-TEMPO: O ELEMENTO PRIMEIRO

Vários filósofos indagaram-se qual a composição primeira, central, da realidade. Chegaram a algumas respostas: o ar, a terra, o fogo, a água, o éter etc. Com o desenvolvimento da física e da química, parece que o assunto saiu do campo amplo da filosofia. Mas o raciocínio especulativo ainda pode ter seu valor, embora os riscos e a boa mão calibradora da ciência.

Raciocinemos juntos. Se pudéssemos dissolver as partículas subatômicas e seus possíveis campos, o que teríamos? O conceito real, a categoria irredutível, mais simples é – o espaço. Assim: tudo, portanto, são formas de espaço; espaço concentrado, condensado. Ou seja: mais do que curvar o tecido do espaço-tempo, toda matéria é o autocurvar do espaço-tempo para dentro de si (desde Einstein, a ligação de espaço e tempo faz-se necessária).

É possível supor, a partir desta conclusão, que o átomo, o indivisível, é o maior, ou seja, o espaço, não o menor. Se correto, há unidade do contínuo e do discreto, este vindo daquele. Porém, diferente dos demais temas deste capítulo, tais pensamentos, filosóficos, carecem de base científica e empírica próprias, logo podem ser negados sem maiores esforços pelos cientistas naturais caso se demonstrem falsos.

A tendência de uma totalidade, em geral, é ir-se do simples ao complexo. Isso no seu histórico, no seu evolver. O espaço(-tempo) é o que há de mais simples no cosmos, logo, se não veio antes na temporalidade, vem antes – é primeiro – pelo menos lógico-ontologicamente .

Diz o princípio do impenetrabilidade: dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço ao mesmo tempo. Por qual motivo? Porque, respondemos, dois corpos são, em si mesmos, cada um, espaço-tempo. É a tautologia de que dois espaços-tempos não poderem ocupar o mesmo espaço-tempo; porém o espaço-tempo pode revelar-se, digamos, condensado.

Demócrito afirmou que existem apenas o átomo (ser) e o vazio (não ser). Ele intuiu ainda: há, de fato, unidade de ambos, o átomo é o vazio, o átomo vem do vazio, embora diferentes e opostos; em nossa linguagem e atualização, o espaço-tempo que se expressa também na matéria, com ou sem massa.

Tal modo de ver o mundo pode gerar uma ontologia geral, além de no inorgânico, além do também geral proposto aqui. Na geografia, Milton Santos afirma que “O espaço é acumulação desigual de tempo” (Santos, 2004). Podemos extrapolar para observações biológicas como, quanto maior o animal é, mais tempo vive, contrariando os problemas de reprodução celular (maior possibilidade de câncer), pois são seres com mais espaço-tempo concentrado em si (embora ainda seja necessária uma explicação propriamente científica, não apenas filosófica). Porém, apesar dessa elaboração-especulação, pensamos que a ontologia extraída de Marx, o Ser é histórico, como suficiente e insuperável para a ciência e a filosofia, sendo esta caracterização possível do espaço-tempo apenas uma expressão, também hipotética, particular da ontologia marxista.

O espaço-tempo e a matéria ou as partículas são apenas um, mas que de fato são dois.

O Ser, enquanto ente, como espaço-tempo condensado aparece como em si – e como energia em busca de mais energia aparece como para si.

Espaço-tempo e energia são, na verdade, não apenas em unidade, mas propriamente o mesmo, uma identidade.

Espaço-tempo, este sendo aquele, apenas um, equivalem ao sincrônico-diacrônico, processo-estrutura e o Ser como histórico, mas, derivado, Ser é histórico-geográfico.

Quando se diz “a verdade está no meio” (na realidade, no todo contraditório em evolver), diz-se mais do que se pretendia: a verdade está, de fato, no – Meio, no espaço. Nossa Arkhé.

Como se verá, porque tudo = tudo, o primeiro não necessariamente é primeiro no tempo.

Descobrimos que espaço é matéria, incluso luz e campo, assim como a matéria, incluso luz e campo, é equivalente ao espaço. São diferentes e opostos que são também apenas um. Uma parte do fato de isso ser descoberto apenas agora deve-se da maturidade social e científica; outra parte, porque eruditos, doutores, sempre têm de discordar, nunca concordar, dos demais ao mesmo tempo em que evitam a qualquer custo qualquer risco real na teoria. Assim, quase se descobriu este fato novo por várias vezes, faltando a ousadia. Vejamos Aristóteles na sua Metafísica que fez longa escola:

 

E comprimento, largura e profundidade, não substâncias: a quantidade não é substância, mas é substância o substrato primeiro ao qual inerem todas as determinações. Mas se excluímos cumprimento, largura e profundidade, vemos que não resta nada, a não ser aquele algo que é determinado por eles. (Aristóteles, 2002, p. 293)

 

Nem todo olho, mesmo um bom, consegue sempre ver o que está diante de si. O salto exige ousadia, portanto. É preciso explicar de modo correto, dizer que o aparente flogisto é, na verdade, gás oxigênio, por exemplo.

 

SER, MATÉRIA, MATERIALISMO

Ser, puro ser. Tudo existente, enquanto tudo, é matéria, abstraída de suas formas. Apenas há a realidade material, pura matéria – nada para seu além sobra. No seu começo, se podemos falar de começo, o ser é o máximo simples, sem determinação, sem qualidades, sem características – beira ser o nada, mas não cai nele porque cai dentro de si mesmo (o espaço é, na verdade, o sem qualidades, a transparência transparente).

Aqui, por força negativa da abstração, nenhum movimento.

A matéria, aqui, é mais do que a matéria empírica da física, diferenciada da massa e da energia. A própria energia é matéria, pois é material. Ademais, Hegel demonstrou que a substância (matéria, espaço condensado) é igual, está presente, nos acidentes, nas propriedades (massa), são apenas um como dois – matéria é sua propriedade, a massa. Isso deriva uma hipótese. Os neutrinos vindos do Sol são, uma parte, mais pesados do que o esperado, o que leva à dedução de que o neutrino mais leve tem alguma certa massa irrisória – mas daqui, deste texto, podemos derivar que o neutrino do elétron tem apenas matéria, ou seja, massa potencial, não real e direta, passando a adquirir massa nas versões mais pesadas. É uma hipótese, da origem filosófica, a ser posta em crítica pelos físicos especialistas.

 

MOVIMENTO

Movimento, puro movimento. Ele é o fluir absoluto, sem começo nem fim, sem causa primeira.

O movimento é absoluto se tomado em isolado. Até mesmo ficar parado é ato de assim estar, movimento. O movimento e a estabilidade estão, no sincrônico, em unidade, A=A e não-A, mas também é claro que o movimento antecede o estável, A=A… e não-A, no diacrônico.

A contradição certamente faz o movimento, mas o movimento, ao contrário, também faz a contradição. No concreto, vai-se da identidade para a diferença, para a diversidade, para a oposição, para, enfim, a contradição; e, supõe-se, de volta à afirmação da unidade agora interna dos opostos contraditórios.

Qual é, então, a causa central do movimento? Se, além das três dimensões, finitas, temos a quarta dimensão espacial, ponto do infinito, base da energia, a matéria e a luz caem em tal dimensão como em si mesmas. Eis a explicação metafísica científica, materialista, do mover.

A lei da mudança é uma lei que muda, mas uma mudança permanente.

 

DEVIR

A verdade da matéria e do movimento é sua unidade necessária – o tornar-se, o vir-a-ser, o devir.

O devir é mudança, movimento, deslocamento, desenvolvimento.

De imediato, a matéria parece se sustentar sozinha, enquanto o movimento precisa dela – mas tanto o pensar filosófico quanto o empírico logo vê que um somente há com o outro, são apenas um.

Ao movimento corresponde a energia; à matéria, o espaço-tempo.

 

METAFÍSICA E ARTE MILITAR

Trotsky, em seus escritos de teoria militar, teve de combater várias concepções fixas de luta, de guerra. Logo, ele protestou sobre certa metafísica, baseada em princípios gerais, que não deveria existir. Ora, temos uma equação qualitativa em nossa filosofia primeira:

 

Movimento = energia = tempo = espaço = matéria

 

A variedade da arte militar trabalha com tais elementos. O próprio Trotsky disse que o uso amplo da manobra na sua guerra (movimento) ocorria por causa do espaço amplo do território em disputa. Os cinco elementos acima dinamizam-se e devem ser considerados juntos e em separado pelo estrategista. Por exemplo, ir a uma distância muito grande em território inimigo (espaço), exige muita energia e logística – um dentre as razões de defender a nação é uma vantagem sobre quem a invade.

Já disse em outro local que os marxistas mais capazes devem escrever um manual militar completo e claro. Nesse sentido, ajuda a organizar o pensamento considerar a identidade na diversidade dos elementos acima.

Uma leitura atenta de Da Guerra de Clausewitz demonstra por toda a obra que tais aspectos, elementos, estão presentes com centralidade e devem ser considerados mais do que de modo instintivo ou pela experiência, também ideal e teoricamente.

Um exército muito pequeno em relação ao inimigo, por exemplo, força a aposta – compensador – em outro aspecto que não sua matéria, logo, na sua mobilidade. Surge a guerrilha. Um exército concentrado e grande força o outro a desmembra-se, a fragmentar-se para melhor combater.

 

METAFÍSICA E LUTA DE CLASSES

Podemos demonstrar que a luta de classes aparenta os conceitos e as equivalências movimento, energia, tempo, espaço e matéria? Sim. A luta por recursos concretos e abstratos estão em jogo. Vejamos:

 

 

1.     Movimento

A luta contra a intensificação da produção é luta de classes, contra movimentos mais rápidos. Movimento é também o dirieito de ir e vir negado por quem não tem dinheiro, além da privatização do espaço.

1.  Energia e tempo

O trabalhador em todas as épocas classistas quer trabalhar mais para si e trabalhar menos. A burguesia, hoje, controla a energia e o tempo de trabalho.

2.  Espaço

A luta pela cidade, pela reforma urbana, contra a especulação mobiliária, pelo direito de ir e ver etc. A luta de classes também é espacial.

3.  Matéria

Hoje pela mediação do dinheiro, há uma luta distributiva de valores de uso e uma luta entre lucro e salário.

 

     A questão nunca foi colocada de tal modo até aqui. Tais lutas têm algo de comum com a luta biológica entre espécies e membros da mesma, mas em nível superior; de qualquer modo, demonstra que a luta de classes é uma barbárie, a divisão dos homens em classe é animalesco, até a greve é algo bárbaro, embora aponte para a civilização.

 

 

METAFÍSICA E SETORES DA ECONOMIA          

Como a questão das classes, os setores produtivos também podem ser classificados segundo os conceitos da identidade dos diversos. Vejamos:

 

1.  Movimento

Aqui, em principal o setor de transportes. Marx afirma no livro II de sua grande obra que o transporte é parte do capital produtivo e industrial, mesmo sendo algo externo. O transporte de mercadorias oferece valor novo a estas.

2.  Energia

Por energia, incluímos também a cesta básica do trabalhador e tudo o que ele precisa comprar para manter-se, sobreviver.

3.  Tempo

As máquinas economizam tempo ou o otimizam.

4.  Espaço

Destaca-se a construção civil.

5.  Matéria

Da matéria-prima aos produtos de luxo e finais estão incluídos.

 

Tal modo de expor mantém em pé os departamentos de produção de Marx. Sua formulação é completamente correta, embora possamos pensar outro modo de classificação móvel.  Marx pensou mais em questão de valor, a riqueza no capitalismo, enquanto pensamos mais em questão de valor de uso, a riqueza social geral.

 

 

O COSMO, O SER

 

É necessário uma concepção geral de mundo, do Ser. Como diz Aristóteles, o Ser se diz de vários modos: Ser (tudo) é energia em busca de mais energia ou mais de si, Ser é espaço condensado (concentrado, formas de espaço), Ser é espaço-matéria, Ser é trabalho, Ser é produção, Ser é histórico em desenvolvimento e geográfico, Ser é totalidade integrada em automovimento contraditório. De modo geral: movimento = energia = tempo = espaço = matéria (= luz = campo = massa), (no nível físico, há em principal identidade sobre a unidade dos diversos; nos níveis acima, ganha algum relevo, ainda subordinado, a unidade dos diversos). Se tudo é igual a tudo, logo tudo é um, ainda sendo também diverso dentro de si.

 

1.  Ser (tudo) é energia em busca de mais energia ou mais de si.

O senso comum orientalista diz que tudo é energia. Tendo algum fundamento, o mais correto é afirma que é energia em busca de mais de si. Um corpo com energia-massa atrai outros para si com a curvatura do espaço. Muitos animais começam a reprodução na primavera, quando aumenta a incidência de luz solar. É muito claro que a vida singular é energia em busca de mais energia; isso foi considerado no homem enquanto animal e enquanto indivíduo – mas também vale para a história de toda a sociedade. Assim, somos ainda a civilização nível zero, ou melhor, 0,75, na escala de Kardashev, porque sequer dominamos a energia no nosso planeta.

A ciência primeiro descobriu formas de energia, depois as unificou com o conceito apropriado. Os físicos e químicos dizem que a energia não existe, apenas um conceito útil; mas o conceito necessário é, também, real. Contra o empirismo, há a energia, em geral, que podemos deduzir de suas formas aparentes.

Graças a Einstein podemos deduzir que o Ser, o cosmos, tem por pulsão ser energia em busca de mais de si mesma, algo difícil de descobrir na cosmologia. Já o que energia, no fundo, de fato é, sua verdade, será exposto no próximo ponto.

Para paladares marxistas, afirmamos que energia em busca de mais de si revela-se no capitalismo como valor em busca de mais valor, dinheiro em busca de mais dinheiro.

 

2.  Ser é espaço condensado (concentrado, formas de espaço).

O mais simples no universo, o mais sem determinações e qualidades, o mais abstrato – o espaço. Ele é o primeiro lógica e ontologicamente, além de talvez no tempo. O espaço é a transparência transparente e, ao mesmo tempo, com as maiores características como infinito (debateremos qual infinito), o puro, o indivisível etc. O átomo é o maior, o espaço, não o menor. Além disso, energia é espaço. Curioso que uma xícara, o café nela, o bebedor da substância etc. são todos espaço condensado, concentrado, para dentro de si.

 

3.  Ser é espaço-matéria.

Espaço e matéria são vistos como diferentes e opostos. Este é ativo; aquele, passivo. Mas isso está prestes a mudar: matéria é espaço, embora não seja; espaço é matéria, embora não seja. A união de ambos permite o movimento. A matéria, ou a luz, decai em espaço; e este tem propriedades semelhantes à matéria, como a ter energia.

 

4.  Ser é trabalho e produção.

Lukács em sua metafísica disfarçada apenas de ontologia, certa matéria interna àquela, diz que o diferencial do homem é o trabalho, a categoria fundante do ser social, mais do que biológico. Mas é necessário generalizar, pois há trabalho no reino da vida e da não vida. Os animais necessitam de um esforço coordenado para adquirir mais-energia do que o gasto na sua aquisição (caça etc.). As células produzem mais-energia do que exigido para produzi-la. Uma estrela, como o Sol, funde átomos por meio da gravidade, produzindo elementos mais pesados, perdendo energia no processo. Temos a entropia e energia enquanto “capacidade de trabalho”.

Em sua metafísica, Aristóteles toma o artesão, tão comum em sua sociedade, enquanto modelo para suas conclusões. Assim, alcança as quatro causas e a ideia do primeiro motor, o artesão que move o mundo. Influenciado pela forte propaganda pela disciplina do trabalho no socialismo “real”, Lukács faz algo semelhante em sua metafísica ao colocar o trabalho como a categoria fundante do complexo ser social. Por as duas concepções serem mecânicas, são limitadas também, erradas e certas, não orgânicas. Ambos generalizaram de modo parcial ou de modo equivocado. De qualquer maneira, o trabalho-produção é algo próprio de todo o Ser, para além do trabalho humano social. Veremos que, por exemplo, também ambos confundem, por exemplo, teleologia orgânica com o modelo mecanicista do trabalho humano.

Até a psicologia afirma o trabalho, além de as demais formas do Ser. Nada fazer gera angústia, logo o sujeito encontra uma tarefa, uma distração, um hábito, um problema (nem que seja no pensamento). A inércia, no sentido comum, torna-se negativo como expressão da necessidade de trabalho, no sentido amplo. Somos seres ativos.

Façamos, agora, em complemento, uma digressão sobre o ouro, o dinheiro por excelência. Ele tem altíssimo valor porque para tê-lo exige-se muito trabalho humano e muito tempo de trabalho. Ora, o ouro exige muito trabalho por ser relativamente raro, pois exige muito também trabalho-energia-tempo para o processo estelar criá-lo, produzi-lo.

 

5.  Ser é histórico em desenvolvimento e geográfico.

Entre as mais importantes bases científicas jamais criadas é a descoberta de que tudo é feito de história, em processo e desenvolvimento. Mas os fatos e o evolver nunca ocorrem no completo vácuo, por isso o cenário importa. O ambiente, o lugar, o espaço etc. também tem dinâmica, movimento e história.

 

6.  Ser é totalidade integrada em automovimento contraditório.

Ser é totalidade; este, em movimento, não apenas repetitivo, circular, pois também como se uma espiral e um evolver. Ademais, tudo está cheio de contradição; equilibra-se nesse paradoxo real, concreto.

No fundo, no fundamento, o Ser é integração (auto)relacionada em processo.

 

 

 

 

 

AS LEIS GERAIS DA METAFÍSICA MATERIALISTA

 

Uma vez surgido, quais as leis gerais do universo? Com nosso alto conhecimento do mundo, temos condição de abstrair leis íntimas, validas paras as três modalidades do Ser – inorgânico, biológico e social.

Há três leis gerais do Ser:

I.  Toma-se como energia em busca de mais de si, de mais energia.

Isso considerado o espaço-matéria; este em sentido amplo, como centro. No social, vale a seguinte máxima: não se faz civilização plantando alfaces. Nesse sentido, até o café e o açúcar do Brasil e a batata americana cumpriram papéis importantes no avanço da humanidade (vale destacar que as flores usam açúcar e cafeína para atrair abelhas, que trabalham assim mais intensamente). Os senhores de escravos brasileiros davam feijão aos escravizados para que tivessem energia de trabalho.

Bem observado, esta é a lei primeira.

 

II. Ir-se do simples ao complexo.

Hegel e Engels demonstram que o simples é tanto simples quanto complexo, como uma célula viva, A=A e não-A. Ora, também, ao mesmo tempo, vai-se do simples ao complexo, A=A e… não-A, como do ente unicelular para um pluricelular. Tal é movimento geral, lembrando, no entanto, que a entropia, se considerado como universal, não é medida de desordem, uma confusão comum.

 

III.           Encaminha-se à interconexão universal, à maior interconexão.

Tanto Hegel quanto, séculos depois, Mario Bunge afirmaram que toda a realidade é um sistema orgânico, em que as partes apenas têm sentido em suas relações, integrados – exceção, dizem ambos, no aspecto físico ou no mecanismo. Para eles, a partir do aspecto químico já há conexão sistemática. Se assim é, vai-se da desconexão rumo à interconexão universal. Mesmo assim, mesmo isso sendo aprofundado com o aumento da complexidade do Ser, fruto da energia em busca de mais de si, talvez o mundo físico puro tenha uma conexão interna oculta e “leve”, com as partes independentes entre si apenas de modo aparencial – ou, ainda, isso se desenvolve como evolver cósmico. Vejamos: se tudo é espaço condensado, já há uma ligação íntima, embora indireta; se as partículas fundamentais, ou quase todas, não rompem com espaço, logo tudo está conectado via espaço enquanto entidade geral.

Os átomos individuais são instáveis por suas energias e matérias, logo necessitam fazer ligações químicas com outros. Compostos cada vez mais complexos surgem até fundar-se a vida. Esta integra-se e desenvolve-se até fundar o ser social, a humanidade, que tende a unificar-se. Na física, a gravidade toma tal tarefa para si.

O erro dos marxistas que intuíram a conexão global de tudo é não ver isso como lei de movimento, como processo, como evolver. A coisa já seria dada e fixa.

 

Os três aspectos – as três leis do movimento – estão mais do que ao lado um do outro ou juntos, pois um está dentro dos demais, derivando-os. A energia em busca de mais de si faz o material cada vez mais complexo que exige novas interdependências, interconexões.

As três leis são, no nosso universo, absolutas, mas seus entes falham muitas vezes em cumprir tais metas; logo o absoluto é também relativo.

O Ser, a matéria, tem três modalidades internas, cada uma mais complexa do que a outra anterior – inorgânico, orgânico ou vida (biologia) e social ou humano. Os mais avançados são dependentes do nível ontológico precedente, como a biologia depende da não vida. O inorgânico, o pôr do outro, tem como suas as três leis gerais acima postas e expostas; o biológico, o pôr do mesmo, tem leis específicas ditas abaixo, em seguida; e Lukács sistematizou as da sociedade, o pôr do novo, como demonstramos. Em síntese, tornar-se assim as leis de movimento:

O inorgânico e o Ser em geral:

 

1.  Energia em busca de mais energia;

2.  Do simples ao complexo;

3.  Ruma-se para maior interconexão.

 

O alto desenvolvimento deste, de tais leis materiais, leva ao salto para a vida. Na biologia, em específico:

 

1.  Processo de diversificação das espécies;

2.  Afastamento das barreiras do inorgânico;

3.  Cada vez mais capaz de lidar com externo.

 

A segunda lei de desenvolvimento foi já descoberta por Lukács enquanto as demais estão de alguma forma ou de outra existentes desde Darwin. O alto evolver da vida leva ao salto para o ser social. Em resumo, uma vez mais, no homem:

 

1.  Produtividade crescente;

2.  Afastamento das barreiras naturais;

3.  Tendência à unificação global como espécie.

 

O alto desenvolvimento do inorgânico realiza-se em parte e tendencialmente no biológico; em relação ao inorgânico, o biológico é ativo como energia em busca de mais energia, enquanto aquele é, de modo relativo, passivo. O biológico realiza-se em parte e tendencialmente no social, pois este é mais capaz de lidar com o ambiente e com o externo.

Tais aspectos gerais do Ser ligam-se bem com os três aspectos gerais do ser social em Lukács; as leis da humanidade são: 1) produtividade crescente – energia em busca de mais de si; 2) afastamento das barreiras naturais – do simples ao complexo; 3) unificação da espécie global – aumento das interconexões. Ou, outro aspecto: 1) produção, trabalho – energia em busca de mais de si; 2) sociabilidade – do simples ao complexo; 3) linguagem – interconexão. A ontologia de Lukács está, portanto, subordinada, em sentido positivo, à nossa ontologia geral e metafísica. Suprassumimos – suprimimos, elevamos e conservamos – o lukacsianismo, elevamos a teoria a um nível superior.

Vejamos agora a ontologia geral, e do inorgânico, e sua expressão no biológico. A energia em busca de mais de si relaciona-se com a capacidade cada vez maior dos seres vivos de lidar com o externo, como passar a controlar a própria temperatura, obter novas habilidades de caça etc. O caminho do simples ao complexo ocorre por meio do aumento de diversificação das espécies, por exemplo. O aumento da interconexão é revelado na lei descoberta por Lukács, o afastamento das barreiras do inorgânico, como animais que se alimentam de outros animais, estes herbívoros, que por sua vez se alimentam de plantas, estas últimas mais próximas e ligadas à inorganicidade. Claro é que expomos de modo simples e quase esquemático; vejamos um exemplo menos abstrato; o olho surgiu de modo independente por 6 vezes, talvez mais, na história da vida, pois era necessário que surgisse algo do tipo no desenvolvimento e na diversificação das espécies; isso é energia em busca de mais de si, ou, no concreto, maior capacidade de lidar com o externo; mas também é uma forma de aumentar as ligações, interconexões.

No mais: energia é o abstrato; complexo, o concreto; conexão, o processo. O abstrato é o concreto em processo – como energia no complexo em conexão (crescente). Mais à frente desenvolveremos tais aspectos.

 

 

 

 

 

 

O SER E O SOCIALISMO

 

O socialismo é a realização do Ser social e uma do Ser em geral. Para haver sociedade livre e igualitária, fraterna, são necessárias algumas condições maduras ou em possibilidade latente. São elas: 1) energia em busca de mais energia, ou seja, produtividade altíssima, com a superprodução crônica latente, energias de fissão e fusão nucleares etc.; 2) interconexões crescentes, ou seja, internet e mercados globais, união da produção mundial via sistema financeiro (e a interdependência enorme entre os bancos), por exemplo; 3) complexidade elevada, ou seja, hiperinflação da urbanidade e dos serviços etc. As concepções limitadas, embora corretas, de Lukács – trabalho, linguagem e sociabilidade; produtividade crescente, tendência à unidade global da espécie humana e afastamento das barreiras naturais – não permitem ainda ver com clareza o que expomos aqui.

Tais elementos demonstram de modo claro e simples que o socialismo era impraticável de modo completo e correto antes do século XXI. Foi necessário um comércio saturado em todo o globo terrestre, comunicação e transportes avançados, supercomputadores, automação-robótica na produção etc.

O socialismo é uma ruptura com a natureza, com o Ser, quando nos tornamos mais sociais, finalmente sociais – com aquilo natural socializado, socialmente adaptado ou modificado. Ao mesmo tempo, no fundo do fundo, o socialismo é uma afirmação da natureza, do Ser. O homem realiza as leis naturais de movimento, realiza-se. Teremos uma sociedade correspondente coma natureza humana, que a respeita – a humanização dos seres humanos antes coisificados, sequer animalizados, pois nega-se até a condição animal do homem sob a sociedade de classes.

Como espécie capaz de ser o modo como o cosmo compreender a si próprio, o universo estudando-se, dominando-se, desenvolvendo-se; o homem também assim, com a última revolução científica unida à ultima revolução social-política, tornar-se-á outro modo de realização tendencial do Ser. No princípio, era a religiosidade, o misticismo das lendas e mitos, o modo de ver o mundo em sua inteireza e causa – um modo primitivo de ver típico de uma sociabilidade primitiva. Na sociedade avançada, teremos um modo avançado, uma visão de mundo definitiva.

 

 

 

 

O SER E A NATUREZA HUMANA

 

Em outro momento, abaixo, debatemos qual a natureza natural-histórica humana. Em resumo, são estas características, determinações: 1) ser integrado, grupal, logo, o simples (indivíduo) no complexo (comunidade); 2) ser mutualista, logo, interconexões crescentes; 3) ser ativo, afirmador de si, trabalhador etc., logo, energia em busca de mais energia.

O inorgânico é ser em si; o biológico, para si; o social, para outro. Mais profundo: o inorgânico, em si; o biológico, em si e para si; o social, em si, para si e para outro. O “para outro” significa também: 1) que ele se faz na experiência, de algo alguém para outro alguém; 2) que é reconhecido pelo outro, 2) que é solidário potencialmente ao outro. Em si, ser integrado; para si, ser ativo; para outro, ser mutualista.

***

Em O Capital I, Marx toma nota:

 

Aplicado ao homem, isso significa que, se quiséssemos julgar segundo o princípio da utilidade todas as ações, movimentos, relações etc. do homem, teríamos de nos ocupar primeiramente da natureza humana em geral e, em seguida, da natureza humana historicamente modificada em cada época. Bentham não tem tempo para essas inutilidades. (Marx, O capital I, 2013, p. 685)

 

O mouro faz uma crítica e aponta o procedimento metodológico. No entanto, os marxistas

 

1)         Confundem natureza humana com personalidade;

2)         Confundem natureza humana com moral;

3)         Enfim, confundem “natureza humana em geral” com “natureza humana historicamente modificada em cada época”.

 

O primeiro passo para avançarmos dar-se por meio da teoria marxista da alienação. Em resumo, alienação é

 

1)         Fragmentação do homem, seu afastamento de relações plenas com a comunidade;

2)         Domínio do homem sobre o homem, a coisificação do semelhante (machismo, classes sociais, homofobia, xenofobia etc.);

3)         Exclusão do homem de sua criatividade, capacidade singular da espécie, de imaginar e colocar em prática de modo ativo.

 

Ou seja:

 

1)         Separação do homem da sociedade a qual integra;

2)         Separação do homem dos iguais, dos outros homens;

3)         Separação do homem de si próprio.[2]

 

Em duas sentenças de Marx: a valorização do mundo das coisas em proporção à desvalorização do mundo dos homens; humanização das coisas e coisificação dos homens.

Dada a base, basta-nos rastrear a equação: se há alienação, há algo negado – algo alienado. Invertamos, deduzamos: seria qual a solução da alienação, o inverso?

 

1)         Integração dos homens;

2)         Relações mutualistas;

3)         Ser ativo.

 

Estamos diante da essência biossocial. E esta descoberta tem implicações sobre todas as ciências humanas, além da psicologia.

Qual, portanto, a origem da natureza humana? Dos primatas que desceram das árvores nas savanas[3] até o homo sapiens sapiens ocorreu um longuíssimo período de formação da nossa espécie por meio da seleção dos mais aptos à sobrevivência. Aqueles cujo perfil facilitava a prática do que hoje é essência humana adquiriam probabilidade maior de sobrevivência, perpetuavam-se[4]. Por isso, por história da humanidade devemos considerar, também, a história da formação da nossa própria espécie, isto é, a importância da biologia na formação do pensamento marxista. Resolvemos, então, a oposição sobre se a essência é histórica ou natural. Assim, superamos o falso “historicismo” e a tese pós-moderna de que tudo é – limita-se à – construção social[5]. É a formação do homem como formação do próprio homem, do orgânico ao social[6].

Em elaboração geral, a alienação ocorre quando o mundo gerado pelo homem ganha autonomia frente a este e volta-se contra ele – a criatura passa a dominar o criador. É preciso, pois, ver a alienação como um fenômeno subjetivo, objetivo e intersubjetivo, assim como a natureza humana – interno e externo ao indivíduo. Tem sua existência na totalidade social e na psique. Destacamos aqui a psicologia por ser esta a questão que esta ciência faltou resolver, a natureza humana, seja por ideologia ou por pouco interesse pela filosofia marxista na ciência oficial.

No entanto, curioso o espanto causado por esta exposição entre marxistas. Ficamos diante das observações: se a natureza é apenas histórica no sentido dos modos de produção, o homem é de fato adaptável – logo a alienação social não explicaria a onda de depressão e suicídio? Se explica, há algo de fato negado. Se o homem é, em essência, apenas o determinado pelo modo de produção, adaptar-se-ia às condições dadas sem maiores prejuízos, senão físicos, pelo menos psíquicos. Por isso, uma resposta própria do marxismo percebe contradição entre natureza humana historicamente modificada em cada época e natureza humana em geral. Entre as tarefas dos homens e mulheres no e rumo ao socialismo será resolver este problema objetivo.[7]

Mário Bunge, o menos limitado dos filósofos oficiais da atualidade, socialista utópico que nada compreendeu do método de Marx, assim expressa, de modo correto:

 

Estamos vivendo a década do cérebro. Avança-se bastante, mas também ignora-se bastante. Não sabemos exatamente quais são as partes do cérebro conscientes de si mesmas; mas acaba-se de descobrir que dar traz muito mais prazer que receber, e que é o mesmo tipo de prazer que sentimos ao comer algo saboroso. Descobriu-se também, que a desigualdade é muito mais nociva que a pobreza. A desigualdade causa stress e este, por sua vez, acarreta em uma superprodução de substâncias nocivas que destroem o cérebro. Nos países mais igualitários, as pessoas são mais longevas. Os costarriquenhos e os cubanos vivem muito mais que os norte-americanos. Ganham muitíssimo menos, são muito mais pobres, mas vivem mais porque são mais igualitários. (Bunge, 2014)

 

Complementamos que, socialmente, o altruísmo, não significando necessariamente desprazer, pode ter na outra ponta da relação um impulso egoísta de quem recebe a ação. Por isso mais correto é o estabelecimento do mutualismo, que supera os opostos, como expressão categorial da essência humana[8].

Vejamos o que diz Mèszáros:

 

Termos como malevolência, egoísmo, maldade etc. Não podem existir sozinhos, ou seja, sem a contrapartida positiva. Mas isso também se aplica aos termos positivos desses pares opostos. Desse modo, não importa qual o lado adotado por um determinado filósofo moral em sua definição de natureza humana como inerentemente egoísta ou maldosa, ou altruísta e bondosa: ele acabará necessariamente com um sistema totalmente dualista de filosofia. Não se pode evitar isso sem negar que ambos os lados desses opostos são inerentes à própria natureza humana. (Mészáros, A teoria da alienação em Marx, 2006, p. 151)

 

Ele Critica o kantismo, porém continua preso à dialética kantista. Deve-se ver a unidade superante dos opostos, além do desenvolver lógico e histórico das categorias. O nem positivo nem negativo passa para o positivo e negativo, que são superados em um novo nem negativo nem positivo. Assim, a negação prática da natureza humana levou a formar uma oposição entre egoísmo e altruísmo, superada – suprassumida – pelo mutualismo.

Se o caráter comunitário, por exemplo, é natural entre nossos primos evolutivos, ele salta de natural para social na espécie humana. Tal mudança qualitativa de natureza é incompreendida. O aspecto natural da espécie não é destruída mas suprassumida numa nova natureza, a natureza humana[9]. É mais do que o comunitário natural, sendo elevado, mais dinâmico e complexo, ao social por meio do trabalho.

Se abstraímos as origens físicas, parte significativa das doenças mentais possui origem na alienação, ou melhor, na não satisfação da natureza humana. A solidão excessiva, por exemplo, degenera e pode acarretar problemas como a paranoia, que expressa a necessidade de interação. Essa observação simples demonstra a inerência de certas características. Viver agrupado é mais do que uma vantagem evolutiva externa, pois está instalada no aparelho psíquico como necessidade, como exigência a ser satisfeita. O trabalho alienado, repetitivo e vazio de sentido, negação do caráter ativo do homem, é outro exemplo de insatisfação, que estressa o trabalhador.

A teoria unificada da psicologia é uma tarefa por se fazer, no entanto muitos marxistas recuam. Não contradição na relação entre as naturezas humanas geral e histórica é o que se pode concluir de modo equivocado. É tarefa socialista desenvolver, na medida em que sua base material amadurece, uma nova relação, ainda dinâmica, entre natureza humana e sociedade e entre natureza humana e a superestrutura subjetiva (moral, concepções, etc.)

À concepção neoliberal de natureza humana – individualista, concorrencial e otimizador de bens – opomos outra, esta sim assentada na mais avançada apreensão científica de nossa época, corroborada pelas descobertas da ciência[10]. A concepção burguesa, sempre requentada, corresponde à imposição do mundo das coisas sobre a psique, tem caráter empírico mas naturalizado, não histórico, incorrespondente, também, com a história da formação de nossa espécie. Trata-se de diferenciar o conjuntural do estrutural e de expor a contradição que daí deriva.

Por seu lado, o falso “historicismo” foi uma forma incompleta mas muito eficiente ao afirmar o homem, o caráter social da espécie. O enfrentamento contra o darwinismo social puxou a balança para o lado oposto. Agora devemos limpar caminho contra o determinismo genético por outro meio: considerando o natural, o social e o “um no outro” entre os humanos. As condições históricas, científicas e ideológicas permitem o avanço. Supera-se a unilateralidade da observação focada exclusivamente num ou noutro polo, sendo o polo determinante o social.

Apoiados na categoria trabalho como categoria fundante do homem, podemos enfim superar a obra de Freud, que tem resistido bem até aqui às duras críticas e elaborações alternativas. A psicanálise, por não ter uma concepção própria de natureza humana, acaba cedendo à visão oficial, o homem enquanto lobo do homem. Todas as versões críticas anteriores sucumbiram e tomaram posição inferior no trato sobre a psique porque falharam onde também a concepção freudiana falhou. Não mais se trata de atualizar mas de ir além, suprassumir o legado psicanalista[11].

***

Vale o alerta para evitar confusões. A base de nossa psicologia marxista, acima, nada tem de derivação desde os princípios gerais, as três leis da matéria. Primeiro, na pesquisa, as conclusões deram-se de modo separado e independente – apenas depois apareceu o nexo interno de tais elaborações. O modo de exposição, por outro lado, faz soar como se a exposição lógica e a própria lógica fosse outra. Os princípio legais são resultado, não começo real na teoria – embora começo real na realidade.

 

 

O SER E A DIALÉTICA

 

Em outro momento, iremos debater as três categorias centrais da dialética, que aqui expomos de modo direto. Assim: 1) totalidade é integração, portanto o complexo; 2) o que está “por debaixo” da contradição e da cooperação, opostos, é a relação, portanto interconexões crescentes; 3) o movimento e o automovimento apontam para o espaço-matéria, portanto a energia em busca de mais de si.

Lukács reclama de Hegel por este unificar ontologia (metafísica) e dialética, a lógica. Fez-se, portanto, uma lógica ontológica ou ontologia lógica. Ora, uma lógica correta deve corresponder à realidade, ao Ser e à essência. Nem mais nem menos. As categorias de todo o Ser têm um desenvolvimento, uma razão de ser e um modo de acessá-lo. O mundo não é puro caos, pois ele é categorial. O erro seria separar a questão do Ser de sua logicidade, como mundos especializados e separados.

Hegel, assim, desceu a lógica ao chão. Cabe ao cientista e ao filósofo absorver a lógica do concreto, do Ser. Além disso, descobrir e desenvolver novas categorias, leis e relações categoriais, o que faremos em outro capítulo de modo o mais completo e definitivo possível.

Toda tentativa de tomar o Ser sem concretude, como o nada, parando aí, fracassa por não ver que a coisa-em-si pura, sem suas propriedade, nada é – apenas existe com suas propriedades mesmas.

O Ser, ademais, apensas pode ser corretamente compreendido dialeticamente, por exemplo, em seu movimento, em seu desenvolvimento, em seu avançar contraditório. Em sua riqueza de determinações sintetizadas. Ser é totalidade contraditória em movimento. Mas reconhecer a movimentabilidade é limitada, pois ela pode ser tratada como ilusão, como apenas caos, como sem rumo e direção, como o mero permanecer ou meroacontecer, como desenvolvimento limpo e linear rumo ao progresso, como evolução sem revolução ou sem saltos de qualidade etc.

Em sua Dialética da natureza, Hegel apresenta uma carta a Marx pedindo segredo temporário de uma descoberta: a física e a química tratam do movimento da matéria; a biologia, do movimento da vida; o marxismo, do movimento social. Claro é, como ambos são hegelianos, que se trata de um movimento contraditório em desenvolvimento de totalidades dinâmicas.  Tudo é história, não cansamos de repetir: o passado é a causa do presente, vai-se do simples ao complexo, os processo macros são irreversíveis.

 



O “OUTRO LADO” METAFÍSICO

 

Parmênides dividiu o mundo em Ser permanente, perceptível apenas à razão, e não-Ser móvel, empírico; depois, Platão separou o mundo entre o mundo da Ideia, das Formas, e o mundo sensível, impermanente; em seguida, Agostinho separa a cidade de Deus, fixa, e o mundo instável, a cidade dos homens. Apenas separam, sem unidade, ao modo idealista. Nossa metafísica científica vê um colateral, um aspecto dentro do próprio mundo, necessário se observamos o infinito (similar a um círculo sem começo nem fim) no finito universo, a origem do movimento e do tempo, o valor real invisível na economia e a energia em geral abaixo de suas formas particulares – chegamos à quarta dimensão, não empírica, do espaço, dimensão para dentro, para dentro de si. Assim, o “outro lado” típico do idealismo é, de fato, um outro lado, a quarta dimensão espacial, responsável pela energia, pelo tempo e pela infinitude. A teoria moderna exige e até intui a dimensão extra, perceptível pelo trabalho teórico-filosófico. Talvez uma causa do movimento eterno seja que a matéria, que aparenta possuir três dimensões, cai o “tempo” todo na quarta dimensão como em si mesma, assim como a Lua está caindo sempre na Terra por sua energia-massa-gravidade. Resolve-se o metafísico problema do movimento e sua origem. Até aqui, a existência do “outro lado”, em duplo sentido, sempre foi uma proposta do idealismo, não do então passivo materialismo.

Um dos momentos que facilitaram tal dedução, a quarta dimensão “espacial”, ocorreu ao ler O Capital livro I, pois, após afirmar que podemos virar e desvirar a mercadoria, mas nenhum átomo de valor encontraremos nela, Marx afirma: “O valor do ferro, do linho, do trigo etc., apesar de invisível, existe nessas próprias coisas...” (Marx, O capital I, 2013, p. 170) Eis uma pista metafísica, ao mesmo tempo sensível e suprassensível, como afirma o próprio alemão.

A causa primeira do movimento é este eterno cair em si mesmo como na quarta dimensão, o vazio infinito (a quarta dimensão do espaço é representada, incluso na geometria, por números imaginários, como a raiz de menos um. Tal número imaginário aparece aqui e ali nas equações, como na de geometria, substituída pelo tempo por Einstein, e na equação de Schrödinger – mas eles tratam tal presença como algo incômodo, um problema apenas, limitado ao formalismo matemático.). A ciência moderna desde Galileu pensou o movimento como fato dado, sem maiores explicações, como algo que simplesmente é, foi e será – de fato, o estado natural é o movimento, não o repouso, diferente do que pensava Aristóteles. Pousar-se é dissolver-se, desabar-se, diluir-se; desmanchar-se no ar. Ao evitar as perguntas metafísicas, caíram em outra metafísica. Neste ensaio, buscamos unificar as visões metafísicas, suprassumindo-as como unindo as categorias da metafísica antiga (substância, conteúdo etc.) com a moderna (massa, matéria, energia etc.), o que inclui o papel do espaço.

A divisão metafísica de mundos na filosofia está lastreada na divisão social de classes. De fato, o capitalismo está dividido em dois mundos, dos ricos e dos pobres. Na geopolítica, fala-se em primeiro e terceiro mundos. Na filosofia antiga, quanto à psicologia, o senhor de escravo filósofo pouco se movimentava, pouco trabalhava, pouco agia; logo,  por falta de prática, de ação, de contato, de matéria – duvidava do estatuto real do real.

 

METAFÍSICA OU DIALÉTICA?

Engels contrapõe a dialética à metafísica. Para ele, aquele foca no movimento e este no estático; aquele vê o processo enquanto este a coisa. Mas a metafísica de Aristóteles quer saber a origem e a natureza do movimento. Ora, a dialética é o exato oposto da metafísica, mas os opostos têm uma identidade interna, logo são também o mesmo; identidade da identidade e da não identidade. Por outro ângulo, elas são iguais porque possuem os mesmos objetos de estudo – o mundo, o Ser e as suas categorias.

Metafísica é ir além, ou por debaixo, da física, das formas, ver o essencial da existência. Associar tal matéria à religião é crítica vulgar do iluminismo ao mundo medieval. De qualquer modo, devemos saber a natureza do movimento, algo ainda não respondido dentro dos limites da ciência.

Temos, aqui, a metafísica científica, projeto abandonado por Kant. Evitar a metafísica é ceder lugar ao atraso religioso, que deseja ser a única visão geral de mundo. Engels, um dos maiores gênios da humanidade, cedeu, sem perceber, ao kantismo, contra a dialética, ao negar a metafísica materialista, dialética e objetiva.

 

 

 

 

O ABSTRATO É O CONCRETO EM PROCESSO

 

A investigação do movimento continua para reforçarmos nossas teses. A equação categorial, ou qualitativa, acima, diz que o abstrato é o concreto em processo, em movimento, em evolver, em devir. Na metafísica, o abstrato domina o concreto. Aqui, isso é revelado pelo fator de igualdade e conversão, o movimento. O concreto cai no abstrato, movimentando-se, como na quarta dimensão, como queda em si próprio.

Tal fórmula tem expressões mais diretas, em nível abaixo, como F=ma, força é igual à massa vezes a sua aceleração, ou, também, E=mc2, energia é igual à massa vezes a velocidade da luz ao quadrado. Nos dois casos o movimento, para nós, tem importância ainda maior do que dada pelos físicos, nada tem de passivo. Pois a “força” e a energia, típicas da quarta dimensão, em reação ao concreto, como a massa-espaço, dão origem ao movimento. Na quântica, temos E=hv, energia do fóton é igual à constante de Planck vezes a frequência da onda. O cálculo clássico v=s/T pode ser expresso como T=s/v, tempo é igual ao espaço sobre a velocidade. O momento linear é igual à massa vezes a sua velocidade, p=mv. Até no cálculo de Einstein da massa relativística, que a massa ganha mais massa com o aumento da velocidade, tem a sombra de nossa fórmula, com o movimento na divisão como denominador:

 


Os exemplos são muitos. Assim, demonstram tais casos, o abstrato, além de igual ao concreto, também é equivalente ao processo; pois, por exemplo, o decaimento de átomos gera partículas com massa (concreto) menor já que esta se tornou energia (abstrato) em forma de maior velocidade (processo) – vemos aí também que movimento = energia = massa-matéria etc.

A quarta dimensão espacial, por ser a casa do infinito, não tem borda, limite, fronteira ou outro. Está, assim, ao mesmo tempo dentro e fora desta realidade. Eis a falha dos filósofos gregos ao saberem a origem do real e do seu movimento.

Quando Hegel diz que o movimento é a unidade de espaço e tempo, deixa de perceber que o tempo é o outro de si do espaço, a manifestação da quarta dimensão espacial.

No processo caótico da pesquisa e do estudo, algo próprio do método dialético, que não tem passo a passo, lidei com os vários fatores singulares, como as equações acima, até que, por “acaso” tive a “sacada” ou insight quando reli um trecho de Marx em O Capital, livro 2. Ei-lo:

 

O capital, como valor que acresce, implica relações de classe, determinado caráter social que se baseia na existência do trabalho assalariado. Mas, além disso, é movimento, processo com diferentes estádios, o qual abrange três formas diferentes do processo cíclico. Só pode ser apreendido como movimento, e não como algo estático. Aqueles que acham que atribuir ao valor existência independente é mera abstração esquecem que o movimento do capital industrial é essa abstração como realidade operante (in actu). (Marx, O Capital - livro 2, 2014, pp. 119, 120)

 

O valor (abstrato) é o capital (concreto) em movimento (processo); ou melhor, o capital, que não é coisa, abstrato, é o valor, que é material, concreto, em processo, ou seja, valor “que valoriza a si mesmo” (processo). Assim, pretendo convencer os marxistas da veracidade desta ideia – de seu ortodoxismo, além do seu valor para todo o Ser – e do conjunto de nossa metafísica marxiana.

Vale como nota notar que a mente, o ideal, a ideia ou a consciência (abstratos) não são coisas, pois são, na verdade, resultado do cerebral e do meio (concretos) em atividade (processos). É a busca do permanente, querer a repetição, na mudança[12].

O nada (abstrato) é o Ser (concreto) no devir (processo), por exemplo. Em nossa metafísica o espaço (abstrato) é a matéria (concreto) em movimento, em decaimento, em dissolução de si (processo). A quarta dimensão, vazio infinito, (abstrato) é o espaço (concreto) gerando movimento (processo).

Na dialética, a verdade (abstrato) é o todo contraditório (concreto) em evolver (processo).

Uso os vários sentidos de abstrato, de concreto e de processo. Mas duas observações precisam ser feitas. Primeiro, para Hegel, a verdade é o todo, logo uma fórmula do tipo “isto é aquilo”, torna-se algo limitado, verdadeiro e falso. Mas, aqui, ainda respeitando o limite hegeliano, dizemos “isto é aquilo no processo”, de maneira superior. Por isso, ainda assim, não usamos a equação qualitativa como chave fácil para todos os detalhes da grande obra marxista. Segundo, ainda para Hegel, uma equação particular, como a da gravitação, não pode ser elevada à teoria de tudo, à teoria geral, universal – exato por ser particular, estar ao lado de outras leis, equações etc. Mas as categorias que usamos – abstrato, “é”, concreto, processo – têm tendências gerais.

Por fim, mais um exemplo: massa (abstrato, propriedade) é energia (concreto) em forma de movimento (processo) – como a massa do próton ser suas partículas internas em agitação.

As três leis da metafísica materialista, já tratadas:

 

 

ABSTRATO (geral) –

CONCRETO

PROCESSO

Ser

Energia

Em busca de mais de si

Ser

Do simples ao concreto

Ir-se

Ser

Interconexões

Crescentes

 

O mesmo vale para outros modos de ser do Ser:

 

Ser

Espaço

Condensado, por

Ser

Totalidade contraditória

Em devir

Ser

Geográfico

E histórico

Ser

Espaço-matéria

Cuja unidade produz movimento

Ser

Matéria

Sob trabalho e produção

Ser

Matéria

Formada, formatada

Ser

Realidade

Em desenvolvimento contraditório

Ser

Infinito

Que se expressa no tempo

Ser

Finito

Posto pelo infinito

Ser

Ordem

Dinâmica, em processo, dotada de caos

 

            A descoberta das equações qualitativas demonstra-se muito frutífera. Em outro capítulo trataremos a maior parte das categorias ontológicas nessa formulação. Para tornar simples, basta ver que 10 = 6 nada diz, precisamos de um movimento, de uma operação combinatória, 10 = 6 + 4. O ato de somar é movimento e processo, em que o resultado é o abstrato do concreto. Aqui, fomos ao quantitativo de modo direto; o processo não é em exato o número 4, mas sua operação +4, como a multiplicação, a divisão etc. Eis a base de todas as equações, incluso as mais extensas e complexas, pois o abstrato é o concreto em processo.

 

 

 

O ABSOLUTO

 

Aqui, pretendemos fundir os opostos eleatas e jônicos. Hegel, idealista, pensou o absoluto como o Espírito, que sai para fora de si mesmo como natureza; na economia, Marx, materialista, pensou a substância valor. Nós pensamos em energia, ou melhor, no espaço-matéria. Os antigos pensavam do que o mundo é feito como, por exemplo, água ou ar, pois são simples, transparentes e abundantes. O que é mais simples, mais vazio, com menos determinações? Ora, o espaço é isso. E, com a quarta dimensão, ele põe categorias-determinações em si próprio como o da infinitude. Vejamos como o espaço tem os atributos dados a algum Deus:

 

Esta extensão infinita e imóvel (que é percebida tão seguramente na natureza das coisas) não tem só a aparência de algo real (que comentaremos adiante), mas também de algo divino, quando enumeramos os Nomes divinos ou atributos que lhes convém exatamente, os quais darão ainda mais razões para crer que ela, com tantos atributos notáveis, não pode ser nada. Tantos são os que pensam assim, que os Metafísicos a assimilam ao Primeiro Ser: Uno, Simples, Imóvel, Eterno, Completo, Independente, Existente por Si, Subsistente por Si, Incorruptível, Onipresente, Incorpóreo, Aquele que Penetra e Envolve Tudo, Ser por Essência, Ser em Ato, Ato Puro. Pelo menos vinte atributos existem para designar habitualmente a Potência Divina, e todos convêm perfeitamente a esse Lugar infinito interior que demostramos existir na natureza das coisas; sem esquecer que ela, a Potência Divina, é chamada pelos cabalistas de “makom”, ou seja, lugar. (More apud Jammer, Conceitos de espaço, 2009, p. 73)

 

Ele, assim, ESTÁ no MEIO de nós… – E a verdade ESTÁ no MEIO.

Pelo menos em nosso universo; o princípio, o absoluto, a essência não é o primeiro no tempo, mas primeiro ontologicamente, ou seja, a matéria-luz decai em espaço. Tudo é espaço concentrado. O espaço é a transparência transparente. O absoluto, dito de modo hegeliano, é resultado.

O meio é o meio – também. A física moderna diz que a luz enquanto onda precisa de um meio que seria um campo próximo; cada tipo de partícula e matéria com seu próprio campo. Nesta obra, colocamo-nos contra a posição majoritária, pois, como a matéria, a luz e o espaço são o mesmo, sendo ainda diferentes, a luz, por exemplo, se propaga no espaço, não num campo. O chamado campo nada mais é que espaço condensado, a partícula ou a onda faz o campo correspondente e próximo por ser espaço concentrado, para dentro de si.

Bohm, o físico dialético, afirma:

 

Ainda não se pode dizer que tenha sido exaurido o problema de qual meio material, se há algum, transporta o campo eletromagnético. (…) Em vez disso, simplesmente se supôs a existência de campos, sem referência direta à questão de se o éter existia ou não. (…) levado adiante por Einstein e hoje sustentado pela maioria dos físicos (Bohm, 2015, pp. 118, 119)

 

Para Einstein, tudo poderia ser reduzido a campos que permeiam todo o universo. Para nós, tudo é reduzível ao espaço ou espaço-tempo. Quando a ideia de éter enquanto meio caiu, criou-se a gambiarra teórica do campo; mas, se usarmos a velha navalha, o conceito de espaço pode cumprir tal função. Por exemplo: a expansão do espaço leva à expansão da onda de luz, que desvia para o vermelho. O espaço não é barreira para luz, é "transparente", porque a luz é o próprio espaço em movimento, de modo concentrado. O oposto da luz não é a sombra e a escuridão, mas a transparência; porém, logo vemos que são o mesmo, um identidade interna. O meio é o fim.

O abstrato é o concreto em processo – a realidade é a substância em autorrelações. O espaço (abstrato) é as partículas (concretos) em relações. O decaimento dos átomos primordiais produziu o espaço – nesse sentido, lógico, o espaço-substância (abstrato) é-são as partículas-acidentes(s) (concreto) em processo, em decaimento (movimento). A substância espaço é as partículas em (auto)relações, em processo.

 

 

A VITÓRIA DO MATERIALISMO

 

A filosofia grega já se inicia materialista, rompendo como a mitologia enquanto explicação válida. Mas o idealismo de Platão e Aristóteles, com muitos outros como os pitagóricos, tomaram o papel mais ativo e criativo – o idealismo vencia todas as disputas. Platão propôs que os escritos do materialista Demócrito fossem destruídos; logo vemos que a corrente concreta contra a ideal sempre passou por marginalidade como ocorre hoje com o materialismo marxista. Hoje, na física quântica, surgiu a hipótese absurda de que a realidade não em existe por si, mas para nós. Para nossa alegria, tal hipótese não é majoritária.

Em resumo extremo, o idealismo diz que as ideias fazem a realidade, incluindo um mundo das ideias ou um céu místico etc.; o materialismo, ao contrário, diz que a matéria faz a ideia, e esta é uma forma bastante desenvolvida da matéria, ou seja, a cabeça segue o chão que os pés pisam. Para Marx, o campo das ideias, por ser material para ele, não é passivo, pois a criatividade, a decisão, a disputa de consciências também importam.

O início da ciência atual teve de afirmar-se perante a visão de mundo medieval, da Igreja. Para isso, para atender a demanda por novos conhecimentos, formaram-se duas teses de mediação: 1) conhecemos Deus por suas obras, logo conhecer a natureza agrada a Ele (Aquino); 2) o “como” funciona o mundo deve ser interesse da ciência, mas o “porquê” ele assim opera deve ser obra da religião (Belarmino). Para sobreviver e prosperar, os cientistas absorveram como parte de suas personalidades tais resoluções. Por outro lado, muitíssimo mais fácil ver as regularidades, as repetições, o “como” do que o “porquê” tudo é de fato tal como é.

Até o gênio Feynman, no século XX, coloca-se contra a filosofia e a busca da razão de ser das tantas leis descobertas:

 

Outra coisa que pode acontecer é que, afinal, caso tudo venha a ser conhecido ou se torne muito sem graça, desapareça gradualmente a atenção que se dá a essas coisas sobre as quais falei. Os filósofos, que estão sempre de fora fazendo observações estúpidas, poderão se aproximar, porque não poderemos empurrá-los, dizendo: “Se vocês estiverem certos, poderíamos encontrar leis ainda desconhecidas.” Quando todas as leis forem conhecidas eles terão uma explicação para elas. Por exemplo, há explicações sobre a razão de o mundo ser tridimensional. (…) Se tudo for conhecido, haverá alguma explicação de por que essas leis são certas. Mas essa explicação estará num contexto que não poderemos criticá-las, argumentando que este tipo de raciocínio não nos permite avançar. Haverá uma degeneração das ideias, do mesmo tipo que os grandes exploradores sentem que ocorre quando turistas começam a chegar a uma região. (Feynman, 2012, p. 179)

 

Ele, sem saber, estava sendo colonizado pela religião, que manda a ciência evitar os assuntos de maior profundidade, da razão de ser do mundo.

Daí vem, também, a tradição de igualar a metafísica e o misticismo, a religião, ao anticientífico; até marxistas caem nesse engano. Para Martin Heidegger, metafísica é saber porque há algo (e o Ser) em vez de nada; para Aristóteles, o estudo metafísico é a filosofia primeira, por que o mundo é assim, qual e se há a causa do movimento, qual a natureza essencial da realidade. Quem é contra tais metas científicas e, ou seja, metafísicas? Toda escola de ciência adota alguma variante metafísica, mesmo que não tenha disso consciência.

A segunda grande vitória do materialismo é a descoberta de que os átomos são partes vitais da existência, que há partículas fundamentais. Para os atomistas, as partículas tinham apenas substância, forma e grandeza; depois, Platão supôs, com algum exagero, que cada elemento básico – fogo, terra, ar e água – tinha uma forma peculiar de esfera, como a esfera do fogo ser formada por triângulos, figura mais semelhante a uma chama. Hoje, teoriza-se as pequeníssimas cordas vibrantes e de modo variado articuladas, fechadas ou abertas etc., com 11 dimensões, como hipótese (teoria das cordas) para a forma real das partículas. Tanto ontem como hoje, faz-se ao mesmo tempo ciência e filosofia; a diferença é que hoje temos mais ferramentas, como a complexa matemática moderna. De qualquer modo, acrescentamos, os átomos são acompanhados por ondas. O atomista Demócrito disse que apenas há o ser (átomo) e o vazio (não ser); além disso, afirmou que o ser vem do não ser! Hoje, sabemos que fótons e partículas virtuais surgem do “nada”. Mas, para nós, o não ser, ou nada, ou vazio é o próprio espaço, com existência ontológica.

A terceira vitória do materialismo ainda está incompleta. O Big Bang foi o começo de tudo? Então, Deus pode ser a sua causa primeira, o primeiro motor. De qualquer modo, discordamos, o que teria criado Deus já que tudo tem uma origem? É chegada a hora de substituir tal teoria por uma que a mantenha viva, mas superada, como a concepção de que o universo ora expande-se e ora contrai-se. Sobre a primeira vez que isso aconteceu no passado, veremos em outro momento; antecipamos que a quarta dimensão põe o finito universo nosso.

A quarta vitória é a teoria da evolução e a genética. Antes, Platão e Aristóteles pensavam haver um conceito por detrás da realidade, uma ideia. Parece evidente: um filho é como seus pais, logo deve haver um texto fixo, mas ideal, dando forma àquela matéria. A genética pousou tal concepção no chão da realidade; temos os genes, o DNA e o RNA. A vida, de fato, possui informações básicas e faz cópia delas; mas isso de modo materialista, não idealista. Além disso, as cópias podem ser imperfeitas, levando a diversificação de espécies por seleção dos mais aptos a sobreviver.

A quinta vitória é o marxismo, a concepção materialista da história. Por não ser o foco, apenas indicamos o grande acerto. O homem precisa produzir para se reproduzir, logo trabalha de certo modo e, por isso, com certa organização social.

A psicologia moderna, como Freud, Wallon, Piaget etc., além da neurociência e da psiquiatria, reforçam o aspecto psíquico como material, como ligado ao meio e à experiência, ademais também ativo. A busca do prazer e, em especial, do sexo, move a psique humana de modo singular. Nenhuma alma, separada, existe para além da complexa organização cerebral.

Toda anticiência, ligada à religião, procura atacar tais vitórias. Os religiosos dizem que a Terra é plana, que a descoberta dos dinossauros é uma farsa, que Darwin e Marx são satanistas, que há um Design inteligente na natureza, que Freud faz pseudociência ou é um tarado, que é absurdo o universo surgir de uma “explosão”. No fundo, estão negando a história universal.

Uma ciência correta causa espanto, muitas vezes positivo, e também uma negação desesperada contra suas ideias. Isso é próprio quando alcançamos um grande nível de verdade. A teoria de Darwin e a moderna biologia foram atacadas porque feriam de morte a religião. A teoria marxista foi negada com violência por religiosos, pelos ricos e pela classe média desejante de ser burguesa numa sociedade que não é a forma eterna, mas transitória. A teoria de Freud foi negada pela prisão mental de muitos, incapazes de aceitar sua própria mentalidade, além de ir contra a religião ao afirmar o sexo com sua grande importância. A teoria de Einstein derivou a teoria do Big Bang, além das modernas teorias do universo, para desespero de cientistas e professores ligados à física clássica e da religião com sua noção de mundo teísta, com um criador.

O socialismo, se vencer, ao dar razão a Marx e Engels, colocará o materialismo no seu devido lugar, no auge da cientificidade.

 

 

 

 

 

ANTINOMIAS DE KANT CONTRA O MATERIALISMO

 

Kant, o organizador e o desenvolvedor do senso comum, apresentou ataques contra o materialismo, suas famosas antinomias, que são teses opostas que parecem ambas verdadeiras. Vejamos como nossa concepção, espaço = matéria etc., resolve isso nas questões físicas.

1.  O universo é finito ou infinito no espaço e no tempo?

Ora, a quarta dimensão, responsável pelo infinito do finito é para dentro, para dentro de si – o finito é uma parte de dentro do infinito (Hegel), o infinito é como um círculo (Hegel) sem começo e sem fim – não como uma linha reta que pode ser sempre maior – no espaço e no tempo, sem borda. O infinito “circular” exige quarta dimensão.

O próprio espaço e talvez o tempo são finitos porque têm origem e desenvolvimento, história. Em três dimensões mais o tempo o universo é finito, mas a infinitude real, qualitativa e intensiva no lugar de quantitativa e extensiva, não tem começo nem fim.

 

2.  A matéria é ou não divisível ao infinito?

A matéria apenas é estável sob certas proporções, do contrário, decai em outras partículas. Se dividirmos as partículas ao “infinito”, logo as dissolveremos em espaço, pois este é o mesmo que a matéria, pois esta é espaço condensado. O espaço é o átomo.

Hegel diz que o contínuo é os discretos (partículas etc.) juntos, reunidos. Assim, o espaço poderia ser feito de partículas de espaço, mas ligados e unificados, formando algo como um tecido. Por outro lado, demonstraremos que as partículas, unidas, uma apenas no princípio, decaíram em espaço, continuaram unidas umas com as outras via espaço. Assim, de imediato, sem a história, o contínuo, o espaço, forma as partículas, que são espaço condensado – embora na história do nosso universo tenha ocorrido o oposto, as partículas (discretas) decaíram em espaço (contínuo). O contínuo, espaço, faz o discreto, partículas, assim como os discretos, partícula(s), fazem o contínuo, espaço. No próximo capítulo, apresentaremos uma proposta de espaço contínuo e discreto ao mesmo tempo por diferentes ângulos.

 

3.  Há ou não uma causa primeira?

O espaço é causa sui, causa de si mesmo, automovente, logo substância, contanto que mantenhamos a pluralidade (energia, movimento, tempo, matéria etc.). Junto disso, temos a quarta dimensão espacial, provável causa do movimento. Hegel disse que a causalidade é recíproca, causa torna-se efeito e vice-versa, o que apenas encaminha a solução.

No vazio infinito inexiste tempo e espaço em si, por isso nem causalidade. Kant afirmou nossa impossibilidade de pensar o absoluto, por nossa limitação mental. De fato, nossa mente é feita para lidar com nossa realidade, nosso universo. A noção de espaço e tempo de modo algum é a priori, mas uma adaptação ao real que tem o próprio espaço-tempo. Mas podemos entender o absoluto de modo indireto, com metáforas e analogias – e por conceitos, categorias sem a imagem limitada. Assim, o infinito hegeliano é simplesmente o infinito, mas podemos facilitar sua compreensão por meio da imagem do círculo sem início nem fim, envolto em si próprio – produzindo o finito de si, dentro de si, desabando-se em si mesmo.

O problema de se existe ou não uma causa primeira falha porque pensa que uma coisa ou fato produz outra coisa ou outro fato apenas. Em verdade, a ideia de causa primeira leva a que a primeira causa e o primeiro efeito não vêm da parte, de uma coisa que passa para outra particular, mas da totalidade vazia. Toda a causa no todo. É o infinito vazio como totalidade que produz o início, a primeira causa.

O infinito, quarta dimensão, desaba para dentro de si no finito, mas a causalidade parcial aparece como um movimento para fora, não para dentro, expansivo e não intensivo.

A ideia de fato ou causa singular originar outro fato ou causa singular é espaço-temporal. Digamos de outro modo: a totalidade vazia do infinito antes do universo era puro caos, sem causalidade; e não tendo lei alguma, teve a lei do caos, de si, de passar a si mesma para a ordem, o nosso cosmos com espaço-tempo e matéria-luz – por não se suportar, por se autoanular. Assim, a primeira causa ao mesmo tempo não é uma causa, mas fruto de um sistema não sistemático, puro de acasos e aleatoriedade caso possamos expressar o antes de tudo de tal modo por aproximação. O acidente ou o acaso é uma causa acidental, uma concessão da probabilidade.

Os gregos antigos imaginaram que o universo era puro caos (material), então um deus o organizou, produzindo a ordem cósmica. Para nós, o caos vai a si próprio, sem um artesão, para a ordem. Em nosso tempo, Husserl, inspirado por Hegel, pensou o zero como relação do zero do conjunto infinito com o (mesmo) zero do conjunto vazio que desaba, por isso, no um. Pois bem; o mesmo deve ter valor na realidade, como fundação do universo, a autorrelação do vazio infinito, do vazio com o seu infinito, desabou na primeira geração universal, no finito não vazio.

 

4.  Há liberdade humana ou apenas leis rígidas, causais, do universo?

Com a física quântica, redescobrimos o que já Marx sabia, a existência é a fusão de ordem e caos, de necessidade (determinismo) e, dentro de si, acaso ou contingente – na, afirmamos, probabilidade. Para Hegel, liberdade é reconhecer as necessidades, como as necessidades históricas. Marx diz que o trabalho é o reino da necessidade no socialismo que sustentará e dará base para o reino da liberdade no cotidiano. A necessidade é a base da liberdade parcial ou plena. Tal antinomia é mais própria do homem, da humanidade; mas dá oportunidade para debatermos de modo mais amplo.

Lukács afirma que liberdade é uma categoria apenas social, humana. Com o avançar da história da humanidade, com o aumento da produtividade do trabalho, o homem é cada vez mais livre, mais individual, com mais opções.

Vejamos uma nova conclusão, própria. Em primeiro lugar, a liberdade é objetiva, não subjetiva. A realidade dá opções, tem opções para si própria. A liberdade subjetiva é tomar a decisão para a qual já tem uma inclinação natural – a liberdade de fazer valer sua necessidade. Se o mundo não oferece a opção típica, de acordo com a personalidade, ou perfil natural, logo se pode escolher entre as opções que melhor expressam o determinismo no ser livre. Aí está o núcleo das soluções dessa polêmica, pois a liberdade é objetiva, do próprio real, antes de ser subjetiva e a confusão se dá por pensar o contrário ou desaperceber um dos polos. Mesmo quando há apenas uma opção, um “o quê”, então “o como” irá se efetivar está em jogo. Assim também, fundindo de fato liberdade e necessidade, superamos visões substancialistas e relacionalistas unilaterais sobre a liberdade. Temos a liberdade dialética.

 

Nem Hegel nem Marx e Engels atacaram de modo completo e de frente a parte física, não social, do problema das antinomias. Com imensa dificuldade poderiam fazê-lo, caso fosse possível, pois a ciência ainda não havia dado as pistas necessárias. Percebemos que as perguntas de Kant, antinomias, estavam erradas, escondiam armadilhas na aparente obviedade, então exigiram esforço histórico e trabalho para desembaraçar os problemas. Por exemplo, se há apenas causalidade ou também liberdade humana oculta que a liberdade pode ser objetiva, não “humana”, do real; se há ou não primeira causa oculta que a causa primeira não é coisa ou fato primeiro, mas uma totalidade, o vazio infinito, quarta dimensão, que desaba sobre si – indo para dentro como se para fora.

Em resumo, primeiro, a dialética é considerar que uma afirmação e sua oposta são ambas verdadeiras, como a primeira causa ser também um acaso, como termos o determinismo da liberdade, como o universo ser finito no espaço mais o tempo estando por dentro do infinito; em segundo, se a verdade está também na afirmação oposta, as duas afirmações são ao mesmo tempo verdadeiras e falsas, pois elas são parciais e unilaterais ao excluir a outra e o todo; isso significa, terceiro, que são, também, nem verdadeiras nem falsas.

 

Em complemento, segundo aspecto, Kant ainda afirma: há três conhecimentos impossíveis – a alma (psicologia), o mundo (cosmologia) e Deus (teologia). Vejamos um por um.

 

1.  Alma (psicologia)

A alma enquanto psique era uma ciência quase nula na época de Kant, mas o século 20 operou uma verdadeira revolução, desde Freud, nessa matéria. Nós temos, hoje, altíssimo conhecimento do espírito humano, faltando apenas uma teoria unificada, mais fácil de produzir.

 

2.  Mundo (cosmologia)

Com Newton, soubemos como atua a gravidade, mas não o seu motivo. Ele disse, sobre isso, que “não elaboro hipóteses”. Assim, usou o conceito de força, mas de maneira parcial, para dar lógica às suas descobertas; mas também considerava duvidosa a gambiarra teórica da força como conceito. Desse tipo de situação, Kant pensava que apenas podemos saber do fenômeno do mundo, não do mundo ele mesmo ou seu “númeno”. Mas Einstein, além de tantas contribuições, chegou à coisa em si da gravidade, que ela é uma curvatura do espaço-tempo, não uma força, causada pela massa-energia[13]. Mais uma vez, o kantismo cai por terra.

 

3.  Deus (teologia)

É impossível conhecer Deus porque ele não existe. O mais próximo disso é o infinito como quarta dimensão espacial, sem começo nem fim, em automovimento, sem imite nem borda, fundante do nosso universo finito e de seu movimentar primeiro; mas que não é separado de nosso mundo, pois está como se dentro dele, apenas relativamente separado.

O Deus real, material, de nossa época, o dinheiro, foi devidamente exposto e conhecido, além de reconhecido, por Marx, em O Capital. O valor invisível, que busca mais de si, causa de si mesmo, substância, tornou-se visível por meio da teoria.

 

Kant ainda apresenta um terceiro aspecto contra o materialismo: as categorias são mentais, para dar sentido à realidade, não reais. Mais uma vez, Einstein deu uma contribuição enorme; pois, para o kantismo, espaço e tempo são ideias do pensamento, mas o físico moderno demonstra que o tecido espaço-tempo existe, há. O conceito de campo avançou de uma consideração “metafórica” para uma verdade objetiva. O mesmo ocorre na biologia com o conceito gene quando Morgan demonstrou em 1910 que a conceituação tinha uma forma física.

Até hoje, os físicos e os químicos consideram que energia é um conceito necessário, mas que ela não existe, porque não diretamente observável. Os conceitos necessários são o que são por serem objetivos, por existirem no real. Idealistas como Hegel pensavam o átomo não existia, embora fosse um conceito, porque era impossível de ver um. Ora, Einstein – de novo! – demonstra que o movimento aleatório de um pólen sobre uma poça de água, movimento browniano, somente é explicável se a realidade for constituída por átomos. O mundo atómico é, considerado aí a onda, muito mais que apenas ideal.

Devemos considerar a “crise categorial”, que pode ocorrer no campo das ideias ou a crise daquilo que uma categoria expressa. No caso primeiro, a categoria “força”, usada de modo amplo e absurdo como criticou Engels, entra em crise e desuso, de início por meio de Einstein ao demonstrar que a gravidade não é força e sim uma curvatura do espaço-tempo por razão da energia-massa. Energia e campo aposentaram e ainda aposentam a força como conceito; e este livro reforça isso demonstrando que as “forças” fundamentais são campos do espaço condensado.

 

 

 

GNOSIOLOGIA OU ONTOLOGIA?

 

Kant afirma que devemos antes refletir sobre nossa capacidade de conhecer para determinar os limites dele. Ora, Hegel reponde: aprendemos a nadar nadando, sabemos se somos capazes de aprender a nadar tentando, ou seja, sabemos os limites de nosso conhecimento tentando conhecer a realidade, não com reflexões abstratas.

Pelo menos a maior parte dos limites do conhecimento são históricos, não cerebrais. Ideias e provas viváveis hoje na ciência eram inviáveis aos gregos antigos. Até certas teses apenas podem surgir hoje, não na antiguidade.

Há, no entanto, dois candidatos a limites de nosso conhecimento. Primeiro, na física quântica, nós podemos saber ou a posição da partícula ou sua velocidade, ou um ou outro, o princípio da incerteza. Segundo, buracos negros não permitem sequer à luz escapar de si, assim não temos seu externo do interno, não temos dados. No segundo caso, talvez simulações de supercomputadores nos salvem.

Há ainda outro fator histórico que impede o conhecer – a posição de classe do cientista ou sua posição diante do mundo. Nunca um economista defensor do capitalismo chegaria às conclusões profundas de Marx em O Capital, mesmo se honesto e rigoroso. Isso tem um reforço estrutural da psique, pois uma vida mais dinâmica e com stress relativo leva a ser mais produtivo intelectualmente, como a macieira produz maçã quando sente-se ameaçada[14].

Enfim, a ontologia é a prioridade do objeto, não a prioridade do sujeito do conhecer, pois é ir até o mundo. A prova de que podemos conhecer o real é que podemos lidar com ele na prática. A ontologia tem uma gnosiologia sua, derivada e, por assim dizer, instável, móvel.

Se há limitação ao saber, será uma limitação dada pela realidade externa, não ao sujeito pesquisador como pensava Kant – mas até isso, mesmo que provado por algum tempo, pode ser derrubado pela evolução posterior da ciência.

No mais, a ontologia madura não deve significar um sujeito científico passivo, que apenas se adapta ao objeto ou que apenas colhe os dados e os organiza, como se fosse mero espelho. Para, por exemplo, deduzir, precisa-se de um sujeito ativo, criativo, ousado. Como a Terra em seu sistema, o sujeito gira em torno do objeto e, também, em torno de seu próprio eixo.

 

 

 

 

MATERIALISMO OU IDEALISMO?

 

Grosso modo, o idealismo é afirmar que a ideia e seu desenvolvimento faz a realidade enquanto o materialismo, oposto, afirma que a realidade, a matéria, faz o pensamento. Marx adota a segunda posição, às vezes de modo muito intenso. Mas o mais correto é dizer: o marxismo é a fusão de idealismo e de materialismo num terceiro, o terceiro excluído incluído. É verdade que a matéria faz, primeiro, a ideia, mas, sendo a ideia uma forma toda especial e mui complexa de matéria, ela tem uma autonomia parcial, relativa, além de ser trabalho, de ser produtiva (cérebro) – a ideia, a idealidade, também afeta o mundo, em principal o social. O polo determinante dessa unidade é o materialismo, mas não de modo mecânico, unicausal, sem mediações (ele se medeia, no externo, consigo mesmo como se com outro, outro de si). Por isso fazemos de fato nossa história, pessoal e social, mas sob dadas condições materiais. O marxismo supera a oposição unilateral entre materialismo e idealismo, conclui a história da filosofia.

Vale uma construção lógica. Na lógica aristotélica, A = x ou não-x, sem terceira resposta, sem um terceiro, que é excluído – ou materialismo ou idealismo. Na velha dialética, existe a verdade exato nesse terceiro, que passa a ser incluído. Mas o terceiro costuma não ser nomeado, “entre” o relativo e o absoluto, podemos apenas aproximar com o relativamente relativo; “entre” o materialismo e o idealismo não há, também, nomeação. Na nova dialética, mantendo em pé a velha, x vai até não-x em “A”. Assim, o materialismo em autodesenvolvimento constrói o ideal, o idealismo, sem deixar de ser o “material” o verdadeiro motor primeiro e o centro, a verdade. Esse caminho do materialismo para o idealismo relativo é o caminho da sociabilidade cega existente até a sociabilidade organizada e planejada, central e democraticamente, no socialismo, quando a ideia fazer a matéria ganhará mais peso, ainda subordinado ao polo oposto unilateral, o materialismo. O terceiro, que supera o materialismo e o idealismo, desenvolve-se, dinamiza-se. O idealismo (abstrato) é o materialismo (concreto) em autodesenvolvimento (processo).

Eis nossas conclusões, um novo marxismo. Mas precisamos limpar o terreno para ganhar outros marxistas para nossa concepção. O velho Marx, d’O Capital, adotou o materialismo “duro e rígido”. Após elogiar muito um dos seus críticos, ele cita um comentário à sua obra, que diz:

 

Para tanto, é plenamente suficiente que ele demonstre, juntamente com a necessidade da ordem atual, a necessidade de outra ordem, para a qual a primeira tem INEVITALVELMENTE de transitar, sendo ABSOLUTAMENTE INDIFERENTE se os homens acreditam nisso ou não, se têm consciência disso ou não. (…) Se o elemento CONSCIENTE desempenha um papel tão subalterno na história da civilização, é evidente que a crítica que tem por objeto a própria civilização está impossibilitada, mais do que qualquer outra, de ter como fundamento uma forma ou resultado qualquer da consciência. (Marx, O capital I, 2013, p. 89)

 

Segundo o próprio Marx, o comentador foi preciso, exato:

 

Ao descrever de modo tão acertado meu verdadeiro método, bem como a aplicação pessoal que faço deste último, que outra coisa fez o autor senão descrever o método dialético? (Idem, p. 90)

 

O trecho tem outros pontos semelhantes ao exposto. Ademais, para Marx, a vontade do capitalista não é a vontade dele próprio, mas do capital impessoal, que se expressa no indivíduo.

O jovem Marx, em textos não publicados em especial, ao menos esboçou nossa concepção. A posição materialista unilateral é substancialista; a idealista, relacionalista. Em outro capítulo, demonstraremos que Marx pendula entre a concepção de substância e de relação, apesar de sua revolução teórica-metodológica e resolver várias oposições entre esses dois pontos de partida.

A velha geração marxista afirma que tentar antecipar aspectos gerais do socialismo, mesmo durante o ocaso maduro do atual sistema, trata-se de idealismo… Mas o ideal importa, a arte marxista é, também, prever, uma historiografia do futuro possível a partir das bases materiais presentes.

O materialismo focou no aspecto animal do homem; o idealismo, na sua diferença para com os demais seres (Levins & Lewontin, 2015). A verdade supera os opostos.

A própria realidade quebra-se em materialismo e idealismo. Materialismo – trabalho manual; idealismo – trabalho espiritual, intelectual. Como a verdade é o todo, a realidade supera e abarca ambos.

A verdade supera e funde o materialismo subjetivo e o idealismo objetivo.

 

 

 

A LIBERDADE OBJETIVA OU DIALÉTICA

 

Outra entre as grandes questões da psique é sobre se somos subjetivamente livres ou não – há ou não liberdade? Há livre arbítrio? Se há, de que tipo é ela? Vejamos em alguns de nossos mestres, antes de oferecer uma nova resposta.

 

Kant

Ele produz uma das quatro antinomias suas, que serão resolvidas nesta obra, perguntando se 1) a realidade inteira, incluso nosso pensamento, segue a causalidade, a necessidade, causa e efeito ou 2) há ao menos também liberdade humana. Ele não responde e considerava uma questão irresolvível. Antes de chegar a uma conclusão, vejamos como outros tentaram solucionar a pergunta.

 

Hegel

Ele oferece pelo menos três respostas sobre a oposição liberdade-causalidade.

Primeiro, a liberdade é reconhecer a necessidade. Por exemplo, respeitar as leis e as tendências da história. Um divulgador marxista afirmou que o animal tem a opção de evitar o fogo, sua liberdade de não se queimar é uma necessidade. Um burguês tem a liberdade de seguir a luta por mais lucro, embora possa escolher ser mendigo, ou seja, prejudicar-se.

Segundo, Hegel afirma que o uno, o um, o indivíduo, parece afirmar-se ao isolar-se do conjunto (muitos, múltiplos), mas isso é sua destruição. Então, apenas se pode ser livre e individual em comunidade. Assim também, um átomo é instável energeticamente quando isolado, por isso deve ligar-se a outros átomos, formando uma molécula, para ganhar estabilidade.

Terceiro, ele funde causalidade e liberdade afirmando a interação dos corpos, dos acidentes, das partes de um todo. A causalidade é recíproca, pois uma parte age sobre outra parte, e esta, vice-versa, também faz o mesmo. Mas todas as partes de uma totalidade, sendo causa e efeito ao mesmo tempo, pertencem uma única substância comum, que está no fundo, no fundamento (necessidade). As partes do todo-substância aparecem, de modo externo, umas independentes das outras, e o mesmo ao contrário, são fora umas das outras, apenas interagindo (liberdade). Mas essas partes são também o mesmo, uma mesmidade, pois são uma substância apenas.

 


Marx

No final de O Capital, Marx afirma que no socialismo a produção será o reino da necessidade, onde o cidadão trabalha, mesmo que apenas jornada curta de 2, 3 ou 4 horas diárias. O que é produzido de modo organizado permitirá o reino da liberdade, fora da fábrica, quando nos dedicaremos à arte, à família, ao ócio etc. Como sabemos, tudo que puder ser robotizado, automatizado, informatizado o será, o que reduzirá com toda força o tempo de trabalho ou de serviço – o trabalho manual será superado, mesmo que não extinto.

 

Lukács

O grande filósofo do século XX afirma que a humanidade tem produtividade crescente, cada vez mais produtivo – e com o aumento da produção aumenta também o grau de liberdade. O escravo antigo era não livre, o servo foi mais livre que o escravo, o assalariado (com liberdade formal) é mais livre que o servo, o trabalhador associado socialista será substancialmente livre. Nosso destino é cada vez mais determinado por escolha ou acaso, cada vez mais com mais opções.

Outro aspecto da liberdade lukacsiana é que o homem no trabalho antes pensa ou imagina como e o que produzir (teleologia, prévia ideação, liberdade) e depois manipula as leis causais da natureza (necessidade) para produzir algo útil.

Para Lukács, a liberdade era uma categoria apenas humana, social, além de histórica.

 

Nossa proposta

Vejamos como resolvemos o problema kantiano. Ora, se a realidade tem possibilidades e probabilidades, ela as tem em si mesma, dentro de si própria. Logo, a liberdade é objetiva antes de subjetiva – é dialética. O homem ou a partícula toma a decisão que tem já tendência, na sua personalidade ou perfil, além de contexto, de tomar. Um chiste famoso ajuda a esclarecer: podemos escolher o que quisermos (entre as opções), mas não escolhemos qual é nosso desejo, o que de fato desejamos. Se temos 4 opções, escolheremos aquela que melhor corresponde ao que somos. A liberdade é ter tais opções exato para escolhemos a que de fato somos levados a escolher, causalidade e necessidade (e nossa liberdade está dentro da realidade objetiva). Esse é o primeiro modo de fundir causalidade e liberdade. O segundo é que o “o que” irá ocorrer é algo necessário, causal, determinístico até, mas “o como” isso irá acontecer está, em geral, em jogo. Por exemplo, certo é que o capitalismo irá cair, mas pode desabar de várias formas, mesmo opostas, como por revolução ou por extinção da humanidade etc.

Necessidade é reconhecer a liberdade.

 

 

 

TELEOLOGIA OBJETIVA

 

Para ganhar moral no meio acadêmico, um dos segredos é ser contra a teleologia, a concepção que a realidade tem finalidade, um fim, um objetivo. É uma crítica fácil e famosa, mas pouco refletida. Os erros nesse assunto se deram à visão mecanicista do tema, desde Aristóteles até Lukács. Vejamos a confusão, as igualdades falsas na crítica:

1)  Teleologia exige uma consciência que planeja.

Isso é a concepção mecanicista de um trabalho artesão ou artístico, generalizada e, logo, rejeitada por muitos. Mas as leis inerentes da realidade podem levar a um rumo específico.

2)  A teleologia exige separar fim e meio.

Falso. Ainda uma visão mecanicista, priorizando uma forma de trabalho, como vemos. O fim pode estar, em sistemas orgânicos, no próprio meio, vai-se realizando no processo, rumo a si mesmo. O socialismo vai rumo a si na lutando por ele, com práticas de acordo com o fim almejado. O fim (abstrato) é o meio (concreto) em desenvolvimento (processo).

O fim, realizado tanto quanto pode, é, por sua vez, meio para algo realizar; por exemplo, o socialismo é o fim, mas, ao existir, será meio para a felicidade humana.

3)  Teleologia é determinística.

Nada justifica essa hipótese. O homem, por exemplo, tende ao socialismo – tende. Mas pode se extinguir antes de se realizar. A teleologia não é nem determinística nem contingente, pois é tendencial.

4)  Não existe teleologia fora da sociedade.

Outra hipótese sem comprovação. Por exemplo, o olho surgiu 6 vezes de modo independente na história da natureza, pois era necessário que o olho surgisse. No social, a história ocorre como teleologia objetiva e insconciente até que a sociedade ganha consciência alta, toma as rédeas da história.

5)  Teleologia exige um fim (absoluto).

Na verdade, a teleologia pode ter um alto grau de autorrealização, mas ele permanece como pulsão, movimento, desenvolvimento. Não se encerra quando se encerra.

Temos a teleologia objetiva. Lukács afirma que na arte há identidade sujeito-objeto, forma-conteúdo, essência-aparência e nós completamos com criar-descobrir e nada-ser. Logo vemos que Hegel se inspirou no trabalho artístico para pensar sua Lógica, caindo em mecanicismo em certo sentido.

Vale a pena fazer uma observação histórica. Engels e Marx, em cartas pessoais famosas, concordaram que A origem das Espécies de Darwin marcava uma crise na teleologia, que elas associaram então à visão essencialista religiosa. Isso pode ser deduzido de sua grande obra, embora erra, mas, da própria letra de Darwin, este afirmou em mais de uma passagem que há uma tendência à perfeição das espécies, ou seja, evolução, para ele, não é apenas diversificação – e o homem, sendo animal, é um ápice biológico apaixonante, mas perigoso até aqui (a natureza viva criou seu próprio algoz, se próprio inimigo, caso não alcancemos o socialismo).

 

 

 

AS CAUSAS

 

Ainda segundo Lukács, com sua teleologia subjetiva apenas e mecanicista, a teleologia (humana, subjetiva, individual) usa a causalidade – posição correta em si, no entanto limitada. Mas, oposto, as relações causais dialéticas, ou seja, a interação recíproca produz de modo “inconsciente” a teleologia. A teleologia faz a causalidade como a causalidade faz a teleologia.

            Aristóteles levantou quatro causas separadas: 1) causa material (água, éter etc.), causa formal (forma geométrica, forma social etc.), causa eficiente (causa para efeito) e causa final (teleologia, ir rumo ao). O grego tratou cada uma de modo separado, mas elas ocorrem juntas, de maneira simultânea e unificada, ao mesmo tempo, com relações recíprocas. Além de sincrônicas, ocorrem, por isso, de maneira diacrônica, como se depois, tempo lógico: a matéria, causa material, cuja forma é sua informidade, passa a ser com cada vez mais forma, causa formal, que impulsiona a causalidade mecânica e dialética, causa eficiente, o que produz uma teleologia, causa final. A ciência moderna focou apenas na causa eficiente enquanto o grego focou na separação delas ou na causa final. A causalidade eficiente produz imediatamente a teleologia, a causa final.

Tal movimento “real”, mantida a sincronia, também foi ideal nas sucessivas gerações filosóficas antigas, dos gregos. Dialética real expressada na dialética ideal. Os primeiros filósofos gregos tiveram, do ponto de vista da mente, que fundar o materialismo para afirmar-se contra a religião, separar-se dela (Novack). Tal materialidade expressa, também, certa materialidade em desenvolvimento, a sociedade grega, sua vida e seu comércio etc. Daí iniciar pela causa material, supondo que a realidade é um único elemento, ou combinação de muitos. A matemática pura algo separa-se do uso de engenharia etc., surgem os pitagóricos e a realidade profunda enquanto número, formas numéricas. Platão avança para a separação entre mundo das formas – perfeitas, puras, imóveis – contra o mundo terreno, da aparência, da inconstância. A afirmação do movimento dá importância para a causalidade, o tempo, a relação. Então, intui-se a teleologia, a causa final, o destino para onde a existência tende a ir, vai-se.

Hegel, o grande gênio, deixou claro que causa e efeito podem mudar de posição na causalidade recíproca. Então, ele passa para um conceito unificados de ambos os opostos, a interação. O marxismo vulgar toma a causalidade mecânica, como se a economia determinasse de modo único, direto, mecânico, determinista e unilateral as mentalidades e as instituições. Embora a produção, em principal, e os demais setores econômicos tenham prioridade, numa hierarquia do ser social, a causa é um “ida e volta” dinâmico. 

 

 

O QUE É A CONCIÊNCIA, A MENTE?

 

A dialética não usa, grosso modo, definição, algo dicionário – ela desenvolve o conceito, mais do que o explica.  Dito isso, mostramos uma dentre as respostas possíveis, nossa proposta. A consciência dar-se, no ser complexo, quando a realidade muda, torna-se incerta, sem padrão aparente enquanto o cérebro continua preso ao passado, à repetição, ao padrão. Busca-se, assim, naturalmente, a permanência na mudança. A mente e a consciência (abstratos, que não são coisas) são o cérebro e a realidade (concretos) em movimento (processo). A contradição em “querer” manter o permanente e a mudança incerta produz a mente e a consciência. Uma situação de crise, instável, empurra para elevar a consciência. A consciência é, portanto, antes, fruto da objetividade, do externo.

Aqui, inspiramo-nos nos gregos. Eles negavam a empiria aparentemente aparência, instável, caótica, sem lógica, sem rumo, contingente e queriam acessar o mundo por meio da boa reflexão, do pensamento dedicado, de deduções abstratas, de lógica e conflito de ideias com palavras. Assim, continuavam querendo o permanente na mudança – e fizeram, portanto, filosofia! A filosofia experimental, a científica e a objetiva, claro, hoje baseiam muito mais diretamente nos dados, no fatos, na empiria, embora saiba que a aparência ao mesmo tempo revela e esconde a essência, a verdade.

Isso leva-nos ao debate sobre inteligência artificial: podem os programas e robôs tornarem-se conscientes? Para nós, o que é, em primeiro lugar, consciência? Devemos responder tal pergunta milenar, até hoje um enigma insuperável, com suas diferentes escolas e polêmicas. Consciência é, também (pois não o que ela é não cabe no dicionário), autoconsciência, consciência de si. Mas ser consciente de si é ao mesmo tempo diferenciar, ter consciência do outro e do externo. Por isso, dizer que consciência é consciência de algo tem tal algo igualmente como a si próprio, alguém. Assim, ter consciência exige ter consciência da sua finitude, de perceber ser algo que não outro, ou seja, ter borda e limite, ou seja, ter fronteira. O erro de dizer que pensamos e temos consciência por meio de todo o corpo deve ser (re)considerada – não penamos com o corpo inteiro, mas é quase isso. O cérebro é também sua função. Ademais, consciência é finitude não só espacial, também temporal – consciência exige falta, logo, necessidade, logo, desejo.

Dito isso, considerando a consciência de seu lugar abstrato, ou seja, separado e isolado nas nuvens ideais, vemos a dificuldade de uma inteligência artificial tornar-se de fato consciente. Ademais, o cérebro é a coisa mais complexa e difícil de replicar do universo. Pode-se, com mais rapidez, simular um “como se” tivesse consciência. Mas, ao oferecer algo como um sistema nervoso completo ao robô, além de sentir necessidades (falta de energia, incômodo etc.), quem sabe a singularidade finalmente ocorra, para o bem ou para o mal. Marx diz que a há humanização das coisas e coisificação dos homens; e isso tende a ser literal, atingir um máximo: das máquinas simples que imitavam o movimento repetitivo das mãos humanas às máquinas complexas que imitam a sua inteligência e consciência.

 

  

 

 

SEÇÃO DOIS

TESES SOBRE QUESTÕES ABERTAS NAS CIÊNCIAS NATURAIS

 

 

 

AS QUESTÕES ABERTAS NA FÍSICA MODERNA

 

Nada é maravilhoso demais para ser verdade.

Michael Faraday

 

Em sua Dialética da natureza, Engels apenas levanta várias questões ainda não resolvidas pela ciência. Muitos pontos foram resolvidos, mas a ciência moderna trouxe novos enigmas. Aqui, iremos um tanto mais longe, pois apresentaremos uma proposta de resolução das lacunas teóricas. A base é nossa equação qualitativa antes exposta resumida em matéria como espaço concentrado. Uma proposta teórica no geral correta deve apresentar soluções para quase todas as lacunas da ciência.

Vejamos as conclusões de pesquisa que se tornaram premissas na exposição. Nossos postulados são:

1) espaço = matéria, matéria é espaço concentrado, espaço é matéria decaída;

2) o espaço, contínuo-discreto, organiza-se como linhas de espaço (tese não central, se os campos como linhas não foram diretamente espaço);

3) a equação QUALITATIVA geral é “movimento = energia = tempo = espaço = matéria” ( = massa = luz[15] = campo).

4) a matéria não apenas curva o tecido do espaço, mas é também o próprio tecido espacial curvado, para dentro, para dentro de si, concentrado na forma particular.

 

1.  Efeito Casimir

Comecemos por uma questão apenas na aparência resolvida, que reforçará na empiria nossa tese. O experimento é este: põe-se duas placas especiais próximas dentro de uma caixa a vácuo. Ocorre que tais placas aproximam-se, revelando uma pressão maior do lado de fora delas, forçando rumo ao encontro de ambas. Seria a prova de uma energia de ponto zero! Partículas virtuais surgem e deixam de surgir do “nada”! Mas o vácuo não exclui o espaço e, teorizamos, espaço é energia – logo flutuações do espaço faz ele se concentrar produzindo as tais partículas. Eis a prova de que espaço é matéria e energia (e luz etc.).

Veja ao autolimite posta pelos físicos e seus filósofos ao focarem na diferença entre espaço e todo o resto no lugar de ver sua unidade, e identidade de fundo, real:

 

Notamos já que na relatividade geral o próprio espaço-tempo tem massa-energia. Mas a massa-energia é o aspecto básico característico da matéria, tal como a entendemos habitualmente. Se até a distinção entre a matéria e o próprio espaço-tempo é problemática, podemos ainda falar de “relações entre coisas materiais” em oposição ao “próprio espaço-tempo”? (Sklar, 2020, p. 60)

 

Há consequências totais de nossa reinterpretação de um experimento. Bohm critica a aleatoriedade da física quântica afirmando que existe um nível ainda mais abaixo, fundamental, subquântico; são, para ele, as variáveis ocultas da causalidade oculta na probabilidade. Neste reino, haveria uma substância e suas entidades, partículas etc. Mas há um grande problema: um nível micro tem um nível ainda mais abaixo, que tem outro mais abaixo, que tem outro etc. – ao infinito, má infinitude. Aqui, para nós, o nível mais fundamental é o espaço, talvez com partículas espaciais (a matéria escura como espaço discreto, particular etc.). Assim, concluímos, flutuações do meio, do espaço, afetam as partículas fundamentais. Um grande problema teórico aparece como com solução óbvia apenas depois de resolvido.

Reforcemos nossas teses com outro fenômeno. Se, sob investigação, para melhor estudá-la, desacelera-se cada vez mais a velocidade uma partícula de elétron, o que ocorre? Ela cada vez mais espalha-se, expande-se, torna-se menos condensada, torna-se menos pontual – ou seja, tende a dissolver-se em espaço, por ser o espaço condensado, para dentro de si, sem romper de todo com este. Matéria é igual ao espaço.

 

2.  Positivo e negativo nas partículas (química)

A ciência da natureza, em geral, foca no como, o caminho mais fácil, e esquece de saber o motivo. O que é positivo ou negativo? Não sabemos, sequer fazemos a pergunta. Na verdade ocorre algo do tipo: algo inteiro, nem negativo nem positivo em si, decai em pedaços, inteiros por si mesmos, que são também partes. O nêutron decai em dois, próton e elétron; um desliza para dentro do outro porque são, no fundo e na origem, apenas um, um algo de fato completo. Assim, são opostos no externo, mas atraem-se porque são o mesmo e semelhantes no interno. Isso vale para vários tipos de decaimento, de opostos que já foram juntos e um, como o elétron e o antineutrino, além dos famosos elétron com próton.

Por que, então, dois prótons se repelem? Ou por que o elétron não cai no próton? Parecem duas perguntas, mas têm o mesmo princípio e resposta. O senso comum pensa o campo como certa camada protetora, o que os cientistas negam; mas o próton é mais do que sua parte “visível”, pois tem um “campo próximo” e, portanto, uma fronteira, um limite. Dois prótons se repelem porque são excessos, desencaixe um relativo ao outro; o mesmo para dois elétrons. Um elétron e um antielétron, pósitron, atraem-se porque são antes, ontologicamente, o mesmo, como se pedaços inteiros de um inteiro. Também assim, o elétron não cai naturalmente no próton porque ambos, sendo pedaços, são ainda inteiros por si, com fronteira própria.

Na química e na física, o próton é tomado como carga +1 e o elétron, -1. Como que dois objetos tão diferentes têm exato a mesma carga com sinais opostos? Que sorte do próton! (a única resposta decente, nesse caso, seria que o próton e o elétron são o mesmo, iguais, só que um é mais partícula que espaço-campo e o outro, ao contrário, mais espaço-campo do que partícula – daí as cargas iguais). Em verdade, tal matematização apenas expressa a aparência, enquanto pomos a essência de tal fenômeno.

Isso nos leva à próxima questão.

 

3.  A matéria e a antimatéria no início do universo

A física atual postula que o decaimento do universo em sua expansão original deveria formar a mesma quantidade de matéria e antimatéria, logo elas se atrairiam mutualmente, aniquilando-se em forma energia, de luz – mas isso não aconteceu, pois temos ainda a matéria comum no nosso universo, bariônica. Por quê? Uma resposta é que o universo se contrai e se expande para sempre sem cair nesse estágio inicial. Os físicos tratam de afirmar como evidente que não existiu tal “explosão” ou que há uma pequena diferença, até hoje não encontrada, entre os opostos. Outra resolução, propomos, é que de fato houve mesmo o grande encontro de matéria e antimatéria, destruindo ambos, e a energia resultante disso decaiu rapidamente em espaço, este expandindo-se salvando um pequena parte da matéria e, talvez e longe, da antimatéria do universo.

 

4.  O segredo da matéria escura e da energia escura.

A gravidade extra nas partes mais distantes da galáxia não corresponde com a massa-matéria existente, logo há alguma matéria transparente, invisível, criando a gravidade extra encontrada, uma espécie de cola. Como resolver tal quebra-cabeça? Matéria é espaço condensado, logo matéria escura é uma forma leve de matéria, de espaço (o que está de acordo com a tese semelhante de Marcelo Gleiser[16]). Segunda hipótese, talvez – ou também –, por a matéria ser espaço concentrado para dentro de si, a matéria bariônica e/ou os buracos negros sugam para si mesmos uma parte do espaço, esticando-o, tornando-o tenso, logo com mais energia, logo com gravidade extra.

E a energia escura? O universo está se expandindo, o que sugere uma energia escura, transparente, de repulsão. Se formos logicistas: matéria é energia e espaço; logo energia e matéria escuras são o mesmo, além de opostos, este decaindo naquele. A matéria (escura) e a luz do universo decaem em espaço (energia escura), o que expande o cosmos. Talvez outras causas incluem como o contrair dos universos vizinhos, por ação de seus buracos negros, esticando o nosso.

Pode ser que a diferença de matéria escura e energia escura é que um seja espaço contínuo e o outro como espaço discreto, granulado.

A matéria escura, extra, entre galáxias pode ocorrer porque os buracos negros e a matéria sugam e esticam parte do espaço, gerando nele tensão, logo energia, logo gravidade.

É possível observar também, de modo matemático, se os buracos negros servem de trituradores da matéria, produzindo espaço, que tem velocidade de escape o bastante, ao menos não nos grandes buracos negros[17], o que exigiria adaptação de nossa formulação universal aqui, como o fato de por isso produzir matéria escura que decai em energia escura (espaço).[18]

 

5.  Entrelaçamento quântico

Descobriu-se, primeiro no cálculo e depois na empiria, que dois fótons que juntos surgem e são separados estão “ligados” mesmo se distantes um do outro, ou seja, se medirmos um aqui e descobrimos que ele está com o spin para cima, logo o outro ali estará com o spin para baixo (antes, ambos estavam no estado de sobreposição, nem para cima nem para baixo em exato). O assunto irritava Einstein, então ele supôs que a teoria quântica estava incompleta. Ora, basta aceitar, de modo materialista, que eles estão de fato em uma “ação fantasmagórica à distância”, instantânea, pois estão ligados por um fio de espaço, por um fio de linha de campo comum.

 

6.  Enigma da fenda dupla

Imaginemos uma placa com duas fendas, duas entradas; se um elétron ou fóton passa por um, logo não deveria passar por outro, agindo como uma partícula que de fato é. Mas, ao passar, vez por vez, várias partículas, elas batem na última placa e forma um padrão de onda, não de partícula! No lugar de baterem em apenas dois lugares, por serem duas fendas, elas batem em vários, como se ondas fossem ainda sendo particular! Às vezes, os físicos se apaixonam demais pela magia de seus mistérios no lugar de resolvê-los. Talvez, algumas partículas não rompam totalmente, apenas de modo relativo, com o espaço ao redor; ou, ao menos, eles têm um “campo próximo” que se afeta pela outra fenda (a partícula passar por uma fenda, mas sofre interferência como se passasse pelas duas).

 

7.  Salto quântico

Um elétron “orbitando” o núcleo está aqui e desaparece, reaparecendo quase ao mesmo tempo ali, em ouro ponto. Como ele saltou, como desparecer e reaparecer “longe” e não percorrer um caminho até o outro local? A posição do elétron depende de si (nível de energia), do núcleo e do seu contexto. Pense-se no lençol esticado; pois bem; ele, sendo o espaço, é concentrado um pouco num canto por uma mão, formando um pequeno “morro”, nossa partícula; se, então, fazemos outro “morro” em outro canto do lençol, aquele primeiro se desfaz, pois houve novo esticamento. Assim, o elétron desaparece aqui e reaparece ali. Outras formas de dizer isso, são estes: 1) o elétron decai, colapsa, em espaço que se reconcentra em outro ponto segundo seu contexto; ou 2) o elétron desaba em neutrinos “emaranhados” (ou, ou também,  neutrinos e antineutrinos que se atraem) que se reconcentram em outro local, reformando o elétron mais uma vez. Esse caso serve para o exemplo da passagem do elétron por uma chapa fotográfica, deixando marcas não contínuas, discretas e afastas umas das outras, de gotículas de prata (repetimos: decaindo ou decaindo em neutrinos-antineutrinos “emaranhados” que se atraem). Para o positivismo, apenas descreve-se que a coisa desaparece aqui e aparece depois ali, sem mais, sem caminho para, sem continuidade. Outra hipótese é que o elétron se torna energia pura, sem uma de suas formas, na quarta dimensão, então retorna, mas isso me parece nem sequer indiretamente verificável, além de improvável também. Outra afirmação, que se sustenta, junta às demais inclusive, afirma que o espaço são linhas, enquanto as partículas são pontas, saliências, de tais linhas, linhas concentradas; por isso, a partícula desaparece aqui, torna-se mais parte da linha, decai em apenas linha, e reaparece ali, a tensão direcionada gera, produz, nova concentração, nova onda ou, ou seja, condensação da corda. Torna-se, assim, espaço e, pela tensão e direção, forma-se nova ponta-onda, partícula (à semelhança do comportamento de expansão da onda de som na atmosfera, aqui é corda-espaço concentrado, concentra e por isso expande etc.). A ideia da realidade como particular ou ondulatória torna-se superada, a oposição unilateral é superada.

 

8.  A escassez de buracos negros intermediários

Ainda não encontramos buracos negros de tamanho intermediário nem sequer na quantidade esperada; eis o mistério. Ao que parece, tais entidades cósmicas são produtivas, sugam matéria e… espaço. Por isso, são maiores do que deveriam ser se passivas ou semipassivas.

 

9.  Unificação de campos

Para a teoria quântica de campos, cada partícula é a “ponta”, a expressão de um campo específico e amplo. No real, todos os campos são um porque são apenas o espaço, já que cada partícula é espaço condensado, ou o campo é a forma mais leve do próprio espaço, mas um tanto condensado. É, antes, a partícula que faz o campo; não o campo, a partícula – a união faz a força. O fato de ela ser espaço condensado, ser algo com “peso”, a gravidade em nível superior (força forte etc.), forma o campo correspondente ou o campo próximo.

 

1.      As dimensões

A teoria das cordas diz que as partículas são, na verdade, cordas de uma só dimensão, unidimensionais, que vibram cada qual de modo diferente e são de formas diferentes. Até o momento, provou-se impossível comprová-la. Tal hipótese trabalhava com 11 dimensões, agora reduzida para 6. Para nós, há quatro, incluso uma espacial oculta, que se manifesta como tempo. A fita de moebius tem apenas um lado, mas parece ter dois quando vista por apenas um pedaço dela. Algo semelhante temos na garrafa de Klein, com seu dentro-fora unitário. Penso que as três dimensões são também, assim, há apenas uma dimensão, o infinito, o todo, que por isso é dimensão nenhuma, mas tem quatro dimensões quando visto por seus pedaços, suas partes.

 

2.           Dualidade onda-partícula

A física dividiu-se por séculos entre aqueles que diziam a luz ser partícula ou, ao contrário, onda. A dialética pede a substituição possível do “isto ou aquilo” por “isto e aquilo” em inúmeros casos. Se houvesse uma boa formação filosófica, os cientistas teriam ao menos levado em conta a hipótese de que ambas as posições acertam e erram ao mesmo tempo, bem antes do século XX. Luz não é apenas onda “e” partícula, mas propriamente uma sobreposição dos dois estados opostos – o dialético em ato! Mantendo nossa posição de que, em resumo da fórmula, tudo é espaço, ainda que concentrado, a parte ondular das partículas ocorre porque elas não rompem totalmente com sua base, o ambiente primeiro, o espaço, mas flui assim mesmo por ele, nele, sendo ele. Talvez exista “resistência” e “atrito” do espaço, gerando instabilidade e ondulação.

Assim, as verdades primeiras são: é-se 1) partícula; 2) onda, 3) onda-partícula, 4) partícula com propriedades de onda, 5) onda com propriedades de partícula. Adicionamos: nem onda nem partícula, pois, não só por ser ora um e ora outro, mas por ser espaço condensado, concentrado (provavelmente: sem romper com sua base, o espaço) – o que permite propriedades aparentemente contraditórias, num um terceiro, uma terceira resposta de fato. Assim: tese – partícula; antítese – onda; síntese – espaço autoconcentrado, que explica as propriedades duplas. A onda vai-se para a partícula, cada vez mais partícula (em dialética diacrônica: x vai-se para não-x em A) – raios gama são muito mais partícula do que raios X, a luz ultravioleta é mais partícula que a infra vermelha (eis uma origem de partículas logo após o encontro destrutivo de matéria e antimatéria no início do universo, sob novas circunstâncias); mas há também outro modo de terceira resposta, o “nem um, nem outro”, unilaterais, mas a constituição do não espaço como o próprio espaço condensado, com as propriedades opostas, agora complementares.

Mais uma dentre as hipóteses. Se o espaço for como linhas de espaço, então uma partícula é como quando balançamos uma corda presa numa das pontas, formando uma ondulação que avança, que se movimenta, algo que toda criança faz ao brincar. Um fóton, por exemplo, expande-se assim, no e sendo o espaço acentuado, concentrado, em movimento, em vibração. Superamos a teoria das cordas assim! A teoria das cordas exige cordas pequenas, particulares, de uma só dimensão, num universo de 11 dimensões. Agora, superando essa ideia ainda atomista, individualista e corpuscular, temos uma teoria de tudo nova, completa – ao que parece, correta.

 

12.            Excesso de raios cósmicos

Sabe-se que a maior parte dos raios cósmicos que encontramos no espaço interplanetário não vem do Sol. De onde viriam? Uma parte pode ter origem nas flutuações do espaço, produzindo tal matéria-luz.

 

13.            Spin do elétron

O spin do elétron é uma “rotação” muitas vezes maior que o permitida pelas leis da física. Na falta de explicação, os físicos dizem “é assim mesmo, um mundo diferente” e ponto, e pronto. Isso não ajuda, apenas esconde uma ignorância. Como demonstramos em nossa equação qualitativa, movimento = energia = tempo = etc. Assim, o que medimos como apenas movimento de rotação é na verdade mistura com seus diferentes, outros de si, que são também idênticos, iguais.

 

14.            A origem do movimento

O movimento é, sempre foi e será. Mas qual a sua causa primeira? A matéria e a luz caem na quarta dimensão espacial, no infinito, como a si mesmas (o infinito não cabe dentro do universo finito, por isso se manifesta como tempo, sendo a quarta dimensão espacial). É possível, também, que o vazio infinito cai sempre em si próprio e, sob tensão, desabe no “´átomo prrimordial”, dando origem ao primeiro Big Bang.

O paradoxo de Zenão é resolvido assim: a flecha percorre o espaço-tempo porque ela é o próprio espaço-tempo em Movimento – está e não está parada; pousada sobre si, move-se, cai-se.

 

15.            Multiverso no tempo e no espaço

Retomemos o assunto acima: há o multiverso no tempo, com o nosso universo crescendo e, depois, reduzindo de modo cíclico, para crescer novamente; e o multiverso no espaço, com vários universos separados. Mas podemos fundir no universo no espaço-tempo. Porque o universo se expande? Uma das causas, além das internas, é que outros universos estão contraindo, sugando espaço em alto nível por fusão de seus buracos negros, que sugam o tecido espacial (ainda que lentamente). O problema de os universos separados no espaço não serem empiricamente observável está resolvido porque eles interagem por meio do espaço único deles, caso existam.

Deriva-se, então, outra hipótese. Se 1) todo o destino do universo está determinado desde o Big Bang e se 2) o universo contrai-se e expande-se ciclicamente – então o mesmo universo, exatamente igual, surge e ressurge, repetindo tudo num “eterno retorno”; temos, neste caso, a “reencarnação”, pois reapareceremos no próximo universo fazendo sempre o mesmo. Mas se há processo, além de circular, pode ser que o próximo início, do próximo universo, tenha pequenas variações de começo que mudam todo o destino, as condições iniciais determinam as condições finais. Eis uma questão em aberto, mas que aterroriza o pensamento, logo o meio científico evita tais tipos de questões.

Quanto ao tempo no espaço, espaço-tempo, tempo ser espaço: por que o infinito não pode revelar-se diretamente no finito universo, não nele cabe, logo ele se manifesta como tempo, como fenômeno temporal, indiretamente.

O nosso universo tem fim e é finito nas três dimensões mais o tempo – mas infinito na quarta dimensão. Assim, como no planeta, ir por demais ao leste te leva ao oeste, embora apareça como mágica ou salto numa mente comum capaz de fazer tal viagem cósmica. No mais, existe um centro inicial do universo verificável, pois o argumento de que todo ponto do universo é o centro não se sustenta de todo (apenas no sentido de que tudo estava concentrado, entes de espalhar-se); portanto, possível dizer, mais ou menos, por aproximação, a priori, qual o centro do universo, que tem, nas três dimensões, “borda”.

 

16.            As quatro forças unificadas

Em minha filosofia, temos a tríade, algo hegeliano, e o colateral, nossa atualização, algo que está ao mesmo tempo dentro e fora. Isso parece se confirmar com a unificação das três forças fundamentais (a nuclear forte, a nuclear fraca e a eletromagnética) sem conseguir incluir a gravidade, a quarta. Mas isso é logica, não ciência concreta. Ao que me parece, por tudo ser espaço concentrado para dentro de si chegamos à unificação das quatro “forças”, que não são, na verdade, força alguma (a união faz a força). Assim, a força nuclear forte é a mesma da gravidade, pois é o núcleo atômico concentrado, para dentro de si, caindo em si próprio, mantendo-se unido. A força repulsiva nuclear fraca deriva pela mesma causa, com efeitos opostos, pois a gravidade é também espaço condensado, para dentro de si, na coisa, o que causa repulsão das partes no núcleo, por exemplo.

 

 

17.A unidade do próton

O próton, partícula do núcleo do átomo, é formada por três partículas, os quarks, que, diferentes e opostos, dois para um, se atraem e se repelem. O que mantém sua unidade na sua força forte é o glúon, certa partícula mediadora que transita entre elas. Isso vale também para o nêutron, um pouco mais pesado. Se operamos uma força enorme para arrancar um quark, este ato dá energia, força, tensão, ao material unido, permitindo criar do “nada” (espaço!) outra partícula, pois elas só existem em três, juntas, um sistema orgânico. O ato de arrancar dá condições, como algo elástico esticado, de criar. Ora, se tudo é espaço condensado, talvez tais pequenas entidades estejam ainda por “dentro” do espaço, logo esticar uma delas para que saia do conjunto, dá energia-espaço ao próprio espaço, fazendo brotar dele nova parceira (espaço condensado).

Esta hipótese, além de outras, quebra o ortodoxismo, mas isso não significa que a versão ortodoxa, não esta, está incorreta (o espaço concentrado serve de “cola”). Um novo paradigma muda a forma de ver o mundo, de interpretar os fenômenos físicos, caso, por exemplo, do Efeito Casimir logo acima. Ademais, muitas conclusões aparentemente provadas pela empiria terão de ser revistas, se outro modo de visão surgir. Partículas efêmeras, de pouca duração, surgem simplesmente porque é possível suas existências, sem necessariamente significar que há um campo específico subjacente, caso do Bóson de Higgs, já que todos os campos tornam-se um, o espaço, e é a partícula quem faz seu campo próximo, não o inverso. A matéria torna-se massa, a substância cria seu próprio acidente a partir de si mesmo como matéria-prima, sem a necessidade de campo específico ou da brevíssima “partícula de Deus”, talvez pelo limite imposto pelo espaço “vazio” e “sem” atrito (a metáfora de andar mais lentamente na água é usada para explicar o campo que dá massa, mas pode ser reduzida ao espaço também). Mas é claro que rirão de um marxista metendo a colher naquilo que não domina… Afirmar que o gigantesco colisor de partículas – templo do empirismo e do reducionismo – de pouco serviu também não ajuda. Logo, devemos ter paciência sobre a intromissão, necessária mesmo com seus deslizes, da filosofia no mundo científico.

Diz-se que o campo permeia o espaço; era, se o espaço é algo, logo nada pode permeá-lo, estar com ele, nele em si; a matéria (e luz), por exemplo, existe “ao lado” do espaço, sendo, por isso, espaço concentrado, condensado. Uma consideração lógica como essa já demonstra a inconsistência da teoria de campos. A hipótese dos muitos campos apenas se sustentam, no máximo, como propriedades do próprio espaço, ele mesmo. Temos, em principal, espaço, possivelmente linhas de espaço-campo (ainda que se revelem espaço condensado). As partículas, portanto, fazem seu campo próximo, como acidentes do espaço, este condensando. Assim, as quatro forças são todas espaço condensado, atraindo e repelindo ao mesmo tempo, ou seja, são campos, um só campo na verdade, como o campo gravitacional, sendo, no fundo, este

 

18. Tunelamento quântico

Na memória de computador SSD, faz-se um elétron “atravessar” um isolante ao ser atraído para o lado de dentro positivo do material, isolado – como ele atravessa? É como se uma bola de futebol atravessasse uma parede grossa sem destruí-la. Uma partícula alfa, núcleo de um hélio, dois prótons e dois nêutrons, logo radiação, sai de dentro de um núcleo atómico pesado e instável, mas isso exigiria muito mais energia do que a disponível para ir-se, para ir além da força forte – como ele atravessa? O elétron ao ser atraído, ao ser puxado, força o isolante inatravessável – mas isso faz o elétron desmanchar-se talvez em onda, mas principalmente em espaço, pois energia é espaço, desse modo a barreira não é barreira alguma, pois tudo é feito basicamente de espaço vazio com alguns ponto atômico ligados (o campo próximo do núcleo, do núcleo, que atrai e repulsa ao mesmo tempo, é o próprio espaço, espaço condensado, além de talvez dar a energia extra necessária por repulsão). “Por meio de” e “através de” são o mesmo nesse nível, nesse caso – por meio e através do espaço, do meio. Vejamos outra conclusão, igualmente derivada de nossa filosofia: a “parede” se torna, na outra ponta, a própria “bola” "nova", e a “bola” torna-se “parede”. Do próprio campo próximo surge, sob pressão externa ou interna o elemento que quer transitar, que desaparece aqui e reaparece ali, por mediação. A metáfora da parede e da bola esconde que a ambas são o mesmo, espaço condensado, não apenas qualitativamente diferentes e de modo algum incomunicáveis; a “parede” torna-se  “bola” “nova” e a “bola” torna-se a “parede”.

 

19.Causa da velocidade da luz

A velocidade da luz no vácuo é constante, além de máxima possível. Mas por quê? Ninguém responde, sequer a pergunta é comum. Diz-se que é assim, apenas. Talvez o espaço vazio, por dentro do qual a luz-energia flui, sendo ele, seja o atrito necessário, o limitante. Tal resposta, claro, é insuficiente, mas já é um começo.

 

 

 

20. Princípio da incerteza

 Cumpre notar o princípio, talvez transitório, da incerteza de Heisenberg, que afirma: quanto com mais precisão medimos uma propriedade de uma partícula, menos medimos a propriedade oposta, pois nossos instrumentos afetam o objeto de pesquisa, alterando-o (lançamos, por exemplo, um fóton num elétron, modificando-o). Assim, se medimos com exatidão a posição da partícula, não medimos a velocidade; se medimos a energia, não medimos o tempo etc.

Vejamos uma tentativa, uma pista, para salvação da física. Se tudo = tudo; se energia, tempo, espaço, movimento, matéria etc. são todas iguais e mudáveis uns nos outros, logo podemos saber indiretamente, com algum grau de precisão a medida de uma propriedade por meio da medida e da alteração da sua oposta ou “lateral”.

 

21. O que é a gravidade

Como gambiarra teórica, Newton afirmou que a gravidade era uma força, força atrativa. Depois, Einstein demonstrou que ela é uma curvatura do tecido espaço-tempo, não uma força. Usa-se a metáfora do tecido real que se dobra diante da massa-peso de uma esfera. Tal visão é útil, facilita a compreensão, mas leva também ao erro. Dela, deveria-se deduzir que o planeta está “mergulhado” no tecido espaço-tempo ao seu redor, por todos os cantos – veja bem: isso significa que a massa-energia atrai o próprio espaço-tempo, ou seja, voltamos ao conceito de força! Como resolver isso? O problema se explica porque cada átomo do planeta ou estrela não apenas curva o espaço-tempo, mas é o próprio espaço tempo curvado, para dentro de si, na forma de partícula, o que deforma, ao concentrar, o tecido em sua volta. Se isso está correto, conseguiu-se o mais difícil, aparentemente improvável até aqui: ir além do próprio Einstein, após ir além de Newton. Um adendo: as pesquisas atuais dizem de exoplanetas, planetas em outros sistemas solares, que não possuem a gravidade esperada para seus perfis (!), não se diferenciando tanto da Terra, por exemplo, apesar da variação de massa – isso pode ser uma pista de nossa nova teoria, hipótese na verdade, da gravidade, que não apenas nega, mas guarda e ao mesmo tempo supera a de Einstein. Caso, um hipotético tipo de resposta e solução, as partículas do núcleo do planeta não sejam tão pesadas, menos espaço concentrado, afeta a gravitação de tais partículas e corpos gerais.

 

Façamos uma recapitulação breve de algumas ideias para fazer a dedução devida. Vimos: 1) espaço é matéria, espaço-matéria; 2) tudo, partículas, é espaço condensado; 3) as partículas atraem as outras por serem espaço condensado; 4) as partículas repelem as outras por serem também espaço condensado, formando um campo de espaço próximo; 5) assim, todas as “forças” são a mesma força, a gravidade. Isso significa que a constrangedora semelhança desses dois cálculos clássicos, da gravidade e da carga, no macro e no micro, na verdade é uma consciência real, expõe uma igualdade real, a mesmidade. Vejamos:

 

 


 


 

 

Ora, isso é a teoria de tudo! Façamos apenas dois comentários, adendos possíveis. Um: o campo elétrico e magnético são curvos se vistos de modo amplo porque o espaço é curvo perto da partícula, porque esta é espaço condensado – logo gravidade, mesmo que sob outra forma (as linha da campo são espaço, mesmo se condensado). Dois: para nós, o espaço é contínuo, não discreto; mas talvez ele tenha a forma de linha de campo, assim, por exemplo, discreto num rumo, como da esquerda para direita, dividindo espaço com outras linhas de campo espacial ao lado e colado, mas contínuo em outros sentidos e direções, exato por ser linha[19] (a esperança é que isso seja uma pista para o problema quântico de por que a partícula prefere o desvio para direita, direção do movimento “hiperleve” da linha de campo, linha de espaço, ainda que condensado, além do emaranhamento quântico já citado e proposto – temos, assim, duas possíveis evidências indiretas de linhas espaciais; grosso modo, a terceira pode ser a fenda dupla, pois não há de todo e de fato partícula, e sim uma linha de espaço com “ponta”, que é afetada pela segunda fenda, ondulando-se, partícula-onda, nem partícula nem onda).[20]

Daí semelhanças “apenas” matemáticas curiosas como m.a = |q|.E , isto é, massa vezes a aceleração é igual à carga vezes o campo. O campo acelera, a massa é a carga – e o que mais possa ser deduzido.

 

22. Orbitação do elétron

A teoria planetária do átomo põe o próton no centro com elétrons particulares orbitando o pesado núcleo. Demonstramos que isso é mais do que metáfora, na gravidade como “força” única ou curvatura do espaço, mas a física quântica diz não saber de fato o que o corre e substitui pelo abstrato e não real em si “nuvem de probabilidade” de um elétron estar aqui ou ali. Mantendo em pé a visão planetária da partícula elétron; podemos supor, em filosofia experimental, que a nuvem é de fato uma “nuvem” com o elétron colapsando em campo próximo (e/ou onda circular-esférica – na camada certa), em movimento, desigualmente distribuído e quase espaço; assim, ele engloba o núcleo e, se afetado por um fóton, colapsa-se em – retorna à forma de – partícula por brevíssimo momento.

 

23.A teoria de tudo

No ponto anterior, além dos demais, vemos uma teoria de tudo. Em resumo, tudo é espaço condensado, para dentro de si – o que não significa que este é sempre o primeiro no tempo, embora seja primeiro por sua simplicidade. Temos a igualdade e identidade na diferença de tudo: movimento = energia = tempo = espaço = matéria (= massa = luz = campo). Exigirá um trabalho específico para quantificar tal equação qualitativa. Tudo é espaço-matéria (e luz), tudo = tudo. Conseguimos, assim, colocar a gravidade, a relatividade, no micro, fundindo com o macro, pois tudo é espaço concentrado.

Vejamos uma prova da relatividade, que massa é igual à energia. Quando um átomo decai, libera partícula mais leve, com menor massa, do que a esperada ao mesmo tempo em que sua velocidade, ou seja, sua energia, aumenta. Provou-se Einstein. Mas por que isso ocorre? Podemos suprassumir, não superar, a teoria einsteana. A massa, como propriedade da matéria (como a matéria sendo sua própria propriedade), decai em espaço ou linhas de espaço-campo; logo, tal linha ganha “espaço”, “aumenta”, o que faz com que a velocidade aumente também naquele ponto de espaço condensado, agora menos condensado – a massa, assim, menos pode resistir ao movimento. Tudo é espaço, ainda que condensado. Por outro lado: o espaço (abstrato) deriva das partículas primordiais (concreto) que decaíram e decaem (movimento) - o abstrato é o concreto em processo.

Nossa hipótese natural de que tudo é espaço condensado, logo podendo ser linhas de espaço, pode ser nomeado, para fins populares, teoria das hipercordas e a teoria M – pois unifica criticamente as demais. O espaço é correntes, como a teoria quântica em loop, mas não é; as partículas são cordas, como diz a teoria das cordas, mas não é, pois as cordas-partículas, nem partículas nem ondas, são pontas de cordas de espaço.

 

Ao que parece, se não for um absurdo a formulação, que deriva os 23 pontos acima, conseguimos unificar as soluções e os fenômenos do micro e do macro. Uma teoria de tudo. A dificuldade é se tratar de um caminho feito de modo filosófico, não matemático, por um físico amador. Se está correta, a crise da física, crise esta quase nunca reconhecida pelos seus profissionais, está resolvida no geral. Temos em torno de 100 anos de questões misteriosas pedindo solução, mas sem respostas. Confiou-se no “sucesso” da mera descrição e do uso prático apenas. O defeito era, em parte, confiar em demasia nos dados empíricos, nas aparências, limitando-se a eles e, em parte, a baixa formação dialética dos cientistas.

Deixamos, no entanto algumas questões auxiliares em aberto. Ei-las:

1)      O espaço é contínuo? Ou linhas de espaço discretas-contínuas?

2)      As linhas de espaço seriam não espaço, mas campos próprios?

3)      Como explicar o paradoxo do gato de Schrödinger?

4)      Apenas buracos negros grandes o bastante sugam espaço, tensionando o tecido? Os menores produzem espaço-matéria escura, que decai em espaço-energia escura?

5)      As partículas rompem com o tecido u linha espacial ou são parte direta dela, apenas relativamente autônomas?

 

Uma dose de medição, empiria e especialização alta, incluso matemática avançada, serão exigidos para provar, ao menos no geral, nossas premissas e conclusões. A ideia geral, a igualdade de espaço e matéria-luz – aquele sendo este diluído, este sendo aquele concentrado –, resiste em pé, correta, mesmo que leve a conclusões diferentes, até opostas.

Vejamos um caso, uma pista. Hawking teorizou que os buracos negros “suavam”, ou seja, evaporavam por causa de efeitos quânticos perto do seu horizonte de eventos. Tal radiação seria térmica. Mas, então, nessa forma, a informação seria perdida, algo proibido por princípios da física quântica. Então cientistas pensaram, para resolver tal contradição, que tal radiação seria como “pelos” do buraco negro. Ora, tais “pelos” podem ser pista de que o buraco negro acumula espaço ou campo em forma de linhas, seja absorvendo espaço, seja liberando-o para o meio externo, ou seja, evaporando, produzindo espaço como matéria escura que decai em energia escura, o espaço propriamente dito.

 

EINSTEIN E O TEMPO ONTOLÓGICO

Adoto nesta obra todas as conclusões e premissas de Einstein, menos a ideia de que o tempo é relativo, ou seja, que ele de fato existe. Tempo é espaço em movimento (t=s/v), e matéria é espaço concentrado; logo, o que existe é espaço-movimento. A premissa einsteana de que a velocidade da luz no vácuo é constante é verdadeira, ao menos na nossa época cósmica, podendo a constante mudar em outros tempos; mas a segunda premissa, de que as leis da física são iguais se parados ou em movimento constante cai em erro. Velocidade e aceleração são o mesmo, têm identidade interna (v=a.t); idealmente, a aceleração pode ser decomposta em velocidades instantâneas. Assim, o corpo diminui e a massa aumenta se aumenta a velocidade, mas o tempo é geral, abstrato e absoluto – expressão indireta da quarta dimensão espacial. Reforçamos: a coisa é apenas em seu movimento; se deixa de mover-se, deixa de existir, desmancha-se; logo, mais movimento, mais velocidade – mais preserva-se, mais é-se como por mais tempo.

 

 

 

 

BIOLOGIA E DIALÉTICA

 

O marxismo empolgou-se com as descobertas de Darwin, pois este colocou de vez a história na biologia, a evolução (diversificação) das espécies. Há inúmeras sacadas dialéticas na obra do inglês. Os críticos marxistas mais dogmáticos reclamam que a inspiração darwiniana é o capitalismo e sua economia política. Ora, nada de errado há nisso, em princípio, pois o mundo do capital é o sistema mais dialético já existente no universo, até agora.

No entanto, os biólogos dialéticos Lewontin e Lewin, desde o século XX, propuseram atualizações e correções à teoria, reformas desde uma visão não cartesiana mecanicista, que separa organismo e meio. Vejamos um resumo das muitas entre suas contribuições.

 

A espécie seleciona o meio, o ambiente

Na biologia teórica, comum apenas a espécie se adaptar ao meio, ou ruir. Isso é uma separação cartesiana de meio e sujeito, este como mero objeto da seleção natural. No entanto, se as condições não são favoráveis, indivíduos e espécies agem como sujeitos, migram-se, mudam-se, para outro local.

 

As espécies modificam o ambiente

O ambiente costuma ser posto como dado, ponto final. Mas a verdade é que o ambiente muda a espécie assim como a espécie muda o ambiente.

 

A adaptação é relativa

Os biólogos pensam que o formato do corpo do animal é um estado ótimo, como certa máquina, perfeito. Nada mais falso. A adaptação não é absoluta, antes é relativa, ou seja, o bastante. As nadadeiras da tartaruga são usadas para cavar e enterrar ovos, mas são ferramentas falhas, imperfeitas.

 

A evolução é contraditória

A orelha maior de um habitante do quente deserto faz com que a temperatura seja regulada, mas, por outro lado, facilita ser atacado por carrapatos.

 

 

 

Nem tudo é adaptação

Hegel, ao tratar de fundamentos, na sua Lógica, fala do fundamento como uma casa, em si necessária, mas que pode ter cores diferentes, quadros na parede, enfeites arbitrários etc. Os dois biólogos citados usam tal inspiração. Nem todas as características de um ser vivo são necessárias ou para fins adaptativos e reprodutivos.

Darwin intui no sentido oposto:

 

(…) com base nos conhecimentos colhidos nos últimos poucos anos estou convencido de que se poderá demonstrar depois a utilidade de muitíssimas estruturas que agora nos parecem inúteis e que entrarão consequentemente no âmbito da seleção natural. (Darwin, 1974, p. 74)

 

Mas a verdade costuma ser contraintuitiva – a verdade suporta opostos.

Outro sentido de “nem tudo é adaptação” é que a espécie e o indivíduo são ativos, sujeitos, não só adaptativos sob o risco de se extinguir.

 

Maior reprodução pode ser extinção

Uma espécie que, por mutação, quadriplica sua reprodução pode ser extinta, pois atrai mais predadores.

 

Um gene trata de várias características, uma característica deriva de vários genes “juntos”

Dizer que um gene corresponde apenas a uma, somente uma, qualidade, relação um por um, nada diz, não corresponde ao real, que é mais complexo.

 

As características físicas representam seu meio

A aerodinâmica dos peixes, baleias etc., animais aquáticos, expressa o meio em que vivem.

 

As características físicas são fruto da relação gene, espécies e ambiente

A biologia vulgar pensa que apenas a genética afeta e determina as características da espécie. Mas a mosca tem o aparelho visual mais ou menos complexo a depender da temperatura com a qual conviveu durante sua maturação. Além disso, a prática da espécie também afeta sua morfologia.

Até o ambiente vaginal atua como certo meio que seleciona os melhores espermatozoides.

 

Relação ambiente e espécie

Para a presa, o predador é parte do ambiente. Para o predador, a presa é parte do ambiente.

 

As partes do corpo são interdependentes

Uma parte do corpo pode não se desenvolver muito ou de modo exagerado porque está em relação necessária e mais ou menos proporcional comas demais.

 

            O passado importa (complemento)

            Darei agora uma contribuição que não encontrei de modo claro nos seus textos: o peso do passado como fonte do presente. A mudança muitas vezes depende do passado, da resignificação de seu material e daquilo que já foi, como espinho sendo folhas modificadas e velhos órgãos adaptados para novas funções. A natureza viva raramente consegue criar “do nada”.

 

GENÉTICA

Os genes eram postos como individuais e separados uns dos outros. Hoje somos mais dialéticos, por exemplo, a cor branca de uma flor está associada à saliência típica de suas pétalas – se um muda, o outro muda.

 

PROPOSTAS

Vejamos, agora, algumas hipóteses, filosofia experimental, que derivam de modo natural de nossa filosofia, por dedução. Tais ideias, claro, devem ser demonstradas, após expostas.

 

LEI DA POPULAÇÃO

Darwin inspira-se no erro teórico, para humanos, da teoria da população de Malthus: a população cresce, mas encontra um limite de alimentos, logo deixa de crescer. E se nos inspirarmos na lei de população de Marx sobre o capitalismo? Vejamos. Vamos, mesmo assim, deduzir, de início, um limite fixo de recursos. Assim: mais se reproduzem aqueles que estão mais ameaçados, pois isso ajuda a aumentar a possibilidade de passar seus genes (o que não impede que Darwin também esteja correto – que abundância é que produz mais reprodução). Vejamos uma pista dessa nova lei relativa. A macieira, quando levada ao clima tropical brasileiro, clima este que não é de sua origem, prefere investir em si do que na sua reprodução, pois tem muita luz, água, nutrientes etc. Então, os agricultores nacionais são obrigados a cortar a água da árvore, cortar galhos etc. para estressá-la – então surgem as maçãs novas, ela reage à sensação de ameaça ambiental, à escassez.

 

Hibernar

Na falta de alimentos, as espécies podem hibernar no inverso para guardar energia. Isso diminui o efeito da escassez sobre a população.

 

Estocar

Há um pássaro americano que, ao perceber a chega do inverno, cria enormes reservas de produtos, rumo ao consumo no inverno rigoroso.

 

Variar ração

Espécies podem mudar ou variar seu consumo. Por exemplo, surgiu uma abelha abutre que lida com carcaças.

 

Mudar o ambiente

Ao consumir uma fruta, o animal, depois, defeca fezes e sementes, ampliando extensivamente a quantidade de árvores úteis.

 

Mudar de ambiente

Os biólogos dialéticos Lewontin e Lewin haviam exposto tal movimento.

 

Tamanho da espécie e dos indivíduos

Uma quantidade maior de membros, constantes os recursos, tendem a ser menores, o que aumenta de modo relativo, em comparação, a quantidade de recursos mesmos.  No longo prazo, tende-se a diminuir o tamanho da espécie, pois os menores têm, nesse sentido, mais chances de sobreviver.

 

 

 

Capacidade de armazenar aumentada

Uma falta de alimentos pode levar os descendentes imediatos a ter mais facilidade de armazenar energia, diminuindo a demanda, a procura. No nível celular, isso ocorre por redução do metabolismo causado pelo maior autoenrolameto do DNA.

 

Roubo

Algumas espécies e indivíduos podem se especializar em roubar outras, além de membros da mesma espécie, ou agregar este hábito.

 

Formar bando

Formar grupos permite otimizar o sucesso da caça, afastando a barreira individual da alimentação.

 

Passar a produzir e criar ferramentas

Vez ou outra, uma espécie que não produz, passa a produzir (e o estresse relativo, com a imprevisibilidade, com o movimento, aumenta a cognição). No caso das ferramentas, macacos aprenderam a quebrar cocos e a produzir varetas para apanhar cupins. As abelhas, ou algum ancestral, em algum momento passaram a produzir mel. Na internet, há inúmeros vídeos de pássaros usando ferramenta externa para pescar. O peixe tegastes diencaeus domesticou camarões para nutrir, fertilizar, seu cultivo (!) de algas, sua fazenda.

 

Tais elementos relativizam, contratendenciam, a lei da população na natureza tal como pensou Darwin. No mais, nossa lei da população, oposta à de Darwin, tem prova empírica na própria humanidade: as comunidades mais pobres têm mais filhos, não menos. Aqueles com melhor qualidade de vida, entre humanos, costumam ter menor prole, mesmo tendo mais recursos. A quebra de 1929 levou ricos falidos aos bordeis antes do suicídio; na segunda guerra, os homens engravidavam as mulheres antes de ir ao combate; com o impacto, incluso midiático, da queda das torres gêmeas nos EUA, surgiu uma onda de nascimento algo como 9 meses após o fato. A causa da vontade de fazer sexo e filhos, nestes exemplos, o stress etc., está oculta e inconsciente – a consciência justifica de algum modo ou outro. No caso das árvores frutíferas, os biólogos apenas constatam sem interpretar ou generalizar; muitas árvores do nordeste brasileiro florescem e frutificam quando inicia-se o período de seca, rnenor humidade e mais calor, maior rico potencial; no Piauí, os ipês florescem o ano inteiro diante da temperatura e da baixa humidade, levando à sensação de risco.

Na psicologia individual, acompanhei um “caso” de uma jovem adulta excessivamente sexualizada, mesmo para padrões brasileiros, com imensa dificuldade em manter fidelidade sexual em um relacionamento. Em nossas conversas, suas falas deixavam claro o impacto sob(re) si que teve a descoberta de uma doença degenerativa autoimune. O medo da morte, lidar tão diretamente com a finitude, concluí, foi a base de sua sensualidade acima da média, que guiava sua rotina e relações. Tal pista não foi a princípio tratada como tal; apenas enquanto caso individual, singular e isolado. Necessitei de vários anos e outros aspectos para derivar uma teoria geral.

Os seres menores, quanto menores, mais se reproduzem. Por quê? Porque vivem pouco. Mas algo mais pode ser acrescentado, evitando a tautologia anterior. Seres menores e mais frágeis, ou seja, em estágio inferior na cadeia alimentar em enorme quantidade de casos, são mais estressados, logo se reproduzem mais do que a alcateia de leões. A lógica darwiniana continua em pé no assunto desde parágrafo, porém atualizado.

 

GRANDES EXTINÇÕES E VARIEDADE

Grandes extinções, ao reduzir exemplares, força a copulação entre espécies próximas, não tão, produzindo novos exemplares com o tempo, novas espécies por combinação. Assim, a extinção em massa que leva à redução de espécies, produz também o efeito oposto, dá base para variação. Além disso, grandes extinções aumentam riscos e estresse, estímulo à libido.

 

GENES E CARACTERÍSTICAS

A sabedoria popular do nordeste brasileiro diz “dois pobres feios fazem um bonito”. Assim, por combinação, dois pais de baixa inteligência natural podem produzir um filho superdotado. A combinação é mais rica e inesperada, menos mecânica – embora tendencial.

 

GENES E EVOLUÇÃO

É provável que a totalidade genética tenha elementos “duros”, difíceis de consolidar mutação, e, por outro lado, elementos “fluidos”, mais fáceis de mutar e permanecer alterados (em alguns casos, ativados ou desativados). Talvez seja mais fácil a mutação da cor da pele, ou da asa da borboleta, do que alguma composição do fígado. Por exemplo, a estrutura básica central muta-se com mais dificuldade do que os aspectos em si não centrais. Isso tem seu risco, pois mutações na estrutura fundamental tende a matar o ser, torna-o menos capaz de se reproduzir; então gera a ilusão que as mutações ocorrem mais nas asas etc. Mas é evolutivo que se preserve uma parte “dura” da informação genética, logo nada impede que algumas partes sejam mais mutáveis.

A segunda hipótese é que, embora de modo fraco, o ambiente leva a que alguns genes, uma parte deles, em poucos aspectos e de modo colateral, se regule para se adaptar ao meio, como a geração seguinte à que passou fome ter mais capacidade de absorver e guardar energia.

 

GENES E PERSONALIDADE-COMPORTAMENTO

A biologia vulgar torna o homem como fruto direto do gene, sem cultura. Isso leva, por resistência, ao erro oposto, nenhuma influência genética. Pelo menos entre os humanos, quase tudo vem do meio e da experiência – mas há um efeito minoritário, sim, do gene. Mas, então, vem um giro: a parte genética é ela mesma mediada, o conteúdo genético do “temperamento” é um conteúdo que pode adquirir as mais variadas formas a depender do meio ambiente social. Boa parte dos problemas teóricos se resolvem quando deixa-se de confundir conteúdo e forma, aparência e essência etc.

A verdade é o todo. Portanto, afirmações como “isto é aquilo” são certos e errados porque parciais, não totais. Dizer que “tudo é construção cultural” é tão certo e errado quanto dizer que “tudo é construção biológica ou adaptativa”. Há efeitos biológicos e adaptativos – há cultura e ambiente. Nem pós-modernismo, nem determinismo genético e biológico! O marxismo relacionalista deve ser superado, pois ele considera o corpo enquanto mera carcaça viva.

.

MAL DE ALZHEIMER

Qual a causa do Mal de Alzheimer? Talvez, há várias causas, possivelmente o excesso de açúcar. Mas dois casos, embora pouca amostra, indicam que ao eletromagnetismo em excesso pode causar o fenômeno da degeneração celular cerebral e a consequente perda de memória. É, aparentemente, o caso de Faraday, o cientista que fazia experimentos didáticos com a eletricidade passando por seu corpo – e de uma senhora que, apesar de ainda adulta, não idosa, estava tendo lapsos de desligamento e perda da memória após anos de trabalho com alta tensão de fios de eletricidade. Tais experiências causam “curto-circuito” de neurônios, ou suas degenerações. Ambos os casos são precoces.

 

A CONQUISTA SEXUAL

Embora imensamente alegre com as conquistas de Darwin, Marx usou sua ironia, comum no meio marxista, ao afirmar que o inglês descobriu a sociedade e a economia inglesa na natureza não humana. Assim, o fato de, no ambiente de Londres, os homens ousados cortejarem as, em oposto, educadas e contritas damas, disputando-as entre si, teria o equivalente no mundo natural.

Ora, Marx deixa de ver que talvez o hábito social tenha origem natural, do homem – e da mulher – como animal que é de fato, tal como os pássaros. Temos o natural socialmente modificado ou adaptado. A natureza adapta-se ao e no social.

Mas vamos muito além. A ideia da fêmea passiva deve ser superada. O macho solicita a fêmea, claro. Mas fêmea “solicita ser solicitada” pelo macho, também. Assim, ela atrai e altera o comportamento do macho por seu cheiro de cio, por exemplo. Uma fêmea de gato castrada não mais atrai um macho qualquer para si. Assim, a fêmea perece passiva, mas ela é ativa, até mesmo ela inicia o processo de conquista.

Isso se vê na sociedade ocidental contemporânea, quando se tornou mais comum a mulher tentar conquistar o homem. Mesmo quando a mulher evita a conquista, ela atiça-o, por exemplo, ao mover seus cabelos, dando inconscientemente o sinal para aproximação dele, daquele. Ele, por sua vez, estufa os peitos, em sinal de interesse, em resposta. Tudo, evidente, nem sempre feito com a devida consciência.

Os “sociobiólogos”, amantes do gene egoísta, desesperam-se sociobiologicamente quando lidam com casos em que alguns machos ajudam outro a conquistar a fêmea, sem a comum de fato disputa entre eles. Para eles, egoísmo é igual à prazer; altruísmo, igual a desprazer. Não veem a cooperação como ajuda possível na seleção natural e na seleção sexual. Argumentam, por exemplo, que o pássaro ajudante logo aprende algo, para si. Como são péssimos em filosofia, deixam de ver que o altruísmo e o egoísmo são ao mesmo tempo fundidos e superados pelo mutualismo, pela cooperação, pela ajuda mútua.

Curioso notar que certas cobras machos, ao falharem em atrair fêmeas, toram-se travestis, atraem outros machos por um odor hormonal alterado. Leoas em cio forçam o leão a mais sexo.

Enfim, oferta e procura. Excesso de machos permite à fêmea ter vários parceiros, selecionando-os. Mas grande excesso de fêmeas, por sua vez, com a escassez de machos, faz com que estes tenham várias companheiras, temporárias ou fixas. Nos quilombos antigos, as mulheres tinham vários maridos, uma poligamia delas com monogamia tendencial deles. Se há tendência de uma espécie fazer vingar muito mais fêmeas ou machos, por exemplo, afeta as relações sexuais.

 

PERFIL E ANATOMIA

Em outro momento, demonstramos como – por meio das mudanças hormonais, por exemplo – hábitos, ambiente e perfis, além de em parte a genética, afetam o perfil físico de um indivíduo humano, expressando seu perfil psíquico. Indicou-se que pesquisas observam isso em cachorros e em raposas recém-domesticadas, além de animais de pasto. Pois bem; um leão tem perfil físico-mental de leão, interno e externo; um coelho tem o perfil ou “personalidade” de um coelho. Pode haver, no entanto, diferenças entre eles, quanto mais complexo é o ser, como mais introvertido e mais extrovertido, mais corajoso ou mais medroso etc. Quando se diz que a moral tem senso estético ao condenarmos matar uma borboleta mas aprovarmos matar uma barata – tal senso não é de todo injusto ou arbitrário, tem realidade de fundo. A rejeição física à barata expressa um mal possível.

 

BIOLOGIA E IDEOLOGIA

A teoria das raças humanas fez um estrago em todo o mundo com seu darwinismo social. Ficou famosa a pesquisa feita ontem no tempo histórico: os negros americanos têm QI médio menor, logo a “raça” negra é menos inteligente. A equipe de tal pesquisa, além do seu baixo nível científico, não soube de Machado de Assis e Milton Santos… Hoje, a sociobiologia apela para o determinismo genético, requentando antigas teses. De modo algum é acaso que eles sejam, via de regra, antimarxistas e de direita. A intensão é justificar este mundo e mantê-lo de pé, apesar de todos os imensos pesares.

Podemos provar que, ainda sendo biológico, o ser social fundou algo inteiramente novo.  Repetindo Lukács: somos a única espécie com produtividade crescente (trabalho, produção, energia em busca de mais energia), a única espécie que se afasta das barreiras naturais (sociabilidade e “sociabilidade” dinâmica, do simples ao complexo) e a única espécie que tende a uma interconexão global (linguagem e “linguagem” complexa, interconexões crescentes). O ser biológico é assim – no aspecto de todo e geral do Ser, como dizemos antes, energia em busca de mais de si etc., entre parênteses – de modo geral, não específico, não em cada espécie individual. Mesmo forçando a mão para ver tais aspectos em outras espécies elas não têm os três juntos e na mesma intensidade, que produz salto qualitativo.

O machismo também afeitou muito a “objetividade fria” da ciência biológica. Hoje, sabe-se que não apenas os espermatozoides são ativos no útero; este seleciona e o óvulo guia o caminho daqueles. Já citamos que a conquista também tem o lado ativo feminino entre humanos. Como as leoas, as mulheres também iam à caça nos tempos primitivos, pois era mais importante a ação grupal relativo à fibra muscular mais, homens, ou menos, mulheres, desenvolvidos.

 

NOVA SÍNTESE EVOLUTIVA

A teoria da evolução de Darwin está no polo opostos à teoria genética, logo era necessária uma unificação consistente. O gigante da biologia leu o artigo de Mendel sobre genes, sua pesquisa; mas foi incapaz de ver sua importância, ignorando. Ora; se um animal é igual-semelhante aos demais e aos pais, logo um “texto” replicado e orientador passa de uma vida para outra – os genes, o DNA e o RNA.

Vejamos um exemplo de tal unificação. A mutação opera a unidade íntima de acaso (contingência) e necessidade (causalidade, lei): a mutação ocorre por acidente, acaso, seja por erro de cópia, de replicação, seja por algum raio cósmico, e talvez um etc.; mas logo tal mudança deve se por à prova, ou seja, deve ser verificado se está de acordo com as leis duras da seleção natural e sexual, ou seja, prospera ou deixa de existir com o tempo. A dialética em ato! O acaso pode estar em acordo ou em contradição com as leis cegas e gerais. A teoria da seleção natural-sexual pressiona sempre para o fim da diversidade, o que não tem valor empírico; foi com a genética o momento de ver a realidade como totalidade, que o diverso é necessidade biológica.

 

  

 

SEÇÃO TRÊS

O MÉTODO DIALÉTICO EMPÍRICO DEDUTIVO

 

 

 

LEIS E CATEGORIAS DA DIALÉTICA

 

Antes de debatermos os métodos científicos, vamos à logica das categorias opostas. Falaremos das três lógicas – formal, velha dialética, nova dialética – com demonstrações da realidade e, quando necessário, a diferença entre minha dialética e a de Hegel.

LÓGICA FORMAL

Vejamos as leis desta lógica simples:

1.  A=A, lei da identidade

Algo é igual a si mesmo, um elefante é um elefante. Ele é o começo da ciência: distinguir e classificar os seres. Assim, o finito é finito; o infinito, infinito.

Um dos problemas desta fórmula é pensar o objeto de modo isolado, sem seu contexto, e de modo estático, sem seu processo. A dialética vê a estrutura e o movimento de que depende o objeto.

 

2.  A=A ou não-A, lei da não contradição

Ou algo é finito ou é infinito; não pode o infinito, nesta lógica, ser finito. A fórmula é apenas um consequência natural da anterior.

 

3.  A=x ou não-x, sem terceira resposta, lei do terceiro excluído

Algo é ou relativo ou absoluto. E ponto, e pronto. Não há meio-termo, caminho do meio ou um “terceiro excluído”.

Vejamos nossos exemplos. Hegel descobre que o finito é apenas um pedaço do infinito, aquele está dentro deste, eles são um, não externos um do outro; finito = infinito, ou melhor, igual a si mesmo e ao seu oposto. Mais: a ciência é relativa, ou seja, parcial, incompleta, temporária ou, ao contrário, é absoluta, chega à verdade ela mesma? Ora, há o caminho do meio, a ciência vai rumo à verdade, está cada vez mais correta, por aproximação – entre o relativo e o absoluto, ou seja, um absoluto relativo ou um relativo ele mesmo relativo.

Refutemos a falsidade, embora também correta, da formulação aristotélica. Diz-se: ou a luz (A) é onda (x) ou partícula (não-x), não havendo, portanto, meio-termo ou o terceiro excluído. Ou um ou outro. Mas a física moderna descobre que a luz é uma sobreposição dos dois estados opostos, tanto onda quanto partícula, podendo também ser ora um e ora outro. Curioso que universitários insistam na clássica lógica quando a realidade já a superou.

 

A VELHA DIALÉTICA

A dialética de Hegel diz que

A=A e não-A

identidade da identidade e da não identidade. Ou seja, o finito é ele mesmo e o infinito, o interno é ele mesmo e o externo, energia é ela mesma e a massa, tempo é ele mesmo e o espaço etc. Preserva-se a diferença dos opostos e, ao mesmo tempo, a mesmidade deles, que são iguais, ou em unidade, ou em identidade. Repitamos o caso anterior, pois é paradigmático. Antes, dizia-se que luz (A) é ou partícula (x) ou onda (não-x), sem permitir uma terceira resposta, o terceiro excluído. Mas hoje sabemos que a luz é um sobreposição de dois estados opostos, partícula-onda.

Pensar dialeticamente é, em parte, pensar assim: algo é ele mesmo e seu oposto; ou, senão, pelo menos em unidade com o seu contrário. O repouso é uma forma de movimento, por exemplo.

 

A NOVA DIALÉTICA

Hegel preserva a lógica formal dentro de si e, ao mesmo tempo, a supera. Aqui, preservamos quase toda a dialética de Hegel, além da lógica formal, numa nova dialética, com peso ainda maior ao movimento (diacrônico). A fórmula é esta:

A=A e… não-A.

O infinito põe o finito, o universo; o caos passa, a si mesmo, por não se suportar, para a ordem; o relativo desenvolve-se, tanto quanto pode, para o absoluto (o caminho do conhecimento – A=x e… não-x). O homem (A) é biologicamente determinado (x), mas torna-se, cada vez mais, tendencialmente (…), socialmente determinado (não-x). Demonstraremos melhor a seguir, perpassando a Lógica hegeliana e a nossa.

 

CATEGORIAS CENTRAIS DA DIALÉTICA

1.  Totalidade (integração).

Direto ao ponto: a totalidade é mais do que a mera soma de suas partes, pois ela é a síntese das partes e suas inter-relações. Além disso, a relação da parte com o todo. O exemplo clássico na natureza é este: a água (totalidade) apaga o fogo, mas ela é formada por átomos de hidrogênio, que causam combustão, e de oxigênio, que permite a combustão. Assim, a totalidade tem características que suas partes não têm.

Para saber o que é um próton não basta saber quais são suas partes num colisor de partículas. É preciso teorizar com e para debaixo dos dados.

Mario Bunge redescobriu, sem saber, de modo incompleto, Hegel, ao dizer que não é nem holístico, com a visão apenas do todo, nem individualista, reducionista, que foca no individual e na parte. Chama o foco em ambos como sistemático. Ele acerta, embora não seja o primeiro, mas esquece que a totalidade forma-se, desenvolve-se, movimenta-se. Aliás, a totalidade não é apenas “espacial”, estrutura e sincrônico, pois também é “temporal” processual, diacrônico e com história.

A teoria da complexidade não dá crédito a Hegel. Ela diz que há níveis ontológicos em que um nível apresenta leis e características que não existem no nível anterior, de onde veio (propriedades emergentes). Ora, isso já é conhecimento na dialética! A complexidade é assunto desde o início do século XIX, de modo algum é uma grande novidade.

A categoria totalidade exige, antes, a categoria de integração – numa totalidade. Sem isso totalidade não haveria. As árvores parecem mera coleção e indivíduos separados, mas elas estão ligadas, inclusive ajudando umas às outras, por ligações ocultas abaixo da superfície.

Lembramos que para Hegel e, mais uma vez, para Bunge, séculos depois, o mundo físico (mecânico) não apresenta um caráter de interdependência geral das partes, estas são separáveis e divisíveis. Não dependem umas das outras, não existem apenas por união. Já no nível de imediato seguinte, a química, já existe essa integração necessária. Assim, vamos do não interconectado à conexão universal – ou a internconexão física é demasiadamente leve, difícil de teorizar. Bunge poderia ter poupado neurônios para outras lacunas intelectuais se tivesse lido Hegel com atenção.

Destacamos, ainda, dois aspectos. Um bioma é um sistema que funciona por si, como totalidade. Mas se o homem põe, por exemplo, um animal novo sem predador natural naquela região, todo o sistema se desequilibra. Em um lago organizado e dinâmico, se pescamos e retiramos muitos peixes, o fluxo de matéria e energia se desregula podendo leva ao colapso do sistema inteiro. Na física, com características de química, os 3 quarks que formam o próton apenas podem existir se juntos, unidos, colados pelo mediador, o gluon. Quando se exerce uma energia para retirar uma das partículas, isso gera tensão, logo energia maior naquele local; assim, a energia de arranque gera logo a energia necessária para surgir de imediato outro quarks, mantendo a tríade e a “cola que se estica” (gluon, ou, para minha pesquisa, espaço no mais fundamental). 

Enfim, uma parte, ao ganhar energia, desenvolve-se num todo. Uma parte pode entrar em contradição com o todo ou com este por meio de outra parte, como na disputa energética – o que pode fundar nova totalidade. Um todo, ao acumular energia, torna-se outro todo.

 

2.  Contradição (relação).

Para Hegel, a base do movimento é, em geral, a contradição. Em dialética, apenas é logico o que é contraditório. Mas a contradição está na própria realidade, na própria coisa, não em primeiro no pensamento ou no argumento. Uma estrela como o Sol tende a colapsar para dentro de si mesma por causa de sua gravidade, mas tal pressão gravitacional é produtiva, produz novos átomos mais pesados, logo liberando fótons na direção aposta à da gravidade, empurrando para a expansão estelar; uma estrela dura bilhões de anos em equilíbrio dinâmico, na contradição, entre as tendências de contração e as de expansão. Na biologia, temos o exemplo da “corrida armamentista”: um leopardo corre em busca de um cervo, logo apenas sobrevivem os cervos mais rápidos; porque estes aumentaram sua velocidade média, as novas gerações de leopardos têm de ficar também mais velozes; assim, um e outro se tornam cada vez mais rápidos, geração após geração, por causa do conflito entre ambos.

Os críticos de Hegel e Engels, dizem que o mundo natural tem identidade, diferença, diversidade, até oposição, mas nunca a contradição. Em geral, os pensadores de humanas do século XX foram, ao que parece, péssimos alunos de ciências da natureza. Na biologia, temos a seleção natural, do meio, e a seleção sexual; o cervo macho luta com outro cervo macho pela fêmea, logo quem tem galhas maiores tende a vencer as lutas; mas galhas cada vez maiores por seleção sexual gera peso extra, logo torna-se mais fácil de ser vítima de um predador por causa da dificuldade de correr – eis a contradição. Refutar a contradição como apenas social ou apenas capitalista é fácil, basta evitar a hiperespecialização de nossa época.

Para Hegel, porém, a contradição é externa perante a unidade interna; para Marx, a contradição também é essencial. A contradição, para ambos, é produtiva, não só destrutiva.

Para haver contradição, deve existir, antes, a relação ou a autorrelação. Por exemplo, os biólogos passaram da cooperação na natureza para a lei da luta de modo absoluto e unilateral, mas ambos existem na realidade biológica. A verdade, unidade, da contradição e da cooperação é a relação, relação recíproca ou relação consigo. Tudo apenas é em relação.

 

3.  Movimento (espaço-matéria).

Os antigos pensavam o movimento como circular, caótico ou ilusório. Hoje, sabemos que apenas permanece aquilo que muda – e só a mudança é permanente. Trata-se de, além de saber as leis regulares do mundo, saber também as leis de mudança, de modificação – e até as leis mudam!

Movimento tem dois significados válidos: 1) deslocamento; 2) mudança. Adicionamos o terceiro: 3) mudança por deslocamento. Quando um objeto é muito acelerado, ganha massa e diminui seu volume.

Movimento é processo, desenvolvimento; mais do que mero movimentar; mais do que circular; também em espiral ascendente.

Por outro lado, para haver movimento deve haver o espaço e a matéria (aqui, em sentido amplo), o espaço-matéria.

 

LEIS DA DIALÉTICA

1.  Mudança de quantidade para qualidade;

Hegel usa o exemplo da água: ele torna-se gelo de repente, no salto -  não de modo gradual, aos poucos. A água torna-se cada vez mais gelada, mudanças apenas quantitativas, então salta de qualidade, torna-se gelo, sólida. O marxismo vê também a mudança de qualidade sem salto como a criança que se torna adulta de modo gradual.

 

2.  Unidade, contradição e interpenetração dos opostos;

O átomo é formado por prótons, positivo, e elétrons, negativo. Os sexos opostos devem se unir. A adrenalina serve tanto para lutar quanto, oposto, para fugir. Mais a frente desenvolveremos melhor tal aspecto.

 

3.  Negação da negação;

Hegel usa tal exemplo: a fruta nega a flor, o broto nega a fruta e assim o ciclo continua.

 

 

 

4.  Desenvolvimento desigual e combinado.

As partes de uma totalidade se desenvolvem de modo desigual, em ritmo desigual, não sincrônico, formando uma combinação. Uma estrela, por exemplo, produz elementos pesados no seu centro, mas suas camadas mais externas ainda são feitas de elementos leves. Um feto inicia com desenvolvimento desigual de suas partes.

 

Como dissemos, mantemos de pé a dialética de Hegel, além da lógica formal, mas pesamos a mão no movimento, no diacrônico. Além disso, damos a base que falta à lógica de Hegel com nossa equação qualitativa, em especial aqui, a energia.

 

OBSERVAÇÃO PRELIMINAR: UNIDADE DOS OPOSTOS NO PROCESSO

Hegel tentou unifica as categorias opostas infinito e finito, conteúdo e forma etc. de modo reflexivo, mostrando a unidade interna e oculta delas, que são o mesmo ainda sendo diferentes. Mas ele permaneceu, em geral, estático, não diacrônico. Nesta obra, neste ensaio, demonstramos outros modos de ver tal unidade, como uma categoria passando tendencialmente à outra, ou a energia como base. Mas vamos mais longe: a categoria A é igual à categoria oposta B em processo. Assim, o contínuo (abstrato) é o discreto (concreto) em concentração, concentrado (processo) (veja-se: um feixe de luz aparece como contínuo porque várias partículas, fótons, os discretos, estão em movimento e juntas) – fórmula geral: o abstrato é o concreto em processo. O movimento de uma categoria, ou sua oposta, ou vice-versa, faz que com que haja a unificação delas. Isso é uma revolução na lógica dialética, junto a elementos como considerar a energia no “fundo” das relações categoriais, além da contradição das categorias mais do que apenas a oposição entre elas. Se não todas, quase todas as categorias em oposição externa fazem tal movimento, expressando essa igualdade no processo, o que dispensa uma exposição exaustiva. Os não marxistas não podem mais reclamar que nossa dialética parou na, ainda revolucionária, ainda na vanguarda científica, lógica de Hegel do século 19. Aqui, uma categoria passa para a outra não só no pensamento, também na prática, na matéria, em devir real-conceitual de uma para outra. Sempre que for interessante, daremos exemplos nas ciências, ou seja, no Ser, no objeto, na realidade, contra a exposição apenas abstrata hegeliana e kantiana.

 

 

 

MÉTODO DIALÉTICO

No início do século 19, Hegel tornou-se imortal por sua grande Lógica, o moderno método dialético. Suas contribuições, ainda hoje, em permanência ao que parece, são insuperáveis; uma dialética superior soa impossível. Além disso, deu-se-nos uma dialética materialista, embora de cabeça para baixo. A força hegeliana é o fato, entre o outros, de ser não unilateral, de suprassumir as grandes oposições da filosofia. Este ensaio, portanto, toma a Ciência da Lógica como sua base correta e primeira, mas incompleta. Por isso, também, trata-se de um ensaio.

Quando perguntamos a um hegeliano ou marxista “O que é ou como procede o método dialético?”, logo gaguejam, ficam desconfortáveis, improvisam. De um lado, de fato inexiste um procedimento investigativo fixo, o que perdoa tais intelectuais – na dialética, pesquisar é estar dentro de um labirinto, tentando descobrir o caminho correto; de outro, como disse Hartmann, o método dialético é irmão do fazer artístico, criativo e associativo, que “saca” a realidade até ali invisível.

O método dialético é, em resumo grosseiro, o inverso do método hipotético-dedutivo, ou seja, em linguagem inferior e falha, um método empírico-dedutivo. Parte-se sempre da empiria para alcançar a verdade do mundo, mas, como os dados mentem e escondem, além de revelarem, usa-se a razão para perceber aquilo oculto ou deformado. A partir da e na aparência saber a essência, da e na forma saber o conteúdo, da e na externalidade saber a internalidade, da e na diversidade saber sua unidade, do e no fundamentado saber o fundamento – nunca fora deles, mas neles mesmos. Assim, o empírico faz parecer que há apenas custos de produção somados a um cálculo do patrão para ter um preço de produção de suas mercadorias, mas Marx vai para além ou para dentro da empiria e descobre que há, na verdade, trabalho necessário com trabalho gratuito do operário ou mais-trabalho, valor e mais-valor, exploração e roubo. É verdade que os dados empíricos são vitais e são o começo da pesquisa, como diz o empirismo, mas também é verdade que os dados empíricos, ao mesmo tempo, escondem a verdade e enganam, como diz o racionalismo, logo usamos a razão para ver a conexão interna da realidade, para perceber os enganos da aparência dos dados, para ir além e abaixo ou dentro daquilo empírico.

Eis o método dialético.

Em minha pesquisa, além de procurar nos dados a verdade, evitando a mera descrição, percebi que o marxismo caiu em teorias opostas, em oposições. Minha tarefa, portanto, foi listar as principais polêmicas e, colocando-as em movimento, resolvê-las – com o raciocínio, claro, mas em base à empiria. Eis, de outro modo, o método dialético.

A verdade é não empírica. Descobrimos na pesquisa empírica aquilo que não é palpável, tocável, mas que se revela ao pensamento desde a própria empiria. A dialética é a verdadeira fusão – mais do que mera aglutinação, como é o caso do hipotético-dedutivo – de empirismo e racionalismo; pois ao pensamento deve-se dois lados ativos, após colher o material necessário: 1) perceber os enganos dos dados; 2) perceber a verdade daquilo pesquisado.

Daqui para frente, teceremos comentários e propostas críticas de atualizações da obra Ciência da Lógica de Hegel. Uma crítica possível, mesmo que parcial, tem, de um lado, de agregar o melhor daquilo criticado para si, de outro, acertar o outro exato no seu ponto mais forte, de base – o ser e o nada.

 

SER, NADA, DEVIR

O puro ser é como o puro nada. Vejamos: se o ser não tem qualidade, nem características, nem determinações – ele, enquanto puro, é nada! Já o nada é, logo ele é como o ser! A coisa se mostra assim, numa anedota: tem cara de jacaré, tem olho de jacaré, tem focinho de jacaré – não pode ser um coelho. Assim o puro ser é como o puro nada; são diferentes e opostos, mas estão em unidade. Já o materialismo afirma que o nada amplo não pode existir, que ser não pode vir do nada. Eis que há teses na física que afirmam ir-se do vazio ao cosmos. Em minha elaboração, tal vazio total seria o espaço, o mais próximo do chamado puro ser por ser mais simples, o transparente. Para os físicos, o vazio teria campos e nessa autorelação surgiriam fótons que decaiam em elétrons e pósitrons que, de novo, tornar-se-iam fótons, num ciclo repetitivo até tudo mudar; mas demonstrei em outro local que a energia de ponto zero é, na verdade, autoflutuações do próprio espaço.

É o ser quem põe o nada como nada de um ente. Em nossa equação qualitativa, categorial: nada é ser no devir. O devir do ser, ele em movimento, põe o nada. Ou, se correto, o início do ser é tão simples que ele, sendo como nada, é um nada.

Na matemática, torna-se assim, desde Husserl: o zero é o vazio e o infinito, o infinito e o vazio; um, porém o outro; a relação do zero do conjunto infinito com o zero do conjunto vazio – põe o um. O que é uma lógica da matemática pode ser sintoma da própria realidade, da origem do universo. Talvez, acomode-se na quarta dimensão.

Ir do nada ao ser é nascer; ir do ser ao nada, perecer, processo de morrer. Mas as coisas e vidas, os entes, não surgem do nada, mas de outro ente. O nada no ente é apenas ausência e falta; o que pode ser diferente no nível, do Ser, do cosmos.

A unidade, não identidade, do Ser e do Nada é, para Hegel, o devir, o vir-a-ser, o tornar-se. Nesta obra, o devir é a unidade de matéria e movimento; estes, separados não tem verdade alguma. Destacamos que matéria, aqui, inclui não apenas a matéria na física, pois tudo é matéria – nada existe divino.

Em Hegel, ser não é nada, nada são de idênticos, mas estão em unidade. Para nós, o nada é substituído por energia e sua base, a quarta dimensão espacial, fora e dentro da coisa ou ente.

O vazio infinito, quarta dimensão espacial, não tem porque não se movimentar dentro de si próprio. Ao menos ele tem uma tensão que desaba no finito, funda nosso universo finito.

 

CONCEITO SUPRASSUMIR

Hegel usa a palavra em alemã Aufheben ou Aufhebung para expressar três significados ao mesmo tempo: superar, guardar (conservar) e destruir. São significados opostos, conservar e destruir, na mesma palavra! E é isso que acontece na realidade (como o devir, viar-a-ser, como o suprassumir do nada e do ser).

O socialismo, por exemplo, destrói de fato o capitalismo, mas, ao mesmo tempo, o preserva – e também o eleva. O capitalismo não apenas simplesmente superado ou destruído – é suprassumido.

 

A DIFERENÇA E O MESMO

A dialética é uma filosofia ao mesmo tempo da diferença e da mesmidade. Ser e nada são de fato diferentes e, ao mesmo tempo, o mesmo. Causa e consequência são diferentes e são também o mesmo. Finito e infinito são diferentes, mas são o mesmo. E assim por diante. Em todas as categorias duplas que trataremos daqui em diante é preciso ver a unidade delas na diferença.

Essa é a dialética. Por exemplo: Lenin errou ao apenas opor a luta econômica (por salário, etc.) contra a luta política, como se esta última fosse a realmente válida e superior. Ora, a luta econômica é política e, ao contrário, a luta política é econômica. A grande luta política de 2013 no Brasil produziu uma onda de greve., por exemplo.

 

SER AÍ, ALGO E OUTRO

O devir, como unidade de ser e nada, passa para o Ser aí.

A determinação torna-se QUALIDADE, ou seja, determinação que é aí. Por sua vez, a qualidade torna-se REALIDADE.

Observemos bem: se determinação torna-se qualidade e, depois, realidade – e se determinação é negação –, então a própria realidade é negação. A realidade é negação de outra realidade.

Na realidade, o ser vai para dentro de si mesmo, torna-se ALGO.

 

ALGO E OUTRO

Algo passa por mudança qualitativa e torna-se Outro. Este Outro é, assim, um Algo que também passa para um Outro – ao infinito.

Aprofundemos

Temos um livro e uma caneta. Se um livro é algo, logo a caneta é outro (o outro do livro). Ora, isso é artificial, pois a própria coisa não está nos dizendo se é algo ou outro – somo nós arbitrariamente que decidimos isso. Mais abaixo, vamos resolver esse problema.

Os dois, livro e caneta, são algos e, ao mesmo tempo, os dois são outros (cada um é o outro do outro). Se o primeiro é algo e outro e o segundo também é algo e outro – logo eles são o MESMO. Vamos para o exemplo. No começo de O Capital, Marx fala de uma dúvida de Aristóteles: é possível trocar 3 sofás por uma casa, mas casa e sofá são coisas completamente diferentes! Como coisas diferentes podem ser iguais? Aristóteles não soube responder, disse que era apenas um artifício mental. Já Marx resolveu o problemas ao dizer que eles são também o mesmo, são igualado, porque são ambos frutos do trabalho humano – três sofás tem tanto trabalho humano quanto uma casa.

Aprendido isso, avancemos.

Como fazer com que o algo não seja outro, com que seja de fato algo – e que o outro seja de fato outro? A consequência é de fato o outro causa, por exemplo. Vamos para o reino místico: a alma, se existisse alma, é de fato algo e corpo da alma é de fato o outro. Veja que algo, uma pessoa, dividiu-se em dois algos, alma e corpo, um sendo verdadeiramente  algo e outro sendo verdadeiramente outro. Isto ser algo e aquilo ser outro já não é uma decisão artificial, uma escolha.

 

SER EM SI E SER PARA OUTRO

Como algo divide-se em dois algos, que são também algo e outro, ocorre que eles se tornam ser em si e ser para outro. O ser em si é o ser dentro de si – enquanto o ser para outro é externo, digamos. Na metáfora da alma e do corpo, o ser em si é a alma e o ser para outro é o corpo pertencente à alma (por isso, para outro).

Há ainda outra interpretação. Os dois algos, separados um do outro, nesta relação são, cada um, ser em si – ou seja, independente do outro, sem relação com o outro, relacionado apenas consigo mesmo. Mas cada um é, por outro lado, ao contrário e ao mesmo tempo, ser para outro – ou seja, ser que está nessa relação com o outro.

 

DETERMINAÇÃO, CONSTITUIÇÃO

A determinação é, por exemplo, o fato de uma bolsa ter a determinidade, para dentro, de guardar objetos; ele é um só com a sua constituição, que são o mesmo. O que nos interessa é que se põe na determinação a ideia de núcleo. O átomo é determinado pelo seu centro, formado de prótons e nêutrons, sendo a quantidade do primeiro o que determina a natureza primeira de uma partícula atômica. O núcleo preserva-se enquanto os elétrons em volta dele sofrem as ações do meio externo, ao menos de modo mais direto. O núcleo desenvolvido da vida complexa é o cérebro; na célula, evoluiu-se dos seres procariontes, sem núcleo, para seres eucariontes, com o código genético determinante protegido.

A constituição pode revelar-se como tal ao fundar a determinação, e este último torna-se a si mesmo com a construção da constituição.

 

LIMITE, MAU INFINITO, O INFINITO QUALITATIVO

O infinito qualitativo exige uma dimensão, digamos, para dentro, uma quarta dimensão espacial. Tal dimensão, se existir, manifesta-se como tempo e como energia. O infinito está já aí sendo o finito apenas seu exemplar cósmico – o infinito está diante de nós, no meio de nós, não avançamos até ele. O bom infinito produz o mau infinito dentro de si, o infinito da progressão. Este infinito ruim se expressa na natureza como com a altíssima reprodução de gafanhotos, formando uma nuvem, comendo tudo em sua volta, logo faltando depois comida (energia) para sua própria sobrevivência, passando assim por algum tempo do nível de equilíbrio de sua população.

Aqui vermos o erro de Hegel ao esquecer o conteúdo. O que é infinito, o infinito, senão o espaço? Ele abarca o finito dentro de si, além de o formar. Quando a Lógica diz que o Ser passa a ter a determinação da infinitude, diz apenas que o espaço, como o vazio, está no centro da ontologia. Finalmente, resolvemos a questão, encontramos o fundo.

Se o infinito produz o tempo, manifestar-se como, a hipótese insistente de muitos sobre o tempo produzir o espaço, não o inverso, ganha novo significado: o infinito produz as três dimensões, ou melhor, as quatro. Curioso notar que a garrafa de Klein, sem externo nem interno, tal como a fita de Möbius, tem uma dimensão a mais; e, nestes casos, os “lados” são uma quase ilusão ao se focar na parte, no pedaço, não no todo – o que aponta para as três ou quatro dimensões como pedaços do infinito, parcialidades relativas.

Nossa teoria atual e os dados dizem que nosso universo é finito. Mas se ele tem fim, há algo depois de si e este também tem algo, como outro universo, depois de si – ao infinito. O problema é a concepção de infinito como uma linha reta cada vez maior, sempre podendo avançar mais, ou seja, o mau infinito, da progressão contínua, pois encontra um limite-barreira e o supera, encontra outro e o supera, e assim por diante. Como dissemos, o infinito como um círculo sem começo nem fim hegeliano tem por resposta prática a quarta dimensão espacial-temporal. Nosso universo é finito, mas infinito quando visto “para dentro”, além da possibilidade de haver outros universos irmãos. O universo em 3 mais um tempo dimensões, finito, tem a pulsão extensiva, amplia-se, um finito que quer ser infinito, má infinitude.

A ideia de que há infinitos maiores do que outros também cai na má infinitude do progresso. Mesmo uma teoria errada pode ser desenvolvida ao limite, como é o caso.

 

UNO E VAZIO – ATRAÇÃO E REPULSÃO

Para Hegel, o infinito real desaba no uno, no ser para si. Ou seja, ele é um dos precursores da teoria do Big Bang e da concussão de que uma estrela expande-se e contrai-se num ciclo de repetição.

É provável que o infinito, aqui exposto como quarta dimensão espacial, forme nosso universo, como o núcleo pequeno e denso do primeiro Big Bang.

O que é vazio para Demócrito e Hegel, para nós é espaço. O uno, para ambos, é o mesmo que o vazio; para nós, o mesmo que o espaço, só que concentrado, como partícula e onda. O universo expandiu-se porque a matéria e a luz decaíram em espaço, facilitando a expansão, repulsão. Para Hegel, a relação do vazio com o uno (átomo etc.) é a causa da transformação do único uno em muitos unos, no múltiplo. O movimento, ao menos, está correto. O Big Bang foi uma expansão, as estrelas como exemplo de unos explodem em uma nuvem cósmica de partículas (os muitos, o múltiplo, os muitos unos). Mas Hegel foi além: a repulsão do uno único dá lugar à atração dos novos muitos unos; ou seja, o universo voltará a unificar-se como no seu começo e a nebulosa que surge da explosão da estrela reúne-se mais uma vez, e de novo, numa nova geração de estrela.

Aqui, Hegel antecipa a teoria das estrelas e a do Big Bang, assim como a crítica superante desta última. Kant primeiro considera as partículas estáticas e apenas depois adiciona a repulsão e a atração nelas, teorizando a origem do Sol e de seu sistema. Hegel, de modo lógico, foi mais longe, pois havia antes outra estrela, outro Sol, que se expandiu, explodiu-se, e formou as tais partículas das quais começa Kant.

Entre outras genialidades, duas se destacam neste ponto, entre elas: o Uno é produtivo. O animal é produção de energia, a estrela produz novos elementos químicos, a fábrica produz etc. Minha tese é a de que os buracos negros também são produtivos sob suas condições extremas como, talvez, transformando espaço em matéria ou elementos químicos excessivamente pesados estranhos.

As descobertas e as teorias modernas reforçam Hegel, mas ainda há outro ponto: o isolamento do para si do uno na repulsão parece como sua afirmação, ao isolar-se dos demais, mas é sua negação, exato por seu isolamento. Por excesso ou fata de energia, como um átomo isolado, precisa ligar-se com os demais para de fato afirmar-se, em comunidade. Na biologia, uma árvore cresce melhor na floresta do que se isolada, pois a presença de outras espécies torna seu ambiente mais saudável, como maior disponibilidade de energia na terra.

Para fazer jus, o primeiro filósofo a pensar algo como um Big Bang, onde algo concentrado dispersa-se no cosmos foi o grego Melisso de Samos:

 

Com efeito, quando o Todo se dissolve em seus elementos sob a ação do Ódio, o fogo se une em um todo e cada um dos outros elementos. Inversamente, quando de novo sob a ação do Amor, há redução ao um, e as partes são forçadas a se separarem outra vez em cada (elemento). (pré-socráticos, p. 203)

 

São palavras de Aristóteles sobre Melisso que demonstram a poderosa intuição científica, recuperada em nosso tempo.

 

O ISOLAMENTO DO PARA SI

Quando o Uno (um) desmancha-se, dissolve-se, fragmenta-se, ou seja, ocorre a repulsão de si mesmo, surge os vários unos, os muitos (múltiplos). Cada uno novo nega o outro uno, isola-se. Mas esse isolamento, que aparece como sua afirmação absoluta, é na verdade sua negação, sua destruição. Ele somente consegue afirmar-se de verdade em comunidade, em união, em atração. Assim, uma pessoa isolada passa por instabilidades físicas e mentais – somos um ser social. Assim, um átomo isolado é instável, logo, para resolver isso, ele se liga a outros átomos formando moléculas. Darwin descobriu que a planta desenvolve-se melhor se agrupada com outras plantas, de outras espécies. Ademais, sabe-se hoje, as árvores têm uma conexão abaixo da superfície por onde trocam nutrientes e informações, ajudam umas às outras etc.

 

SIMPLES E COMPLEXO

Engels, em sua Dialética da Natureza, tenta demonstrar que o simples é, ao mesmo tempo ele mesmo e o seu oposto, o complexo, A=A e não-A. Assim, uma célula viva é simples, mas muito complexa quando observada por outro ângulo, dentro de si, pois é todo um grande sistema interno. Nossa nova dialética, além disso, inclui o momento do simples rumo ao complexo, A=A e… não-A. Assim, o ser vivo simples, unicelular passa para um ser composto, complexo, pluricelular, como a água viva e um elefante.

 

INTENSIVO E EXTENSIVO

Hegel diz da identidade de ambos, intensivo e extensivo. Um grito mais intenso, por exemplo, torna-se ouvido numa extensão maior. O que unifica os dois opostos é a energia, mas esta sendo limitada para o uso gera uma contradição, a afirmação energética do intensivo reduz a extensividade e vice-versa.

Uma estrela com mais intensidade de energia poder ser muito menor que uma com menos energia, pois produz mais gravidade, maior curvatura do espaço.

As quatro “forças” fundamentais da física são apenas um, similares à gravidade, talvez excluída apenas a nuclear fraca, responsável pelo decaimento do átomo. A gravidade é a força mais extensa, logo a mais fraca em intensidade; a nuclear forte, que mantém o núcleo do átomo unido, é a mais curta, logo a mais intensa – além de ser a mesma da gravidade em proporções de intensidade e extensividade diferentes e opostas, como espaço condensado, para dentro de si.

Para Hegel, o intensivo corresponde ao nada – para nós, a intensidade é, em primeiro, energia. Logo, o espaço-tempo, como matéria em principal, é a extensividade. Mas a intensidade é, também, espaço-tempo condensado; mas a extensividade é, também, energia que se propaga. Temos a unidade do intensivo e do extensivo.

A intensividade passa para a extensividade, vice-versa, a extensividade passa para a intensividade.

 

 

CONTÍNUO E DISCRETO

A realidade é fluido ou feito de partículas? Ambos. A união de partículas, uns, unos, forma algo contínuo, como a água contínua é formada por moléculas discretas. A energia permite a separação ou a união dos unos, dos discretos, formando algo contínuo. O espaço é tanto contínuo quanto discreto, o que pode ser visto, uma solução, pela teoria da gravidade quântica em loop, que defende o espaço ser como correntes cujas partes estão ligadas umas às outras.

Como o contínuo tem fim, tem borda, ele é ao mesmo tempo discreto.

 

SALTO DE QUALIDADE

Engels diz que a natureza não tem salto porque ela já opera por saltos. Como dissemos, a água não se torna gelo aos poucos, mas salta para tal estado após esfriar-se muito. Mas há saltos por sobre etapas na natureza? Porque há etapas necessárias é que pode haver saltos por sobre elas. Primeiro, surgem as estrelas, ao juntar a matéria por gravidade, e depois, os buracos negros. Mas a computação moderna demonstrou que no início do universo partes dele colapsaram diretamente em pequenos buracos negros. Na biologia, dados empíricos de salto por cima de etapas é dificílimo de conseguir, mas deve haver.

O salto de qualidade ocorre por ganhar ou perder energia, de modo absoluto ou relativo.

 

QUALIDADE E REARRANJO

Para dialética, a coisa ocorre assim: mudanças de quantidade nada afetam a qualidade, mas, chega-se a um ponto em que mudanças altas de quantidade produzem uma mudança qualitativa – salto de qualidade por mudanças de quantidade. Caso famoso da água que congela de uma vez ao esfria-se muito. As diferenças de qualidade são diferenças, no fundo, de quantidade: a diferença da luz vermelha para a violeta é a de quantidade, de frequência; a diferença qualitativa de átomos diferentes é a diferença quantitativa da quantidade de prótons e elétrons de cada um. Pois bem; há outro modo de diferença qualitativa que exclui a quantidade em si – o arranjo ou rearranjo dos elementos constituintes. A diferença qualitativa do diamante e do grafite não é a quantidade nem o tipo de partículas, que são iguais para ambos, mas a forma em que elas estão organizadas. Na hipótese da teoria das cordas, as partículas são cordas unidimensionais em que seus formatos-arranjos, se abertos ou fechados etc., importa para o que são. A primeira das três fases do socialismo é, grosso modo, um rearranjo – nova forma de organizar e hierarquizar os elementos – da última fase do capitalismo.

Na obra O Capital, de Marx, este usa de modo inconsciente nossa formulação: primeiro, reúnem-se, a partir do capitalista, diferentes artesãos na oficina comum, cada qual com sua tarefa – todos fazendo, por si, alfinetes, por exemplo; depois, surge, por isso, o rearranjo das partes, pois, no lugar de trabalho mais isolado, cada trabalhador não faz uma agulha por si, mas uma das partes do processo de produzir agulhas – da cooperação simples à cooperação complexa, manufatura. Salto qualitativo sem mudança em si de quantidade.

Tal formulação é tão gritante que duvido ter sido o primeiro a formulá-la, mas, ainda assim, não conheço nenhum autor que a tenha exposta, tanto mais no modo como fiz acima.

No mais, mudanças quantitativas causam mudanças de arranjo, logo qualitativas.

 

SALTO PARA SI

Na física, temos três tipos de neutrino, cada um mais elevado, mais pesado (com mais energia), em relação ao outro, mas ainda neutrinos, três sabores: neutrinos do Elétron, neutrinos do Múon e neutrinos do Tau. Como se o geral fosse o mesmo, ainda que diferentes e “maior” em certos aspectos e no particular.

 

CAOS E ORDEM

O caos não suporta a si próprio e, nessa autointeração e autorrelação caótica, não tendo lei alguma, tem a lei de passar a si mesmo para seu oposto – a ordem. O caos, por ter uma lei que não é lei, tem como se a ordem dentro de si. A ordem, que veio do caos, por outro lado, ainda é dinâmica, por isso tem como se o oposto, o caos, dentro de si.

Na coisa, a ordem é preenchida pelo caos; mas não há separação por uma parede entre caos e ordem dentro dela, logo a coisa é unidade de ambas ao mesmo tempo. Isso se vê na previsão do tempo, que deve ser sempre curta.

O caos absoluto é liberdade negativa; e é um sistema, porém não sistemático. A unidade de caos e ordem cai-se na probabilidade.

O socialismo é a ordem, como liberdade positiva, ou seja, é de um lado uma economia central e democraticamente planejada e, por outro, uma livre associação dos produtores.

O caos é mais do que mero acaso, pois é acaso enquanto totalidade.

Com o tempo, a Lua e a Terra se sincronizaram para que a rotação da Lua em torno de si esteja com o mesmo lado sempre direcionado para o nosso planeta. Na biologia, nos estágios iniciais de uma comunidade, formada por várias espécies em determinado espaço, há instabilidade; depois, com o seu avanço, adquire estabilidade, como população constante, e tudo o que a comunidade consome é por ela mesma produzido.

Dentro da ordem como a totalidade, reina o caos relativo.

.

SOBRE A PROBABILIDADE

A probabilidade revela a contradição de ordem e caos no mesmo. Há que separar o resultado geral do resultado particular. Em 2014, percebi que o governo Dilma, por causa das circunstâncias, iria cair, isso é o geral como resultado. O modo como iria cair poderia ser vários: 1) golpe, 2) renúncia, 3) impedimento, 4) protestos dos trabalhadores, não da classe média. São formas de cair. Há uma quinta forma de derrubar o governo, embora o mais improvável, o governo mudar radicalmente a politica e mobilizar nas ruas para impedir o processo; conhecendo-se a tradição pelega do PT, era pouco viável. O capitalismo cairá, isso é determinístico, mas a modo de cair, se vai ao socialismo ou à barbárie, ou à extinção, é algo em jogo.

O erro do paradigma do mundo como certa máquina, ou computador, ou relógio, não como sistema orgânico, leva ao foco na coisa, como um dado ou moeda. Ora, no dado perfeito ou moeda ideal, o que acontece é acaso, aleatoriedade, além de possibilidade, não probabilidade como algo de ½ de ser cara ou coroa. Já no sistemático há, de fato, probabilidade ou possibilidade crescente.

 

INFINITO QUANTITATIVO

Antes, tratamos da má infinitude qualitativa; agora, o oposto, trataremos da má infinitude quantitativa. Perceba que o quantum ou quanto, como quantidade sem limite em si, pode ir para o infinitamente grande ou infinitamente pequeno. Sempre há um número maior do que o qualquer outro. Avançar para um número maior faz com que suja a má infinitude quantitativa. Na má infinitude da qualidade, algo supera sua barreira e se torna outra coisa – a semente é limite e barreira de si mesma, e supera-se tornando-se broto, depois planta, etc. No quantitativo, ao contrário, essa mudança não ocorre: a passagem de 5 para 6 não muda a qualidade, apenas a quantidade é alterada. E torna-se algo repetitivo: 6, 7, 8…

Pequemos o Número 8: ele é um quanto ou quantum. E o que existe além de dele, fora dele? Existe o infinito da quantidade, do 9 adiante. Então temos o finito, de um lado, e seu oposto, seu além, o infinito, de outro. Esse finito tem natureza oposta, tem duas determinações opostas: 1) ele é uma quantidade determinada, por exemplo, 8; 2) mas tem o impulso irresistível de ir ao infinito, ou seja, de tornar-se 9, 10…

Quando separamos o quantum, quanto, e seu além, o infinito, descobrimos uma relação de opostos – o quantum e seu além. Mas Hegel faz uma bela manobra: o além, onde está o infinito, é também um quantum! Logo surge uma relação entre 2 quantum, entre duas quantidades. Então entramos no próximo tema: a relação quantitativa. O quantum tinha um limite apenas indiferente, quer dizer, ele poderia simplesmente saltar de 8 para 9, para 100… Tanto faz.  Mas, agora, limitado por outro quantum externo a ele, ele torna-se um quantum determinado, uma quantidade determinada e limitada por outro quantum.

 

RELAÇÃO QUANTITATIVA

Vamos tratar de quantidades, de quantum, que só têm sentido em relação um com o outro, nunca isolados. São três tipos de relação: a direta, a inversa (ou indireta) e a de potências.

Vejamos a relação direta. Se pegarmos números como 4/2, quatro sobre dois, temos uma relação em que o 4 e o 2 só têm sentido nessa relação. A divisão dá 2. Mas podemos mudar a quantidade, mantendo o mesmíssimo resultado (chamado expoente por Hegel): 6/3, seis sobre três, que também é igual a dois. O mesmo resultado, a mesma natureza, é expresso em quantidades diferentes.

Vejamos, agora, a relação inversa. Se dizemos que 3+2=5, podemos dizer, também, que 4+1=5. Se um número cresce, o outro número cai – e vice-versa. Simples assim. Um número nega o outro para manter o mesmo resultado, 5. O limite dessa relação é igualar ao resultado, como 5+0=5. O último 5 aparece como limite, como barreira, além do qual está o infinito.

Por último, vejamos a relação de potências. Se dizemos 22 ou 23, dois elevado a dois ou dois elevado a três, dizemos, então, que o 2 está em relação consigo mesmo como se fosse relação com outro, 2x2 ou 2x2x2. Essa relação consigo mesmo na potência é o quantitativo retornando para o qualitativo – o quantitativo qualitativo ou o qualitativo quantitativo.

Para passar ao próximo ponto, digamos algo especial. O quantitativo, inicialmente, aparece como aquilo que pode subir e descer sem limite, sem mudar nada. Mas a quantidade é verdade da qualidade. Para subir e descer como queira, o quantitativo deveria pertencer a algo que não muda nenhum pouco nesse subir e descer – mas isso nunca existe. A mudança de quantidade chega a um ponto em que muda a qualidade daquilo ao qual ele pertence – por isso chegamos à medida, unidade da qualidade e da quantidade.

 

UMA INTERPRETAÇÃO

O marxismo percebeu que quantidade e qualidade podem entrar em contradição. Vejamos dois casos. Para vender mais quantidade de mercadorias, os patrões fragilizaram a qualidade das mesmas mercadorias para forçar o consumidor a logo comprar um novo exemplar. Hoje, a produção científica se mede pela quantidade de artigos publicados, mas isso diminui a qualidade de tais artigos, pois produzir algo relevante leva tempo. Como a quantidade vem da qualidade como sua base, ao deteriorar a qualidade, a quantidade acaba, por fim, a deteriorar a si mesma – embora de início a medida tome partido da quantidade, tal contradição tem de ser resolvida por causa da deterioração do seu oposto, logo de si mesma.

 

MEDIDA

O que os qualitativamente diferentes têm em comum enquanto diferença apenas quantitativa por debaixo que faz a diferença qualitativa é a energia/espaço-tempo de cada um. O que torna as mercadorias iguais é a quantidade de trabalho nelas, de elas serem fruto do trabalho humano (lembremos que energia é capacidade trabalho).

Na medida, Hegel diz que tudo tem a medida necessária, não arbitrária – e uma alteração importante na medida, destrói ou muda o ser aí. Pois bem; isso está relacionado com energia (em busca de mais de si) e espaço-tempo (condensado). As coisas inorgânicas têm sua proporção dada pela quantidade de energia concentrada. Na biologia, os animais não podem ser grandes em demasia, pois o calor gerado seria imenso, inadministrável; além disso, outro exemplo, as células não podem crescer tanto porque a relação de volume e superfície, aquele acima deste, limita a relação com o ambiente, dificultando trocas para com ele, limitando a energia. No social, o inchaço do Estado nas crises sistêmicas exigiu deslocamento de espaço-tempo condensado e energia de sua base necessária, por exemplo. Vejamos um exemplo mais próximo. A Coreia do Norte não produz alimentos e materiais como petróleo com suficiência, o que dá base para o regime autoritário, ou seja, não produz energia suficiente para homens, outros seres vivos e para as coisas; por isso, por salto, teve de compensar produzindo energia nuclear para bomba atômica, assim atraindo recursos para si em forma de chantagem internacional.

Outro ponto é que, para muitos, por suas naturezas concretas muito diversas, maçã, por exemplo, não é igualável à xícara. Ora, ambas têm energia, logo certa quantidade de maçãs têm tanta energia quanto certa quantidade de xícaras. Em nível inferior, a quantidade de elementos atômicos também são iguais sob certas proporções de uma e outra.

 

POSITIVO E NEGATIVO

Vejamos. 1) o nem positivo nem negativo 2) passa para a oposição contraditória do positivo e negativo; 3) então, dessa dialética, surge um novo nem positivo nem negativo. Eis o movimento puro e uma pista para o pensar científico.

Para Hegel, o nem positivo nem negativo estava apenas ao mesmo tempo com o positivo e o negativo. Uma estrada vai, ao mesmo tempo, para o leste, positivo, e o oeste, negativo; mas estrada mesma é nem positivo nem negativo, abarcando os opostos dentro de si; o átomo neutro tem dentro de si o positivo e o negativo. Nós vamos mais longe, mantendo a contribuição estática hegeliana.

No início do universo, a matéria decaiu do nem positivo nem negativo para uma sopa quente de prótons, positivos, separados dos elétrons, negativo. Com o esfriamento do universo, a atração dos opostos permitiu a união do positivo com o negativo, do próton com o elétron, formando átomos completos neutros (nem positivo nem negativo). Veja-se que o átomo neutro tem dentro de si os opostos, o positivo e o negativo. Também os opostos, elétron e próton, podem se fundir formando o nêutron. Existe na física a polêmica sobre se o neutrino, uma partícula pequeníssima, tem um antineutrino, um oposto, ou se, outra hipótese, ele é a antipartícula de si mesmo; talvez seja melhor afirmar que ele é “nem positivo nem negativo”, diferente do elétron e do próton. Um fóton, sem carga, de alta energia divide-se em elétron, negativo, e anti-elétron ou pósitron, positivo, e, atraindo-se, colidem e tornam-se um novo fóton, também sem carga, nem positivo nem negativo.

 O próton e o elétron atraem-se porque são opostos, no nível externo, mas porque são o mesmo, no nível interno. Ambos são completos incompletos, pedaços de algo antes uno (nêutron). Já que são partes, além de proporções gerais diferentes, um cai no outro com facilidade; mas como cada um, sendo parte, é também um inteiro, o elétron e o próton afirmam-se, têm fronteira, um não cai no outro como deveria. A fronteira também se dá pelo motivo de ambos serem espaço condensado, com campo próximo próprio. O mesmo fato da atração, ser espaço concentrado, causa a repulsão, ser algo em si como espaço condensado.

A contradição entre o positivo e o negativo revela-se no exemplo da contradição entre proletariado e burguesia. A contradição de elétron e antielétron se dá porque, na atração, cada um afirma-se diante do outro – mas exato isso aproxima.

Na biologia, os primeiros seres reproduziam-se por si, assexuadamente, e, por intermédio do herrmafrodismo, surgem seres mais complexos com sexos opostos. Nestes, os opostos, que podem disputar, por exemplo, espaço e energia, unem-se num nem positivo nem negativo para a reprodução dos genes e da espécie.

Os opostos externos atraem-se porque são, no fundo, semelhantes, pois semelhante atrai semelhante.

 

A REGRA

A regra é uma forma de medir exterior, fora, daquilo medido. Mede-se, por exemplo, o tempo como uma forma de medir os segundos, os minutos, as horas, etc.

 

A MEDIDA ESPECIFICANTE

Agora, a medida específica de algo: diz, por exemplo, qual o tempo específico daquele objeto, daquele evento.

 

RELAÇÃO DE AMBOS OS LADOS COMO QUALIDADES

Para pensar o título deste subcapítulo, pensemos o seguinte cálculo: velocidade é igual ao espaço sobre o tempo – v=s/t. Para medir a velocidade, uma qualidade, eu preciso medir, dizer o quanto, de duas outras qualidades, o espaço e o tempo. Na fórmula, parece importar apenas a quantidade, não a qualidade, do espaço e do tempo – mas eles estão aí como qualitativamente por "detrás".

 

O SER PARA SI DA MEDIDA

O ser para si da medida é que, por exemplo, o cálculo da medida, como v=s/t, refere-se às características de algo, de um objeto, de um momento, de certa matéria, de uma coisa.

 

 

 

COMBINAÇÃO DE DUAS MEDIDAS

Como a medida se refere a algo, duas medidas se combinam. Vamos ter de dar um exemplo do capítulo 1 d'O Capital de Marx, onde ele usa as próximas observações para demonstrar o desenvolvimento lógico e histórico da mercadoria rumo ao nascimento do dinheiro.

Nos povos antigos, não existia dinheiro. Dentro das tribos, as coisas não eram exatamente trocadas, mas apenas compartilhadas. Foi quando começou o contato entre uma tribo e outra, na fronteira entre aqueles povos, que começou a troca, o escambo -- produto por produto, mercadoria por mercadoria, de uma tribo para outra, e vice-versa. Aí não havia dinheiro algum: aquela mercadoria media-se em certa quantidade de outra mercadoria, de outra tribo. Algo parecido com: 1 casaco = 3 braças de linho. Veja-se que há duas medidas de duas coisas que se combinam.

 

A MEDIDA COMO SÉRIE DE RELAÇÕES DE MEDIDA

Com o tempo, a quantidade de trocas entre povos diferentes aumentou. Então uma certa mercadoria tornou-se trocável por certa quantidade de qualquer outra mercadoria. Algo parecido com: 1 casaco = 3 quilos de feijão ou 5 quilos de arroz ou 10 quilos de algodão ou 7 quilos de ferro -- ao infinito.

Veja que qualquer mercadoria pode ser a mercadoria central pela qual todas são trocáveis. 7 quilos de ferro = 1 casaco ou 3 quilos de feijão, e assim por diante, e assim por diante.

Se duas ou mais coisas podem ser aquilo pelo qual todas as outras se trocam, se medem – logo: deve haver algo em comum entre elas, nem que seja apenas tal relação mesma. No caso das mercadorias, de Marx, o comum é que todas são frutos do trabalho -- todos têm valor -- e se medem pelo tempo de trabalho socialmente necessário para construir a mercadoria.

No caso da química, podemos observar que todos os elementos têm anergia ou todos são formados pela mesma base - prótons, elétrons e nêutrons. O que diferencia QUALITATIVAMENTE os diferentes tipos de átomos -- hidrogênio, ouro, ferro, carbono etc. -- é que eles têm "apenas" QUANTIDADE diferentes do mesmo material (de elétrons, etc.).

 

 

 

A AFINIDADE ELETIVA

A expressão "afinidade eletiva" vem da química e da alquimia. Significa que algo tem preferência, atração ou facilidade de combinação com outro algo específico. No caso em que estamos focados, sobre a mercadoria, surge uma mercadoria pela qual todas passam a ter preferência de troca, atração -- o ouro, tornando-se o dinheiro. Por que ele? Bem; ele exige muitíssimo trabalho para ser retirado do fundo da terra, logo têm muito valor dentro de si (e muito valor em pequenos pedaços), por outro lado, ele pode ser fundido ou repartido como se queira (já um casaco é ruim para ser dinheiro, pois não pode ser cortado e remendado à vontade).

 

LINHA NODAL DE RELAÇÕES DE MEDIDA

Para este ponto, primeiro diremos de modo puro, abstrato, depois concreto, com exemplos. A mudança quantitativa, para mais ou para menos, vai aumentando, aumentando até que deixa de ser possível continuar mudanças de quantidade -- ocorre um salto de uma qualidade para outra. A mudança passo a passo, gradual, é interrompida e ocorre uma ruptura, uma mudança de qualidade.

É famoso até hoje a ideia de que na natureza não há saltos. Isso está errado. A água líquida fica cada vez mais gelada, mas ela continua água líquida -- ela não fica gradualmente mais sólida, ao poucos, ou cada vez mais rígida. A água salta de líquida para sólida, um salto de qualidade. Veja-se que mudança de quantidade, de estar cada vez mais frio, é interrompida para uma mudança de qualidade. A morte também é um salto: vai-se envelhecendo aos poucos, passo a passo, até que não basta, então salta-se de uma vez para a morte, interrompendo o gradual, o pouco a pouco. Na história, isso também acontece: mudanças graduais na sociedade -- como a tecnologia nas empresas levar ao desemprego -- leva a que, por salto, ocorra uma revolução.

 

O SEM MEDIDA

O sem medida ou o desmedido não é apenas uma qualidade, pois também é um substrato, uma coisa, uma substância ou matéria. É como se as mudanças de quantidades e de qualidade de algo fosse apenas uma mudança externa, na superfície da coisa – por dentro ela permanece igual a si mesma (mesmo se mudando).

O lado externo é com medida – o que ele é por dentro é o sem medida, o que não se deixa limitar pela medida. Existem vários tipos de elementos químicos diferentes entre si em quantidade e qualidade. Ora, por dentro todos eles têm algo que permanece em todos – prótons, elétrons e nêutrons (eles são o sem medida em relação aos elementos).

Como qualidade, o processo social chamado capital é desmedido, sem medida. A concorrência empurra para produzir mais mercadorias, mais quantidade de empresas. O problema é que o patrão não sabe se suas mercadorias serão vendidas, se há procura real por elas, pois a economia capitalista é sem planejamento central – ele só descobre depois de produzir, no mercado. Assim, com a vontade incontrolável de crescer a produção, o capital é o sem medida. O dinheiro sempre quer mais dinheiro, num acumular rumo ao infinito, um processo sem medida que o agrade de todo.

 

A INDIFERENÇA ABSOLUTA

Aquilo que é a parte interna de algo, a substância ou substrato, que permanece igual a si mesma na mudança, onde a mudança aparece como apenas externa, na superfície de algo – é a indiferença. Nós costumamos pensar a indiferença como "não dar atenção para aquilo", mas aqui o significado é outro: o indiferente é o que não tem diferença dentro de si, sua própria diferença é apenas externa, quase pelo lado de fora de si.

 

A INDIFERENÇA COMO RELAÇÃO INVERSA DE SEUS FATORES

O indiferente tem a diferença que ocorre na sua superfície como algo que pertence a si próprio. Ele é indiferente, mas a diferença pertence a ele mesmo. Vamos oferecer um exemplo.

Em minha pesquisa, percebi que os países chamados socialistas eram, na verdade, frutos de revoluções, ao mesmo tempo, de duas naturezas, tanto capitalista quanto socialista, e eram então sociedades como duas naturezas apostas, capitalistas e socialistas. O indiferente é a própria realidade material daquelas nações -- as pessoas, as pontes, as fábricas, e assim por diante. Nesta realidade de base, do chão do real, ocorreu uma luta entre as tendências socialistas e as tendências capitalistas daquelas regiões -- isso é a relação inversa dos fatores. Na medida em que as tendências capitalistas cresciam, as socialistas eram, em oposto, diminuídas. Até que a tendência capitalista fosse total, engolisse toda a sociedade, reduzisse a nada o seu inverso -- na década de 1990, todos esses países tornaram-se totalmente capitalistas.

No século 20, a sociedade mundial estava dividida entre países formalmente socialistas e capitalistas. O socialismo inicia em um país, mas nunca suportará sozinha ser cercada pelo capitalismo, logo o socialismo tem de acontecer em outros países durante algumas poucas décadas. O crescimento do número de países socialistas diminui seu oposto, o capitalismo – e vice-versa. O que não avança recua.

 

UM POUCO MAIS DA RELAÇÃO INVERSA

No ponto anterior, vimos que O indiferente, aquilo indiferente, divide-se por fora como dois fatores opostos, um cresce enquanto o outro diminui. Vamos aprofundar mais um pouco primeiro indo ao exemplo prático, depois à ideia pura. No século 20, os países formalmente socialistas tinham, na verdade, também elementos capitalistas dentro de si enquanto os países capitalistas amadureciam as bases do socialismo dentre de si mesmos – uns eram mais socialistas do que capitalistas enquanto outros eram mais capitalistas que socialistas. Veja que da oposição de um lado socialista e outro capitalista surgiu que os dois lados têm um tanto do lado oposto dentro de si mesmo. Até que o capitalismo domasse tudo, embora amadurecesse dentro de si as condições finais para o socialismo. Os opostos, assim, têm cada um mais de algo do que de outro algo.

 

PASSAGEM PARA A ESSÊNCIA

O ser tem tudo dentro de si. Até onde chegamos, temos algo que tem um lado dentro e um lado fora, um interno e um externo, uma essência e uma aparência, um conteúdo e uma forma. Todas as determinações (qualidades) que vimos até aqui foram tornando o ser menos vazio, menos abstrato: determinação, constituição, limite, uno, algo e outro, e assim por diante. Antes puro e esvaziado, o ser foi preenchido. Ele, o ser como substância ou substrato, repele-se a si mesmo, repulsão de si próprio, nega-se, desenvolve-se -- assim se preenche de qualidades ou determinações. Agora ele aparece como algo que é o substrato, a substância, a matéria em oposição ao seu lado "de fora". Mas essa oposição é apenas formal, errada: aquilo que é O indiferente, O sem medida -- o interno ou dentro -- também preenche o que aparece como o externo, as determinações. Isso ficará mais claro nos próximos pontos, onde resumiremos a doutrina da essência.

 

DOUTRINA DA ESSÊNCIA

A essência é a verdade do ser, o ser torna-se essência, a essência é o ser desenvolvido que foi para dentro de si mesmo. Quando pesquisamos o ser – os dados estatísticos etc. –, logo desconfiamos que este mesmo ser esconde algo, uma essência, que está atrás, ou melhor, dentro de si, dentro dele. O trabalho científico vai do ser (qualidade, quantidade) para a sua própria essência.

A Doutrina da Essência é a mais difícil, mas também a mais interessante (além de ser um livro bem menor que os outros dois). Sobre, reforçamos o que dissemos na introdução: aqui, uma categoria aparece em outra: essência aparece na aparência, o interno aparece no externo, etc.

 

DETERMUINAÇÕES DE REFLEXÃO

Aqui, vamos já resumir a ideia central que unifica o livro, a grande “sacada” de Hegel. Vejamos: ele percebeu que se dizemos a categoria “positivo”, então necessariamente vem a categoria “negativo”, pois um somente pode existir com seu oposto. Outro caso: se há causa, logo deve haver a consequência desta causa. O fundamento exige o fundamentado, o conteúdo exige a forma, e assim por diante. Isso são as determinações de reflexão, pois um conceito reflete o outro, e eles ficam nessa relação.

Parece que a categoria, determinação, “causa” é totalmente autossubsistente, autossuficiente, que se sustenta sozinho – mas percebemos que a categoria “consequência” é sua derivação natural com o qual está ligado.

Nas categorias da Doutrina do Ser – Ser, algo, constituição limite, uno, muitos, etc. – um conceito é fora do outro, passa para o outro, que passa para o outro, que passa para o outro… Agora, na essência, é diferente: como num espelho, um conceito se reflete no outro – um interno exige um externo, por exemplo.

Os conceitos da Doutrina da Essência passam a ideia de um lado “dentro” e de outro lado “fora”: uma essência e uma aparência, um conteúdo e uma forma, um interno e um externo, um fundamento e um fundamentado, uma parte e um todo, etc.

 

ESSENCIAL E INESSENCIAL

O inessencial é, por assim dizer, o lado de fora de algo, de um ser aí. Ele é o ser em oposição ao lado de dentro, a essência. Essa essência em relação com seu oposto não é mais exatamente essência, mas é o essencial. Então temos a essência transformada em essencial – e o inessencial que é a transformação do ser, do “lado de fora”.

Mas nada diz num “ser aí” qual pedaço dele é o essencial e qual é o oposto, o inessencial. Temos um problema, então. Como resolver isso? Hegel soluciona assim: na verdade, o inessencial não é o ser – o ser é a própria essência, e a essência é o próprio ser. Não sobra nada para o inessencial, que se torna zero, nulo, ou seja, mera aparência.

 

 

ESSÊNCIA E APARÊNCIA

A essência tem que aparecer.

A filosofia anterior a Hegel separou essência e aparência. Por exemplo, Platão dividiu o mundo em dois mundos separados: 1) o mundo da essência, o mundo da ideia, o mundo perfeito, onde não há movimento; 2) o mundo do sensível, o mundo que vivemos, onde há movimento, onde tudo morre ou é perecível. Hegel supera esse tipo de visão: a aparência é o nulo, pois a aparência não é diferente da essência – a aparência é, na verdade, a própria essência, que aparece a si mesma.

Em seu movimento de si mesma, a essência torna-se aparência. A essência não é morta, inerte, parada: ele movimenta-se para fora e para dentro de si mesma, modifica a si mesma, desenvolve a si mesma. A aparência é o aparecer da essência nesse movimento de si própria.

Não está a essência aqui, escondida, e, em oposição, a aparência ali, exibindo-se. Na realidade, a aparência sequer existe de fato – existe apenas a essência que aparece. Somos nós que, quando vermos o mundo, vemos apenas um pedaço dele, um ângulo dele (por isso a aparência, como se nos aparece aquilo); mas o mundo mesmo é apenas essência aparecente.

 

APARÊNCIA COMO ENGANO

Marx diz algo assim: se a aparência do mundo revelasse de imediato a sua verdadeira essência, toda ciência seria desnecessária. Com certa inocência, os filósofos antigos pensavam que bastava olhar o mundo, como ele é imediatamente, para saber como este mesmo mundo é.

A aparência esconde a essência, deforma a essência, aparece até como o inverso da essência.

Vejamos o caso na física, no inorgânico. Pela maior parte da história da humanidade, a ideia de sucesso foi a de que a Terra era o centro do universo e o Sol girava em torno da Terra, de nós. Isso aparece assim, o Sol nos rodeando, para visão imediata. Ora, isso tem até mesmo utilide prática, para nosso dia a dia: todos os dias dizemos que o Sol está se pondo ou surgindo, guiamos nossa vida nesse “fato”, embora saibamos a essência real, que é a Terra que está girando em torno do próprio eixo e em torno do Sol.

Na biologia, parece que as espécies mudam-se para adaptar-se por uso e desuso, por esforço: por se esforçar para comer em árvores altas, a girafa tem pescoço longo; porque a neve a branca, o urso é branco. Mas isso é um engano. Na verdade, acontecem mudanças genéticas ao acaso, que, se são úteis para a sobrevivência, são repassadas para os filhos. Surgiu um urso branco filhote por acaso, logo ele sobreviver melhor na neve, podendo camuflar-se, logo teve mais chances de sobreviver e reproduzir-se.

Na vida social, na mente do escravo todo o trabalho dele é totalmente trabalho para o outro, para o senhor de escravo que o domina. Aparece para ele assim, como se todo o fruto de seu esforço fosse destinado para outra pessoa. Mas isso é um engano da aparência. De fato ele trabalha de graça uma parte de sua jornada de trabalho para o senhor escravista, mas este “senhor” tem de manter vivo o homem escravizado, tem de fazer com que parte do seu trabalho retorne para ele mesmo.

No capitalismo é o contrário: parece que o trabalhador é pago totalmente pelo seu trabalho, nem mais nem menos. Esse engano tem “dados empíricos” que parecem provar que é este o caso, por exemplo: 1) o salário sobe se trabalha 1 hora a mais e cai se trabalha 1 hora menos; 2) o trabalhador qualificado ganha mais enquanto o trabalhador não qualificado, menos. Foi preciso o trabalho científico para superar esta aparência, para chegar à essência: o operário trabalha uma parte da jornada para si, para pagar o valor da sua força de trabalho, mas outra parte da jornada é trabalho para outro, de graça, não pago, um roubo do patrão.

 

CONTRADIÇÃO ESSENCIA-FENOÔMENO-APARÊNCIA

A essência quer permanecer, permanece, mas ela é o próprio fenômeno, que muda e é inconstante, então, nessa contradição, este força aquela a mudar – mas são dois em um, o mesmo. Eis uma das formas de contradição unitária possíveis.

 

REFLEXÃO

Voltamos ao tema da determinação de reflexão. Desta vez, vamos desenvolver, derivar, este resultado do qual falamos antes.

Agora, faz-se preciso atenção. A reflexão não é reflexão mental, filosófica, subjetiva – é mais parecida com reflexão da luz ou uma “flexão para trás”, algo que vai, bate e volta.

Para ficar claro, em diante usaremos a determinação de reflexão de essência e aparência, embora outros casos (interno e externo, etc.) ainda serão trabalhados no avançar deste capítulo.

 

 

 

REFLEXÃO POSTA, PONENTE

Este é o caso inicial em que uma categoria põe a outra, sua oposta. A essência põe a aparência, o conteúdo põe a forma, o fundamento põe o fundamentado, o interno põe o externo e assim por diante.

Veja que há uma “hierarquia” como a essência ser a base da aparência.

Na verdade, esse pôr é, também, nenhum pôr. Por quê? A aparência, como dissemos, é nula – é apenas a própria essência que aparece. A aparência (ou o externo em relação ao interno, ou a forma em relação ao conteúdo, etc.) não é um outro, não é separado daquilo de onde veio, não tem vida própria, não é independente.

Consideremos o fato de “a aparência ser a própria essência”. Pois bem; essência sai de si mesma, bate na aparência, e assim retorna de novo para si mesma (reflexo, reflexão). Esse é o movimento, mas que, ao mesmo tampo, não é nenhum movimento – porque a aparência não é um outro, mas “parte” da própria essência.

 

REFLEXÃO EXTERNA, EXTERIOR

Mas agora vamos pensar o contrário, o inverso. Pelo menos como as coisas parecem ser, a aparência é um e a essência é o outro. A aparência é, agora, a outro da essência. Reflexão externa porque elas estão formalmente separadas uma da outra.

Aqui, o trabalho científico acontece assim: partimos da aparência (dos dados estatísticos, das qualidades de algo) para descobrir a essência desta aparência. A partir da própria aparência é que descobrimos a essência – nunca jogamos fora a aparência, pois ela permite chegar à essência.

Tudo parece e aparece ao contrário: é fato que a essência põe a aparência, mas desta vez partimos da aparência para chegar na essência da realidade – outro: é fato que a essência é a própria aparência, mas aqui ele parecem como cada um no seu canto.

Também partimos do fundamentado para descobrir qual é o fundamento de algo. Partimos do externo para descobrir o interno. Partimos da forma para descobrir o conteúdo. Partimos da consequência para saber a causa. É invertido.

 

REFLEXÃO DETERMINANTE, DETERMINADA – DETERMINAÇÃO DE REFLEXÃO

Quando fazemos o trabalho da “reflexão exterior”, descobrimos finalmente que aquela aparência (ou externo, ou fundamentado, etc.) da qual iniciamos não é nada sem sua essência. Cada um só existe com o outro e dentro do outro.

Chegamos, de novo, às determinações de reflexão. Essência sempre põe a aparência – e elas são o MESMO. O interior, o interno, sempre põe seu oposto, o exterior, o externo – e eles são o MESMO. Um continua a si mesmo dentro do seu outro; cada um tem seu outro dentro de si mesmo. Assim, o outro não é verdadeiramente um outro, mas o mesmo. Vejamos o segundo caso: se sou internamente um mau poeta, logo farei maus poemas; se, ao contrário, sou internamente um bom poeta, farei bons poemas – o interno se torna o próprio externo.

 

DETERMINAÇÕES DE REFLEXÃO

Neste ponto, vamos das ideias abstratas para, depois, exemplos concretos.

 

IDENTIDADE - DIFERENÇA

A essência é igual a si mesma, A=A, assim ela é identidade. Mas ela é, também, a negação de si mesma, ou seja, um movimento.

Nesse automovimento da identidade, da essência, ela se torna diferente de si própria. É tanto diferente quanto idêntica a si, dentro de si: a diferença tem a diferença e, ao mesmo tempo, a identidade.

O diferente ou o diverso não está do lado de fora ou ao lado da identidade. Ao contrário: a mesma coisa idêntica consigo, a essência, é que desenvolve uma diferença interna, por dentro da identidade mesma.

Assim, a filosofia e a dialética de Hegel são tanto uma filosofia da identidade (mesmidade, do mesmo) quanto da diferença.

 

DIVERSIDADE – (DES)IGUAIDADE

Como temos dois, a diferença e a identidade, chegamos à diversidade. As coisas diversas têm apenas uma relação externa umas com as outras – são indiferentes em relação às outras, cada uma em seu próprio canto, sem relação real.

A relação dos diversos é a igualdade ou a desigualdade. Mas nada neles, nos diversos, diz se eles são iguais ou desiguais uns dos outros. Essa comparação, que iguala ou desiguala, é externa, feito por outro, por um terceiro, por alguém.

Há algo mais sofisticado aí. Somente posso ser igual se eu for igual a outro, a um diferente de mim – um desigual. Por outro lado: somente posso ser desigual de outro se sou igual a mim. Veja-se que cada um, o desigual e o igual, estão um dentro do outro, e vice-versa.

 

OPOSIÇÃO – CONTRADIÇÃO

Os lados da mesma coisa tornam-se mais do que diversos uns dos outros – tornam-se opostos, o positivo e o negativo.

O positivo e o negativo são, no começo, apenas o negativo um do outro, um para o outro – cada um nega seu oposto apenas. Depois, segundo momento, fica bastante claro que o positivo é de fato positivo; e o negativo é de fato o negativo. Enfim, terceiro momento, descobre-se que o positivo e o negativo são apenas nessa relação um com o outro, aquilo que são eles são em uma relação necessária.

Tudo está em polos opostos, tudo tem oposição dentro de si mesmo.

Em muitos casos, a mesma COISA é tanto positivo quanto negativo. O dinheiro que o credor empresta ao devedor é, este mesmo dinheiro, negativo para um e positivo para outro, passivo para um e ativo para outro. A estrada que vai para o leste, positivo, também vai para o oeste, negativo; a estrada tem os opostos em si. O átomo tem prótons, positivo, e elétrons, negativo, dentro de si próprio. Se eu digo +A e –A, o que existe de igual e comum entre eles é “A”.

Já a contradição é, em geral, a fonte de todo movimento, automovimento. Tudo tem contradição de polos opostos, tudo está “quebrado por dentro”. Algo é tanto contraditório dentro de si mesmo como, ao mesmo tempo, é esta mesma contradição dissolvida.

O negativo afirma a si mesmo excluindo o positivo; também, o positivo afirma-se excluindo o negativo de si. Ora, eles somente existem nesta oposição, dentro desta oposição – mas, ao mesmo tempo, eles recusam seu oposto, repelem um ao outro. Isso é a contradição. Pense-se na luta de classes: o movimento operário repele a classe dos patrões, embora ambos estejam unidos por atração na produção, na fábrica; o fim deles é o fim das classes sociais, o socialismo.

A contradição não pode ser eterna, ela tem que se dissolver, se resolver. A filosofia comum pensa a contradição apenas como fonte de destruição, de fenecer, de morte; mas ela também é a fonte do desenvolvimento, do progresso, do movimento.

 

ESSÊNCIA COMO FUNDAMENTO

Assim, a essência foi para “fora de si mesma” e foi ganhando determinações de reflexão (diferença, positivo e negativo, etc.). Os opostos em contradição, o positivo e o negativo, são no fundo o mesmo, porque eles têm um fundamento igual (veja-se a semelhança das palavras “fundo” e “fundamento”). Vejamos um caso já citado. Uma pessoa impulsiva (fundamento, essência) torna-se “sem noção” em algumas situações, logo algo negativo, mas também torna-se criativa, logo algo positivo. A mesma “base”, a essência que se tornou fundamento, faz os elementos “externos”, as qualidades e defeitos, o positivo e o negativo.

Como a essência tornou-se fundamento? Indo dela mesma rumo à… ela mesma. Ou seja, desenvolvendo-se: ela se diferenciou dentro de si, se diversificou, se tornou oposição, positivo e negativo, contradição e… retornou para dentro de si porque os opostos nada são de fato, apenas dissolvem-se naquela essência que se tornou seu fundamento, que retornou para dentro de si mesma.

 

UMA INTERPRETAÇÃO

Há em Hegel um erro no seu grande acerto: as categorias identidade, diferença, diversidade oposição, contradição – acontecem ao mesmo tempo, ou melhor, sem tempo algum! Além dessa maneira de pensar, há outra mais ativa: a identidade passa, de fato, para a diferença, para a diversidade, para a oposição, para a contradição. As duas formas de pensar tais categorias, ao mesmo tempo e uma após a outra, são corretas, acontecem juntas.

Vamos para casos práticos que saem do tempo, do passar, lógico de Hegel rumo ao tempo comum, histórico – esta elaboração não está mais em Ciência da Lógica. Vejamos. O operário e o patrão são IDÊNTICOS, pois ambos são pessoas livres no mercado. Mas são DIFERENTES: um é vendedor de sua força de trabalho enquanto o outro é comprador desta mesma força. Logo, eles são DIVERSOS já que cada um é diverso do outro. Quando o patrão contrata o operário, eles formam a OPOSIÇÃO, pois um é operário e o outro é, ao contrário, o seu patrão – um só pode ser patrão se o outro for operário, e vice-versa. Enfim, vem a CONTRADIÇÃO: as greves, a luta do patrão por aumentar a jornada ou acelerar as máquinas etc.

O homem e a mulher primitivos eram IDÊNTICOS, mas logo se vê que eles têm DIFERENÇAS. Como essa diferença, tornam-se DIVERSOS. São também, formalmente, OPOSTOS. Quando surge a propriedade privada, o homem tem de saber se deixará herança para um filho legítimo, não de outro, logo a OPOSIÇÃO entre os sexos tornou-se CONTRADIÇÃO, controle do homem sobre a mulher.

O ancestral dos atuais seres vivos era igual a si mesmo, ou seja, IDÊNTICO. Seus descendentes foram, geração a geração, tornando-se cada vez mais DIFERENTES do seu ancestral. Depois, por muitas mutações genéticas, surge uma DIVERSIDADE de espécies (cuja origem é aquele ancestral idêntico e comum). A diversidade cai na OPOSIÇÃO e CONTRADIÇÃO entre os animais, entre os seres.

O império romano fez do Latim a língua da Europa – identidade. Mas as diferentes regiões desenvolveram diferentes sotaques – diferença. Estes diferentes sotaques avançaram para as variadas línguas latinas (português, italiano, espanhol, francês) – diversidade. Daí surge a oposição e, quem sabe, a contradição entre as línguas europeias.

 

NEM POSITIVO NEM NEGATIVO – UMA INTERPRETAÇÃO

O nem positivo nem negativo avança-se, para além de si, até a oposição entre o positivo e o negativo; por sua vez, esta oposição é resolvida – formando um novo “nem positivo nem negativo”.

O trabalhador artesão medieval (nem positivo nem negativo) é modificado pela relação entre o capitalista (positivo) e o operário (negativo); um afirma-se na realidade, por isso positivo; e o outro está em desvantagem, precisa mudar o mundo, por isso negativo. Ocorre a negação da negação com o socialismo – e o próprio operário nega-se, deixa de ser operário ou classe. Por outro ponto de vista: o primeiro, o artesão, é o positivo em relação ao que lhe substitui, a oposição entre o operário e o burguês, ou negativo.

No início do universo, a matéria decaiu do nem positivo nem negativo para uma sopa quente de prótons, positivos, separados dos elétrons, negativo. Com o esfriamento do universo, a atração dos opostos permitiu a união do positivo com o negativo, do próton com o elétron, formando átomos completos neutros (nem positivo nem negativo). Veja-se que o átomo neutro tem dentro de si os opostos, o positivo e o negativo. Também os opostos, elétron e próton, podem se fundir formando o nêutron. Existe na física a polêmica sobre se o neutrino, uma partícula pequeníssima, tem um antineutrino, um oposto, ou se, outra hipótese, ele é a antipartícula de si mesmo; talvez seja melhor afirmar que ele é “nem positivo nem negativo”, diferente do elétron e do próton.

Para Hegel o nem positivo e nem negativo acontecer somente ao mesmo tempo que o positivo e o negativo. A estrada é nem positivo e nem negativo, que tem dentro de si o rumo para o leste, positivo, e para o oeste, negativo (qualquer um dos dois pode ser considerado o positivo ou o negativo). Mas nós vamos mais longe. Um fóton de alta energia, nem positivo nem negativo, passa, a si próprio, para o elétron, negativo, e o antielétron, positivo, que se atraem e tornam-se, de novo, um fóton, nem positivo nem negativo.

 

FUNDAMENTO

A essência que foi para “fora” de si e, então, retornou para si – torna-se fundamento. É claro que o fundamento tem um fundamentado, logo desconfiamos que tudo existente tem um fundamento “atrás de si”.

 

FORMA E ESSÊNCIA

A essência é total, mas seu lado externo por ser visto como a FORMA. O lado externo é aquele onde vimos a diferença, a diversidade e a contradição – a forma está aí. Na verdade, a essência tem tudo em si, mas poderemos analisar forma e essência de modo – separado? É o que faremos na próximo ponto.

 

FORMA E MATÉRIA

Quando essência e forma se separam, a essência já não é essência de imediato, pois é reduzida à matéria, ao material. Podemos dizer que a matéria é passiva, pois é formada pela forma, enquanto a forma é ativa, pois dá forma à matéria.

Aqui, parece que a matéria existe por si mesma e, do outro lado, a forma só tem sentido se é a forma de um material. Essas são as consequências do método de separar o que, dentro da realidade, está necessariamente unido, em unidade.

Não existe forma pura, sem matéria; não existe matéria pura, sem forma. O que existe é matéria formal ou forma material. Vamos aos exemplos. A forma de moeda, para ser moeda, não pode ser apenas forma – ela é feita ou de cobre, ou de ferro, ou de prata, ou de ouro, ou seja, de algum material.

 

UMA INTERPRETAÇÃO

Em minha pesquisa, percebi que a matéria da forma vai da materialização para a desmaterialização (claro é que se faz preciso, antes, materializar para, depois, desmaterializar). A forma-dinheiro foi do menos material ao mais material – do cobre para a prata, para o ouro – para então, em seguida, ir rumo ao menos material como mais perecível – do ouro para a prata, para o cobre, para o papel, para o bits. Na vida, surgiram animais cada vez mais materiais até surgir os gigantes (como dinossauros e outros seres), então começou a desmaterialização, a diminuição do tamanho das novas espécies. A quantidade maior de trocas e de dinheiro está ligada à desmaterialização deste; o menor tamanho de certos animais está ligado à possibilidade de maior quantidade deles. A maior materialização, nos dois exemplos, diminui a perecibilidade, aumenta o tempo de vida.

 

FORMA E CONTEÚDO

A união da forma e da matéria – é o conteúdo. Vejamos um caso. Se eu tenho uma pintura retratando um jogo de futebol, esta mesma pintura tem a forma (da bola, dos jogadores, do campo, etc.) e também, junto, a matéria, a tinta principalmente, com diferentes cores. Ora, esta forma e esta matéria, unidas, passam uma mensagem fictícia, artística um conteúdo. Elas têm um conteúdo.

Vejamos outro caso. Marx diz que a relação de contrato entre trabalhador e patrão, quando aquele está no mercado trabalho procurando emprego, tem a FORMA de uma relação entre iguais – ambos, operário e patrão, são livres, estão no mercado, estão fazendo um contrato livremente aceito. Mas o CONTEÚDO é outro, de exploração, em que ou o operário vende sua força de trabalho para ser explorado por outro ou morrerá de fome.

Vamos para a terceira visão, comum no marxismo. A economia e a luta de classes, as classes sociais, são o conteúdo – já o Estado, os partidos, as organizações são a forma. Nesse modo de ver, tanto o conteúdo quanto a forma têm, cada qual, dupla natureza, duplo caráter. O conteúdo (economia, classes) é 1) muito mais dinâmica, mas 2) também mais instável, inconstante; por outro lado, a forma é 1) conservadora, lenta, paralisadora, mas 2) conservadora no sentido de conservar, de preservar (as conquistas, etc.). Assim, os conflitos e as instabilidades do conteúdo fazem surgir, de si mesmo, uma forma para “compensar”. Mas o conteúdo se desenvolve a tal ponto em que a forma conservadora torna-se um fardo, algo muito atrasado – o conteúdo renovado supera aquela forma e funda uma forma nova, para suas novas necessidades.

Uma forma pode estar em contradição com seu conteúdo: um partido comunista pode estar organizado de forma incompatível com seu conteúdo, com o perfil dos membros e com seu programa.

 

FUNDAMENTO FORMAL

O fundamento formal é fácil de entender, pois é o chamado “argumento circular”, uma tautologia. Vejamos: Por que a Terra gira em torno do Sol? Por causa da gravidade. E o que é gravidade? O que faz a Terra girar em torno do Sol… Percebe que foi do nada ao lugar nenhum? O argumento não avança, o conteúdo e forma estão aí fundidos num fundamento apernas formal, digno de riso. A ciência tem vários tipos de tautologias óbvias do tipo, que devem ser combatidas.

 

FUNDAMENTO REAL

A gravidade, por exemplo, é de fato o fundamento da estrutura de uma casa, de uma base. Ou seja, os alicerces da casa têm a gravidade como seu fundamento. Estes alicerces e a gravidade são a base para o “enfeite”, o inessencial, o não essencial. Por exemplo: as paredes de uma casa podem ser pintadas de vermelho ou azul – mas tanto faz a cor, e a gravidade não é fundamento dessa cor escolhida para pintar a casa. Então, além do fundamento e do fundamentado, tem uma porção enorme de “coisas” que não tem fundamento naquele fundamento.

Hegel faz uma crítica ao fundamento real. Um trabalhador consegue o emprego porque é disciplinado, tem experiência, tem beleza, tem contatos, etc. Qual dessas características é o fundamento? Nada diz que um – por exemplo, a disciplina – foi o fundamento da contratação dele enquanto os outros fatores seriam o fundamentado… Assim, a reflexão que procura um fundamento de algo pode escolher entre centenas de fatores para um apenas ser o central, o que é em si um erro.

 

FUNDAMENTO COMPLETO

O fundamento (real) tem, ele mesmo, um fundamento! Então temos 1) o fundamentado; 2) o fundamento deste fundamentado; 3) o fundamento do fundamento… Este 2 que ficou no meio é unidade tanto do fundamento real quanto do fundamento formal, pois ele é de fato fundamento (do fundamentado), mas ao mesmo tempo é um fundamentado. Com isso, Hegel fecha o ciclo total – não é necessário ir, ao infinito, para o fundamento do fundamento, do fundamento, do fundamento, etc.

O método de Hegel foi pegar o que é junto, a forma e o conteúdo enquanto fundamento formal, então separou a forma e o conteúdo no fundamento real, depois juntou novamente tudo no fundamento completo. Ele fez, também, assim antes: essência e forma estavam juntas, então as separou para chegar até a matéria e a forma, depois juntou no conteúdo e forma. Esse método será usado mais vezes, portanto merece atenção a este aspecto.

Ainda sobre o fundamento completo, o grande marxista Valério Arcary diz sobre o caráter (fundamento) de um partido, como o PT: “Partidos podem ser julgados pelo programa que apresentam para a transformação da sociedade. Ou podem ser explicados: (a) pela história de suas linhas políticas e de suas lutas políticas, sobretudo, as internas; (b) pelo confronto entre suas  posições  quando estão   na   oposição,   e   quando   se aproximaram  do  poder; (c) pelos valores  e  ideias  que  inspiram  seu programa (d)  pela  composição  social  de seus   membros,   militantes   ou simpatizantes, ou dos seus eleitores, ou da  sua  direção; (e) pelo  regime  interno  do seu funcionamento; (f) pelas formas de seu financiamento;  (g) pelas  suas  relações internacionais. Todos estes critérios são válidos e significativos, e a construção de uma síntese exige uma apreciação da sua dinâmica de evolução.” Ora, cada um pode ser, por si, o fundamento real dos demais; mas o fundamento tem, também, um fundamento! Chegamos à necessidade do fundamento completo. Qual seria o do PT, o fundamento do fundamento? Este: o fato de ser um partido ligado diretamente, organicamente, com Estado burguês, logo com a burguesia.

 

CONDIÇÃO

O RELATIVAMENTE INCONDICIONADO

Aqui, temos duas personagens, a condição (ou as condições) e o fundamento. Vamos, primeiro, separá-los e considerar tal separação. A condição é mero ser aí imediato, sem ser por ela mesma qualquer condição para algo. Ela é apenas material variado, material como seu próprio conteúdo. Por outro lado, isolado consigo mesmo, o fundamento vai para fora de si em seu automovimento e tem, portanto, também seu próprio material, seu próprio conteúdo. Assim: um é incondicionado em relação ao outro, e vice-versa.

 

O ABSOLUTAMENTE INCONDICIONADO

Nosso papel, agora, é ver a unidade real daqueles dois, que se colocaram como opostos e separados um do outro. A condição, como material externo, na verdade é o que representa o Ser (com o qual começamos este capítulo); ora, se ele é o Ser, vale comentar que este, este Ser, “evoluiu” a si mesmo rumo à essência (que aqui é fundamento); o ser aí imediato, indiferente, não se nega ao se prender ao fundamento, ao contrário, ele se realiza, ele é ser que vai para a essência (o material do fundamento, para o fundamento). Assim, o fundamento põe seu fundamentado, vai para fora de si, dando forma ao material da condição. Por outro lado, o fundamento só se realiza a si mesmo quando passa, ele mesmo, para seu fundamentado, que é feito com o material da condição.

Mas há uma virada incrível.

O fundamento e condição estão aonde? Ora, eles estão dentro do “absolutamente incondicionado”, de uma Coisa incondicionada – estão dentro de uma totalidade! Esta Coisa, este Todo, tem dentro de si própria tanto o fundamento quando as condições, desmancha eles dois dentro de si.

 

O SURGIR DA COISA NA EXISTÊNCIA

Quando todas as condições de uma Coisa existir estão prontas, então estão ela entra na existência. Por exemplo: não se deve tentar criar um sindicato antes de estarem reunidas pelo menos as condições mais básicas necessárias para fundar tal organização. A vida na Terra surgiu depois que as condições – temperatura, ambiente, compostos, etc. – estavam prontas para isso.

As condições se reúnem, “caem” juntas, internalizam-se – e assim surge uma Coisa na existência. Algo, como uma revolução, é impossível até que se torne inevitável. É interessante ver que esta união das condições cria um lado “interno” na Coisa, ou seja, as condições produzem o próprio fundamento!

Por outro lado, o fundamento também cria a Coisa na existência. O fundamento sai de si mesmo, se externaliza – passa para o fundamentado. Mas, com isso, ele não fica atrás ou no fundo, não: o próprio fundamento está naquele seu fundamentado.

Vimos duas formas que parecem fazer a Coisa surgir, pelo lado das condições e pelo lado do fundamento. Porém: a verdade final é que a Coisa vai rumo a si mesma, desenvolve-se a si mesma, põe a si mesma – ela já existe antes de existir (era uma coisa e tornou-se outra).

Há outra forma de ver o parágrafo anterior. O fundamento torna-se o fundamentado, logo ele deixa de existir em si – a coisa é, então, um sem fundamento, embora tenha vindo dele. Por outro lado, a condição faz a coisa, mas, esta coisa, uma vez feita, é sem condição, é incondicionada, a condição superou a si mesma como o fundamento também o fez.

 

EXISTÊNCIA

Primeiro veremos a essência e a imediatidade como juntas (existência), depois como separadas (aparecimento), depois como reunidas e relacionadas (relação essencial). Comecemos, portanto, pelo começo, em que a essência tem que aparecer.

Assim como o Ser, que é o geral, tem dentro de si o algo (algo como uma caneta é um ente do Ser) a existência tem como sua expressão nas coisas, na coisa.

A grande questão deste capítulo é o fato de que Kant, antes de Hegel, afirmou: nós conhecemos apenas a coisa como ela é para nós, sua aparência, sua manifestação – não como esta coisa é em si mesma, não a “coisa em si”. Há, então, um duplo: de um lado, a coisa em si e, de outro, como aquilo aparece, sua manifestação. Vamos resolver este problema, como acessar a essência da coisa.

 

A COISA E SUAS PROPRIEDADES

A coisa divide-se em 1) coisa em si e 2) no seu lado externo, em dois. Mas, ora, este lado externo é também uma coisa, uma coisa em si, pois cai para dentro de si mesmo. Assim, essas duas coisas em si, a coisa em si original e a manifestação desta como outra coisa em si, são, na verdade, a mesmíssima coisa – que apenas aparece como relação de dois.

A propriedade da coisa em si aparece como aquilo que uma coisa se torna diferente de outra coisa, o lado de fora, da superfície, da coisa. Mas nas duas (ou mais) coisas em si diferentes, como a propriedade é algo externo a elas duas, esta mesma propriedade fica do lado de fora delas, logo elas são internamente, por dentro, iguais, duas coisas em si iguais, são o mesmo.

Na verdade, não existe coisa em si sem propriedade, a coisa em si não fica escondida ou por detrás, mas é a própria propriedade mesma. Uma coisa não é feita de propriedades, ela é apenas as próprias propriedades!

Assim, o que chamamos de coisa em si pura, não é o lado essencial, como parece, mas o lado inessencial, sem essência, sem tanta importância. É o lado das propriedades aquele grande lado em que as coisas são de verdade, de fato. Uma coisa em si pura não é nada! Nada há que descobrir dela e nela, pois algo só é de fato algo em suas propriedades, com suas propriedades. Se queremos saber sobre alguma coisa, devemos estudar suas propriedades e a união delas, destas.

Na astronomia, nós sabemos o que é uma estrela distante por meio de suas porpriedades: ver-se sua gravidade, seus efeitos, seu brilhos, observa-se ela no infra vermelho e no ultravioletas, e assim por diante, e assim por diante., conectamos esses dados, até que sabemos o bastante sobre ela.

 

O CONSISTIR DAS COISAS EM MATÉRIAS, MATERIAIS

A separação entre uma “coisa em si”, que é o lado sem importância por si, e o lado das propriedades faz com que estas mesmas propriedades se revelem como matérias, materiais. A coisa é feita de matérias (partículas, átomos, etc.). Sem ser feita de propriedades, ou seja, de matérias, a coisa nem sequer é coisa alguma.

De imediato, a coisa é feita de matérias que são independentes, indiferentes, umas das outras, apenas juntas externamente dentro desta coisa. Mas logo se vê que elas, ao se afirmarem como si mesmas, negam as outras matérias. Mas, outra conclusão, oposta, elas penetram umas nas outras e, ao mesmo tempo, por outro lado, são indiferentes umas das outras nessa mesma penetração. Assim, a coisa é contradição entre a independência de cada material e a penetração umas nas outras ao mesmo tempo.

A coisa se dissolve. As matérias entram e saem dela, e ela não é sequer um limite ou uma barreira para estes materiais. A coisa é um “isto” (em que as matérias estão reunidas) e um “também” (menos ou mais matérias).

 

APARECIMENTO

Antes de Hegel, alguns filósofos, como Patão, separaram o mundo em dois mundos: de um lado o mundo que é em si e para si, o mundo essencial, o mundo das leis; de outro, oposto, o mundo que a parece, o mundo do aparecimento. Ora, existe apenas um mundo, somente UMA totalidade, que se divide em duas totalidades, que são, ao mesmo tempo, separadas e unidas. O mundo essencial tem de aparecer, logo ela também é seu oposto, o mundo que aparece. Por seu lado, o mundo que aparece tem dentro de si um fundamento, o lado mundo essencial. Cada um de ambos é ele mesmo e seu oposto.

O mundo que aparece mostra ou revela o mundo essencial, mas de modo invertido, ao contrário. O que é positivo no mundo essencial aparece como negativo no mundo que aparece; assim, no inverso, o que é negativo no mundo essencial é positivo no mundo que aparece; um azar essencial aparece como sorte no mundo que aparece, e vice-versa. Serve o exemplo já citado: no mundo que aparece, o Sol gira em torno da Terra, o Sol nasce e se põe; mas no mundo essencial, a terra é que gira em torno de si mesma e do Sol.

 

RELAÇÃO ESSENCIAL

A relação entre o “mundo que é em si” e o “mundo que aparece” torna-se relação essencial. São um só que aparece como dois, ou seja, relação consigo do mundo como e fosse relação com um outro.

 

O TODO E AS PARTES

De início, o todo não é as partes – e as partes são o oposto do todo. Mas há algo mais profundo. O todo sem partes é vazio, sequer é um todo, pois somente pode ser um todo de partes relacionadas umas com as outras. As partes, por outro lado apenas são partes se dentro de uma relação com outras partes dentro de um todo – como dissemos, um dedo, como parte, somente tem sentido se como parte do corpo ao qual ele pertence. Se ele sai desse todo, se é decepado, cortado, ele é uma parte que é uma totalidade em si mesmo, mas uma totalidade morta, inútil, um dedo que se decompõe. Há, assim, quase máxima unidade do todo e das partes, um necessitando do outro.

Complementemos isso: as partes são dependentes umas das outras ou independentes umas das outras? Derivamos: Tese – as partes são totalmente independentes umas das outras; Antítese – as partes são totalmente dependentes umas das outras; Síntese – as partes são relativamente autônomas umas das outras enquanto são, ao mesmo tempo, relativamente dependentes umas das outros – mas a interdependência entre elas é o lado superior de ambos.

O todo é mais do que a mera soma das partes, pois é a união das partes e suas interelações umas com as outras, recíprocas. Como dissemos: o hidrogênio queima, o oxigênio permite a queima – mas a união de ambos numa totalidade, H2O, produz a água, que apaga o fogo, tem função oposta.

 

FORÇA E EXTERIORIZAÇÃO

Ora, o que faz do TODO de fato um todo, ou seja, que as partes não sejam apenas o mero juntar, um mero agregado indiferente, um mero unido artificialmente? A força. A força gravitacional, se força for aqui, mantém o todo do sistema solar junto em um sistema, além de mantar unido nosso próprio planeta como um todo. O que mantém o capital geral e o capitalismo como um todo, como mais do que meras partes? Resposta: o valor, valor este que há dentro das máquinas, matérias-primas, mercadorias, capitais, etc. O valor geral é o que unifica o sistema.

A força se externaliza, assim ela aparece como duas ou mais forças – mas no fundo é uma força só que aparece como forças diferentes, diversas. Por exemplo: há apenas UM valor global na sociedade – uma única massa total de valor, uma só energia, apenas uma substância. Mas ela aparece como vários valores porque se colou por dentro de várias mercadorias diferentes. Veja que as mercadorias concorrem umas contra as outras, os capitais concorrem uns contra os outros; desse modo, por terem valor dentro de si, o valor (força) luta ou se junta com ele mesmo como se com um outro, um valor com ou contra outro valor, uma força com ou contra outra força (mas, na verdade, são a mesma força); externamente há vários valores, mas internamente há apenas um valor social global. O exemplo torna-se mais claro se o leitor domina a economia marxista.

 

 

 

UMA INTERPRETAÇÃO

Vale destacar que Hegel trata do todo e das partes, mas sem dizer como o todo forma-se, além do fundamento e das condições tratados bem antes em sua obra. O todo e a parte já estão aí, além de reciprocamente relacionados em sua unidade. O todo é um reunir atrativo de partes, pela força; um todo vem, também, de outro todo que se suprassume; uma parte do desenvolver do todo, sendo uma parte que é também em si um todo, desenvolve-se e pluraliza-se, então, se era apenas um antes, igualmente é um depois. Em especial, da parte rumo ao todo: o crescimento e desenvolvimento de um todo dar-se, por isso, pela força ou, ou melhor, energia que concentra em si, causa e consequência de seu evolver, como espaço-tempo condensado, em que uma parte torna-se um todo de partes unitário.

 

UMA INTERPRETAÇÃO

Na ciência física, o conceito de força está em “crise categorial”. Por muito tempo usada, parece não ter mais tanta sustentação. Cabe aos hegelianos e marxistas avaliarem se é o caso ou não de suprassumir tal categoria.

 

EXTERNO E INTERNO

A relação de força e sua exteriorização produziu o interno e o externo. O externo é o próprio interno, que vai, este último, para fora, digamos assim. Um artista somente pode fazer uma arte, exterior, que expresse seu interior – fará grande obra se for, por dentro, um grande artista. O externo não está em unidade com o interno, pois o externo é, ele mesmo, o próprio interno. Eles estão separados, como se fossem dois, apenas na aparência. O externo NÃO esconde o interno, na verdade o revela, o mostra – se se quer saber o interno de algo, observe seu externo, pois o lado exterior é a revelação da essência, essência agora determinada como um interno. Uma personalidade, interno, revela-se na sua prática do sujeito, externo.

 

O EFETIVO

O efetivo ou realidade é a unidade de essência e existência. A essência que não aparece se junta coma existência que é apenas aparecimento; juntas formam a efetividade, a realidade. Veremos melhor a seguir.

 

 

O ABSOLUTO

Lembra-se que o exterior e o interior não mais do que uma unidade de opostos porque na verdade eles são UM? Por bem; este um, apenas um total, é o absoluto.

Pensemos na palavra absoluto para pensar o absoluto real. O absoluto nega-se a se confundir com algo, com quaisquer coisas, pois é o absoluto. Por outro lado, oposto, ele tem tudo dentro de si, pois é o absoluto.

 

EXPOSIÇÃO DO ABSOLUTO

Tudo que vimos até agora é a exposição ANTERIOR do absoluto: ser, quantidade, qualidade, essência, existência etc. Mas é uma exposição para trás, digamos assim. E para frente? O absoluto tem o lado “externo”, mas que é ele próprio, um ir para frente dele mesmo, uma exposição dele mesmo não apenas como UM, mas como multiplicidade, como várias expressões.

 

ATRIBUTO ABSOLUTO

Pensemos a multidão de coisas diferentes. Elas são, na verdade, “transparentes”, pois uma reflexão filosófica perceberá que elas têm uma atributo em comum, de todas elas – esse atributo é o absoluto que há pro meio de toda, mas um absoluto parcial porque determinado como o atributo, atributo geral. Cada coisa tem vários atributos, mas, juntas, apenas o atributo geral, o absoluto.

Mas esse método, de ir das coisas rumo a saber que elas tem um absoluto dentro delas em comum, é errado, defeituoso. Por, primeiro, devemos derivar o absoluto, como fizemos neste capítulo todo, e, depois, derivar o atributo e em seguida, o modo (maneira).

MODO (MANEIRA)

O atributo tem dois extremos em si. Por “debaixo”, tem o absoluto; por “cima”, tem o modo ou a maneira. O modo é como uma variedade externa, do lado de fora.

Mas logo descobrimos que o modo “externo”, na verdade, é próprio absoluto mostrando a si mesmos, manifestando-se, exibindo-se, sendo esta própria manifestação ele próprio – não fora dele. Assim, o absoluto vai para dentro de si indo para fora de si, negação da negação; sua autoexibição é ele entrando unidade com ele mesmo, pois o modo ou maneira não é um outro.

 

 

EFETIVIDADE

Agora, veremos as categorias modais: efetividade (realidade), possibilidade, contingência (acidente), necessidade. De imediato, saiba que este último, a necessidade, tem força de lei, de que algo tem que ser necessariamente assim. Dito isso, sigamos juntos, unificando opostos.

 

CONTINGÊNCIA, EFETIVIDADE, NECESSIDADE, POSSIBILIDADE – FORMAIS

Vejamos, primeiro, a efetividade e a possibilidade como separadas uma da outra, como formais. A possibilidade formal é o pensamento de que há várias e opostas possibilidades; um pensamento limitado, que pensa todas as possibilidades futuras, sem hierarquia.

A união, a unidade, da possibilidade e da efetividade (realidade) é – a contingência. Contingente é aquilo que pode ser ou pode não ser, tanto faz, pode acontecer ou não; por exemplo, uma inflação antes de uma crise pode tanto acontecer como não acontecer, não é necessário que ocorra. Veja: sendo o efetivo (realidade) e a possibilidade exatos opostos, eles estão fundidos num meio-termo, a contingência, pois o contingente, quando acontece, é ou existe, logo é efetivo, mas poderia também não acontecer, logo é possibilidade. É um e outro.

Como derivamos a contingência, devemos agora derivar seu oposto, a necessidade, o necessário formal. Para isso, também usaremos, de novo, a possibilidade e a efetividade (realidade) formais. Sigamos juntos. De um lado, a possibilidade é algo que existe (por exemplo, um ovo tem em si mesmo a possibilidade, é a própria possibilidade, de ser comido pelo homem por causa de suas PROPRIEDADES, que fazem dele um ovo) – logo a possibilidade é o seu oposto, a efetividade ou realidade. Por outro lado, o efetivo separado do “em si”, da essencialidade, ou seja, separado do interno-possibilidade, é uma efetividade sem chão, sem base, sem por onde sustentar-se – logo, assim, torna-se apenas possibilidade, ou seja, seu oposto. Pelo fato de um cair no outro, e vice-versa, surge daí a necessidade formal.

 

NECESSIDADE FORMAL RATIVA, EFETIVIDADE (REALIDADE), POSSIBILIDADE E NECESSIDADE – REAIS

Passaremos do formal para o real. Ora, como a efetividade tem a necessidade, como vimos antes, ele é uma efetividade ou realidade real. Melhor: se juntarmos, como deve ser, efetividade e seu oposto, seu lado de dentro, a possibilidade, então temos a efetividade real.

Mas, então, a possibilidade também é real. Para vermos tal tipo de possbilidade, isso ocorre quando avaliamos o mundo e vemos, de fato, com atenção e profundidade, as condições, as características, as tendências, as propriedades a organização e a desorganização desse mesmo mundo. Se na possibilidade formal, havia várias hipóteses futuras, na possibilidade real ocorre a hipótese limita.

A possibilidade real tem de ser, tem de acontecer, necessariamente assim por causa de tais condições e circunstâncias – logo chegamos à necessidade real. A possibilidade real já é a necessidade real, pois são opostos apenas na aparência e na observação descuidada.

Se olharmos o mundo como de fato é, ele é, ao mesmo tempo, tanto possibilidade quanto efetividade (realidade). É ambos, os opostos juntos. Ele é uma efetividade, uma realidade, mas que “deseja” ser uma nova efetividade depois, por dentro dele mesmo.

Aqui, Hegel faz uma nova sacada. A necessidade real vem da possibilidade e da efetividade; mas a possibilidade e a efetividade é, também, uma unidade que produz o contingente, o contrário da necessidade! Por isso, conclui-se: o contingente produz o necessário, além de estar unido com ele!

 

NECESSIDADE ABSOLUTA

O que existe de verdade, no todo, é unidade de essência e ser, de externo e interno no absoluto. A totalidade é necessidade.

O contingente não só produz a necessidade como, o oposto, é produzido por ela. Temos a necessidade absoluta.

Vamos derivar, agora, a contingência absoluta da necessidade absoluta. Atenção. A necessidade absoluta é um efetivo, um real, logo o efetivo é um efetivo absoluto. Mas, se o efetivo ou real é absoluto, logo tem a possibilidade dentro de si mesmo, porque é absoluto. Ora, qual a unidade do efetivo e do possível? Já dissemos duas vezes – é o contingente. Então a unidade do efetivo absoluto e da possibilidade também absoluta é o contingente absoluto (da e dentro da própria necessidade absoluta).

A necessidade absoluta tem a possibilidade absoluta. O feudalismo teve de passar, por força de uma lei histórica, para o capitalismo!

 

CRÍTICA DE LUKÁCS

Lukács diz que a realidade não tem necessidade absoluta, pois o mundo é probabilístico, por probabilidade. Para isso, ele usa uma frase de Lênin: “não há situação absolutamente sem saída”. Assim pode ser 80% sem saída, 99, 9% sem saída, mas sobra, ao menos, O,1% de saída. Assim, tendemos a ir do capitalismo para o socialismo, mas podemos ser derrotados e humanidade ser extinta numa catástrofe econômica e ambiental. Deixo ao leitor a escolha sobre quem tem razão, Hegel ou Lukács.

As duas posições fizeram a cabeça dos físicos no século XX. Algfuns afirmaram que é impossível causalidade e determinismo na física quântica, portanto deveríamos  nos limitar a cálculos de probabilidade – apenas. Einstein e Born fizeram uma luta de morte contra tal concepção, afirmaram que nosso conhecimento hoje ainda é limitado, por isso usamos apenas aspectos probabilísticos – mas há uma solução oculta, causal, em variáveis ainda ocultas.

Minha posição, conclusão, afirma que, por a realidade ser complexa, praticamente ou pro muito tempo apenas poderemos acessar ela de modo tendencial e probabilística – mas ela é, no fundo, determinística. No mais, 1) o “o que” é e acontecerá de fate é determinista, mas “o como” está em jogo; 2) a realidade tem opções para si e a partícula ou homem escolhe a opção que já deveria escolher, incluso pelo contexto.

 

ACASO E NECESSIDADE

Em primeiro, separo contingência de acaso. Isso faz o marxismo. O acaso é o oposto da necessidade, mas está, ao mesmo tempo, em unidade com ele. O caso mais famoso é ao da evolução das espécies na biologia. Uma mutação genética acontece por acaso; pois bem; ao mudar os descendentes a mutação prospera se facilita a sobrevivência da espécie ou deixa de existir se dificulta a sobrevivência dessa mesma espécie. O acaso aí não nega as leis da biologia, da evolução, mas atua dentro dessas leis (necessidade). Se o presidente morre hoje por um enfarto ao acaso, isso pode acelerar ou atrasar a história, suas leis ou necessidades, as tendências históricas, mas não nega a existência do acaso dentro da necessidade, atuando aí.

 

POSSIBILIDADE E NECESSIDADE CRESCENTES

Piaget atualizou a dialética ao afirmar que há a POSSIBILIDADE CRESCENTE. Algo é cada vez mais possível. Segundo Nahuel Moreno, ele fundiu os opostos, a possibilidade e a necessidade, nesta formulação, da crescente possibilidade. Assim, apenas ao final a necessidade é imposta na realidade. O socialismo é cada vez mais possível dentro do capitalismo, mas somente poderá surgir quando o capitalismo estiver muito maduro, no final, com a alta possibilidade que se desenvolveu.

Penso que, ao mesmo tempo, ocorre a necessidade crescente. Mas ela é mais firme quando a necessidade se realiza após o caminho da possibilidade crescente; pois, a partir daí, a necessidade é cada vez mais necessária.

Além disso, é possível que a possibilidade teste-se a si mesma antes de se tornar necessidade plena. Assim, antes de surgir o capitalismo, tentou-se revoluções burguesas fracassadas. Antes de surgir o socialismo, tentou-se revoluções socialistas fracassadas.

 

PROPOSTA DE ATUALIZAÇÃO

Além das atualizações anteriores, o acaso leva-nos à reflexão do caos e da ordem.

O caos não suporta a si próprio e, nessa autointeração e autorrelação caótica, não tendo lei alguma, tem a lei de passar a si mesmo para seu oposto – a ordem. O caos, por ter uma lei que não é lei, tem como se a ordem dentro de si. A ordem, que veio do caos, por outro lado, ainda é dinâmica, por isso tem como se o oposto, o caos, dentro de si.

Na coisa, a ordem é preenchida pelo caos; mas não há separação por uma parede entre caos e ordem dentro dela, logo a coisa é unidade de ambas ao mesmo tempo.

O caos absoluto é liberdade negativa; e é um sistema, porém não sistemático. A unidade de caos e ordem cai-se na probabilidade.

O socialismo é a ordem, como liberdade positiva, ou seja, é de um lado uma economia central e democraticamente planejada e, por outro, uma livre associação dos produtores.

 

PROPOSTA DE ATUALIZAÇÃO

Movimento = energia = tempo = espaço =matéria = massa = luz = campo

Tudo = Tudo. Tudo é espaço-matéria, espaço condensado, para dentro de si. Tudo e energia em busca de mais energia, em busca de mais de si.

 

RELAÇÃO ABSOLUTA

Agora que o absoluto é sua própria autoexposição, a própria aparência total, podemos ver a relação de substancialidade e a relação de causalidade.

 

SUBSTÂNCIA A ACIDENTES

Os acidentes são aquilo que não é essencial (a cor de algo etc.). A substância é, então, o oposto, o essencial de algo. Porém, Hegel descobre a unidade dos opostos: que a substância produz seus próprios acidentes, põe eles, põe eles como se fossem externos a si (embora não sendo de fato) – mas os acidentes são apenas expressão da substância ao mesmo tempo em que a substância somente é em, dentro de, seus acidentes.

Eles são uma unidade, mas insistamos na diferença deles mais um pouco. A substância vai para fora de si e põe os próprios acidentes, mas, depois, ela “abandona” os acidentes e volta para dentro de si mesma. Substância e acidentes separados produz um meio-termo que os unifica, a potência.

Veja-se. Em nossa metafísica o espaço, embora não primeiro em nosso universo, torna-se substância e as partículas-ondas são os acidentes.

 

CAUSASALIDADE FORMAL

Como potência, a substância é a causa dos acidentes, pois põe estes como se fossem outros para ela, não ela mesma.

Ocorre que a causa só pode ser causa sem tem um efeito e, ao inverso, o efeito só é efeito se tem uma causa – um depende do outro, apesar de ainda não fundidos com apenas um. Ora, se a causa se realiza no efeito, esta mesma causa deixa de existir, logo o efeito deixa de ser efeito. O que sobra disso? Um imediato, uma substância, um conteúdo indiferente em relação à causa e ao efeito – um “mesmo” que está tanto em um quanto, depois, no outro.

 

CAUSALIDADE DETERMINADA

Aquilo que está na causa é aquilo que estará, também, no efeito. Uma chuva molha o chão – logo tanto na chuva quanto no chão há o mesmo, a água.

A causalidade produz, além disso, sua própria causalidade. A água que foi ao chão evapora e produz, novamente, uma nova chuva.

Mas essa causalidade tem o defeito do mau infinito: uma causa tem outra causa, que tem uma causa, que tem uma causa… Um efeito tem um efeito, que tem um efeito, que tem um efeito… Como resolver isso?

 

EFEITO E CONTRAEFEITO

A causa numa substância ativa produz um efeito sobre outra substância, logo esta segunda, a afetada, faz um contraefeito naquela primeira – ida e volta, efeito e contraefeito, a causa passou para outro e, depois, retornou para sua origem. Temos a causalidade recíproca.

A causa passou, ela mesma, para o efeito, tornou-se o efeito, mas teve de retornar para sua origem como contraefeito, como nova causa.

Os humanos modificam o mundo e o mundo modificado modifica o próprio homem. O poderio econômico imperialista dos EUA produz o poderio militar, que, por sua vez, produz mais poderio econômico. O vício em bebida pode causar depressão, e esta última causa, por sua vez, mais vício; ou, ao contrário, começa-se com depressão que produz vício – num ciclo vicioso que se aprofunda. A causa torna-se consequência e a consequência torna-se causa, efeito e contraefeito.

Temos, então, a interação em que a mesma substância absoluta age como várias substâncias diferentes em interação umas com as outras.

 

CAUSA E ACASO

Segundo Lukács, há unidade de causa e acaso. Uma totalidade é feita de muitas partes que causam umas às outras e vice-versa; isso permite que ocorram acasos por causa da complexidade das interações das partes entre elas.

 

UMA INTERPRETAÇÃO

D’O Capital, de Marx extraio a ideia de que há causa com efeitos opostos. Uma desvalorização da moeda brasileira no câmbio produz industrialização, pois compensa comprar dentro do país no lugar de importar, mas também produz, ao mesmo tempo, o oposto, desindustrialização, pois algumas indústrias nacionais necessitam importar insumos e máquinas do exterior.

Há duas formas de tal causalidade: 1) a causa produz um efeito, que, por sua vez, produz um efeito oposto (instalar um novo maquinário derruba a taxa de lucro numa empresa, mas, por produzir matéria-prima mais barata individualmente, aumenta a taxa de lucro de outras empresas, pois reduziram o custo com capital); 2) a causa produz efeitos opostos ao mesmo tempo ou quase.

Um efeito pode vir de diferentes, opostas ou combinadas causas. Para a economia vulgar, a inflação sempre vem do excesso de dinheiro – mas pode ter, na verdade, várias origens, como desvalorização do câmbio, monopólios etc. E mais dinheiro circulando pode mesmo não gerar nenhuma inflação se a velocidade de circulação da moeda cai, por exemplo.

Uma causa pode gerar um efeito ou seu oposto. Novack observou que a industrialização alta produziu um império capitalista nos EUA enquanto produziu miséria e, depois, revolução socialista na Rússia. Mesma causa, efeitos opostos (porque em circunstâncias diferentes).

Os teóricos da complexidade observam que uma grande causa pode produzir um pequeno efeito enquanto uma pequena causa pode produzir um grande efeito. Por quê? Por causa das condições, das circunstâncias em que ocorrem. São as condições ao redor que fazem, por exemplo, uma pequena causa ter grandes consequências.

Causas diferentes, até opostas, que ocorrem ao mesmo tempo possuem, também, uma causa mesma comum a todas elas.

 

IDENTIDADE, DIFERENÇA ETC.

Para a dialética de Hegel, as categorias passam apenas logicamente umas para as outras, pois são sincrônicas, não diacrônicas: a identidade, a diferença, a diversidade etc. já estão todas aí, ao mesmo tempo, ou melhor, sem tempo algum. Em minha dialética, além de tal sincronia, existe também a diacronia das categorias: a identidade passa, a si própria, para a diferença, para a diversidade etc. Na biologia, com um ancestral comum, idêntico a si mesmo, seus descendentes são cada vez mais diferentes do inicial – depois, começa a diversidade: diferentes raças e diferentes espécies novas por mutação – como se depois, começa a oposição entre eles – que cai na contradição, no conflito. Passou-se no processo, no diacrônico, da identidade, para a diferença, para a diversidade etc.

 

CONTRADIÇÃO IDENTIDADE DIFERENÇA

A identidade guarda em si a diferença; a diferença, a identidade. Mas pode haver contradição movente de ambos, que se torna processo ou se resolve. As espécies e os seus indivíduos tendem a se diferenciar por mutação enquanto seleção natural e sexual, ao contrário, age no sentido inverso, para unidade, para o homogêneo, fazendo vencer a luta pela sobrevivência apenas os mais capazes de adaptação.

 

OPOSTOS

Já vimos isso no inorgânico antes. Cumpre notar o princípio, talvez transitórios, da incerteza de Heisenberg que afirma: quanto com mais precisão medimos uma propriedade de uma partícula, menos medimos a propriedade oposta, pois nossos instrumentos afetam o objeto de pesquisa, alterando-o (lançamos, por exemplo, um fóton num elétron, modificando-o). Assim, se medimos com exatidão a posição da partícula, não medimos a velocidade; se medimos a energia, não medimos o tempo etc.

Na biologia, além de tudo evidente, como a luta entre os seres e os sexos, vemos que o corpo humano possui sistemas opostos, simpático e para simpático.

 

 

 

Os opostos estão assim, em unidade, ainda que contraditória.

Na física quântica, Dirac percebeu que os resultados dos seus cálculos poderiam ser tanto com sinal positivo quanto negativo, prevendo a existência da antimatéria, isto é, a matéria com sinal oposto, como neutrino e antineutrino, elétron (-) e antielétron (+). Nesta obra, expomos que os opostos em carga são, no fundo, o mesmo, o que antes era unido e dividiu-se, explicando a atração e a repulsão. Na química, temos a quiralidade, a produção de moléculas quase idênticas, mas opostas, uma canhota e outra destra.

 

(DES)MATERIALIZAÇÃO

Em minha pesquisa, percebi que a matéria da forma vai da materialização para a desmaterialização (claro é que se faz preciso, antes, materializar para, depois, desmaterializar). A forma-dinheiro foi do menos material ao mais material – do cobre para a prata, para o ouro – para então, em seguida, ir rumo ao menos material como mais perecível – do ouro para a prata, para o cobre, para o papel, para o bits. Na vida, surgiram animais cada vez mais materiais até surgir os gigantes (como dinossauros e outros seres), então começou a desmaterialização, a diminuição do tamanho das novas espécies. A quantidade maior de trocas e de dinheiro está ligada à desmaterialização deste; o menor tamanho de certos animais está ligado à possibilidade de maior quantidade deles. A maior materialização, nos dois exemplos, diminui a perecibilidade, aumenta o tempo de vida.

Se há retorno à materialização, após desmaterialização, é algo pertencente ao empírico. Isso está relacionado com a energia disponível. A falta de energia pode diminuir o tamanho de uma espécie.

 

FORMA E CONTEÚDO

Dentro do próton há quarks que têm menos massa, mas seu movimento-energia (conteúdo) aparece como massa extra (forma) de sua totalidade, o próton.

O conteúdo é matéria formada (o abstrato é o concreto em processo).

O desenvolvimento do conteúdo pode entrar em contradição coma forma conservadora. Ou a forma exige muita energia etc. do conteúdo, tendo de resolver tal contradição.

 

DO MENOS PARA O MAIS FORMAL

A realidade vai do informe, do menos formal, à forma. Uma nuvem informe, nebulosa cósmica, torna-se uma estrela com seus planetas “redondos”. Do organismo ameba quase informe até células mais formais como neurônios e seres complexos formatados.

 

TODO E PARTES

Hegel afirma que a força mantém a unidade das partes e do todo, as partes juntas como um todo. Mas a categoria força entrou em crise categorial na ciência moderna (Jammer, Conceitos de Força - Estudo sobre os fundamentos da dinâmica, 2011), substituída por campo (para nós, espaço-tempo) e, dizemos, energia.

Mas essa energia-força não apenas mantém a unidade do todo, mas forma o próprio todo, seja reunindo as partes, seja desenvolvendo uma parte em várias partes. No segundo caso, uma parte não suporta a quantidade de energia em si, então desenvolve-se em multiplicidade integrada, em várias partes com interrelações.

Vale destacar que Hegel trata do todo e das partes, mas sem dizer como o todo forma-se, além do fundamento e das condições tratados bem antes em sua obra. O todo e a parte já estão aí, além de reciprocamente relacionados em sua unidade. O todo é um reunir atrativo de partes, pela “força” (na verdade, pela energia); um todo vem, também, de outro todo que se suprassume, que entra em contradição consigo, ou com parte(s) de si, pela missão, do todo e da parte, de acumular energia. Uma parte do desenvolver do todo, sendo uma parte que é também em si um todo, embora não realizado, desenvolve-se e pluraliza-se, então, se era apenas um antes, igualmente é um depois. Em especial, da parte rumo ao todo: o crescimento e desenvolvimento de um todo dá-se, por isso, pela energia que concentra em si, causa e consequência de seu evolver, como espaço-tempo condensado, em que uma parte torna-se um todo de partes unitário.

Provável, Hegel inspirou-se no fato de a força gravitacional manter unido o todo do sistema solar, de suas partes. Ora, hoje sabemos que a gravidade não é uma força, mas curvatura do espaço-tempo causado pela massa-energia. E mais. A gravidade (a energia, o espaço-tempo curvado) transformou a poeira estelar, por meio desse próprio material, em Sol e seus planetas, em central e orbitantes.

No capitalismo, a energia-valor vinda da energia-força de trabalho mantém o todo como todo, um modo de vida, o capital como autoprocesso. Mais à frente, veremos o papel do circulante, do mediador, na manutenção do todo sistemático.

Aqui, vemos o limite de Hegel; ele: 1) tomou as partes; 2) derivou o todo; 3) disse que as partes formam um todo pela força. Ora, se ele é o filósofo da unidade dos opostos, dos diferentes e diversos, qual a unidade da parte ou das partes e da força? Ele não responde, sequer levanta a questão. Se substituímos força por energia, se energia é massa e espaço, e matéria etc., logo a parte, como matéria, é um só com a “força”, ou seja, com a energia, são diversos e, ao mesmo tempo, o mesmo, um dentro do outro, um sendo o outro. Logo vemos que nossa elaboração, embora direta, é superior à hegeliana em estado puro.

Uma parte, afirmando-se como todo em si, entra em contradição com o todo ou com outra parte por meio do qual entra em contradição também com todo com que qual este é alinhado.

 

CONCRETO E ABSTRATO

O concreto inicial, junto de si, passa para a abstração, a separação, que volta ao concreto. Padrão da geologia: do concreto amorfo, surgiram progressivamente os continentes iniciais, proto-continentes elevados no período Arqueano, que, após processo longo, fundiram-se no Pangeia; este, então, separou-se nos atuais continentes do planeta. O atual afastar aproxima. O nosso universo, provável, sai de um ponto comum (concreto), expande-se com o afastar das partes (abstrato) para possivelmente unir-se de novo (concreto).

 

TRÍADE E COLATERAL

A lógica dialética de Hegel e, de modo materialista, de Marx apresenta a relação de tríade. Tais relações em trio, que são relações categoriais, também ocorrem no real. Para exemplificarmos, algumas inter-relações de tríade: a) infraestrutura, estrutura, superestrutura; b) ID, ego, superego; c) inconsciente, subconsciente, consciente; d) proletariado, setores médios, burguesia; f) indústria de bens de produção, indústria de bens de consumo, indústria bélica; g) prótons, elétrons, nêutrons; i) forças produtivas natureza, técnica, homem; j) matéria-prima, maquinário, trabalhador; etc. Quando e se há, um quarto elemento ou o que destoa chamemos colateral, o que está ao mesmo tempo dentro e fora, separado e integrado.

Nessa obra, essa dialética, manifestada no inchaço do colateral, se apresenta em especial na hiperinflação do capital fictício, no alto desenvolvimento do setor de serviços e aumento da subclasse dos desempregados. Esses inchaços colaterais são expressões e consequências do alto amadurecimento e definhar do sistema capitalista.

Na física, podemos expressar nos quatro estados típicos da matéria: sólido, líquido, gasoso e plasma. Também observamos nas forças fundamentais: força nuclear forte, força nuclear fraca, eletromagnetismo – e a gravidade. Mas a gravidade está “dentro e fora”, pois desde Einstein sabe-se que esta não é uma força mas curvatura do espaço-tempo. Dai a dificuldade dos cientistas de, após unificar as três primeiras, fazer a unificação matemática das quatro forças consideradas.

Continuemos com exemplo de tríade na química, em forma de organização estrutural (abstraído, na formulação retirada, o movimento). Ao tentar classificar – método aristotélico, lógica formal – os elementos químicos, agrupando-os de modo lógico, o químico alemão Johann Wolfgang Dobereiner, em 1817, percebeu que no agrupar de elementos de propriedades semelhantes, tomando a forma de grupos de três, um deles tinha a massa atômica (MA) como média aritmética dos outros dois… Chamou “lei das tríades”. Exemplo: Cloro (Cl), Z 25,5; Bromo (Br), Z 80; Iodo (I), Z 137. Seu modelo foi rejeitado por considerem limitado para classificação simples dos elementos em geral, reunindo-os. Em versão hoje aceita, na tabela periódica, onde há o avanço do mais simples ao mais complexo na formação de elementos: entre metais e não metais, há os semimetais ou metaloides, de características parciais de um e outro – e os gases nobres ou raros (colateral).

Utilizando tal ferramenta, Hegel afirmou existir três macroclimas: muito úmido e frio, muito seco e quente e o rico intermediário entre ambos (tríade). Leitor disciplinado da produção hegeliana, Euclides da Cunha, afirmou na obra Os Sertões (Cunha, 2002) que o filósofo alemão deixou de notar o perfil de alguns climas brasileiros – cap. V, em A Terra, subcap. “Uma Categoria Geográfica que Hegel não Citou” –, em especial o sertão (no livro citado, faz comentários sobre este fator sui generis de norte a sul da nação, em diferentes paisagens), onde as chuvas em excesso por meses ocorrem após secas por maior período, onde o calor violento do dia contrasta com o frio agressivo da noite, etc. Isto é: colateral.

 

REAL E FICTÍCIO

O movimento do real ou verdadeiro rumo ao fictício ou falso e o inverso – pois este desenvolve aquele em si – ocorre na materialidade.

O real produz dentro de si sua própria ficção. Este é meio que tem em si o próprio processo de realização. A própria formação humana, sua realização, produziu o fictício: a arte, ficção do e dentro do real. O fictício, existente, aparece como simulação do real. A ficção é e não é; por ser vazio dentro de si, opõe-se ao seu não ser, o real. No lastro lógico, o real corresponde ao ser enquanto o fictício corresponde ao nada; neste último, a ficção, fica mais evidente a unidade de nada e ser.

A categoria fictício deve ser afastada da pura palavra falso no sentido puro de erro, sendo diferentes; o fictício está dentro do real e é autodesenvolvimento deste. A relação entre verdadeiro e falso na lógica formal é correta em seu nível, trata de especificidades externas, parciais e estáticas. Na dialética, o falso, o fictício, o pseudo, o imaginário, o artificial ou o virtual tem a realidade desenvolvendo-se dentro de si. Também se diferencia da relação dialética real e irreal.

Em matemática, a teoria dos conjuntos numéricos, por meio da evolução social da humanidade, desenvolveu o conjunto dos números reais (naturais, inteiros, racionais e irracionais) até alcançar os números imaginários, fictícios.

O real encaminha-se ao fictício; e este é, por isso, ficção real. É o caso das partículas fictícias ou quasipartículas em física. Em biologia, os pseudofrutos são bons exemplos. Outros casos, mais abstratos, são a força centrífuga como pseudoforça e as falsas espirais na matemática. Em geral, a própria nomeação científica, embora partindo do sujeito, revela a natureza; nosso trabalho aqui, portanto, é perceber e destacar sua unidade interna.

A unidade do real e do fictício é o real efetivo ou completo.

 

 

 

CENTRAL E ORBITANTE

Lucáks critica Hegel por este deixar de perceber que as categorias de A Ciência da Lógica nos livros Doutrina do Ser e Doutrina do Conceito deveriam seguir a forma de determinações de reflexão do livro A Doutrina da Essência (Lukács, Prolegômenos e para ontologia do ser social, 2018). Assim, por exemplo, pôr o qualitativo põe o quantitativo. Pois bem; a obra de Hegel trata do centro apenas, sem colocar aí seu oposto com o qual “mistura-se”. Propomos, então, a relação central e orbitante. O centro é “mais”, naquilo que é central, do que aquilo que o orbita. O central apenas é central com e em relação ao orbitante, e vice-versa; daí a unidade deles.

Quando o leigo pergunta a algum físico sobre a semelhança entre a orbitação do elétron em torno do núcleo e dos planetas em torno do Sol, logo explicam que esta visão atômica é antiga e, portanto, forçada. Percebamos que usa-se a comparação visual no lugar do conceito. Em nível de categoria, a relação próton e elétron é a mesma natureza de Sol-planetas. Entre os seres vivos isso também ocorre, como um macho forte agregando em torno de si outros de sua espécie ou fêmeas.

 

GERAL, PARTICULAR, SINGULAR

Para Hegel, o movimento dialético é de o universal que, diferenciando-se, vai, dentro de si, à particularidade, que se singulariza. Observou tudo de modo invertido; logo comentaremos o motivo de seu erro.

Hegel deixa de ver que o singular evolui, evolve-se, para o particular e o universal. A descoberta disso deve ser creditada, primeiro, a Marx: o pequeno mundo singular do mercado na Idade Média desenvolve-se até ser a totalidade universal capitalista hoje. O singular já é o universal, mas não realizado.

O que se reproduz, o gene individual ou a espécie geral? Ora, a oposição é desnecessária e unilateral. Quando, por exemplo, um animal quer se reproduzir normalmente, ele deve encontrar outro semelhante do sexo oposto, logo não pode ser algo de todo individual, singular.

Há contradição temporária entre o geral e o singular. Quando uma fêmea chimpanzé mata seu filho albino, ela afirma o singular-geral dominante. A singularidade de um indivíduo destoa do geral, da espécie, até formar espécie nova. O coletivo pode oprimir, não afirmar, o individual.

 

 

GÊNERO

Na Doutrina do conceito, Hegel pensa o gênero apenas como o comum no sincrônico na estrutura das espécies. Mas também é assim no diacrônico, no processo. Por exemplo: na verdade, não existe peixe, pois para existir algo assim comum a tantos seres, eles deveriam ter um ancestral único comum, mas não o há.

Os erros de Hegel nessas matérias devem-se ao fato de ele não ter ainda diante de si a Teoria da Evolução das Espécies, que dirá a do Big Bang. Mesmo para um gênio isso pesa, o fator histórico e o nível de desenvolvimento da ciência; para ele, valia a grande classificação, um ao lado do outro, das espécies; igualmente, valia ao movimento repetitivo e tedioso, aparentemente estático, do cosmos, da física de sua época. Diz Hegel, sobre o geral-singular e o gênero; “Mas a natureza orgânica não tem história…” (Hegel, Fenomenologia do espírito, 1992, 2002, p. 212)Logo vemos o seu limite, não tomar as categorias como diacronia interna, não apenas passagem.

 

POSSIBILIDADE E NECESSIDADE CRESCENTES

Piaget atualizou a dialética ao afirmar que há a POSSIBILIDADE CRESCENTE. Algo é cada vez mais possível. Segundo Nahuel Moreno, ele fundiu os opostos, a possibilidade e a necessidade, nesta formulação, da crescente possibilidade. Assim, apenas ao final a necessidade é imposta na realidade. O socialismo é cada vez mais possível dentro do capitalismo, mas somente poderá surgir quando o capitalismo estiver muito maduro, no final, com a alta possibilidade que se desenvolveu.

Penso que, ao mesmo tempo, ocorre a necessidade crescente. Mas ela é mais firme quando a necessidade se realiza após o caminho da possibilidade crescente; pois, a partir daí, a necessidade é cada vez mais necessária (até o ponto de não retorno).

Além disso, é possível que a possibilidade, em seu evolver, teste-se a si mesma antes de se tornar necessidade plena. Assim, antes de surgir o capitalismo, tentou-se revoluções burguesas fracassadas. Antes de surgir o socialismo, tentou-se revoluções socialistas fracassadas.

A contradição aí se dá de duas formas: 1) a necessidade constrange a possibilidade, a subordina a si; 2) a possibilidade tenta afirmar-se antes da necessidade madura.

A necessidade nem sempre encontra a possibilidade de realizar-se. Vejamos a biologia. 1. Folhas verdes – mas absorveriam mais luz se fossem negras; 2. reprodução sexuada dominante –  mas a assexuada seria mais simples, rápida e fácil; 3. dormir –  isso faz perder muito tempo e há duros riscos, melhor seria "desligar" parte do cérebro por vez. São limites a partir dos quais os seres devem se adaptar, pois lhes é impossível uma adaptação máxima, perfeita, como folhas negras.

 

CAUSALIDADE

D’O Capital, de Marx extraio a ideia de que há causa com efeitos opostos. Uma desvalorização da moeda brasileira no câmbio produz industrialização, pois compensa comprar dentro do país no lugar de importar, mas também produz, ao mesmo tempo, o oposto, desindustrialização, pois algumas indústrias nacionais necessitam importar insumos e máquinas do exterior. No inorgânico: a explosão de uma estrela produz onda de choque que impulsiona a formação de novas estrelas. Na biologia: 1) a hipólise estimula uma glândula no corpo humano, mas esse aumento passa a inibir o hormônio hipofisário.

Há duas formas de tal causalidade: 1) a causa produz um efeito, que, por sua vez, produz um efeito oposto (instalar um novo maquinário derruba a taxa de lucro numa empresa, mas, por produzir matéria-prima mais barata individualmente, aumenta a taxa de lucro de outras empresas, pois reduziram o custo com capital); 2) a causa produz efeitos opostos ao mesmo tempo ou quase.

Um efeito pode vir de diferentes, opostas ou combinadas causas. Os olhos do polvo e dos animais terrestres têm origens diferentes. Para a economia vulgar, a inflação sempre vem do excesso de dinheiro – mas pode ter, na verdade, várias origens, como desvalorização do câmbio, monopólios etc. E mais dinheiro circulando pode mesmo não gerar nenhuma inflação se a velocidade de circulação da moeda cai, por exemplo.

Uma causa pode gerar um efeito ou seu oposto. Novack observou que a industrialização alta produziu um império capitalista nos EUA enquanto produziu miséria e, depois, revolução socialista na Rússia. Mesma causa, efeitos opostos (porque em circunstâncias diferentes).

Os teóricos da complexidade observam que uma grande causa pode produzir um pequeno efeito enquanto uma pequena causa pode produzir um grande efeito. Por quê? Por causa das condições, das circunstâncias em que ocorrem. São as condições ao redor que fazem, por exemplo, uma pequena causa ter grandes consequências. Vejamos a contradição. A condição, ao redor, se opõe à causa, mas se torna assim, também, causa. Na década de 1930, a França viveu uma greve geral revolucionária com ocupação massiva de fábricas; os trabalhadores, com esta imensa ousadia, poderiam ter tomado o poder, mas exigiram, depois de tanto esforço e sacrifício, apenas aumento salarial, que logo foi consumido pela inflação. É uma contradição, por exemplo, que uma grande causa cause um pequeno efeito ou que o efeito seja o oposto da natureza e intenção da causa.

Além disso, a causalidade não mecânica pressupõe a possibilidade do atraso da causa sobre o efeito. Isso se dá porque há a inércia e um passado ou estrutura. Uma crise econômica afeta a consciência dos trabalhadores, mas com atraso.

Isso permite rápido comentário. Einstein, nosso gênio, ao que parece, igualou aceleração e gravidade, pois ambos produzem o mesmo efeito. Ora, efeito igual pode ter causas completamente diferentes, não necessariamente iguais de imediato, apenas no fundo como em movimento = massa = energia etc.

As diversas causas, muitas vezes simultâneas, possuem, elas mesmas, juntas, uma causa comum. As várias causas simultâneas de uma crise cíclica têm a mesma causa, mesmo núcleo comum, as questões de produtividade.

Para registro, Lukács, afirma que as partes de um todo interagem entre si reciprocamente, causando-se umas às outras – e isso permite que ocorram acasos.

De modo resumido, a causalidade é recíproca, a causa torna-se efeito e o efeito torna-se causa, em processo de construção. A economia afeta a cultura, mas a cultura afeta a economia. Além disso, o que está na causa continua-se no efeito como a bola de sinuca transfere seu movimento-energia para a outra bola com a qual se choca.

A causa reciproca ocorre em desenvolvimento porque as partes em relação estão em mudança, como energia em busca de mais de si.

A contradição entre efeito e causa, é que aquele contraria a base deste, como um oposto. O crescimento do Estado é a causa da destruição do próprio estado, consequência. Vejamos um caso na biológico, na obra “O biólogo dialético”:

 

Suponhamos que aparece uma mutação em uma espécie com alimento limitado, a qual causa a duplicação da fecundidade sem mudar a eficiência de colheita de alimento e o metabolismo. A mutação vai ser rapidamente estendida através da população, a qual vai ter logo o dobro de fecundidade. Mas como a espécie tem comida limitada, a população adulta não vai ser maior que a anterior. A população recentemente evolucionada estará em melhores condições de crescer rapidamente se há um incremento na provisão de alimento, porém seu número final não será maior que si tivesse fecundidade mais baixa. Por outro lado, se os predadores que se especializam em ovos ou jovens mudam sua imagem de busca a espécies que têm mais abundância nos estados juvenis, , pode reduzir-se a população ou incluso chegar a extinguir-se. (…) As mudanças evolutivas dentro de uma espécie podem causar sua propagação, incrementar seu número ou tamanho da população ou provocar sua extinção. (Levins & Lewontin, 2015, p. 104)

 

 

Ademais, como produz efeitos opostos, o avanço se dá pela passagem da causalidade para a tendência.

 

TENDÊNCIA E CONTRATENDÊNCIA

A tendência produz, de si mesma, a própria contratendência relativa. Eis a contradição em movimento. Uma estrela tende a colapsar dentro de si, mas, além da resistência natural dos átomos, estes se fundem e produzem fótons que empurram para fora. Novas formas de vida que passaram a produzir oxigênio abriram o caminho para maior diversificação biológica, mas, pouco depois de surgirem, tal elemento químico atuou como veneno contra as formas viventes então existentes.

 

COISA EM SI E MATERIAIS

Para nosso trabalho, existe a coisa, não a coisa em si. Hegel descobre que a coisa em si nada é de fato, apenas é suas propriedades reunidas. Estas, então, são apenas materiais, matérias. A coisa se dissolve. As matérias entram e saem dela, e ela não é sequer um limite ou uma barreira para estes materiais. A coisa é um “isto” (em que as matérias estão reunidas) e um “também” (menos ou mais matérias).

Destaco que, para Hegel, os materiais fluem como querem na coisa; mas, se bem observado, elas estão em conexões necessárias uma com as outras, na interpenetração, logo não fluem tanto; ao mesmo tempo, a coisa, e em estado superior como o ser vivo, tende a ser unidade tanto de matérias com interpenetração quase estável quanto, em agregado, os apenas juntos e externos uns aos outros. Por exemplo, diz-se que grande parte do corpo humano são bactérias e vírus em nós; mas o que permite que elas sejam conosco é a interconexão daquilo que permite sermos o que somos, para além ou por debaixo de nossos necessários agregados. Enfim, o mero agregado, onde as matérias são separadas uns dos outras, passa para a interpenetração.

Mais uma observação importa. Kant diz que há limites ao conhecimento – que apenas sabemos do fenômeno, nunca da coisa em si mesma; já Hegel afirma que não sabemos se tais limitações existem ou não, apenas saberemos pesquisando, tentando (e sabemos da coisa em si por meio de suas determinações, de suas propriedades). Muito conhecimento antes impossível agora é claro e possível por causa do desenvolvimento histórico, especialmente o técnico. Pois bem; parece provável que os buracos negros são, enfim, a coisa em si incognoscível, do qual mal podemos saber apenas dos fenômenos (têm apenas três características destacáveis: massa, spin e carga). Na Lógica de Hegel, a coisa em si vai para fora, expõe-se, o interno vai para o externo. Mas o alto evolver do cosmos levou a que a curvatura do espaço-tempo, a energia em busca de mais energia, impedisse que até a luz, o objeto mais rápido existente, escapasse de si.

A coisa em si (abstrato) é suas propriedades (concreto) expressando-se (processo).

 

FIM E MEIO - TELEOLOGIA OBJETIVA

Em Hegel, na Lógica, a teleologia é apenas subjetiva, que usa o objetivo, o objeto, como meio e tem-se na realização da finalidade, do fim, o subjetivo dentro do novo objeto, uma unidade do subjetivo e do objetivo. Exemplo: o escultor usa ferramentas, ou objetos, para agir sobre outros objetos e assim realizar um fim, a sua ideia de escultura - o resultado final tem o subjetivo no resultado objetivo.

Há outra consideração: o fim não está apenas no fim, mas no próprio meio. O fim vai-se realizando no meio, no seu processo, rumo a si mesmo. Esta é uma forma de unidade de fim e meio. Eis a teleologia objetiva, orgânica, que dispensa uma razão pensante ou superior.

Existe ainda o fato de o meio, que deve ser apenas meio, que, por suas propriedades e circunstâncias, torna-se fim – a degeneração do meio em fim, em fim em si mesmo. Esta contradição com o fim real deve ser resolvida. O fim continua afirmando-se como necessidade contra a autonomia do meio.

Para evitar interpretações racistas, a ciência comum afirma que a teoria da evolução seria, na verdade, teoria da diversificação apenas. Uma galinha é “inferior” aos antigos e poderosos dinossauros, mas bem adaptada ao meio. Há aí certa confusão, entre parte e todo. Os animais individuais ou espécies podem mutar-se das mais variadas formas, porém o todo, a biologia, caminha-se para produzir seres cada vez mais capazes, como dos incapazes para os capazes de regular a própria temperatura, teleologia relativamente realizada no homem.

Enfim, Hegel e outros, como Lukács e Aristóteles, colocam o trabalho como centro e caem no maquinismo, separando meio e fim adotando o modelo escolhido como universal, ou metáfora. É uma forma indireta de mecanicismo.

 

 

INTERNO E EXTERNO

Hegel demonstra que os opostos tem certa mesmidade. Um poeta faz um poema na qualidade externa de sua qualidade interna como poeta. O externo expressa o interno; este, por sua pulsão, passa para aquele. O próprio Hegel diz do fato de que, no começo, o objeto é apenas externo, logo apenas interno – então desenvolve-se para algo interno-externo. O externo se internaliza – o interno se externaliza. A matéria externaliza-se ao decair-se em espaço; o espaço internaliza-se ao formar partículas.

Em equação qualitativa, temos, por exemplo: o interno é o externo que se internaliza (ambos, interno e externo podem ser, ora um e ora outro, abstratos; o interno é abstrato por não ser diretamente observado ou o externo, por ser visto de modo isolado – assim, o abstrato é o concreto em processo).

 

DUPLO CARÁTER

Algo tem duplo caráter: a religião é um alívio humanizante, mas fonte de alienação; a luz é uma sobreposição de estados, partícula-onda; a mercadoria é valor de uso e valor. Nesse duplo, um domina o outro, o oposto, uma contradição que é resolvida no evolver. Além disso, um é, na coisa, um em si enquanto o outro é um em contexto (e no processo). Em si, a religião é alienação; no contexto, tem algo oposto, humanitário. Talvez a física descubra o que é “em si” e “em contexto” na dualidade partícula-onda da luz e do elétron. Por exemplo: diz-se que a partícula não é partícula, mas onda e campo, que colapsa em partícula porque a medimos, ou seja, lançamos um fóton nela.

Mario Bunge, que nada entendeu de marxismo para além de erros acadêmicos, tentou refutar o “duplo caráter” em Hegel. Vejamos, de novo, um exemplo da natureza: segundo a seleção sexual, o cervo ter grandes galhas é positivo, uma vantagem, pois vence adversários de espécie em batalhas pela fêmea; mas, segundo a seleção natural, isso é negativo, uma desvantagem, pois dificulta correr para longe de seus predadores – positivo e negativo, vantagem e desvantagem, duplo caráter!

 

PROCESSO E CRISE

A lógica deve elevar ao pensamento puro a lógica real dos ciclos empíricos na biologia, no cosmos, no ser social. No capitalismo, temos crises de 10 em 10 anos, mais ou menos, cíclicos – porém não apenas circular ou repetição, mas processo, desenvolvimento contraditório. A Terra também com ciclos regulares de, mais ou menos, 27 milhões de anos. Os ciclos são, portanto, periódicos. São espiral ou desenvolvimento embora apareçam apenas como repetição circular, regular; ou, antes, o circular faz, dentro de si, o processual. Aqui, entra o conceito central de crise; a crise, como destruição ou risco e oportunidade na sabedoria comum, abre caminho para o desenvolvimento posterior, como novas espécies vivas após uma grande extinção. O capitalismo não vai de equilíbrio em equilíbrio, mas de crise em crise, como afirmou Elias Jabbour; talvez por Hegel ver apenas o início de tal sistema, não tenha encontrado base material para seu grande cérebro formular algo do tipo, mais profundo do que este esboço em ensaio, além de as ciências naturais estarem ainda engatinhando relativo ao que virá no século XX. Assim, todo modo de produção entra em crise terminal após grande desenvolvimento; assim, a psicologia tem suas fases e ciclos. A crise aparece externamente como interrupção do processo, como apenas seu oposto, mas é, na verdade, sua condição de autoelevação.

A crise, desde o processo, é uma questão, em resumo, em igualdade com os demais, energética, como crise de produção. Uma estrela como Sol entra em crise quando a fusão nuclear, sua produção, gera muito ferro, um elemento muito estável, que impede que a gravidade produza novos elementos, interrompe-se o trabalho – a estrela explode, o que produz elementos mais pesados. A crise dos modos de produção – contradição entre forças de produção e relações de produção – começa com problemas de produção e a destinação da energia social-natural, como o Estado sugando muito da sociedade para sustentar o mundo, a própria sociedade, tal como ele é (mas acaba realimentando a crise). Os ciclos planetários, talvez também cósmicos, crises, na nossa Terra geram problemas como a falta de alimento-energia para os seres vivos.

Em geral, amplos processos e crises, que são o mesmo, produzem eras (eras do capital, eras biológicas, eras cósmicas, eras sistêmicas da sociedade etc.).

Kunh informa que as crises científicas levam ao foco em filosofia e novas teorias. Em semelhança, as crises sociais também produzem uma pressão pelo pensamento, por novos guias mentais. As crises biológicas podem levar animais com alguma complexidade a algum traço de pensamento um pouco mais complexo ou protoconciência, como nas abelhas antigas.

 

AUTORRERULAÇÃO DO SISTEMA ORGÂNICO

Em seu Da Guerra, Clausewitz faz uma afirmação válida até hoje: as grandes nações atuam para que a correlação de forças entre os Estados mantenha-se estável, não mude, permaneça. Assim, quando a Rússia invadiu a Ucrânia, todo o mundo ocidental de maior peso saiu em defesa deste contra aquele. A Coisa se autorregula. Assim, o sistema orgânico, que tende a mudar, tende a impedir a mudança de si próprio, age contra si nas duas pontas, contra a permanência e contra a mudança, pela permanência e pela mudança. Assim, os EUA fazem o possível para impedir que um concorrente à altura surja contra si, caso da subordinação do ascendente Japão no final do século XX, algo difícil de fazer contra a China por razão das circunstâncias.

Na biologia, as comunidades e populações são contraditórias e desiguais, mas busca-se o equilíbrio. Na química, o princípio de Le Chatelier diz que a nova combinação de átomos em moléculas por efeito de reagentes pode até se reverter parcialmente, sair do anterior equilíbrio, onde mudança e contramudança se igualavam na equação, para uma adaptação ativa; assim, se aumentamos a pressão, as moléculas podem se recombinar em parte para o modo anterior de maneira a reduzir de novo a pressão, tornar a pressão como a de antes de seu aumento. Vale, sobre o quimismo, um comentário: a pressão externa é, na verdade, internalizada – não é apenas, como pensa um químico ou professor apressados, uma busca abstrata por equilíbrio.

 

CONDIÇÃO

Hegel diz: 1) o todo é absolutamente incondicionado; 2) a condição é relativamente incondicionado em relação ao fundamento; 3) algo somente surge quando todas as condições de seu surgir estão presentes – as condições colapsam para dentro do resultado novo, logo as condições estão no seu condicionado. Algo mais deve ser dito, complementado sobre: algo surge apenas quando as condições de seu surgir e de seu consolidar estão maduros – pois pode surgir sem se consolidar; e isso pode tornar até um tanto mais difícil seu ressurgir. A vida deve ter surgido várias vezes de modo independente, e talvez até hoje surja, mas apenas uma das oportunidades deu certo. E ela surge e ressurge porque há condições para tal como compostos complexos, o meio solvente água e energia alta.

 

NECESSIDADE E ACASO

O acaso ocorre dentro da necessidade, que é o geral. Pode haver contradição entre ambos: o acaso pode adiar a realização da necessidade; por outro lado, o acaso que entra em oposição com a necessidade, definha-se e destrói-se. O fluxo geral da água pode ser determinado, mas, ao ir ao fundo dela, às suas pequenas partes, impera o acaso, um paradoxo real, que aparece como intelectual sem o ser de fato. O acaso de uma mutação prospera se está de acordo com as leis da vida ou definha se dificulta a sobrevivência da espécie por meio do indivíduo.

 

 

ENTRE O JUÍZO E O SILOGISMO

Hegel diz que afirmações do tipo “ser é nada” ou “forma é conteúdo” são proposições impróprias, imperfeitas, falhas e deformadoras. Pois bem; ao que parece, a formulação está, apenas, em muitos casos, incompleta. Podemos dizer “nada é ser no devir” ou “conteúdo é forma com matéria”; assim, mais do que apenas o simples “sujeito é predicado”. Tal fórmula nem cai no juízo puro nem no silogismo completo, mas se aproxima bastante da verdade. De modo cru, quer dizer “A = BC” ou “A é BC”; esta é a fórmula básica, como nas equações quantitativas, por exemplo, o abstrato é o concreto em processo. Quando Lenin diz “política é economia concentrada” chega ao nosso formato, sendo a palavra “concentrada” ou fator de igualdade e conversão.

Na fórmula de fundo e de começo, temos “nada é ser no devir”. Isso permite várias interpretações (assim como certas equações na física permitem diferentes interpretações ), mas reforçamos o inicial de que o ser, em seu movimento, põe o nada relativo no ente de si. Bem observado, rima com F=ma, ou seja, força é igual massa vezes a aceleração; como força foi suprassumida pelo conceito energia, temos, no nível superior, E=mc², energia é igual à massa vezes a velocidade da luz ao quadrado. Serve bem para expor a substituição proposta de nada e força por energia, além da referência ao espaço-tempo.

No mais, tema lateral, elaboramos que nas determinações de desenvolvimento ainda temos A=A e não-A com o acréscimo proposto de A=A e… não-A, pois incluímos o movimento, ou seja, o tempo, este que está na própria coisa, na forma.

Segundo Ruy Fausto, Marx descobriu novo juízo em que o sujeito passa por diferentes predicados sem se confundir com um deles. Dinheiro é – medida dos valores – padrão de preços – capital – meio de pagamento – meio de entesouramento – expressão ímpar do valor. Na verdade, já está como primeiro caso criado de equação qualitativa, entre o juízo e o silogismo.

Para concluir este ponto, valerá a pena esforço teórico para sistematizar modos como “se, então”, “todos, exceto”, “tanto quanto”, “tende à” etc. Um trabalho que não cabe nesta obra.

É comum que um dos elementos de “A é BC”, em geral o “C”, represente movimento, processo. Lenin diz que “política é economia concentrada” e Carl von Clausewitz afirma que “a guerra é a continuação de política por outros meios”; eis duas equações qualitativas bastante concretas, mas inconscientes.

Se não todas, quase todas as categorias opostas são unificadas na seguinte equação qualitativa: a categoria A é a categoria B no processo. Desse modo, o caos (abstrato) é a ordem (concreto) em movimento (processo). Descobrimos, assim, uma nova forma de unidade e identidade das categorias, expressa pelo movimento de pelo menos uma delas.

 

CONCEITO

Para Hegel, como para Aristóteles, a vida tem seu impulso no conceito. Ele, assim, erra ao acertar pela metade. O que há na ideia de vida, no interior, é energia – em busca de mais energia. Sua escolha do conceito acerta apenas ao ser a antecipação lógica, idealista, da realidade do DNA, materialista, o bloco de informação da vida, que se reproduz.

Com a unidade e a identidade de energia, em busca de mais de si, com o espaço-tempo, que se condensa em matéria, espaço-matéria, temos a Arkhé, o absoluto, ou seja, uma nova dialética, uma nova ontologia, uma nova metafísica. A ciência chega, inevitavelmente, a um estágio em que é possível apenas grandes reformas científicas, não mais revoluções do pensamento. Tal parece ser o caso da Ciência da Lógica de Hegel; porém, torna-se possível uma reinterpretação completa, que tem a dialética hegeliana como sua base inevitável por tanto ter avançado – mas base ainda limitada, sem correto fundamento.

Hegel pensou, por limite de seu tempo, que a Ciência da Lógica poderia sustentar-se apenas, em seu início, na forma. Mas demostramos aqui que há um conteúdo, conteúdo lógico-ontológico, fundamental. Quando ele diz, por exemplo, que o devir, como unidade de ser e nada, desaba no ser aí, nunca oferece a base desse desabamento, que nós oferecemos. Afirma ainda que no ser aí, ainda nada há do espaço e do tempo, quando demonstramos que existem no próprio ser aí (na física atual, tanto espaço quanto o próprio tempo estão apenas do lado de fora da coisa, não se sabe como). Assim, acolhemos a forma da dialética hegeliana como nossa, como nosso início e base, embora incompleta e sem base própria. A categoria energia, por exemplo, perpassa e pervade as três modalidades do Ser – ser inorgânico, ser biológico, ser social; além disso, na psicologia, a ideia de Freud do sexo como pulsão elementar da psique , tem dentro de si o conceito puro energia. O quase-materialismo de Hegel agora é de fato materialismo dialético.

 

 

SISTEMÁTICO

Hegel diz do método sistemático, para pesquisa e para exposição, com a analogia do aprendizado da escrita, em sequência: começamos com as vogais, as consoantes, as sílabas, as palavras, as frases e, enfim, o todo do texto. Ora, isso também é diacrônico, no tempo: o homem primitivo teve de evoluir sua fala nesta mesma sequência, assim como a fala da criança. As duas formas de serem sistemáticas são juntos e apenas um, mesmo que ocorram, aqui e ali, certas incorrespondências. Hegel diz que o mais simples e abstrato é o mais geral (hidrogênio, mercadoria, células etc.), logo o começo da exposição, mas também é isso porque é o primeiro na história.

Inspirado na química, completamos: temos: o analítico, que desenvolve a coisa sem nada nela acrescentar, o sintético, que adiciona algo como o oposto na coisa – e o combinatório, simples ou composto.

Exemplo: A - BC para AB - C.

Exemplo: máquina (construção etc.) e matéria-prima como capital constante e força de trabalho como capital variável.

Passa para

Máquina, construção etc. como capital fixo e matéria-prima junto com força de trabalho como capital circulante.

Vejamos outro caso. A combinação de capital comercial e produtivo produziu o domínio do primeiro sobre a produção e as finanças. O domínio do capital produtivo, produziu subordinação do capital comercial e das finanças. O domínio das finanças, combinado com o industrial, produziu dominação do capital industrial e do comercial. Hoje, temos a hiperinflação e domínio do capital fictício. Se limitássemos a combinatória aos maquinário, insumos e força de trabalho; diríamos que tivemos 300 anos de domínio dos “insumos”, 300 de domínio da “máquina”, 300 da força de trabalho, socialismo antes do comunismo. Mas isso logo se demonstra limitado.

A unidade do analítico e do sintético, ambos válidos por si, é o combinatório. Este tanto põe (sintético) quanto, por outro lado, não põe (analítico). Hegel apenas apresenta os opostos e, como dissemos, não viu o movimento, desenvolvimento, do sintético no sistemático; para ele, passamos do analítico para o sintético e vice-versa, como apenas dialética negativa, não positivamente dialético.

Contra Kant, Hegel diz que 7+5=12 é analítico, não sintético. Mas é, bem observado, tanto um quanto o outro, combinatório. 7 e 5 estão separados, depois unidos pela “cola” interna; eles se combinam. O conteúdo – que Hegel diz ser igual antes e depois – é e não é o mesmo, pois combinaram-se, e a forma, algo tão importante para a dialética, mudou, tornou-se 12 unitário.

Outro sentido, lateral, de sistemático vem de uma coincidência curiosa entre psicanálise e história humana, ainda não encontrada por mim na natureza, mas cuja correspondência parece existir na célula viva. Na sociedade, temos: economia, classes, superestrutura subjetiva (mentalidades) e superestrutura objetiva (instituições). Pois bem; a psique arranja-se de modo análogo: ID ou instintivo e impulsivo (economia), ego (classes), parte do superego repressivo (instituições, Estado em central) e parte do superego da idealização de si (mentalidades). Assim, temos: infraestrutura, estrutura e superestrutura, sendo que este último se duplica – e eles se formam, em geral, a partir do infra. Ao que parece, pode-se elevar à lógica ontológica tal sistema. A base (infra e estrutura) é dinâmica e produtiva enquanto a superestrutura dupla é conservadora, conservativa, estrutural.

O método empírico-dedutivo que temos defendido nesta obra é um juízo analítico a posteriori, considerado impossível por Kant. Este defendeu a existência do juízo analítico a priori, sintético a posteriori, além do sintético a priori, que não depende da experiência, para ele a fonte de toda ciência real. Ao contrário, partimos do empírico, da experiência, para saber o que já está nele, mas oculto.

 

UNIDADE DE PRODUÇÃO – FIXO E CIRCULANTE

Hoje sabemos que o Ser é produção. As estrelas, por gravidade, produzem elementos novos, cada vez mais pesados, perdendo energia em forma de fótons e neutrinos. A célula é uma unidade produtiva que produz mais energia do que aquela exigida em sua produção. O homem teve, por exemplo, o campo de trabalho escravo, o feudo, a fábrica com trabalho manual e, agora, a fábrica sem trabalho manual. Temos, então, três fatores universais: a produção-consumo e a distribuição. Ser, não apenas o social, é trabalho também.

Assim, as três modalidades de ser têm o fixo e o circulante. Mas o fixo é, também, circulante, apenas relativamente fixo. No sistema solar, nível inferior de sistema orgânico, a luz é exemplo de circulante. Os elétrons compartilham fótons. Na biologia, o sistema circulatório bombeia o sangue. No capitalismo, temos o capital fixo (máquina, instalações etc.) e o capital circulante (matéria-prima, força de trabalho etc.). O circulante costuma servir de cola adicional que mantém o sistema como sistema; assim, o dinheiro unifica o mundo do capital. Assim, o próton é formado por 3 quarks que se unificam em sistema com o auxílio da partícula glúon, compartilhada entre eles, em movimento. No partido de tipo leninista, revolucionário, o jornal une a militância. Até onde se sabe, aquilo circulante é, em termos absolutos e quantitativos, menor em matéria do que aquilo relativamente fixo.

Em primeiro lugar, o circulante distribui energia, embora possa fazer mais do que isso. As abelhas são o circulante na biologia, em busca de energia, mas também polinizam as flores.

 

A INDUÇÃO DEDUTIVA

A indução, ter grande amostra igual que permite afirmar que “todos os x são y“, e a dedução, partir de dois ou mais postulados (em certo sentido, arbitrários) para ter nova conclusão, são opostos. Vejamos, no entanto, a unidade negativa deles para depois alcançar a positiva. Se todos os muitos patos que observo são negros, logo deduzo que todos os patos são negro, dedução por indução. Se deduzo algo a partir de premissas “aleatórias” ou “intuitivas”, logo tenho que provar uma e várias vezes tal conclusão, indução por dedução.

Mas há a indução dedutiva, unidade positiva dos opostos. Dois postulados (ou mais) podem ter origem indutiva, que derivam uma dedução. Vejamos. Se digo apenas “todas as revoluções socialistas vitoriosas formaram ditaduras”, logo, por indução, “socialismo é ditadura”; mas, se faço a outra, segunda, indução “todas as revoluções socialistas ocorreram em países imaturos”, unificando com a primeira, logo deduzo “as revoluções socialistas caíram em ditaduras porque eram países imaturos para o socialismo”.

Isso não se confunde de todo com o método dialético, que expomos aqui, empírico-dedutivo.

 

A PASSAGEM LÓGICA

Demonstramos A=A e… não-A. A dialética comum diz que o simples é complexo, pois um simples ser vivo unicelular é complexo em si próprio. O socialismo é uma complexidade simples (daí sua maior facilidade de gestão). Isso é correto, mas apenas sincrônico, não diacrônico (o simples de fato, também, avança para o complexo). Agora, porém, seremos sincrônicos ao já termos pesado a mão nos processos.

A=A já põe o segundo A como diferente, logo A=não-A, ou seja, A=A e não=A. Ora, se isso é uma passagem, mesmo se apenas mental ou lógica, logo A=A e… não-A. Façamos agora o caminho inverso. A=A e… não-A. Logo A tem em si a potência de Não-A, logo A=A e não-A (e A permanece em não-A). Assim, se A e não-A são o mesmo ou em unidade, A=Não-A, por isso A=A! Em nossa dialética, em A=A e… não-A, até o “e” importa como impulso de adição, de acréscimo, pois mais é mas, e, ao mesmo tempo, mas é mais.[21] O “…” demonstra o tempo, o movimento, o processo, o genético, o diacrônico, o evolver, o (auto)desenvolvimento, evolução e revolução.

De certa forma e modo, a fórmula A=A e... Não-A funde, em movimento, a lógica formal, A=A, e velha Dialética, A=A e Não-A. Dizer “A=A e não-A” é transição, lógica e histórica, entre o classificatório “A=A” e o dinâmico “A=A e… não-A”.

Lênin, antes de estudar Dialética, caiu na lógica de Kant, dos opostos fixos. Assim, opôs a luta econômica e a luta política, preferindo esta última. Toda a diferença fica assim:

A=A: luta política aqui, luta econômica ali.

A=A e não-A: luta econômica é, ao mesmo tempo, luta política.

A=A e... não-A: a luta econômica torna-se luta política, e vice-versa.

Após uma luta política grande, em geral surgem lutas econômicas; o aumento das lutas econômicas as unificam numa luta política.

As duas formas anteriores, lógica formal e a velha dialética, estão dentro da terceira forma, não apenas negadas.

A unidade e contradição dos opostos categoriais no sincrônico leva ao desenvolvimento das mesmas categorias no diacrônico. O simples vai ao complexo porque o simples é complexo. A identidade vai para a diferença, diversidade, oposição e contradição porque a identidade já é diferença, diversidade, oposição e contradição. Vele observar que certas categorias já podem ser tratadas como estrutura ou processo: “acidente” pode ser processo acidental ou característica acidental; “potência” pode ser possibilidade ou impulso e pulsão. Mas, em geral, devemos demonstrar o movimento real-conceitual interno.

 

SUJEITO E OBJETO

Adorno opõe a dialética fechada de Hegel à dialética aberta (Adorno, 2013, p. 65). Mas há o caminho do meio, o terceiro “excluído”. Pode-se chegar ao todo estável, amplo e correto no geral, sem esgotar, sem domar tudo. Isso permite reformas apenas, atualizações, mesmo que reformas revolucionárias. Veremos neste livro e neste capítulo uma dialética nova, que preserva completamente Hegel, e põe, desta vez, o todo, ainda que não tudo.

A ciência conheceu toda uma etapa burguesa, que foi progressiva para a humanidade em essência, pois ofereceu bases ao socialismo. A ciência será socialista – mais do que de forma latente ou oculta como com a III Revolução Industrial – quando der base ao desenvolvimento da nova forma social, suas tecnologias etc.

Entre as condições para a revolução mundial encontra-se um alto desenvolvimento da ciência e da técnica. É preciso grande conhecimento das propriedades do mundo, de suas possibilidades, de sua natureza e de sua história para revolucionar a sociedade. Enfim, é preciso que o homem tenha produzido as condições para perceber que “somos uma forma do cosmos conhecer a si mesmo” (Sagan). Tal identidade entre sujeito e objeto deve estar latente, ainda exigindo uma nova revolução científica, para sua realização socialista.

A verdade é revolucionária.

 

 

 

o ABSTRATO é o

CONCRETO

Em PROCESSO

O nada é o

Ser

Em devir

O ser é o

Nada-infinito

Que implode

Outro é o

Algo

Que passou para outro

A determinação é a

Constituição

Formada

O mal infinito é o

Finito

Indo além de seu limite e barreira

O finito é o

Bom infinito

Que produz a finitude

O muito (múltiplo) é o

Uno (um)

Que se fragmenta, pluraliza

O uno (um) é o

Múltiplo (muitos)

Que se reúne, concentra-se

O intensivo é o

Extensivo

Concentrado

O extensivo é o

Intensivo

Que se expande

A qualidade é a

Quantidade

Em mudança

A quantidade é a

Qualidade

Em alteração

O contínuo é o

Discreto

Concentrado, reunido

O discreto é o

Contínuo

Disperso

A aparência é a

Essência

Que aparece

O conteúdo é a

Matéria

Formada

O fundamentado é o

Fundamento

Que avança

A Coisa é as

Condições

Que desabam “para dentro”

O interno é o

Externo

Que se interrnaliza

O externo é o

Interno

Que se externaliza

O acaso ou o acidente é a

Necessidade

Que se revela

A liberdade é a

Necessidade

Desenvolvida

O acaso das

relações causais recíprocas das partes-todo

Ocorre

A necessidade é a

possibilidade

Crescente

A realidade é o

Desigual e combinado

desenvolvimento

O sujeito é o

objeto

Que se transcende

A realidade é a

Substância

Em autorrelações

O desigual e combinado é a    Realidade  em                           Desenvolvimento

 

 

 

OS MÉTODOS CIENTÍFICOS

 

É muito comum em meios universitários e entre militantes de esquerda dizer “isso é dialético” para afirma que algo é complicado, confuso, misturado. A dialética é algo sobre o qual muitos falam, mas poucos sabem exatamente do que se trata. Os textos a seguir pretendem oferecer uma introdução de fato completa e clara.

A dialética é 1) um método científico, 2) uma lógica da realidade e do pensamento (logo, uma concepção de mundo, como afirmar que o real é necessariamente contraditório) e 3) uma forma de exposição da pesquisa científica concluída. No nosso dia a dia, comum ouvir alguém reclamar “isso não tem lógica, é contraditório!”; ao contrário, o dialético é o contraditório – apenas há lógica na contradição! Na Grécia antiga, a dialética era vista como parte da arte do diálogo, como Sócrates fazendo os adversários com os quais debatia cair em uma posição contraditória, a corrigir seus argumentos. Muitos séculos depois, o alemão Hegel escreveu uma obra chamada Ciência da Lógica, que toma para si toda a história do pensamento, e chega a conclusões inteiramente novas. Por exemplo: a história da filosofia caiu numa oposição: ou o universo era formado pelo acaso ou, ao contrário, por leis necessárias, então Hegel resolveu com a conclusão de que o acaso atua junto e em base à lei, à necessidade (a necessidade é aquilo que, de fato, é); a lei dá as condições para o acaso, seu oposto, acontecer, o acaso é o acontecer da própria necessidade (lei) – demonstra uma unidade, ainda que contraditória, dos opostos, acaso e necessidade (lei). Mas, se pareceu difícil, não adiantemos demais os assuntos: avancemos aos poucos e progressivamente.

 

A HISTÓRIA DO MÉTODO CIENTÍFICO

 

RELIGIÃO

O primeiro método é o mais distante de si próprio, seu oposto e negação – ou seja, um método não científico. Os homens percebiam padrões tantas vezes reais, então davam uma explicação mística àquela regularidade, à repetição. Assim os antigos sacerdotes judeus diziam que Deus desejava que lavássemos as mãos antes das refeições.

 

FILOSOFIA

Separando-se e derivando da mitologia, a filosofia antiga tinha de lidar com a falta de dados empíricos. Para isso, contava com o pensamento, com a busca de bons raciocínios e argumentos para tentar explicar o mundo.

Os filósofos negavam o empírico como algo sem permanência, incerto, perecível. Buscavam – aí está o lado forte – a essência da realidade, porém consideravam esta mesma essência como imutável, imóvel (diferente do que considera a dialética moderna). Um dos lados fortes de tal postura é querer saber das coisas nas próprias coisas, “deixar a pedra falar por ela mesma”.

 

EMPIRISMO

O empirismo afirma que o cientista deve limitar-se a colher e organizar os dados empíricos. Apenas, e talvez um ou outro comentário lateral entre os gráficos. Para Bacon, por exemplo, os sentidos revelavam a realidade, por isso devemos usar o seguinte procedimento: colher dados e, depois, generalizá-los – chamamos método indutivo. Segundo esse pensador, o erro seria colocar nossos pensamentos, nossos valores, nossos pontos de vista enganadores sobre os dados. O lado positivo é seu apresso pelo empírico, mas seu lado negativo é limitar-se aí.

Hegel usa a seguinte metáfora para sua crítica: afirma que o empirismo separa as camadas da cebola, que, na verdade, crescem conjuntamente, e esquece-se de reunir o que foi separado (abstraído). Eles veem as pates do todo, mas esquecem da interação delas e que o todo tem características próprias, que as parte não têm.

O empirismo toma dados empíricos e generaliza aquilo que é repetido. O problema é que deixa de tomar a realidade em seu movimento, em seu desenvolvimento.

Um exemplo desse método é seu uso por Freud. Ele observou que várias pessoas tinham esta ou aquela característica central, logo ele pensou: existem três tipos de personalidade – 1) a psicótica, que é rígida nas ideias, 2) a neurótica, que reformula as ideias, 3) a perversa, que adota esta ou, depois, ao contrário, aquela ideia se causará prazer para si, se lhe dá alguma vantagem. É uma generalização, uma indução.

Hoje, quando temos computadores que percebem vários padrões ocultos, o trabalho apenas empirista tornou-se desnecessário, a máquina faz o trabalho melhor, cabendo ao cientista a interpretação dos dados.

 

RACIONALISMO

O racionalismo defende que se deve ir de conclusões racionais encaminhando novas conclusões racionais. É o método dedutivo. O cientista faz uma afirmação que considera verdadeira, então deduz daí as consequências de tal proposta.

O lado positivo da visão é que colocar tudo sob dúvida, como as supostas premissas obrigatórias. O lado negativo, segundo Hegel, é que não propõe verdadeiramente um método.

Os racionalistas pensavam que os dados poderiam nos enganar com muita frequência, logo é a razão que deveria guiar o trabalho do cientista – o oposto da ideia dos empiristas.

Einstein usou e defendeu o método dedutivo, embora, no fundo, sem saber, seu método fosse outro, como demonstraremos. Ele partia, por exemplo, das premissas “arbitrárias” 1) as leis do universo são as mesmas se o observador não está em aceleração; 2) a velocidade da luz é a maior possível no universo. Daí ele derivava conclusões, que poderiam se provadas.

 

A EVOLUÇÃO DAS TENTATIVAS DE UNIFICAÇÃO

A história da filosofia caiu-se em uma oposição entre empirismo e racionalismo. Veremos agora dois outros métodos científicos que procuram, cada um depois e mais avançado que o outro, resolver a questão – os métodos hipotético-dedutivo e dialético em principal.

 

KANTISMO

Kant tentou unir empirismo e racionalismo com a seguinte proposta: temos conceitos feitos pelo homem (racionalismo) que organizam a empiria, os dados confusos (empirismo). A crítica dialética é a de que os conceitos devem mudar se os dados empíricos mudam, se a realidade muda, ou seja, os conceitos devem se adaptar aos dados, não é os dados que devem caber dentro dos conceitos – os conceitos nada têm de fixos, eternos, imóveis, diferente do que defendia o kantismo.

A ideia de Kant entrou em decadência por muitos fatores. Entre eles: ele pensava o espaço e o tempo como categorias apenas mentais, para organizar o pensamento “por fora”, mas a física einsteana provou que o espaço-tempo existe.

 

HIPOTÉTICO-DEDUTIVO

Sobre o método hipotético-dedutivo de Popper, dito em resumo: diante de um problema científico, delimita-se uma hipótese (ideia, racionalismo, subjetividade) e o cientista escolhe, ele mesmo, o método de verificação empírica (empirismo). A hipótese é, assim, testada – verificada. Como os demais, esse método rendeu muitos frutos, mas tem seus limites: um deles é que muitas vezes descobrimos o “como” da realidade, porém também temos de descobrir o “motivo”, o “porque”. Além disso, pensar hipóteses é quase um tiro no escuro, mesmo com critérios que limitam tais hipóteses. O mesmo fato pode ter vários e vários fundamentos, razões diferentes, causas diferentes.

A crítica conclui:

1)  Nem sempre se parte de hipóteses, pois podemos simplesmente ir colher dados como primeira ação.

2)  Uma hipótese não precisa ser falsificada, como quer Popper, mas, antes, comprovada.

3)  Uma teoria errar uma previsão não significa que ela seja descartável, mas que deve ser apenas adaptada, em parte alterada, mantendo seu núcleo central de pé.

4)  Há casos na ciência em que uma teoria erra a previsão, não acerta o fato, mas depois, por insistência nela, descobre-se que é, na verdade, correta. Por exemplo: a teoria da gravidade levava à previsão de novos planetas no sistema solar, mas não eles foram encontrados; mesmo assim, a teimosia de defender a teoria “errada”, fez depois descobrir tais planetas ocultos.

Portanto, a concepção científica de Popper demonstrou-se limitada. Para ele, tanto o marxismo quanto a teoria da evolução não são ciências. Diante do prestígio da segunda teoria, atacado por isso, recuou, no início apenas de modo parcial, afirmando que a teoria de Darwin era certa metafísica bem sucedida, mas não em exato ciência. A questão é que o método defendido por Popper não é capaz de lidar com ciências que levam em conta a história do objeto de estudo, como a história humana, a história biológica, a geologia, a cosmologia etc.

 

DIALÉTICA (EMPÍRICO-DEDUTIVO)

Indo direto ao ponto, muito resumido: a dialética é o ir aos dados empíricos, colhê-los, depois, ou quase depois, passar a fazer intepretações, conclusões (não somente comentários) deles – e critica-se os limites e enganos dos dados empíricos. Do objeto em pesquisa, ver-se a estrutura e o processo, o sistemático e o histórico, o genético, a aparência e a essência, o externo e o interno, o diverso e a unidade interna e oculta. 

Leiamos o próprio Marx sobre seu método:

 

A investigação deve se apropriar da matéria (…) em seus detalhes, analisar suas diferentes formas de desenvolvimento e rastrear seu nexo interno. Somente depois de consumado tal trabalho é que se pode expor adequadamente o movimento real. (Marx, K. (2013). O capital I. São Paulo: Boitempo. P. 90; grifo nosso.)

 

Ao longo deste livro, evito colocar citações, porém é impossível fazer um resumo tão claro quanto. Vejamos, agora, um comentador de O Capital elogiado por Marx:

 

Para Marx, apenas uma coisa é importante: descobrir a lei dos fenômenos com cuja investigação ele se ocupa. E importa-lhe não só a lei que os rege, uma vez que tenham adquirido uma forma acabada e se encontrem numa inter-relação que se pode observar num período determinado. Para ele, importa sobretudo a lei de sua modificação, de seu desenvolvimento, isto é, a transformação de uma forma a outra, de uma ordem de inter-relação a outra. Tão logo tenha descoberto essa lei, ele investiga em detalhes os efeitos por meio dos quais ela se manifesta na vida social. (Idem)

 

Lembramos o leitor que o método não é o critério da verdade. Com os demais métodos, ao menos uma parte importante da realidade foi compreendida pelos cientistas. O método dialético é apenas o mais profundo – também o mais difícil, por isso merece mais de um capítulo nesta obra.

Vejamos o que diz Hegel:

 

Mas a filosofia não deve ser uma narração daquilo que acontece, e sim um conhecimento daquilo que é verdadeiro no acontecimento e, além disso, a partir do verdadeiro, ela deve compreender aquilo que, na narração, aparece como um mero acontecer. (Hegel, Ciência da Lógica, Doutrina do Conceito, Ed. Vozes, p. 50.)

 

Para esta citação, vale um exemplo. A mera descrição da história da humanidade dirá que tivemos o escravismo; depois, a servidão (feudalismo); depois, o trabalho assalariado (capitalismo); depois, o trabalho associado (socialismo). Mas o que isso diz, embora sem dizer? Veja que a passagem de um sistema de trabalho para outro, com o aumento da produtividade, torna o homem cada vez mais livre: o servo é mais livre que o escravo; o assalariado moderno, formalmente livre, é mais livre que o servo; o trabalhador associado, verdadeiramente livre, é mais livre que o assalariado – há uma tendência para a liberdade. Isso, a conclusão, não é algo palpável, sensível ou tocável, mas descobre-se que é verdadeiro a partir do empírico.

O método dialético evita de todo elaborar hipóteses, fazer especulações, histórias metafóricas etc. O cientista colhe o conjunto dos dados empíricos (empirismo, o papel necessário das informações) e busca descobrir, a partir daí, o não empírico (racionalismo, o papel ativo do pensamento, do sujeito). Em linguagem de Hegel: descobrir o suprassensível, o não sensível, por meio do sensível.

A dialética funde racionalismo e empirismo. É verdade que os dados empíricos são vitais e são o começo da pesquisa, como diz o empirismo, mas também é verdade que os dados empíricos, ao mesmo tempo, escondem a verdade e enganam, como diz o racionalismo, logo usamos a razão para ver a conexão interna da realidade, para perceber os enganos da aparência dos dados, para ir além e abaixo ou dentro daquilo empírico.

Vejamos o método dialético. A partir da e na aparência saber a essência, da e na forma saber o conteúdo, da e na externalidade saber a internalidade, da e na diversidade saber sua unidade, do e no fundamentado saber o fundamento – nunca fora deles, mas neles mesmos. É possível perceber, mas não é possível tocar a verdade, pois ela não é uma coisa.

Chamo tal método, aqui exposto e desenvolvido enfim, método empírico-dedutivo (dialético). A conclusão, o não empírico, vem dos dados, mas os dados não dizem, ou melhor, escondem e revelam ao mesmo tempo. Reforçamos, portanto: 1) do empírico podemos chegar, também, a algo real, mas não diretamente observável, como o valor econômico, ou o elétron, ou a energia; 2) Os dados e a aparência podem enganar, não basta colher pistas ou provas.

Bem ou mal, cientes ou não; Darwin, Einstein, Marx e Freud usaram o método empírico-dedutivo (dialético). As premissas das quais partia Einstein eram razoáveis no sentido de já terem sido observadas, não eram arbitrárias e criativas, daí derivava conclusões. Darwin percorreu o mundo para conhecer a natureza viva em sua empiria para, daí, alcançar concussões – Wallace fez o mesmo. Freud ouvia sonhos dos pacientes e suas falas aparentemente soltas e desconexas para, aí então, perceber uma unidade interna oculta.

Hegel explica que devemos começar pelos dados empíricos, sem impor conceitos:

 

O saber que, de início, ou imediatamente, é nosso objeto, não pode ser nenhuma outro senão o saber que é imediato: - saber do imediato ou do essente. Devemos proceder também, de forma imediata ou receptiva, nada mudando assim na maneira como e se oferece e afastando de nosso apreender o conceituar. (Hegel, Fenomenologia do espírito, 1992, 2002, p. 83)

 

E critica o começo dedutivo do racionalismo:

 

Quando se apresenta à ciência, como pedra de toque – diante da qual não poderia de modo algum sustentar-se –, a exigência de deduzir, construir, encontrar a priori (ou seja como for) o que se chama esta coisa ou um este homem, então seria justo que a exigência dissesse que é esta coisa, o qual é este Eu que ela “visa”; porém, é impossível dizer isso. (Idem, p. 87)

 

No procedimento dialético, partimos do Ser, ou seja, vemos o qualitativo, o quantitativo e medimos; em seguida, chegamos, assim, no não empírico, na essência; a partir disso, no fim, alcançamos os conceitos necessários.

A seguir, comparamos a metodologia comum nas universidades com o procedimento dialético.

 

 

COMPARAÇÃO ENTRE OS MÉTODOS

No geral, veremos que, na relação sujeito-objeto ou objeto-sujeito, a prioridade, o mais correto, é adaptar-se ao objeto de pesquisa. 

 

Paradigmas

A ciência anterior procurou objetos físicos como exemplares do funcionamento da realidade. O mundo, a sociedade, o universo seriam como um relógio, uma máquina, um computador. Um erudito sociólogo pode, assim, reclamar da existência de greves, pois os operários dessa forma negam seu papel no relógio social, isto é, rompem com um modelo artificial, posto de fora…

A realidade é sistemática ou orgânica. Veja que tais palavras são mais abstratas, intocáveis. A concepção de sistema orgânico – ou complexo dinâmico – é, na verdade, mais concreto porque permite antever o objeto de estudo como complexo, composto de partes interligadas e mutualmente causais, em desenvolvimento, mutável, contraditório etc. Vejamos em psicologia: aspectos específicos do cérebro podem ser semelhantes a circuitos mecânicos, mas o todo é irredutível a tal concepção, se bem observada, muito pobre. A realidade também não é como o corpo humano, pois, além da estrutura orgânica, temos de ver, também, o processo, a história do objeto de estudo.

A concepção de mecanicista de mundo tem origem histórica e efeito até mesmo no inconsciente dos cientistas. A cientificidade no capitalismo estava ligada à necessidade de produzir novas ferramentas, produtos-mercadorias e máquinas. Daí que a visão mecânica teve uma pesada base para impor. O maquinário, não a visão orgânica sistemática, tornou-se majoritária. Mas se a ciência que alçar voos mais altos ou menores, no macro e no micro, terá de considerar a realidade de outro modo, tal como ela é.

 

Escolha de premissas

Segundo o procedimento comum, o cientista precisa escolher entre duas premissas opostas: ou o homem é o lobo do homem ou o homem nasce bom e a sociedade o corrompe. Ora, escolher qualquer um dos caminhos é limitar a visão da realidade já na partida. O correto é escolher a realidade empírica como sua base; uma antecipação filosófica, uma concepção, deve ser resultado de pesquisa – não o começo. De igual maneira, um postulado ou princípio deve ser a solução final, o resultado que resolve, no lugar de ser o começo da pesquisa.

 

 

 

Com quais conceitos?

Em projetos de pesquisa é comum perguntar com quais categorias o estudioso contará para alcançar conclusões. É o método científico anterior, inspirado em Kant. O método dialético tem, primeiro, de pesquisar a fundo para descobrir as categorias: elas são resultados, não o começo. Os conceitos não são inventados, fazendo a realidade caber neles; são descobertos e devem corresponder a um objeto real. Tem-se um conjunto categorial após a pesquisa. Enquanto o objeto é histórico, ele tem início com desenvolvimento e um fim. O trabalho surge num momento específico da história. Desde sua origem, modifica-se: trabalho primitivo, trabalho escravo, trabalho servil, trabalho assalariado, trabalho associado.

Parte do esforço científico é a crítica das categorias. Há categorias de essência e de aparência. Por exemplo: dividir partidos em direita e esquerda é usual e correto em seu nível, mas é limitado na ciência mais profunda; partidos e líderes políticos representam com seus programas interesses de classes e frações de classes sociais; há partidos cujo programa representa os bancos, os industriais, a classe média servidora pública, os operários, etc. As categorias de aparência avançam em certos aspectos e limitam em outros, por isso a tarefa é descobrir as categorias de essência. As categorias de aparência são, também, em certo sentido, o ponto de partida, mas ao mesmo tempo em que são criticados.

Kant considera que os conceitos são anteriores, algo puramente mental, principalmente o espaço e o tempo. Assim, tenta guardar para si o lado racionalista. No parágrafo anterior demonstrados que se pode ser mais sofisticado.

É mais fácil ao esforço científico alcançar conceitos de aparência da realidade, que tanto avançam quanto impedem o avançar da compreensão do real. Ir à essência, compreender a essência da realidade, é o salto necessário à resolução dos mais profundos problemas científicos, que não cabem nos limites do aparencial. Valor de troca e valor de troca preço são categorias importantes, porém a realidade social capitalista apenas pode ser explicada pela categoria interna a elas, que elas expressam e ao mesmo tempo ocultam, como o valor-trabalho. Daí que o projeto inicial de Marx e Engels levava o nome de "crítica das categorias da economia política".

Vejamos um caso de atualização categorial. Marx percebeu que, diferente de outros tipos de sociedade, o desemprego é uma lei social no capitalismo, chamou “exército industrial de reserva”. Com o desemprego crônico, Leon Trotsky necessitou atualizar o conceito para “subclasse de desempregados”.

Em psicologia é cobrado em doutorado sobre os conceitos com os quais contará. Se escolhesse, por exemplo, os da psicanálise – pulsão de morte, complexo de Édipo etc. –, começaria limitando sua pesquisa a categorias arbitrariamente eleitas.

No mais, o método dialético evita trabalhar com definições: o conceito é cada vez mais preenchido. Exemplo: o conceito de consciência não cabe numa simples definição única, ao contrário, vai sendo “encharcado”; aparece como “a consciência é sempre consciência de algo”, depois como “imaginação determinada”, depois é “alucinação relativa” etc. Exemplo de Marx: o capital é, no decorrer de seu livro, dinheiro e mercadoria, valor que se autovaloriza, trabalho morto que suga trabalho vivo, uma relação social e não uma coisa, etc. Na física, energia como conceito tem inúmeros significados, todos corretos e limitados.

Os conceitos de positivo e negativo na físico-química são de aparência. Como o próton e o elétron, tão diferentes e desproporcionais, seriam de carga +1 e -1? Descobrimos que os opostos são, antes, partes, embora também inteiros em si, de algo antes uno, por isso um encaixa-se e desliza-se no outro.

 

Fontes

Toda fonte é útil e, em certa medida, obrigatória: estatísticas, entrevistas, relatos,etc. A história positivista considerava válido apenas o material empírico das fontes oficiais do Estado… É uma concepção limitada. Os pós-modernos caem no erro oposto, qual seja, desconsideram dados estatísticos, quantitativos.

Em geral, é o objeto de pesquisa que determina como ele será descoberto, logo nossa pesquisadora evita escolher por si como avaliar o real e tenta esgotar todas as fontes possíveis rumo à verdade.

A pesquisa dialética é como estar em um labirinto. É preciso andar, aprender, percorrer, testar até entender o ambiente inteiro e, somente depois disso, encontrar o caminho correto.

 

Espaço e tempo

A orientadora de uma psicóloga pede que, para simplificar a pesquisa, limite em um determinado espaço, como um bairro da cidade, e em um determinado tempo, talvez uma década. Ora, mais uma vez é o objeto da pesquisa que deve delimitar o tempo e o espaço necessários para compreender de fato, por exemplo, o fenômeno do suicídio em Teresina/PI.

 

Interdisciplinaridade

Hoje, não é clara a fronteira da química e da física na física quântica. A ciência hiperespecializada não alcança a verdade.

O caso acima é hipotético, mas indica como é o trabalho científico: a especialização deve ser acompanhada com uma cultura mais geral. Em parte, no decorrer da pesquisa, que costuma demorar anos, o cientista modifica-se, adquire tais conhecimentos. A verdadeira pesquisa costuma unir várias áreas de conhecimento, antes separadas e especializadas.

 

A hipótese

O método hipotético-dedutivo começa com a hipótese diante de um problema. O método dialético, ao contrário, termina com hipóteses, previsões e tendências. Foi a partir da avaliação da realidade que Marx percebeu que a livre concorrência de sua época desemborcaria no seu oposto, na sua negação, nos monopólios e oligopólios; concluiu que a tendência seria a redução do número de operários nas fábricas, substituídos pelo maquinário, o que corresponde hoje à automação/robótica; expôs que a taxa de lucro tende à queda no longo prazo (na sua época, foi mais uma demonstração lógico-matemática enquanto hoje é empiricamente observado, pois temos dados de duração secular). Por fim, destacamos que nem tudo permite previsão exata apenas porque foi explicado; Marx explicou as crises cíclicas do capitalismo, mas é impossível daí fazer previsões de quando e onde será exatamente a próxima quebra econômica (porque o objeto, a realidade, é muito complexo).

 

Historicidade

A realidade deve ser vista no espaço e no tempo. Interessa mais as leis da mudança da realidade, além das leis regulares e “permanentes”. É preciso ver, portanto a estrutura e a mudança, o que é próprio de cada época.

 

Como organizar o material

Na ciência comum, cabe ao pesquisador organizar como deseja os dados empíricos, tecer alguns comentários, aqui e ali, entre uma estatística e outra, e talvez encerrar seu livro com alguma proposta. A dialética descobre, ao contrário, que a organização de um livro, de uma sequência de capítulos, deve surgir do próprio objeto de pesquisa – nunca é uma junção arbitrária. Um capítulo, por exemplo, deve derivar o próximo, que deriva o outro, que deriva o seguinte, e assim por diante. O que é tratado no primeiro capítulo é condição para entender o segundo capítulo e todos os demais. Em minha pesquisa, A crise sistêmica, tive de tratar primeiro da economia, depois das classes, depois da subjetividade, depois das organizações – em sequência. Fiz isso não por um “modelo” artificial, mas porque a própria realidade tem essa hierarquia, exigindo uma hierarquia semelhante também no avançar do livro. Se fizesse diferente, quase a todo momento teria de remeter a assuntos ainda não tratados.

 

O que pesquisar

De imediato, a liberdade de tema para pesquisa deve ser completa, pois o pesquisador vai ao rumo daquele assunto que lhe interessa. Mas, se o pesquisador tem responsabilidade, ele pesquisa o que a realidade ou a teoria estão de fato necessitando. Pode-se, por exemplo, listar uma série de temas centrais, urgentes, e escolher entre eles qual tem mais afinidade. No fundo, o objeto, o real, determina qual vai ser o tema da pesquisa – se se quer fazer algo relevante, útil. No Brasil, pesquisa-se bem menos sobre violência urbana do que a importância do tema, do problema.

 

 

 

Prioridade do objeto

Nos tópicos anteriores, fomos demonstrando a “prioridade ou centralidade do objeto” na pesquisa. Isso é o dialético. Kant colocava, ao contrário, o sujeito como central, pois ele escolheria o espaço e o tempo, os conceitos, como organizar a pesquisa etc. Esse é método inferior, anterior a Hegel e Marx. Tomar para si a prioridade do objeto é a grande conquista científica.

 

Bibliografia

Devemos revisar o que já foi dito sobre o nosso objeto de pesquisa. É preciso ver, em outros autores, seus acertos nos seus erros e seus erros nos seus acertos, além de criticar as categorias usadas por eles. Em geral, uma área de pesquisa cai em teorias ou teses opostas inimigas e ambas unilaterais, parciais, erradas e certas ao mesmo tempo; isso nos dá a oportunidade de resolver a polêmica e encontrar uma terceira resposta que explica porque erraram e também acertaram os teóricos anteriores. Levamos ideias de outros ao máximo desenvolvimento até que são superadas por elas mesmas, transcendem ou são por si mesmas extrapoladas. Assim é a refutação dialética de outra tese: mostrar sua incompletude, desenvolvê-la ao máximo e corrigi-la.

 

Ideologia

Toda grande teoria tem sua versão vulgar. Entre alguns cientistas, afirma-se que é preciso separar a informação objetiva de ideologias. Mas ideologização é, apenas, uma concepção de mundo; se uma descoberta científica altera nosso modo de ver a realidade, ele gera uma nova ideologia como um dos produtos seus. Se o Sol passa a estar no centro do universo, não mais a Terra – tudo muda. Nossa sensibilidade, nossa capacidade de ver o mundo, é, assim, histórica, avança na história.

Podemos separar a verdadeira ideologia da falsa ideologia. A primeira está revelando com o mundo tal como ele é – por aproximação da verdade; a segunda, ao inverso, mistifica ou deforma a realidade, produz um engano.

 

Filosofia

Desde Kant e Hegel, a filosofia separada da ciência tornou-se uma fraqueza. O desenvolvimento de uma pesquisa é tanto mais filosófica quanto mais profunda, por isso o método dialético funde ciência e filosofia na exposição de suas pesquisas.

 

O perfil do cientista

Nas ciências humanas, a posição do cientista perante a realidade – se é conservador ou revolucionário, se é religioso ou ateu etc. – e sua própria realidade – se é ligado aos trabalhadores ou aos ricos, se sua vida é ativa e contraditória ou extremamente estável – afeta a capacidade de ver o mundo tal como ele é de fato. Em geral, a posição verdadeiramente crítica é superior.

Nas ciências exatas e biológicas, isto não é uma verdade em si. Mas é de se supor que o estilo de vida do cientista, no sentido amplo, ajuda ou atrapalha indiretamente seus avanços.

Na psicologia, percebe-se que certos estudantes limitados sexualmente têm dificuldades com a teoria freudiana (estando tal teoria correta ou não). Outros negam as demais teorias e refugiam-se em Jung para evitar a crise de lidar com a crítica irreligiosa, para fugir de conclusões ateístas.

Nas áreas como história, economia e sociologia, os pensadores têm mais ou menos dificuldade – e mesmo capacidade – de ir a fundo no objeto de pesquisa, de acessar a realidade, segundo o projeto social que reivindicam, a classe ao qual pertencem etc. por mais que sejam muito esforçados. Nunca os economistas ligados aos patrões chegariam às conclusões tão profundas de Marx em O Capital.

A moderna ciência da mente reforça isso. Certo grau de estresse, ao menos sob o capitalismo, é necessário para a criatividade como a árvore dá flor e fruto quando se sente ameaçada. A vida dos militantes socialistas é sem rotina, com novidade constante, com desafios, com ameaças – por isso, também, o movimento comunista produziu tantos gênios.

Além disso, como sujeito-ferramenta, o cientista tem que ser capaz de ver, deve ser culto, como conhecimento do melhor na filosofia. Indicamos os seguintes filósofos: os pré-socráticos, Platão, Aristóteles, Epicuro, Hegel, Marx e Engels.

 

O critério da verdade

A teoria das cordas na física, por exemplo, quer “provar” sua validade por ser matematizada, elegante, única disponível etc. – já que faltam provas empíricas. São maus critérios. A ideia de que a Terra era o centro do universo justificava-se por seus cálculos, que davam conta de movimentos e previsões… A teoria heliocêntrica, ao contrário, foi defendida por ter cálculos mais simples. Ora, o critério não pode ser de tal tipo. Marx afirma que, ao contrário, a prática é o critério da verdade – não simplicidade de cálculos, elegância da teoria etc.

Uma teoria deve ser, antes de mais, verificável. Mas a falha de uma construção teórica não deve necessariamente indicar a negação de toda a sua teorização; pode ser que aspectos tenham de ser modificados, alterados, acrescentados – mantendo firme boa parte daquilo teorizado. Assim, a "falseabilidade" é relativa, não é o melhor critério.

 

  

 

SEÇÃO QUATRO

A FILOSOFIA E A CIÊNCIA

 

 

 

 

 

A FILOSOFIA CIENTÍFICA, DA CIÊNCIA

 

Muitos filósofos demitem-se da arte de pensar com a seguinte justificativa: a filosofia formula perguntas, não respostas… Assim, a filosofia científica apenas expõe os problemas de certa ciência, apresenta de modo organizado as diferentes propostas. E só. Na verdade, se quer alguma relevância, deve apresentar soluções e hipóteses, além de boas indagações.

Uma filosofia baseada em evidências e na ciência chamo filosofia objetiva, quando a realidade guia o pensamento. Isso é o que está exposto neste ensaio. Em geral, os cientistas têm baixa formação filosófica, logo fazem má ciência; por isso, precisamos de filósofos dignos do nome e das tarefas modernas do pensamento.

A filosofia válida é de Hegel para frente… A Ciência da lógica de Hegel e a filosofia de Marx, sua cientificidade, são as mais importantes para alguém ligado à ciência. As descobertas modernas afirmam os dois filósofos como os grandes e mais avançados paradigmas ainda não reconhecidos. Questões ideológicas e classistas, no entanto, atrapalham tal avanço.

 

REVOLUÇÕES CIENTÍFICAS

Nossa concepção de ciência é evolucionária e revolucionária. Thomas Kuhn teorizou “A estrutura das revoluções científicas”, como o seguinte movimento: ciência normal – resolução de quebra-cabeças – paradigma – anomalia – crise – revolução. Mas para ele não há evolução e saltos ontológicos na ciência. Se bem observado, a ciência vai de teorias de aparência para teorias de essência. Newton tomou o espaço desde a empiria imediata, como imóvel e independente. Depois, chegamos mais perto da essência, o espaço enquanto móvel e ligado à matéria. É natural que a história da ciência avance assim, rumo ao mundo essencial que se demonstra oposto e inverso do mundo que aparece.

Em resumo Kuhn erra nos seguintes aspectos; sobre a ciência, não observa:

1) que vai da aparência à essência;

2) que chega-se ao ponto em que pode haver reformas, não rupturas;

Chegaremos muito próximo da verdade absoluta, algo entre o relativo e o absoluto. O conhecimento geral, não nas firulas e detalhes, poderá ser alcançado coma devida sociabilidade. Assim como o socialismo é fim da época de revoluções, a ciência fará apenas reformas, ainda que revolucionárias – apenas atualizações, correções etc.

2)      que o próprio método científico segue tal roteiro de desenvolvimento e crise;

Ele toma o método científico como único, inteiro, sem evolução – apenas os resultados e as teorias prontas mudam, entrem em crise e se revolucionam. Mas há uma história do método científico que se conclui na dialética contemporânea, exposta nesse livro. Tal desenvolvimento por saltos do método ocorre como se pelas costas dos cientistas, em geral sem domínio da filosofia. Os métodos científicos até agora operantes estagnaram, não alcançam mais tantas conclusões de essência.

3) que a ciência tem valor ontológico, que chega-se à verdade ela mesma.

4) A teoria escolhida entre as opções deriva da realidade.

Realidade, aqui, em dois sentidos: a) a teoria deve corresponder bem com o real, 2) a realidade social tende a aceitar mais uma teoria e menos outra. O marxismo é a melhor teoria social, a correta, mas a sociedade capitalista não é incapaz de aceita-la, por isso a verdade torna-se marginal. A (meta)física aristotélica servia à sociedade escravista, por exemplo.

Curioso que Kuhn descreveu as revoluções científicas do mesmo modo que as crises periódicas, cíclicas, do capitalismo. A realidade parece ter produzido uma boa influência sobre seu cérebro, abstraindo o concreto em teoria. Sua obra é genial, incluso supera muitos dos limites grosseiros de Popper, mas não é materialista o suficiente, como demonstramos com nossas propostas e críticas.

 

SISTEMA FILOSÓFICO

A decadência da filosofia moderna leva a negar, a priori, a possibilidade de um pensamento sistemático. Assim, o contemporâneo filósofo justifica sua falta de esforço e competência declarando uma limitação final à reflexão. Ao contrário, este livro expõe de modo acabado a base de um sistema científico-filosófico completo o bastante, que corresponde a uma concepção de natureza, de natureza humana, de estética, de arte militar, de teoria da história e da crise dos sistemas sociais etc. (expostos na obra A crise sistêmica). Pode parecer, visto assim, que se partiu de um princípio e de uma premissa para derivar, em dedução, toda uma rede de conclusões. Não é meu método, que é o oposto, o dialético. Primeiro, percebi a essência humana, a natureza comum das crises sistêmicas etc. para, a partir daí, perceber que há uma sistemismo por detrás, como conclusão, nunca enquanto começo da pesquisa. Assim, posições como movimento= energia = tempo = etc. e tudo como integração relacional em movimento são bases de um pretendido definitivo sistema de pensamento, ainda que relativamente aberto.

Hegel afirma que uma premissa ou postulado é verdadeiro e ao mesmo tempo é falso, porque, de um lado, expressa uma parte da realidade, mas, de outro, expressa apenas uma parte da realidade. A verdade, diz ele, é o todo. Pois bem; com construções como nossa fórmula categorial movimento = energia = tempo = espaço = matéria etc. chegamos à totalidade, a todos os elementos de base

 

 

 

 

 

 

 

FORÇA, ÁTOMO E CAMPO

 

Na busca da unidade de tudo, os cientistas procuram tal unicidade em algo por demais concreto ou por demais abstrato. Assim, tornou-se mania nomear este e aquele fenômeno como “força”, até tal categoria vulgar entrar em crise. Depois, tudo era átomo, nem sequer onda, supondo-se, por exemplo, uma partícula calorífica, responsável pelo calor. Por fim, tudo seria campo, um vício de nosso tempo. Para Einstein, toda a realidade física poderia ser reduzida a um conjunto de campos universais. Há unidade por debaixo, mas há diversidade externa. A pluralidade deve ser afirmada junto com a unidade de fundamento, de fundo, oculta.

 

FORMA E ESPAÇO

Dizer que o espaço é a possibilidade de forma tem um significado maior agora, em nossa teoria – mais do que o “aonde”. Alguns físicos afirmam que as partículas são, como em Platão, puras formas, sem matéria, sem conteúdo. As partículas-ondas têm, na verdade, conteúdo, forma e grandeza – como pensavam os antigos atomistas. O conteúdo da forma é o espaço, o conteúdo “material” das matérias. A matéria é espaço condensado, apesar da matéria vir antes do espaço no tempo de nosso universo, aquele tornando-se este. O espaço é matéria-luz que decai.

 

 

MATEMÁTICA

 

A matemática é uma invenção ou existe na realidade? Sobre, a resposta correta deve revelar a causa da longa polêmica. Um e outro e, ao mesmo tempo, nem um nem outro. A matemática é uma construção humana feita para corresponder à realidade. Parece existir no real porque quer ser retrato dele, ao menos no quantitativo. Mas aí há um nó. A matemática não surgiu de dentro para fora do sujeito apenas ou primeiro; antes, "veio" de fora, do mundo, para dentro do pensamento. Quando se fala em matemática como invenção parece algo como na arte, uma pura inspiração, algo quase arbitrário, um raio em céu azul. Nada disso. A quantidade existe na própria matéria. Dito isso, fica clara, além de resolvida, a oposição, o ou-ou, de longa data.

De modo lateral, incluímos que o limite matemático trata de indeterminações com resultados infinitos (indeterminação) ou zero sobre zero, o vazio infinito. Isso é uma expressão matemática indireta da nossa tese sobre o início do universo, o vazio infinito. No chamado limite, torna-se preciso certa manobra para evitar tais resultados e, enfim, cair na finitude numérica.

Nosso terceiro comentário sobre a matemática beira o delírio, mas prefiro sua exposição. Os números positivos são os números naturais, logo os números negativos são artificiais, inaturais, formais. Não há -2, há ausência una de dois, ou seu retirar. Uma prova disso é que, além da engenharia fazer seu uso, para fins concretos, somos obrigados a produzir a raiz de menos 1, para tornar positivo o cálculo, a operação. A subtração, a divisão, a raiz, de um lado, e a soma, multiplicação e a potência, de outro, são apenas formas de adição, ainda que negativa. Daí a inexistência, também, na matemática comum do uso de raízes negativas. A ausência quantificada em número é muito própria do mundo social, artificial, como a dívida monetária. Nesse sentido, os números negativos são imaginários. Então, quatro provas do imaginário e da artificialidade útil dos números de fato negativos: 1) ausência de raiz de números negativos; 2) os artifícios para trabalhar com potências de números negativos (se com ou sem parênteses); 3) o uso do número “i”, raiz de menos um, para manobrar um cálculo, torná-lo viável; 4) a soma, a multiplicação e, de certo modo, a potência têm propriedades (permutabilidade etc.) que seus opostos não têm, são mais limitados. O número negativo: há e não há, ser-nada, real-ficção.

Uma consciência não arbitrária ainda merece ser destacada. No limite matemático, tende-se à, por exemplo, zero ou três sem nunca alcançar eles, tais números. Na lógica formal, A = x ou não-x, nunca uma terceira reposta. Já a dialética aposta justos no terceiro excluído, que não costuma ser o meio-termo entre x e não-x. Na nossa dialética, em “A”, x tende, também, até não-x, sem alcançar absolutamente este último. O conhecimento (A) vai de relativo (x) até mais do que relativo (…) sem nunca conseguir alcançar absolutamente o absoluto (não-x). A = A e… não-A. A matemática avançada aproxima-se da dialética, em especial de sua renovação. A nova dialética merece, portanto, formalização maior.

 

INFINITO

Hegel demonstrou, num toque de genialidade, que o infinito é qualitativo, não quantitativo. O mau infinito é o infinito da progressão, que algo pode ser cada vez maior ou menor, pois encontra uma barreira e supera, então encontra outra e etc. O bom infinito, ele diz, apresenta-se à semelhança de um círculo, sem começo nem fim, não como certa linha sempre esticável. Nisso, ele deu a resposta geral correta para o problema da infinitude, mas foi ignorado pelos filósofos, matemáticos e físicos posteriores. Assim, surgiu a ideia absurda, embora apaixonante, por Cantor, de que há infinitos maiores do que outros; assim, surgiu o Hotel de Hilbert, aonde sempre se pode colocar mais um visitante num dos infinitos quartos, bastando passar os demais para o quarto seguinte da infinitude liberando a vaga do primeiro quarto.

Hegel foi crítico duro da matemática e da redução quantitativa, mas a topologia e os nós, como qualitativos, têm feito escola. Assim, pode-se supor que um nó não possível de desfazer em 3 dimensões pode-se desfazer em quatro, mais uma espacial. A fita de Moebius, com todas as suas derivações como, juntando duas de tais fitas, que só têm um lado, forma-se a garrafa de Klein, quadridimensional. Em tal garrafa não tem externo e interno! Em sua lógica, Hegel já afirma que o externo e interno são o mesmo, são um, uma unidade. Enfim, o infinito real é como a quarta dimensão, sem borda, que transborda para fora e para dentro do nosso universo finito. É o vazio infinito e caótico que desaba no nosso universo preenchido, finito e com ordem-lei.

Devo acrescentar, aqui, a ideia de relação infinita. Por exemplo: a partir de poucos átomos, podemos formar milhões, talvez bilhões, de novas combinações, compostos cada vez mais complexos (por sua vez, tais compostos entram em relações). A relação do homem com a natureza é uma relação infinita, um alterando o outro e vice-versa, por meio do trabalho e da produção. Na matemática, 7/3, sete divido por três, tem o resultado inexato e sem fim, 2,333333333333…Uma relação infinita do ponto de vista matemático.

 

TEORIA DO CAOS

 

A concepção determinista e mecanicista entra em crise por vários caminhos, uma revolução do pensamento ainda incompleta. Nesse sentido, a teoria do caos reforça ou rejeita a dialética? Vejamos as premissas:

 

1.      Há ordem no caos, caos na ordem.

Isso é unidade dos opostos, dialética pura! Além disso, há sistemas que passam do caos para ordem, para novo caos, para nova ordem regular, e assim por diante. O próprio caos pode ter regularidade – a própria ordem pode ser irregular.

2.      As leis interagem para produzir o oposto da lei, caos, não repetição.

Uma legalidade pode dar em caminhos diferentes! Isso reforça a dialética unidade de necessidade (lei) e contingência ou acaso.

3.      O todo não pode ser analisando separando as partes e tomando-as de modo apenas individual.

A dialética afirma que o todo possui propriedades que as partes individuais suas não possuem, mas que é necessário analisar também as partes, suas relações recíprocas e sua história – para entender o todo (o todo “espacial”, estrutura, mas também processo, no tempo). Assim, vemos outra concordância, em que não basta o empirismo de separar as partes e juntá-las apenas externamente.

4.      A sensibilidade do processo às suas condições iniciais.

Aí encontramos a historicidade, que o passado é a causa do futuro.

5.      O caos não se desaba na ordem.

Aqui, parece haver uma contradição aparente com nossa dialética. Mas o caos é sistemático, tem e desenvolve própria dinâmica e regularidade-irregular. Além disso, a permanência do caos é típico de sistemas mecânicos, não dialéticos. Em processos, o caos, por exemplo, a atmosfera complexa e intratável, produz o furacão, algo regular.

6.      Pode-se fazer previsões curtas, mas não de longo prazo, pois pequenas variáveis ocultas no início ganham importância tal que modificam o destino do processo.

7.      Um todo ordenado tem caos dentro de si.

 

O marxismo sabe que uma crise vem a cada 10 anos – mas “mais ou menos”. Se passarmos 10 anos sem crise alguma, podemos dizer que ocorre uma probabilidade crescente de quebra econômica nos anos seguintes; mas não podemos dizer exato quando e onde a bolha vai estourar. Uma análise de conjuntura nunca é perfeita simplesmente porque é impossível saber e medir todas variáveis em jogo – e tal análise deve ser de “conjuntura”, com possibilidade de caminho do real logo à frente, não capaz de medir ou antecipar em longo prazo. O processo estrutural é antecipável; mas o “como” e os detalhes, não. No mais, há marxistas tentando, genialmente, aplicar a matemática moderna para atualizar O Capital de Marx.

O cosmo escreve certo por linhas tortas.

 

 

 

 

 

TEMPO

 

Desde Einstein, há a coisificação do tempo, que é relação e abstração real, além de manifestação (da energia, do infinito, do espaço, da quarta dimensão, do movimento). Não se vê uma cor andando por aí. Por isso, há um tempo geral – não se avança ou recua no tempo, ambos impossíveis, embora o primeiro seja considerado real. Quando se discorda de uma concepção científica tão vitoriosa, tão correta e que dá tantos resultados, costuma-se cair em desmoralização e ostracismo. A teoria de Einstein está correta, mas incompleta. Porque a Lua gira em torno da Terra, pensa-se que o Sol também gira desse modo; porque o espaço existe, pensa-se que também o tempo enquanto “coisa”.  Em velocidades muito maiores que há média, o “tempo” passa mais devagar porque diminui a entropia, o objeto torna-se mais espaço concentrado.

Com sua poderosa lógica abstrata – o ser é, o nada não é –, Parmênides “provou” que o movimento não existe, uma ilusão. Com sua poderosa lógica matemática, Einstein, entre os maiores gênios da história universal, “provou” que o tempo é relativo, além de existir. Ora, o fóton mover-se e não se mover, o tempo passar, mas não passar nele é uma, em lógica, redução ao absurdo – logo o tempo não é.

Vale notar que o verbo “durar” trata tanto do tempo quanto do aspecto físico, da resistência. Um objeto (satélite, relógio, luz etc.) em velocidade maior, por concentração, dura mais durando aparentemente menos.

Adotamos, ao mesmo tempo em que superamos, mantemos em pé, toda a teoria de Einstein – atualizada para produzir uma teoria de tudo. O único aspecto deixado de lado é a relatividade real do tempo, como se fosse um em si. Contra a resistência conservadora natural de toda superestrutura, não dogmatizamos a autoridade. As matemáticas físicas de Newton são úteis para nossa escala, são funcionais – massa a teoria estava errada. Já nossa teoria de que não só se curva o espaço-tempo, como diz o alemão, mas matéria é próprio espaço-tempo curvado, para dentro de si, não anula a teoria einsteana como acontece com a teoria de Newton. O velho já nasce novo.

Talvez, a premissa errada de Einstein é afirmar que as leis da física são as mesmas – na forma – se parado ou em velocidade constante, sem aceleração. Mas velocidade e aceleração são o mesmo, apesar de ainda diferentes (v=at). Assim como na química a lei falha relativamente em diferentes pressões atmosféricas, em diferentes velocidades também, com certo desvio da norma, do cenário comum.

 

UMA HIPÓTESE INCÔMODA

É difícil resumir a enorme contribuição revolucionária de Einstein, que tem sido confirmada pelas atuais e rigorosas medições. Sua teoria, ademais, permitiu prever o Big Bang, teoria contra a qual ele protestou por algum tempo, e os buracos negros, que ele pensava ser impossível na prática existir. No entanto, deve-se lançar a questão: e se parte das conclusões de Einstein são, na verdade, paradoxos científicos-lógicos abertos, não propriamente conclusões? Por exemplo, para a luz, o objeto mais rápido, o tempo não passa nem o espaço (isso reforça que movimento = espaço = tempo = etc. com um tornando-se o outro); isso é um paradoxo a ser resolvido, pois é claro que o fóton de luz vai-se do Sol para a Terra – mas, do ponto de vista da luz, isso não ocorre! Na antiguidade grega, dizia-se que o movimento de uma flecha, como todo movimento, seria uma ilusão ou que Aquiles nunca alcançaria a tartaruga porque sempre teria um caminho a vencer antes dela. Nesse caso, a ideia moderna de velocidade, espaço sobre o tempo, resolveu a questão. Talvez tenhamos de pensar uma nova e agregada teoria do movimento; por exemplo, uma pessoa que gira na terra sobre a linha do equador tem velocidade diferente de alguém que faz o mesmo giro no polo norte, pois eles percorrem o mesmo tempo, 24 horas, mas um espaço diferente na mesma temporalidade. Mas deve existir alguma medida de movimento que os iguale.

A solução seria um novo conceito ainda oculto? Talvez. Os homens antigos rejeitaram a ideia de que a Terra estava girando, pois, se fosse o caso, os pássaros estriam em apuros com dada rotação – logo o Sol é que estariam em movimento. Eles não conheciam o conceito de inércia, ou que tudo terrestre está a girar junto, tão importante para ciência moderna.

 

TEMPO E ENTROPIA

A ideia de entropia está correta, mas é incompleta e relativa – pois é, na essência, energia em busca de mais energia. Que o tempo e a entropia tenham a mesma direção leva à intuição de que são o mesmo e ligados. Ora; a maçã decai, degenera; mas, antes, ela teve de acumular energia, teve de se desenvolver e se complexificar. O caminho inverso da entropia não faz o tempo andar no sentido oposto. A entropia não é igual ao tempo, mas à energia e, de modo mais direto, ao movimento. Há movimento, não em si o tempo. Reforçamos, portanto: entropia foca na energia, não na matéria, logo não é sinal de complexidade ou desordem-confusão maior.

 

CAUSALIDADE

 

Bunge defende que a causalidade é base da ciência e deve ser, portanto, defendida. Tudo bem: mas qual causalidade? Hegel suprassume a ideia de causa e efeito por efeito e contra-efeito, por causalidade recíproca – enfim, por interação! Assim, a economia influencia a cultura e esta, a economia (Bunge, que não entende bem de marxismo, mas se pôs a falar sobre, não percebe isso em sua crítica a Marx e sua tradição). O processo de ida e volta é movente, desenvolvedor, além de contraditório como contradição enquanto causa do movimento em geral. Além disso, aquilo que está dentro da causa passa a estar, depois, dentro do efeito.

A ideia de acausalidade de Jung é revolucionária apenas no sentido de ser uma nova e original contribuição – errada… Coincidências acontecem, influências inconscientes do ambiente acontecem. Nem tudo se mede por probabilidade rara de acontecer ao mesmo tempo: um astronauta não pode confiar na probabilidade baixíssima de um lixo espacial acertá-lo dado o grande tamanho do espaço sideral, pois o aleatório não se limita à matemática com sua exatidão numérica. No mais, se consideramos os relatos de Jung sobre as muitas coincidências enquanto corretas, verdadeiras, elas podem esconder apenas que os diferentes fatos têm uma origem comum, uma base, uma circunstância, um padrão, uma só condição comum – além dos acasos muito prováveis, mas na aparência improváveis.

A causa mecânica existe, afinal, máquinas existem… Mas em sistemas orgânicos a causalidade é muito mais complexa, como a mesma causa produzindo efeitos contrários aqui e ali; causas opostas produzindo o mesmo efeito, aqui e ali.

Aliás, a causalidade vulgar de uma causa que tem uma causa, que tem uma causa, que em uma causa – deve explicar a causa primeira. Como dissemos, ela foi, uma totalidade “causal”, o caos da relação do vazio com o seu infinito interno, um acidente, uma causa acidental, uma concessão da probabilidade.

Kant também foi outro ousado equivocado: insistiu na ideia já existente que a causalidade é uma forma subjetiva, humana, cerebral para dar ordem ao que não a tem, o mundo… Seria apenas método, gnosiológico. A ciência refuta-o todos os dias, no seu cotidiano.

Einstein e Born, dois dialéticos e socialistas, os melhores de suas gerações de gênios, militaram contra o positivismo da interpretação “correta” de Bohr, que apenas via o externo, as regularidade empíricas, dava forma de cálculo às manifestações; pois, supostamente, assim é se assim (a)parece. Por isso, caíram no acaso (que nada mais é que o outro lado, oculto, da causalidade, este como se por detrás), ou seja, na probabilidade incerta e inconstante. Mas o caos apenas expressa a lei e a ordem subterrâneas. A crise da física é uma crise científica geral ainda não devidamente reconhecida – crise da cientificidade burguesa, que se esgotou. Para fins industriais, as interpretações positivistas são úteis ao se limitarem à manipulação do real, sem compreendê-lo. Mas a essência é a causa da aparência – ir ao invisível e ao não empírico já! Se com sorte, nossa formulação anterior de teoria de tudo pode, com correções, ser a base do fim de tal crise, que ainda precisa de uma revolução social…

Há uma causa, que interage externamente com diferentes causas – que se anulam, que se impulsionam, que se contradizem, que se combinam. Enfim, comum haver, entre elas, uma causa única comum.

O todo é a causa das partes – as partes, e suas relações, são a causa do todo.

Alguns afirmam que a relatividade de Einstein permite que o efeito venha antes da causa. Confundem manifestação e essência. Na essência, ocorre causa antes e efeito depois; mas a coisa pode aparecer invertida, na aparência. Isso acontece, por exemplo, em economia, quando a subida de juros, consequência da crise iniciando no subterrâneo oculto, aparece na economia vulgar, positivista e que vê apenas o nexo externo, enquanto causa da crise mesma.

Born demonstrou que, se vemos numa perspectiva mais ampla, o acaso é uma expressão da causalidade. Lukács demonstrou que as muitas partes de uma totalidade interagindo em causalidade recíproca pode gerar relações ao acaso, acidentes de relação. Desde a teoria do caos, podemos incluir, demonstrar: as leis causais, necessárias, produzem o caos, e as contingências, o acaso como totalidade.  As leis inerentes ao capitalismo produz um sistema irracional.

Dado tal conteúdo pesado, vejamos um caso comum, de valor popular: quem veio antes, o ovo ou a galinha? O raciocínio semifixo pula de um para o outro, sem conseguir se decidir. Falamos de um ovo de galinha e de uma galinha de ovo de galinha. Pois bem, resposta: o processo de formação da espécie galinha é, também, o processo de formação de um ovo para si, de galinha, que “produz” e comporta a espécie… Tudo parece melhor, mesmo na vulgaridade, quando treinamos o raciocínio dialético, em movimento. Na verdade, tal caso popular guarda em si uma grande questão abstrata.

 

 

 

SIMULTANEIDADE

A gravidade move-se na velocidade da luz. No social, as crises sistêmicas diferentes, do ponto de vista externo, amadurecem juntas, porque suas bases, a economia, a produção em principal, amadurecem. Se todas as partículas são espaço condensado, logo o surgir de uma altera instantaneamente, simultaneamente todo o universo, que é um só tecido. Assim como concentrar parte de um lençol esticado altera todo o objeto, ao mesmo tempo. Linhas de espaço ou de campo específico unem dois ou mais fótons, emaranhados quanticamente, alterando um ao mesmo tempo em que se muda o outro.

 

 

 

 

 

O FIM DO PARADIGMA ARISTOTÉLICO

 

As ideias de Aristóteles tiveram sucesso milenar, passando por toda a Idade média como teoria majoritária sobre o mundo. Mas a ciência moderna e contemporânea significa a superação de tal paradigma, que é baseado no inocente “basta olhar” ou “se assim aparece, assim é”.

Dante inicia o enfrentamento ao aristotelismo afirmando que uma obra aonde o conteúdo não é comédia tem a estrutura, a forma, de comédia. Assim, subverte a estética de Aristóteles. Depois, Cervantes tornou o conteúdo da comédia alta literatura, nada vulgar, diferente do que pensava o antigo.

Segundo, o grego afirmava que o estado natural das coisas e do mundo é o repouso. Mas Galileu demonstrou que o repouso é forçado e o movimento é natural.

Terceiro, afirmou que a física excluía a matemática e, assim, o quantitativo. Newton consolidou a revolução de Galileu e Copérnico com sua obra Principia, que matematizou o mundo. Ainda hoje temos o erro oposto, isto é, considerar o quantitativo sem o qualitativo e suas mudanças. Além disso, provou, contra Aristóteles, que as leis da Terra e do Céu são as mesmas, não diferentes no fundamental.

Para Aristóteles, cada coisa tinha seu lugar natural por seu peso, por isso o ar ficava acima da terra. Mas os conceitos abstratos desenvolvidos de líquido, sólido e gasoso, além de plasma, superaram a visão de líquido igual à água.

Kant disse que ao menos a lógica formal, aristotélica, A=A, o princípio da não contradição, estava preservada no seu tempo e para sempre. E eis que entra em cena Hegel ao, ao guardar e manter o passado, descobrir a lógica dialética, A=A e não-A, e a ideia de que o mundo objetivo é autocontraditório, em movimento e em contexto. Ademais, superou a separação aristotélica de ontologia (metafísica) em um canto e dialética em outro.

Outra concepção resiliente foi a ideia do mundo enquanto mecanismo ou máquina. Assim, passamos das esferas cristalinas universais, que governavam o mundo para os medievais e antigos, para uma concepção coisal do universo. Apenas o hegelianismo e o marxismo fizeram um combate de frente contra tal visão, defendendo o “todo orgânico” em desenvolvimento e em processo mais do que circular repetitivo. A física e a química desde o século XX também têm dado grandes aportes novos sobre.

Para Aristóteles não existia o “espaço”, havia apenas o “lugar” concreto. Porém, Einstein demonstrou a concretude espacial.

 A concepção classificatória dos seres, por características comuns, elevada por Aristóteles foi substituída pela cladística, que organiza os seres biológicos segundo a teoria da evolução, ou seja, segundo sua história evolutiva.

Até o fim da primeira metade do século 20, até anteontem, continuou em pé a hipótese aristotélica do éter, meio por onde a luz fluiria. Mas, sabemos hoje, há pouco tempo, que tal substância não existe, descartada. Nesta obra, incluímos o espaço, não o campo, enquanto meio e meio da luz.

Em resumo, a ciência atual é a refutação da construção aristotélica, baseada nas aparências. As ideias de Aristóteles pareciam, assim, autoevidentes. Por exemplo, um corpo pesado cai naturalmente mais rápido que um corpo leve – no entanto, sabemos que isso se deve ao atrito e resistência do ar; no vácuo, caem quase exato ao mesmo tempo, com desprezível diferença.

 

  

 

TRABALHO, LINGUAGEM E SOCIABILIDADE

 

Demonstramos antes, em nossa metafísica, que trabalho é uma categoria central de todo o Ser, não apenas no ser social, não apenas trabalho humano. Assim, o ser imediatamente anterior ao o primeiro humano já trabalhava, como trabalho biológico, como animal. Lukács afirmou que o trabalho (humano, social) é fundante do ser social. Mas como surgiria aquilo que dele depende e de que ele também tem dependência – a linguagem e a sociabilidade? A resposta dele foi esta: os três sugiram juntos, ao mesmo tempo, mas todos de modo leve, inicial, primário – e foram, então desenvolvendo-se reciprocamente, com o trabalho como “centro”, ou primeiro motor na prática. Pois bem; essa forte hipótese pode ser contraposta por outra, que aqui apresento: de modo leve e inicial, a sociabilidade e a linguagem humanas sugiram antes de trabalho (humano), dando condições, então, para este último surgir. Depois de iniciado o trabalho humano, apenas depois disso, ele passou a ser de fato o centro e o centro desenvolvedor principal da linguagem e da sociabilidade, cada vez mais complexos por seus lastros no trabalho social (além, é claro, da ação recíproca entre eles, deles). Para clarear, vejamos outro caso. Se não tivéssemos dados empíricos sobre a origem do capitalismo, naturalmente teorizaríamos que o comércio, o dinheiro e a produção de mercadorias surgiram ao mesmo tempo e juntos de modo leve, de modo primário… Mas não foi o caso: o comércio e, depois, o dinheiro surgiram antes, dando base material para surgir, apenas daí, o centro, ou seja, o trabalho produtor de mercadorias e assalariado e a produção capitalista. Dialética: os pressupostos tornaram-se, então, postos – o posto torna-se, logo, pressuposto. O trabalho é de fato o “centro” e o fundante, mas sua história tem uma pré-história mais complexa.

O processo concreto apenas pode ser descrito pela pesquisa arqueológica e antropológica – se for possível. Todo início tem sua dificuldade de compreensão: como surgiu o universo? Como surgiu a vida? Como surgiu o ser social? A distância, a simplicidade e a falta de dados empíricos complicam toda a pesquisa. Deduções, argumentos e generalizações passam a ter importância vital. O simples é, assim, o complexo. A religião baseia-se em tal ignorância parcial para afirmar-se, até mais uma vez ser superada. Sabe-se que as condições para a vida, por exemplo, exige muita energia, um meio solvente (água) e compostos moleculares ricos, possivelmente baseado necessariamente em carbono, que é capaz de fazer as corretas ligações atômicas. O resto são hipóteses baste corretas, correspondentes: energias termais do fundo do oceano, atmosfera ativa e com raios, raios cósmicos etc. Não temo como, de início, o início não ser confuso.

 

METÁFORA E COISA

Muitos cientistas apelam para a metáfora como meio de explicar, mas logo o exemplo imaginativo torna-se exemplo supostamente real, exemplar – eis o fetichismo na ciência. Na outra ponta, Kant e Hegel são contra exemplos, pois, dizem, deve-se acessar a ideia pura, mas ambos acabaram por exemplificar inúmeras vezes. São duas armadilhas. Vi um ótimo divulgador científico afirmar que a entropia é aumento de desordem (não é, na verdade, pois o foco é na energia, não na matéria) com o exemplo de um prédio explodir e ser impossível reunir seus pedaços. Outro caso é o da maçã que degenera, apodrece. Ora, se o universo se reúne novamente e reinicia-se, se a maçã teve antes de surgir, desenvolver-se e amadurece; logo a entropia é e segue válida, mas também à, acima, energia em busca de mais energia. Temos o paradigma da coisa, ou melhor, da mercadoria, quando se quer usar um objeto, como máquina ou computador, como paradigma, ou mesmo algo sensível e direto. Um dado, porque não conhecemos e não temos a medida de todos os fatores, é apenas um jogo aleatório, de acaso, não probabilístico. Para nós, reina o acaso, mas há uma causalidade complexa oculta no seu jogo (o acaso é a causalidade por acidente, acidental – o abstrato é o concreto em processo). Por outro lado, a probabilidade é como conseguimos acessar a realidade, que é determinística de modo oculto, no fundo, difícil de acessar. Peguemos o caso dos pedaços do prédio e transformemos cada parte, por salto, em pedados de universo, em galáxias ou aglomerados de galáxias; ora, esses “pedaços” serão atraídos uns pelos outros e formarão, de novo, algo uno, reiniciarão o universo em nova geração universo, por repulsão nova após a atração.

No mais, há um desafio que pode, talvez, mesmo renovar ainda mais a dialética, para além do que este livro fez. Olhando nossa geração universal, vemos que o mundo vai do simples ao complexo. Mas pode ser que ele vá, também e depois, do complexo ao simples (diz-se que um buraco negro é bastante simples). Vemos, assim, apenas a aparência e metade da verdade, pois a entropia, correta, também tem energia em busca de mais de si.

 

MECANICISMO E TRABALHO

A realidade é um sistema orgânico: tem causalidade recíproca, mudanças qualitativas, contradição, desenvolvimento etc. Mas a ciência moderna caiu no mecanicismo determinado, ou seja, a realidade seria como certa máquina repetitiva, sem mudanças qualitativas, sem contradição, apenas ordem, fixa etc. O erro tem origem no nível da ciência naquele, daquele, tempo. Segundo Born, caiu-se, termo dele, no mecanicismo indeterminado, ao a física quântica negar a causalidade dentro do acaso (a identidade dos opostos, acaso é, visto no mais amplo, algo causal), ao não considerar o qualitativo e seus saltos etc.

O mecanicismo fez escola. Aristóteles adotou o trabalho artesão como seu modelo, algo próprio do mecanismo. Assim, um deus artesão formou o universo, um primeiro motor imóvel. Daí que ele tenha pensado, desde o mecanicismo do trabalho, as suas quatro causas (matéria, forma, causa, teleologia ou finalidade). O trabalho também afetou Hegel com sua versão de unidade e identidade sujeito-objeto (nesse formato, válido apenas à arte e à psicologia – apresentamos outro “modelo” em capítulo anterior); daí, também, pensar que a razão, a planejadora do trabalho, é o que move a realidade, o Espírito absoluto hegeliano.

Lukács cai no mesmo erro mecanicista do trabalho, reduzindo-o ao social, por isso pensando a teleologia como apenas subjetiva, algo da pré-ação humana. Não viu a teleologia objetiva e inconsciente. O marxismo cai nesse erro quando deixa de ver que a causalidade é recíproca, colocando a economia ou a produção como centro absoluto de tudo sem mais.

 

 

CRÍTICAS CONTEMPORÂNEAS À METAFÍSICA

 

Mostramos que a metafísica materialista supera bem as objeções kantianas. Mas cabe algum espaço à crítica comum. Vejamos, então, os principais autores.

Friedrich Nietzsche. Sua crítica era contra o mundo duplicado metafísico (mundo das ideias e formas contra o mundo da matéria etc.). Ele e o marxismo[22], afirmam a unidade do mundo. Mas a unidade, na dialética, não nega a diferença e a duplicidade dentro de si, ao mesmo tempo. O outro lado é, dissemos, à maneira de uma quarta dimensão.

Não por acaso, ele é o pai do irracionalismo filosófico.

Martin Heidegger. Denunciou que a filosofia afastou-se do Ser, mas, ao focar nele, o separa do ente. Depois, de modo arbitrário, coloca o homem, o ser-aí, como a expressão direta de todo o Ser. Na dificuldade, apostou na quebra da linguagem. Ele não entende quase nada da ciência de sua época, não viu na cientificidade a pista para uma nova metafísica, correta em seus aspectos gerais.

Analíticos. Tal escola atua para, na prática, destruir a filosofia. Negam as questões de ontologia, ou seja, de metafísica, e afirmam que a tarefa do filósofo é meramente esclarecer conceitos… Em vez de darem um passo à frente, logo quando a metafísica pode concluir sua história universal, dão passos atrás.

Positivismo. O mau cientificismo acusa a metafísica porque confiam apenas naquilo diretamente verificável, empírico. Não veem que do empírico partimos para o não empírico, que da física chegamos à metafísica, que o argumento sustentável também faz parte da verdade na ciência (neste caso, por exemplo, se o Ser é possibilidade de ordem e finito, o Nada anterior é, ao contrário, vazio infinito e caótico). O positivismo mereceu sua crise, pois nem tudo são as aparências com suas leis apenas externas.

 

Como vemos, os críticos atuais da metafísica não são boa companhia, atrasam o desenvolvimento científico e filosófico.

 

 

AS DUAS OPOSIÇÕES CIENTÍFICAS

 

Desde a vitória do retumbante materialismo sobre o idealismo; duas oposições surgiram, ganharam relevo maior: 1) reducionismo contra dialética; 2) substancialismo contra relacionalismo.

O reducionismo diz que o todo nada mais é que a mera soma de suas partes, que algo pode ser reduzido aos seus elementos básicos constituintes, que as partes são iguais, que não há mudanças de qualidade. Já a dialética afirma que as partes são elas mesmas e suas interrelações recíprocas, que o todo tem propriedades que as partes isoladas não têm, que as partes são qualitativamente diferentes umas das outras e operam saltos qualitativos, que as partes ganham novas funções no todo quando deixadas de ser observadas isoladamente. A realidade é como um organismo vivo, orgânico, incluso com história, não como certa máquina ou qualquer objeto.

O reducionismo, enquanto premissa errada, pode fazer avançar a ciência – mas só até certo ponto, quando encontra uma parede intransponível. A genética cresceu muito de modo reducionista, por exemplo.

Bunge fala em “sistemismo”, sua suposta descoberta. Ele funde, de maneira dialética, mesmo sem reconhecer isso, o holismo, que foca no todo, e o reducionismo, que foca nas partes, nos elementos individuais, no atomismo. Usa ambos. Pois bem; ele, sem o querer, plagiou Hegel… Até o nome é o mesmo: o alemão nomeia “método sistemático” ir das partes até o todo, do abstrato (isolado, individual) até o concreto (totalidade rica, integrada). É como aprender vogais primeiro, consoantes depois, sílabas em seguida, palavras após, frases logo, texto completo posteriormente… Do abstrato ao concreto. No Mais, Bunge deixa de ver a história tanto das partes como do todo, que deve ser vista, além das leis históricas como as gerais. Como poucos leem A Lógica de Hegel, menos ainda entendem, menos ainda devoram os três livros até o final; poucos sabem que o método do abstrato ao concreto, sistêmico, tratado por Marx como seu método já está exposto ao mundo pelo outro alemão, no final de sua grande obra.

Quanto à oposição unilateral entre relacionalismo e substancialismo, este livro supera ambos em quase todas as suas páginas. Assim, o espaço e a massa seriam ou relacional ou substâncias; a essência humana seria ou relacional ou natural-substância; seríamos determinados pela biologia e genética ou pela construção social; a realidade humana seria materialista ou idealista; a psicologia seria relação homem-homem ou homem-objeto; a crise sistêmica seria econômica ou baseada na urbanidade elevada; o centro seria as forças produtivas ou as relações de produção; etc.

Vale notar que as oposições científicas costumam estar acompanhadas por posições políticas e visões de mundo opostas, mesmo nas ciências naturais. Daí que Margaret Thatcher tenha dito, ao modo reducionista, que não há sociedade, apenas indivíduos. Daí que a classe trabalhadora inglesa, ao modo dialético, tenha se reunido para comemorar sua morte nas ruas.

 

SUBSTANCIALISMO E RELACIONAISMO

A ciência e sua filosofia caíram em duas teses unilaterais e opostas, a de substância e a de relação. Assim, a massa ou é substância ou relacional, o espaço existe de modo absoluto ou é apenas expressão de relações, a evolução das espécies é ou relaciona (lamakismo) ou genético. O substancialismo chegou a pensar que o calor seria uma partícula calorífera.

Em Aristóteles, em sua metafísica, tal oposição limitante já existia:

 

Mas, é absurdo dizer que são os mesmos para tudo: de fato, dos mesmos elementos derivam tanto as relações como a substância. E qual poderia ser esse elemento comum? Além da substância e das outras categorias não existe elemento comum; o elemento existe anteriormente àquele de que é elemento. Na realidade, nem substância é elemento das relações, nem qualquer uma das relações é elemento da substância. (Aristóteles, 2002, p. 551)

 

Pode-se perguntar se são diferentes ou idênticos os princípios e as causas das substâncias e das relações e do mesmo modo para cada uma das outras categorias.

A teoria substanciaista do espaço de Newton imperou por muito tempo, mas começou a ser superado por Einstein ao se descobrir, a partir de suas teorias, que o espaço curva-se em relação com a matéria e movimenta-se. Neste livro, a ideia de que a matéria e a luz decaem em espaço visa superar também a oposição limitante entre substancialismo e relacionalismo.

A verdade está no terceiro “excluído”. É verdade que somos, por exemplo, determinados pela genética, mas também é verdade que o ambiente nos altera reativamente. Os descendentes de um povo que passou fome tende a ter mais capacidade de acumular gordura.

 

 

 

PLATÃO E NIETZCHE

 

O leitor acostumado percebe os dois filósofos como inspiração interna, oculta, de outra obra, A crise sistêmica. De certo modo, reescrevemos a República de Platão. Por exemplo, há referência às três ondas plantonistas (os macrociclos do capital), o fim da família e da propriedade privada, os “filósofos” no poder etc. Sendo Platão uma inspiração oculta e culta de Marx; na obra citada, A República, o grego fala em “pessoas acorrentadas” numa caverna, a alegoria da caverna, o que estimulou o alemão, milênios depois, dizer aos trabalhadores: “Vós não tendes nada a perder a não ser vossos grilhões!”. Eis a metafísica materialista por detrás do marxismo!

Vale uma digressão: na versão inicial, pomos Cronos, deus do tempo, o valor, contra Zeus, deus do raio, da energia, a classe operária – relacionando as eras, com Hera. A mitologia e a realidade casaram-se.

Quanto a Nietzsche, façamos uma digressão própria.

 

Pluralismo

O sistemismo de uma obra é um sinal de sua verdade e de sua qualidade, de um esforço e de um nexo real expresso no nexo textual, conceitual. Tal modo de expor pode agregar dentro de si o pluralismo das formas de exposição.

 

Dinamismo

Mas qual dinamismo? O marxismo afirma que o movimento é desenvolvimento, movimento contraditório. O irracionalista reconhece a contradição, mas concebe o movimento como puro caos e apenas.

A vida individual de fato é caótica. A vida social, o todo, tem ordem em seu caos. Uma alternativa é o indivíduo ligar-se mais ao todo para dar rumo e ordem, sentido – o socialismo ordenado.

 

Perspectivismo

No lugar de ir ao argumento dedicado, ele analisa os diferentes pontos de vista e ângulos. Ora, ambos podem ir juntos. Aqui, também, usamos o estilo contrito e direto.

 

 

 

Experimentalismo

Ele arrisca, diz. Aqui, nesta obra, o experimentalismo é uma forma científica de ser filosófico. Damos, então, rumo ao seu instinto.

 

Além-do-homem, super-homem

Para ele, tal ser surge por alguém sofrer muito e viver a arte. Outro modo de ver: o homem fazendo a si mesmo, criatura e criador de si. Oferecemos outro caminho, pois ainda sequer somos homens e, além disso, no futuro superaremos nossa condição de espécie (programação genética etc.).

 

Apolíneo e Dionisíaco

Afirma que focamos, desde Sócrates, na razão, esquecendo a paixão e a emoção, o gozo. Logo, defende a posição última. Se formos rigorosos, devemos fundir ambos, um ajudando o outro e vice-versa.

 

Moral

Sua moral busca a origem da moral na divisão de classes. Mas ele foi, de fato, elitista. Isso se prova na sua campanha contra a Comuna de Paris. Ao menos, ele busca a reflexão do valor dos valores, historiciza-os também.

 

A vontade de potência

Ele me inspira, junto com Clóvis de Barros, a pensar todo o Ser como energia em busca de mais energia, não apenas a vida. Ele pensou em termos cosmológicos, o que é incrível. Mas, para nós, a energia (para ele, força), vê como central sua expansividade, não sua concentração.

 

Forças

Para ele, tudo era um jogo de forças, no plural. Aqui, demonstramos que a categoria força é superada por espaço, campo e energia. Para ele, as forças fazem o espaço; para nós, a matéria decai-se em espaço. Se mantemos a categoria, para nós, há apenas uma “força”.

 

O eterno retorno

Como metáfora, seríamos felizes se nossa vida repetisse igual a igual para sempre? Trataríamos como sorte ou azar? Parece que ele considerava como algo também cosmológico. Neste ensaio, atualizamos sua intuição física para a ideia de que o universo reinicia-se para o ponto inicial, retrai-se após expandir-se.

Além do mais, além do universo ter gerações ciclos, também houve de fato um início de tudo e do tempo, depois do vazio infinito. Em Nietzsche, porém, não há começo real.

 

Amor fati

A ideia de, de modo ativo, aceitar o mundo, ser alegre com ele tal como é, de modo, repetimos ativo. Isso casa com o marxismo: ser ativo e buscar a felicidade hoje, e já, não amanhã. Se todos buscassem uma vida que vale a pena, o capitalismo cairia.

 

Fusão arte e vida

Diz do futuro como fusão de ambos. Adapto isso no uso constante do conceito de ficção. Além do mais, o realismo diz que o socialismo será a poesia concreta.

 

Uma obra digna tem de estar pousada no ombro de antigos gigantes. A refutação dialética não é apenas negar uma teoria ou filosofia, com porcos adjetivos, mas aproveitá-la no que ela tem de verdade, desenvolvê-la, levar a tese adversária até as últimas consequências, modificá-la e adaptá-la. Eis o ensinamento de Hegel e Adorno.

 

 

DIALÉTICA

 

DIFERENÇA NA UNIDADE

A unidade e identidade dos opostos na lógica de Hegel é uma conquista de toda a civilização. Mas erros acontecem por se confundir forma com conteúdo, aparência com essência, conjuntura com estrutura etc. É preciso ver a diferença também. Nesse sentido, estamos com Adorno e Althusser, unindo ambos. A aparência nem sempre releva de todo a essência, pois o mudo que aparece pode ser, por exemplo, o oposto do mundo essencial, mesmo aquele estando dentro deste. A mesma forma pode servir a conteúdos diferentes, até opostos. O mesmo conteúdo pode ter diferentes formas.

 

O MAIS ABSTRATO

O mais geral é o mais simples e o mais abstrato, serve de base – a célula na biologia, a mercadoria no capitalismo, o átomo na química. Em método, devemos pegar o todo, ver suas partes em seguida, decompor, decompor – até alcançar o conceito real mais abstrato, mais puro, mais geral e invisível. Assim, temos o valor na economia; assim, temos a energia-espaço na física e na química (e na biologia, e o valor é energia); assim, o Bem em Platão. É outra forma de abstração, que não se reduz a isolar, a separar; também vê tal unidade interna oculta de tudo, do todo. Portanto, chegamos ao espaço, pobre em características (determinações etc.) e à energia apenas indiretamente observável. Levamos o limite mecanicista – decompor o todo em partes iguais, reduzir o todo às partes etc. – do método de Descartes até as últimas consequências, superando-o.

Vejamos. O método cartesiano propõe dividir um problema, uma totalidade, em partes, tantas quantas forem necessárias – isolá-las e, então, sendo mais simples, logo compreensíveis, tratar com elas como modo de saber do todo. Do que isso se diferencia do método abstrato-concreto de Hegel e Marx? Curioso notar que os marxistas que afirma ser o método de Marx o “abstrato-concreto” não leram ou não entenderam a Lógica de Hegel até o final do último, terceiro, livro.  O método é, antes, de Hegel, o sintético, não de Marx ou dos economistas políticos… Ademias, n’O Capital, Marx corrige seu caminho, mostrando, de modo relativo, que o abstrato faz, sim, o concreto e a totalidade num processo lógico-histórico, mais aquele do que esse, claro. A questão é que a dialética volta a reunir as partes, a integração, o todo “síntese de múltiplas determinações”. A dialética sabe que as partes dependem do todo; que o todo tem propriedades inexistentes nas partes; que o todo e as partes são contraditórios, com saltos de qualidade e em desenvolvimento.

 

MÉTODO DE EXPOSIÇÃO CRÍTICA

O método pode ir do simples ao complexo, do passado ao futuro, do abstrato ao concreto. Ademais, um método possível é o crítico: exponha-se a ideia do adversário de maneira honesta, ponto a ponto, então se faz o comentário crítico. A própria ideia é apresentada na maneira de uma crítica, passo a passo. Pode-se, por exemplo, expor todas as teorias relevantes sobre Ética, dos antigos até os contemporâneos, ao mesmo tempo em que a própria ideia é exposta por contraste e por refutação. Todas as teorias quânticas podem ser expostas, discordando delas, demonstrando seus limites, rumo à solução. O precursor disso foi Marx com suas “teorias da mais-valia” e outros manuscritos.

 

MODELOS

Parte da ciência foi ao racionalismo, unilateral. Alguns, o dedutivo a partir de postulados e leis intuídas, uma aposta. Depois, o hipotético-dedutivo, uma hipótese quase arbitrária a ser testada. Depois, os modelos hipotéticos para explicar, melhor, encaixar, o conjunto de fenômenos. Todos são úteis e científicos, mas limitados. O melhor método é ter o “modelo” como conclusão, no final, como consequência necessária da empiria com a teoria. A ideia de modelo teórico parte do sujeito para o objeto quando se deveria partir do objeto ao sujeito.

 

FALÁCIAS

Em geral, grosso modo, as falácias ocorrem porque se quer focar na estrutura abstrata, numa lógica a priori, na gnosiologia, de uma argumentação – no lugar de focar na realidade, em seus nexos reais, na ontologia. Por exemplo, a falácia do apelo à tradição foca na “mente” ou na cultura no lugar de no próprio objeto; do mesmo modo, o apelo à novidade tenta dar um critério externo ao objeto; o apelo ao erro de, contra, focar em algo antigo, também é um critério externo, como se a verdade não estivesse na coisa e no real, pois o fato de ser uma ideia antiga nada diz se está errada ou certa em si.

Vejamos a falácia quanto à correspondência temporal, à coincidência como causalidade: se algo vem antes de outro algo, fato, logo aquele é a causa deste, pois a causa vem antes do efeito. Veja-se que, em vez de fazer uma pesquisa direta e disciplinada, fez-se uma dedução abstrata, não concreta, querendo supor nexos pela externalidade, no lugar de descrever o processo como – se há. Isso parte de uma premissa falsa de que a coisa em si, logo o nexo causal, é incognoscível, inalcançável. É um erro substituir a ontologia por gnosiologia, aquela deve dominar esta.

Tentar fazer ciência apenas com formas lógicas é um erro comum, que desdenha a empiria. Sob tal base frágil ergue-se a ciência burguesa, em especial na economia. Uma teoria pode estar logicamente bem estruturada, mas completamente, ou quase de todo, errada, equivocada, unilateral etc. É um erro, por exemplo, escolher premissas maiores não empíricas nas ciências concretas.

 

A DIALÉTICA NAS CIÊNCIAS HUMANAS E NATURAIS

O marxismo é, de longe, o melhor que há nas ciências humanas, apesar de inevitavelmente minoritário sob o capitalismo (as ideias dominantes de uma época são as ideias de sua classe dominante). Na psicologia, o freudismo agrega também os mais eruditos, junto com a psicologia marxista. Por que tal sucesso, embora minoria? Porque está numa posição social que necessita da verdade, saber como o mundo de fato funciona e suas razões. Por outro, a pobreza material e espiritual comove a muitos talentos; daí, por exemplo, a força do marxismo e do marxismo acadêmico na América Latina, em especial no Brasil e na Argentina. O capitalismo não é capaz, hoje, de provar que é um sistema merecedor de permanência. Mas a dialética é forte também porque 1) o objeto social é o mais complexo, incluindo aí a ciência da psique; 2) temos uma riqueza enorme de dados empíricos nesse objeto. Tais características não existem com tanta força nas ciências da natureza. De todo modo, o século XX teve muitos influenciados, de modo direto ou indireto, pelo marxismo e pela dialética, Born e Einstein em destaque. Isso levou ao ponto de conservadores acusarem a teria da evolução, a quântica e a relatividade de “ciências marxistas”. Vale recordar que o método não é o critério da verdade, embora a dialética prove-se um meio superior.

 

 

AS FERIDAS NARCÍSICAS DA HUMANIDADE

 

Freud erra ao levantar quais são as feridas que tiraram a humanidade de seu posto especial nas ideologias e nas ciências. Vejamos como deve ser.

O homem, a Terra, deixa de ser o centro do universo com a revolução copernicana: o Sol o é central. Assim, o ser humano foi retirado de um dos seus postos divinos. Tal ataque consolidou-se com Newton, depois, com Einstein. Até hoje, há ditadoras religiosas que negam tal revolução.

O segundo ataque ao narcisismo é a teoria da evolução de Darwin. O homem foi reduzido a animal, à parte da evolução da vida. Mais uma vez, a religião perdeu chão ao divinizar o homem. Por isso, tal teoria ainda sofre ataques. Vale lembrar, no entanto, que Marx antecipou – contra a filosofia e a religião de seu tempo – que o homem é, primeiro, um animal, que precisa primeiro satisfazer necessidades.

Isso leva-nos ao terceiro ataque ao narcisismo da humanidade, não reconhecido por Freud: o marxismo. Marx demonstrou que, de modo inconsciente, somos frutos de nosso tempo, de nosso modo de viver – que nossas ideias expressam nossas materialidades reais (como pertencimento a classes, ao sistema em vigor etc.). A moral, a filosofia etc. não são frutos puros do cérebro, mas em primeiro lugar da realidade em que vivemos. Somos, enfim, frutos inevitáveis da história. No mais, o capitalismo, o modo de vida que parece natural, passou a ser visto como instável, transitório e efêmero. Por isso, o marxismo sempre será caluniado e perseguido em todo o mundo, enquanto tal modo de produção baseado no dinheiro existir. Curioso que Freud foi incapaz de reconhecer tal revolução, sendo vítima da própria censura.

A quarta, não terceira, ferida contra o narcisismo da humanidade foi, é claro, a psicanálise. O homem é em grande parte governado pelo inconsciente, não pela razão pura, e seus instintos, em especial o sexual, tem força enorme sobre o indivíduo. Tal revolução teve como preparo direto o marxismo e o darwinismo, indiretamente a revolução da física. Por isso, nunca será perdoado, será caluniado e acusado de todo tipo de mal.

Veja-se que as quatro revoluções do pensamento humano causaram tensões, crises e perseguições (todas até hoje negadas por algumas ditaduras e por religiões). Nem todos conseguem aceitar tais teorias, tanto mais no grau necessário. O socialismo, se vitorioso for, trará a paz e o prestigio geral-popular a tais descobertas, ainda que de modo superante como no caso da psicanálise, que ao menos acertou o miolo da questão.

Mais associado ao marxismo, a moderna dialética, desde sua forma avançada em Hegel, também causa constrangimentos, desconfortos e resistências semi-inconscientes sobre cientistas e não. Para muitos, inaceitável que a contradição deva ser aceita e que ela é, ademais, produtiva, não apenas destrutiva; que a realidade é movimento e desenvolvimento, ainda que contraditório. Difícil sair da apenas individualidade para a integração, para o contexto, para a ideia de que o todo é mais do que a mera soma das partes. Mas a unidade e identidade dinâmica dos opostos, respeitando a diferença, torna-se o caminho inevitável. A vida é luta, não o conforto da alta classe média. Nem todos são capazes, material e mentalmente, de aceitar a dialética da matéria e da ideia. Mesmo que de maneira inconsciente e cambaleante; Einstein, Darwin, Freud e Marx usaram o método empírico-dedutivo, dialético, ou seja, colher criticamente os dados e, então fazer as devidas interpretações, ir para debaixo da empiria, para o oculto nos fatos.

Vale destacar que nenhuma filosofia, nenhum modo de ver o mundo, sofreu tanta perseguição quanto a marxista. Também raro causar tanta paixão entre vanguardas e simpatia geral entre as massas. Nos EUA e na Inglaterra, países aonde o estalinismo com seus partidos não fez grandes e tantos estragos, as novas gerações, mais precárias, declaram simpatia pelo socialismo, pela ideia difusa e instintiva que tal palavra levanta.

Tais resistências narcísicas costumam estar lastrada na religiosidade. Para a maioria, impensável uma vida sem religião, sem fé. A igreja garante vida social, emoção, casamento, fuga da solidão, apoio etc. Aceitar a verdade, que liberta, seria insuportável, tornaria suas vidas mais difíceis, material e subjetivamente. Eles precisam de um compensador numa sociedade descompensada, desequilibrada, precisam de uma droga simbólica. Por isso, resistem contra Marx, Darwin, Freud etc.

  

A TEORIA DE TUDO

 

Há mais de uma dúzia de teorias quânticas, todas de acordo com os fatos observados. O erro delas, em seus acertos parciais, está em não criticar os fatos – menos ainda suas premissas. Contra fato há, sim, argumentos. O fato é ele mesmo e um falso. É aparência. A ideia de descrição pura – dos fenômenos quânticos, da economia etc. – esquece que descrever é enganar, enganar-se. O suposto apenas descrever já parte de premissas, já parte de “obviedades”. Quem apenas descreve, ao iludir-se que apenas isso faz, erra e erra-se. Nisso caiu o positivismo quântico, a MMT na economia etc. Além do mais, o descritor parte de conceitos e preconceitos. É preciso criticar as próprias premissas, por mais evidentes que pareçam. A ideia de que a realidade é feita, primariamente, de partículas (ou ondas), gerou inúmeros erros. Nossa ideia de que a partícula é espaço condensado, condensação de linhas de espaço ou de linhas de campo supera a concepção paradigmática anterior. No nível atômico, segue válido tomar a realidade como atômica; mas a coisa se desfaz no nível subquântico, no espaço-campo. A linha metafórica que liga as partículas emaranhadas são linhas reais; as cordas que formam as partículas são cordas reais amplas, não apenas discretas; as correntes do espaço-tempo são de fato algo continuo etc.

A tentativa de unir o micro e o macro (e o meso) numa teoria de tudo teria de lidar com a incompatibilidade em relação à teoria da relatividade. Veja-se. A teoria de Einstein estava correta, mas, deixou-se de perceber, precisava ser desenvolvida ao máximo, aprofundada, ir-se até seu limite. A matéria, o átomo, até a onda, nada mais é – nada mais é! – que espaço condensado, concentrado, para dentro de si. A gravidade é produzida pela concentração de espaço que é a partícula. Por isso, a luz, que não tem massa, mas tem energia (energia é igual à massa), também curva o tecido, pois é o próprio tecido de modo em linha em ondulação, tecido condensado, ou linha condensada.

Deveria ser obrigação de todo físico passar por um ano de formação filosófica intensiva, em especial na dialética. Isso alarga o pensamento, produz criticidade, oferece alternativas.

A ideia de que tudo = tudo já povoa a humanidade desde os gregos, por milênios. Antes, faltaram condições sociais, matemáticas, físicas e, enfim e o fim, ousadia. São tempos covardes. Nossa teoria, porém, tem caráter qualitativo, faltante da exigência quantitativa de nossa época – em que tudo deve ser abstrato, frio e medido pela quantidade. Papel para o matemático ou para o físico com outras qualidades que não a criatividade primeira.

Coisas ficaram por exemplificar, talvez com a ajuda da futura matematização. Porque a linha de espaço-campo tem preferência natural para a direita? Resolver problemas geram novos desafios, novas perguntas. Explicamos, de modo geral, a preferência dos elétrons pela via direita, contra a simetria tão endeusada pelos físicos, e correta (a dialética trabalha, também, com opostos). Finalmente: a fenda dupla, o positivo e o negativo, o emaranhamento quântico, o desvio para a direita, o spin, a descontinuidade do movimento etc. estão explicados em sua base. Assim, recuperamos a unidade lógica – o mecanismo básico – da física clássica, de nosso nível, com a física quântica. Até agora, marabalismos justificavam a diferença com jogos de linguagem, com pedidos de fé etc.

Como criador, descobridor, de tal interpretação física, tenho a esperança de que intelectuais especializados consigam, daqui em diante, revisar, pela base, quase todos os fenômenos estudados nos manuais universitários. Por exemplo: e se o espalhamento do gás quando aquecido se dá – ou menos também – por que cada “partícula” acumula, assim, mais energia, ou seja, mais espaço para si, com sua autofronteira maior, afastando as demais? A megalomania parece não ser de todo delirante.

As últimas gerações de filósofos puros e de formação têm fugido do conhecimento geral, universal, refugiando-se na ética etc. Se fossem sérios, teriam interesse genuíno por questões científicas, em principal suas polêmicas centrais. Filosofia nada mais é do que uma forma de ciência. Nossos doutores em filosofia são, via de regra, inúteis, parasitas do dinheiro público. Pensam, aliás, que todos os seus méritos e salários devem-se apenas ao esforço próprio e isolado – o capitalismo esconde o nexo e a interdependência dos homens entre si assim como das partículas exige-se muito para perceber o nexo interno entre elas, a teia, numa teoria geral, do todo, de tudo. O critério da realidade é a própria realidade.

 IDEOLOGIA

 

A palavra maldita, ideologia, com a qual uns acusam os outros, e vice-versa, de a praticarem em suas afirmações talvez ou supostamente interessadas. Como veremos, todo este capítulo tem como centro tal objeto. Para nós, a mentalidade não é epifenômeno, como até Marx deixou quase entender em alguns momentos. Mas, mesmo assim, doloroso à consciência a ideia de que não decidimos quando decidimos ou que não temos livre arbítrio. Às vezes, somos até capazes de ver nos outros que eles e seus pensamentos são frutos do meio, de sua experiência não escolhida, mas “esquecemos” de olhar com o olho de dentro para fazer a autoanálise. Em geral, apenas quem está numa posição social que necessita da verdade, a posição comunista e proletária, torna-se capaz do julgamento muito pleno de si e dos demais, de saber a base concreta do pensamento ou sentimento abstratos. Vejamos, agora, o resumo de alguns de nossos mestres e uma conclusão específica sobre.

 

MARX E ENGELS

Eles começam a concepção marxista de ideologia enquanto sinônimo de falsa consciência, como oposto à ciência. Depois, Marx avança para um conjunto de ideias como forma de tomar consciência prática das tarefas e problemas de seu tempo.

Eles elaboraram, então, a famosa máxima: as ideias dominantes de uma época são as ideias de sua classe dominante.

 

LENIN

O teórico russo contrapõe ideologia como visão de mundo classista, das diferentes classes. Há, assim, a ideologia operária e, oposta e inimiga, a ideologia burguesa.

 

 

LUKÁCS

O húngaro nomeia ideologia toda a superestrutura subjetiva: ciência, política, moral etc. Para ele, ideologia é ontológica, ou seja, tem função prática na realidade para 1) convencer uns aos outros a trabalhar de tal ou qual modo, 2) convencer os outros homens a organizar a vida social de certa ou daquela maneira.

 

ALTHUSSER

O autor francês retomou a ideologia como falsa consciência, como uma versão ou visão invertida, de cabeça para baixo, do mundo real. Na prática, ele apenas retomou o senso comum e preconceitos de seu meio ambiente, a universidade burguesa. Sua meta foi adaptar o marxismo à academia e suas concepções de classe média.

 

OUTRA CONTRIBUIÇÃO

Como no tema da liberdade humana, todas as concepções acima estão certas em algum nível. As diferentes ideologias – filosofia, arte etc. – subjetivam a objetividade, ou seja, desenvolvem, unilateralizam e aprimoram o que já existe na realidade. Por isso, muitas vezes apenas organizam e sistematizam o senso comum, o cotidiano.

Engels afirma:

 

Vimos como os filósofos franceses do século XVIII que abriram o caminho à revolução, apelaram para a razão como o juiz único de tudo o que existe. Pretendia-se instaurar um Estado racional, uma sociedade ajustada à razão, e tudo quanto contradissesse a razão eterna deveria ser rechaçado sem nenhuma piedade. Vimos também que, em realidade, essa razão não era mais que o SENSO COMUM do homem idealizado da classe média que, precisamente então, se convertia em burguês. (Engels, Do Socialismo Utópico ao Socialismo Cientifico, 2003, detaque meu)

 

Ele repete, na mesma obra:

 

Para o metafísico, as coisas e suas Imagens no pensamento, os conceitos, são objetos de Investigação Isolados, fixos, rígidos, focalizados um após o outro, de per si, como algo dado e perene. Pensa só em antíteses, sem meio-termo possível; para ele, das duas uma: sim, sim; não, não; o que for além disso, sobra. Para ele, uma coisa existe ou não existe; um objeto não pode ser ao mesmo tempo o que é e outro diferente. O positivo e o negativo se excluem em absoluto. A causa e o efeito revestem também, a seus olhos, a forma de uma rígida antítese. À primeira vista, esse método discursivo parece-nos extremamente razoável, porque é o do chamado SENSO COMUM. Mas o próprio SENSO COMUM - personagem muito respeitável dentro de casa, entre quatro paredes - vive peripécias verdadeiramente maravilhosas quando se aventura pelos caminhos amplos da investigação; e o método metafísico de pensar, pois muito justificado e até necessário que seja em muitas zonas do pensamento, mais ou menos extensas segundo a natureza do objeto de que se trate, tropeça sempre, cedo ou tarde, com uma barreira, ultrapassada a qual converte-se num método unilateral, limitado, abstrato, e se perde em Insolúveis contradições, pois, absorvido pelos objetos concretos, não consegue perceber sua concatenação; preocupado com sua existência, não atenta em sua origem nem em sua caducidade; obcecado pelas árvores, não consegue ver o bosque. (Idem, destaque meu)

 

Lukács fala que a ciência costuma derivar do cotidiano como a criação de pombos observada por Darwin, mas não teve tanta clareza sobre isso quanto à ideologia.

Marx diz n’O Capital:

 

O segredo da expressão do valor, a igualdade e a equivalência de todos os trabalhos porque e na medida em que são trabalho humano em geral, só pode ser decifrado QUANDO O CONCEITO DE IGUALDADE HUMANA JÁ POSSUI A FIXIDEZ DE UM PRECONCEITO POPULAR. Mas isso só é possível numa sociedade em que a forma mercadoria é a forma universal do produto do trabalho e, portanto, também a relação entre os homens como possuidores de mercadorias é a relação social dominante. (Marx, O capital I, 2013, p. 103)

 

Em seguida à citação, ele faz a famosa afirmação: por estar no mundo antigo e ser senhor de escravos, Aristóteles era incapaz de perceber a substância do valor.

A realidade é traduzida pelo pensamento, não criada neste nível. Uma obra de moral expressa a moral objetiva da realidade, por assim dizer. Quando pós-modernos falam de “Multidão” no lugar das classes em luta, eles estão intuindo o fim das classes no comunismo de modo impressionista e imediatista, pois as classes estão de fato em crise categorial. Quando outros pós-modernos falam de fim do trabalho e besteiras semelhantes, de fato sentem com exagero a crise do valor, a automação etc.

O filósofo ou o artista está na vanguarda do novo, ainda que algo seja de curta vida. Adorno percebeu já e ainda no começo que a música se tornaria apenas o fundo de um cenário, logo fato comum hoje desde o walkman, o MP3, o celular, a internet etc. Claro, muitas vezes erram os ideólogos.

Se a realidade humana, pessoal, está fragmentada, logo surgirá uma filosofia fragmentada. Passamos para a linguagem humana aquilo que não a é. O espírito do tempo hegeliano, Zeitgeist, na verdade é a objetividade do tempo, ou melhor, do meio, a carne e a coisa de uma época, corpo social e dinâmico – espírito, mas espírito concreto.

Isso produz uma nova conclusão, teorema: se uma teoria parcial pode surgir, ela surgirá. Vejamos dois exemplos. A artificialidade atual do dinheiro, na artificialidade do sistema mantido pelo Estado, sua criação fácil, leva a membros da classe média a pensarem como solução para tudo a criação maior de moeda. A nova classe média e a aristocracia operária europeia fizeram a cabeça de Sartre e seu existencialismo.

O materialismo parte, também, do senso comum: a realidade existe. Para um cidadão médio é óbvio que a objetividade há, e é, pois Deus a criou. O idealista apressado acusa tal ideia por ser vulgar, cotidiana, e eleva a voz para duvidar da existência autônoma do real. Na verdade, sequer dá dois passos à frente na sua elaboração.

A realidade é um inconsciente objetivo para além do inconsciente individual, subjetivo. Assim, este é influenciado por aquele; então ocorre a racionalização, no duplo sentido, psicanalista e não psicanalista. Lukács, por isso, erra quando diz que o artista, similar ao Espírito hegeliano, vai para o mundo e, enriquecido por ele, produz algo, retoma-se; não; o poeta já está na realidade e sua inspiração vem de repente, tantas vezes do inconsciente duplo para a consciência; depois, uma ideia leva à outra, e outra, e assim por diante. Se o romancista pesquisa, parte da ideia inicial, age a posteriori, e suas investigações são muito específicas, como estudar arte militar para melhor descrever e narrar uma batalha.

Veja-se que os reformistas enrustidos no meio marxista insistem em negar a validade teórica de três aspectos do socialismo científico: a dialética, a queda da taxa de lucro rumo a crises e ao fim do sistema e a necessidade de um partido democrático centralista. Fazem isso de modo, em geral, inconsciente, mas o fazem. Em geral, expressam a classe média em suas entranhas cerebrais, por isso, por exemplo, a maior dificuldade de ir além da lógica formal.

Enfim, a subjetividade dominante de uma época é a subjetividade de sua objetividade dominante. O subjetivo é um espelho ampliador. A classe dominante não cria ideologia em uma sala secreta de reuniões, caso contrário seria pura falsificação, não ideologia; assim como não controla o próprio sistema, a burguesia não controla a criação ideológica de modo direto e inteiro; “nós criamos, mas criamos apesar de nós”. A realidade entra na cabeça da própria classe dominante, que traduz o real de seu ponto de vista, e tenta ganhar a sociedade para suas próprias posições, que têm origem primeira no objeto, ainda que unilateral.

Uma ideologia, por mais força social potencial que tenha por si, costuma precisar de uma superestrutura objetiva, uma instituição, para prosperar em muitas cabeças. As teorias de Lenin e Trotsky somente deixaram de ser marginais porque lideraram uma revolução, um partido e um Estado. Na França, a escola de Annales apenas cresceu porque tomou espaços universitários. Para muitos filósofos, cargos como o de reitor de universidade tiveram um efeito brutal na popularidade de suas ideias. Fora de tais meios, costuma-se cair na marginalidade.

O externo se internaliza. Os marxistas afirmam que apenas (re)conhecemos o objeto quando ele está maduro; antes, conhecemos imperfeitamente o objeto porque o objeto também ainda é imperfeito. Os mercantilistas na economia pertencem à época mercantilista; a teoria da evolução de Darwin, a seleção do mais apto, pôde surgir e ser corretamente aceita porque a revolução industrial impôs o império da livre concorrência, permitiu surgir tal avanço científico por sua estrutura-avanço social e tais ideias eram úteis para o desenvolvimento das forças produtivas. Eis uma forma diferente de identidade e unidade objeto-sujeito. Em duplo sentido, o objeto que se reconhece no sujeito. Além do mais, a realidade tende a produzir homens e mulheres para si, que veem tanto quanto podem ver.

A ideologia traduz e expressa as contradições e as dinâmicas do real, ainda que seja para negar tais contradições e tais dinâmicas. A ideia de tradição medieval vem de uma objetividade que pouco muda, em que o passado dava respostas suportáveis – até não mais dar.

Temos, portanto, uma concepção ideológica de ideologia. A consciência avança se sua base material avança; e recua se esta recua. Mas a consciência também é matéria, então tem força na própria materialidade, e resistência à mudança, para frente ou para trás, além de influenciar também o meio. Há aprendizado, há tradição. De tal modo, damos um novo significado para a dinâmica unidade e identidade sujeito-objeto; tal objeto como objetividade, realidade. A ideia é matéria – a ideia é matéria em processo.

Platão contrapõe filosofia (ciência, dialética) e senso comum. Nós fazemos diferente, mais do que o oposto: o senso comum torna-se base tanto para o avançar quanto parta o limite do pensamento de uma época.

 

A DUPLICAÇÃO DOS MUNDOS MODERNA

    

A ideia de dois mundos é antiga, desde a religiosidade dos primeiros homens. Sua popularidade atual vem do filme Matrix, que tanto influenciou a filosofia – normalmente, o caminho é inverso, a filosofia afetar a arte.

Ainda há dualismos e idealismos disfarçados por aí. O cérebro de Boltzmann diz que, num tempo muito longo mais a entropia, há a possibilidade alta de fazer surgir um cérebro vagando no vazio do universo, vivendo por alguns poucos segundos ou minutos – e alucinando a nossa realidade. A imagem é maravilhosa, percebe-se.

Outra versão é esta: estamos dentro de um programa de computador. Do ponto de vista probabilístico, isso é o mais provável – o que reforça nossa crítica aos limites da probabilidade na ciência. No mais, uma simulação gera outra simulação, que gera outra etc.; isso tão logo a civilização virtual tenha condições para isso, tecnologia.

A caverna de Platão (mundo das ideias), a cidade de Deus etc. estão atualizadas. Há físicos que afirmam que a realidade não existe, que a coisa só há se a medimos, se a olharmos etc. É um erro crasso tratado como ciência séria. Outra ilusão é a concepção de muitos mundos, de universos paralelos; assim, ao fazermos a medida e o objeto colapsar numa de suas possibilidades, estados, outro universo é criado, aonde a outra possibilidade também se realiza… Bom; a matéria e a energia do universo são limitadas, não finitas, logo impossível que uma simples ação de medida crie algo novo e paralelo completo.

A mais sofisticada diz que o universo é um holograma de buracos negros. Ainda que a matemática apresente alguma justificativa, a lógica numérica não é a própria realidade total.

Uma concepção real de mundo duplicado, mas ao mesmo tempo uno, deveria surgir – este livro parece acertar em tal tentativa de expor sua natureza.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

EXTRA: OS PARADOXOS

 

A solução dos problemas dos famosos paradoxos é que tais contradições deverão produzir ou mudança ou colapso, movimento. Vejamos três casos de destaque:

 

1)      Se um barco tiver toda a sua madeira restaurada, ele continuará sendo o mesmo barco?

E se a madeira velha, retirada, for usada para produzir um barco, será um novo ou o antigo? Ora, do ponto de vista hegeliano: ambos os barcos são novos e os mesmos. Mas em nossa dialética diacrônica, a coisa é um pouco diferente. Um vai tornando-se o outro. No quantitativo, um barco com 100 tábuas, se tira e substitui 2, então ele é 98% antigo, 2% novo.

Mas ainda cabe outra resposta:  todo, a realidade, do qual os dois barcos participam é outro ao mesmo tempo o mesmo, todo único. O erro seria focar na coisa, nos objetos.

Outra resposta; a coisa é , em primeiro, sua forma, que pode mudar de matéria, não a própria matéria.

 

2) Quem barbeia o barbeiro na cidade aonde ninguém barbeia a si próprio?

Como resolver? Colapsando ou movendo. Vejamos: 1) o barbeiro pode barbear-se em outra cidade, 2) ele colapsa a lei barbeando-se, 3) um não barbeiro o barbeia etc.

Cria-se um carinho pela contradição apaixonante, quer mantê-la em pé.

 

3)O paradoxo de Ferrmi

Esse é um paradoxo mais científico do que filosófico. Toda a probabilidade diz que há civilizações extraterrestres, mas elas não aparecem – por quê? Porque o mesmo Sol, estrelas, que dá vida e permite surgir uma espécie inteligente, destrói a tecnologia avançada com suas explosões, com seus ventos solares especiais e intensos. Civilizações, ademais, têm um ponto nodal, como no fim do capitalismo, quando se extinguem, a si próprio, ou prosperam. Talvez, nossa biologia tenha sido a mais rápida em produzir uma espécie especial. As civilizações inteligentes e avançadas, se existem, estão em demasia distantes umas das outras. Nem toda civilização inteligente é, de imediato, avançada. Por fim, evita-se o contato direto.

 

 

O COLAPSO AMBIENTAL

 

O Marx marxista começa a sua produção expondo que uma das alienações de nossa sociedade é que o homem não se vê como parte da natureza, põe-se enquanto externo a ela. Pouco depois, levanta a questão da defesa do meio ambiente contra a sua destruição, mas de modo muito limitado. Em O Capital, expõe que rompemos metabolismo da natureza ao transferirmos material do campo para a cidade, rompendo um ciclo natural. Observou também que a divisão da terra em propriedades separadas e privadas não permite um manejo bom do solo. Mas suas fortes observações param aí já que não percebeu que a crise ambiental é parte vital das crises de um sistema, como o capitalista.

O homem sempre agredirá o planeta. Mesmo o homem tribal levou à extinção de espécies. A questão é que tanto podemos fazer isso hoje de modo profundo quanto temos condições, por outro lado, de agredir o mínimo possível, de modo sustentável. Uma hidrelétrica é necessária à sociedade, mesmo que agrida o natural, mas pode ser reduzida e compensada a sua ação social sobre o meio ambiente.

Desde a famosa década de 1970, quando tudo mudou, passamos a extrair mais da natureza durante um ano do que ela é capaz de repor por si própria no mesmo período. A pulsão infinita do capital, a má infinitude da progressão, ao tentar agredir o infinito verdadeiro, na verdade agride sua própria base, o que pode nos levar à extinção.

A vida – tanto mais a de grande porte – se reerguerá nos próximos milhões de anos, com ou sem a humanidade. Nossa tarefa é humanizar a natureza produzindo novos elementos químicos e mudando os animais. Podemos criar sementes mais fortes, mas, ao mesmo tempo, em nome do lucro, as tornamos estéreis na segunda germinação para forçar a compra de novos insumos.

Torna-se uma necessidade reaproveitar e reciclar quase todo o lixo ora descartado, mas isso fere poderosos interesses. Além disso, o lucro não tem limites, quer sempre mais, por isso o desmatamento avança apesar da ameaça ao ecossistema.

Ou socialismo ou extinção! O atual modo de vida precisa passar para outro mais organizado, planejado, sem lucratividade – mas não é algo inevitável. A produção romana escravista levava a esgotar o solo, algo resolvido com o método de descanso da terra praticado pelos medievais. Mas o feudalismo, em sua fase final, também criou uma crise ambiental ao aumentar a quantidade de feudos e destruir matas de nascentes etc. Cada fim de sistema classista tem sua crise do meio ambiente, mas apenas a atual ameaça a espécie humana total.

 

ENERGIA

A civilização pode ser medida por sua capacidade energética. Por exemplo, impossível ergue uma civilização baseada em alfaces, logo precisamos plantar aquilo que oferece mais energia. Nesse sentido, temos a escala de Kardashev, aonde há civilizações de tipo 1, que domina a energia de seu planeta, de tipo 2, que domina a energia de seu sistema solar, e tipo 3, que domina a energia da galáxia. Ainda somos a civilização de tipo 0, mais precisamente, 0,75 – ainda não somos uma civilização.

Para ao menos tocar o tema, destacamos que cada era do capital tende a uma própria relação na produção de energia. Vejamos. Era mercantil: força humana, animais, moinhos de água e vento; era industrial: máquina a vapor; era financeira: eletricidade, hidrelétricas, petróleo, etc.; era fictícia: o mesmo da anterior, como um salto para si, com a consolidação, após os anos 1950, da fissão nuclear, e o uso recente de energias solar, eólica e maremotriz cada vez mais aperfeiçoadas (nesta era, prepara-se o caminho técnico-científico da próxima revolução energética, que inclui a fusão nuclear).

A fusão nuclear, método que estamos tentando dominar, gerará energia global abundante e limpa, além de sem grandes riscos. Ela é própria para a sociedade socialista, por isso esta deve investir nela com máxima força. Isso nada mais é que imitar a fusão nuclear da nossa estrela em escala menor.

Tal revolução energética por vir facilitará com que nos tornemos uma civilização interplanetária. Faremos, tanto quanto possível, mineração em outros planetas, principalmente no próximo e estável Marte. Uma sociedade desse tipo exige uma tecnologia mais avançada e tal mesma tecnologia mais avançada exige relações sociais mais avançadas também, ou seja, socialistas. A revolução comunista levará nossa espécie para além da atmosfera. É uma lei social que forças produtivas mais elevadas exigem relações de produção e sociais também mais elevadas.

Tudo isso está de acordo com a necessidade drástica de redução do uso de petróleo. A poluição está causando um efeito estufa, está aquecendo e desregulando o clima. Mas o capital não demonstra o menor sinal de que combaterá o problema na sua medida, pois a lucratividade não conhece limites. Faz algum tempo, a escola americana MIT fez uma postagem na internet afirmando que o grande problema da captação de energia solar é que é muito eficiente, então a energia torna-se muito barata. Eis um problema capitalista!

A afirmação de que o capital é incapaz de resolver tal problema não é um dizer por fé. Se tal sistema for capaz de impedir a catástrofe, tanto melhor aos socialistas, pois eles terão muito mais tempo histórico para mudar a realidade, com menor risco de extinção. O fato de podermos ser extintos em algumas décadas é um peso enorme, que reduz a margem de manobra da luta por outra sociedade.

 

 

 

 

MARXISMO E METAFÍSICA

 

É muito difícil enfrentar as tendências de seu tempo. No século XIX, a luta de Kant e dos positivistas contra a metafísica tornou-se popular, digamos assim, tornou-se uma obviedade científica, filosófica. Para que saber sobre o nada e o ser? O iluminismo associou metafísica com metafísica medieval, aonde a religiosidade impera – até nosso tempo, ser metafísico é considerado, no meio marxista, algo religioso. Para que saber “o porquê” realidade, seus aspectos centrais e universais, se podemos fazer bom uso do “como”? Assim, ficou para a Igreja saber os fundamentos primeiros do mundo.

Marx e Engels contrapuseram a dialética com a metafísica, sem atentarem que são o mesmo, ainda que opostos. A dialética é uma forma de metafísica, contra o que pensava, veja só, Aristóteles. O materialismo com história é uma concepção geral de mundo, de cosmos, de como é a realidade.

Seguindo tal tradição, Lenin e Trotsky também abominavam qualquer associação coma palavra metafísica. Lukács corrigiu nosso caminho, usando um nome mais aceitável para a academia universitária burguesa – ontologia, um aspecto e área da metafísica.

Como o marxismo tornou-se, em grande medida, acadêmico, teve de ceder à antimetafísica e burguesa concepção de ciência. Mas, entre não marxistas, aqui e ali, surgiam sinais de renascimento da filosofia primeira, como em Heidegger, Ser e tempo; como em Sartre, Ser e nada.

Diz-se que o bibliotecário que organizou a obra de Aristóteles colocou os textos para além dos textos da física por uma questão apenas de ordem. Mas ordem nas prateleiras tinha, no fundo, uma correspondência coma ordem real. É a partir da física e das demais ciências que podemos chegar a certa e correta metafísica. Tal meta deve explicar e superar não só as ciências particulares, mas também soar como a evolução natural de toda a filosofia, sua conclusão inicial.

O marxismo é uma concepção geral de natureza, de sociedade, de ética etc. de realidade primeira, de mundo. Não é a filosofia de nosso tempo; antes, filosofia do tempo. Assim, consegue transcender de maneira imanente a época de sua elaboração.

Nas minhas pesquisas e elaborações, fui chamado a tomar as conclusões às quais alcancei como algo de todo novo, uma revolução imensa de ineditismos. Sou marxista como Marx era hegeliano ferrenho e, ao mesmo tempo, crítico. Nomeio minha metafísica marxista porque pertenço a uma tradição filosófica bastante clara. A ruptura permanece na continuidade.

 

VALOR

Apenas com Postone a questão da importância central do valor fez-se presente, para além e por debaixo da categoria capital. No entanto, o marxismo continua considerando tal conceito como não existente em si, como apenas relação. No posfácio de Engels ao livro III d’O Capital, ele cita economistas que afirmaram ser o valor algo inexistente, uma ficção, mas extremamente útil ao trabalho científico. O comunista rico, ao contrário, afirmou a existência de tal “coisa” ou “propriedade”.

Vejamos citações que reforçam nossa tese:

 

Uma mercadoria aparenta ser, à primeira vista, uma coisa óbvia, trivial. Mas sua análise a revela como uma coisa muito intricada, plena de sutilezas metafísicas e caprichos teológicos.

 (Marx, O capital I, 2013, p. 146)

 

No entanto, a mesa continua sendo mesa, uma coisa sensível e banal. Mas tão logo aparece como mercadoria, ela se transforma numa coisa sensível-suprassensível.

(Idem, ibidem)

 

O valor do ferro, do linho, do trigo etc., apesar de invisível, existe nessas próprias coisas…

(Idem, p. 170)

 

Aqueles que acham que atribuir ao valor existência independente é mera abstração esquecem que o movimento do capital industrial é essa abstração como realidade operante (in actu).

(Marx, O Capital - livro 2, 2014, pp. 119, 120)

 

Mais-valia e taxa de mais-valia são, em termos relativos, o invisível e o essencial a ser pesquisado, enquanto a taxa de lucro e, portanto, a forma da mais-valia como lucro se mostram na superfície do fenômeno.

(Marx, O capital 3, 2008, p. 34)

 

Metodologicamente, Hegel dá a pista:

 

Tem que se deixar de lado a opinião de que a verdade tem que ser algo palpável.

(Hegel G. W., 2016, p. 53)

 

O valor é uma entidade não empírica, invisível, metafísica – não apenas relacional. É nesse sentido que o dinheiro torna-se o deus real do mundo real, a medida de todas as coisas.

No começo de suas pesquisas, Engels e Marx negaram a categoria valor, talvez por seu lado metafísico. Mas logo tiveram de recuperá-la, único modo de, no real, entender o capitalismo.

O valor, sejamos ousados, nada mais é que nada, energia, aspecto da quarta dimensão. Hegel diz que o que está na causa passa para o efeito, como a água da chuva estará no solo molhado; ora, a energia corporal do trabalhador passa para a coisa, o objeto, a mercadoria física.

 

 

 

TECNOLOGIA MODERNA

 

O marxismo parou de estudar as novas ciências e tecnologias, permanece vítima do mundo acadêmico e da especialização. Talvez, cremos certa máquina de produzir novos compostos químicos, o que revolucionaria tudo – mas disso nada sabemos. A química tem vasto uso industrial; nesse sentido, de modo inconsciente, uma ciência socialista por excelência.

As máquinas estão substituindo de vez o homem na produção – seja por imitação da mão humana, seja pela imitação de seu cérebro e sensibilidade (programas, robótica). Em muitos aspectos, a máquina nos supera. O tempo do tempo livre está por chegar, mas ele se manifesta hoje como desemprego desesperador. A culpa, claro, nunca é dos físicos e engenheiros. Se há certa culpa dos cientistas e técnicos é o fato de que os produtos estão sendo fragilizados, feitos para quebraram, o que gera lixo maior, mais consumir a natureza, lucro acrescido e consumidores insatisfeitos. O socialismo acabará com essa palhaçada que nos leva à extinção.

Programas como o ChatGPT são capazes de fazer música – ainda não muito bem –, matérias de jornais etc. É um recurso útil e inevitável em certo sentido. O desemprego crônico e a precarização é um tendência inevitável sob o capital.

A verdade também está sob risco. Vídeos perfeitos poderão ser produzidos, com voz correta, com pessoas fazendo atrocidades que não cometeram em verdade. Mas a tecnologia não é a causa única, polo substancialista, pois se estivéssemos numa sociedade organizada e socialista, sem grandes lutas de classes, tais meios não teriam base relacionalista para degenerarem em falsificação criminosa ou caluniadora.

O mais notável são os computadores e supercomputadores, incluso a emergente hipercomputação quântica, que permitem – finalmente! – o planejamento geral, central, técnico e democrático da produção, da distribuição e da economia.

Atrapalham, no entanto, o desenvolvimento técnico o controle privado de patentes, o segredo industrial e os monopólios e oligopólios. A solução, evidente, não é propriedade em si estatal, mas social, o Estado e as empresas controladas pelos trabalhadores e pelo povo.

Há uma tendência efetiva em investir em ciência de aplicada, para fins lucrativos, contra a ciência de base, que estagnou em certo sentido. Isso prepara a queda da burguesia ao criar as bases para o revolucionamento total da sociedade.

 

EDUCAÇÃO

 

Os professores foram capaz de tornar o estudo da realidade algo tedioso, insuportável, angustiante. A educação científica da humanidade é deplorável, e o capital tem cada vez menos necessidade de gente com alta especialização (as coisas ganham cognição).

Como tudo é contraditório, a internet permite uma educação superior. Posso dizer que ela mudou minha vida, permitindo-me ter cultura para escrever livros como este. De modo que parte do currículo pode ser cumprido coma autoeducação, via canais de vídeos etc.

Porém o QI tende a cair por causa do pouco movimento e da pouca vivência prática das novas gerações, vidradas na tela de celular desde o nascimento. Não é exagero dizer que estamos destruindo o cérebro das novas gerações, e não teremos o direito de reclamar depois. Alguns infantes apresentam sinais de autismo sem serem geneticamente autistas.

Apenas países dominantes investem na educação – e olhe lá! –, pois precisam de especialistas na concorrência global de empresas. Os EUA têm um povo, no geral, inculto, bom para controlar a classe trabalhadora; mas atrai para si os melhores cérebros, que surgem com dificuldade em todo o mundo.

A educação não muda o mundo; por isso temos, no meio da crise econômica brasileira, engenheiros dirigindo taxi uber. È a economia, estupido! Apena s o socialismo é capaz de garantir a humanidade intelectualizada, ativa e senhora de si – reforçando o indivíduo e seus talentos.

Temos uma educação do século 19 na era do conhecimento subatômico. Deve-se garantir a internet como meio prazeroso de aprendizado e paixão científica. Professores excepcionais, por didática e personalidade, precisam dispor cursos e aulas completos sobre temas de suas especialidades.

Logo teremos óculos que permitirão entrar no mundo paralelo virtual ou, melhor, ou melhor, ampliar a nossa realidade. Isso permitirá, por exemplo, “ver”  a célula em tamanho amplo, seu funcionamento, suas partes e explicações. Mas isso depende, em grande medida, de construirmos uma sociedade justa, que necessite de um povo culto.

 

TEORIA MARXISTA DA ALIENAÇÃO

 

É da cultura comum afirmar que alguém sem interesse por política é um alienado. Tal significado de alienação até está correta, mas é muito limitada. Comecemos com uma reflexão. Se o trabalho é central para a espécie humana, porque só nos sentimos humanos quando terminamos de trabalhar? Bem observado, sentimos os prazeres mais básicos e animalescos de dormir, comer, praticar sexo, etc. Isso ocorre porque vivemos em uma forma de sociedade que nega nossa humanidade.

Para nos aproximarmos do conceito completo, o primeiro significado de alienação é separação. E é ainda mais correto dizer “separação daquilo que deveria estar integrado, unido”. Veremos: tal concepção é insuficiente ao mesmo tempo em que permite uma aproximação bastante correta da teoria.

 

O CAMINHO DA TEORIA DA ALIENAÇÃO

Hegel, pensador anterior a Marx, elaborou: nosso pensamento, o subjetivo, cria o objetivo, como, por exemplo, o Estado. Aquilo criado a partir de nosso “espírito” separa-se de nós: é a subjetividade objetivada. A partir da ideia de Estado, nosso exemplo, cria-se uma instituição que ganha vida própria, que ganha independência. Aqui vale uma atenção: o processo de formação de algo separado é, para Hegel, inteiramente positivo.

Outro filósofo, desta vez da época de Marx, chamado Feuerbach, criticou Hegel com imensa dureza. Elaborou uma teoria ateísta e materialista da realidade, contra a religiosidade mais ou menos presente em Hegel. Feuerbach afirma: Deus não criou o homem – foi o homem quem criou Deus! Porém: a ideia de Deus passou a dominar o próprio homem, ou seja, a criatura passou a dominar o criador! Deus, esse pensador diz, é a representação do próprio homem, de sua própria essência, para o homem infeliz com sua realidade. Aqui vale outra atenção: para ele, a alienação é inteiramente negativa.

Marx combina as duas formulações, de Hegel e Feuerbach, para formar algo novo. O homem – ou melhor, os trabalhadores – cria a realidade, mas essa mesma realidade volta-se contra o criador e o domina. O Estado, por exemplo, só pode existir porque há trabalhadores, porém o Estado existe para reprimir e controlar a classe trabalhadora.

O mundo das coisas criado pelo trabalhador ganha autonomia e independência, então a criatura, como as mercadorias, controla o criador. Aquilo que chamamos “capital”, que é um processo social, é também um processo cego, que impõe regras sobre os homens. Porque os homens estão desorganizados como sociedade, separados uns dos outros, surge uma série de leis sociais que não são decididas por ninguém, pois surge uma lógica das coisas que passa a controlar a humanidade.

Nas fábricas, o fruto do trabalho, o resultado do esforço, é uma mercadoria que não pertence ao trabalhador, ou seja, ao criador – pertence ao capitalista. Ele, o operário, é separado do fruto de seu próprio trabalho e nada tem de identidade com seu produto final. É muito comum o operário passar oito horas seguidas apenas colocando uma única peça num aparelho, no entanto ele nada sabe da função de seu ato de trabalho, para que serve aquele componente que ele instala no produto.

O trabalhador serve ao processo produtivo, não é o processo produtivo que serve ao trabalhador. O operário torna-se uma ferramenta de carne e osso da máquina – o maquinário passa a dominar os trabalhadores. Assim, a máquina é sujeito e o operário é objeto – o trabalhador é coisificado, o maquinário é humanizado. Há, portanto, coisificação dos homens com a humanização das coisas.

Vale a pena oferecer relatos sobre não alienação no trabalho. Certa vez, fui vigia de dependentes químicos; numa dessas vigilâncias, sentou perto de mim um paciente que pintou as paredes e colocou grama no pátio da instituição; pois bem: ele conversava com um colega e disse: fazer todo o trabalho é puxado, mas quando vemos o resultado, dá um prazer enorme. Esse “prazer”, um sentimento, é muito valorizado pelo marxismo; o trabalho escravo, feudal e assalariado negam esse prazer sentimental do animal humano. Tenho um amigo que, por improviso, sem formação oficial, produz, por exemplo, a própria mesa de sua casa; ele diz que, quando vê o fruto do seu trabalho, lhe dá um prazer enorme – o cérebro premia a criatividade, a criação ativa. No meu caso, a primeira vez em que tive tal sentimento foi quando ensaiava com minha banda nossas próprias músicas; nós não repetíamos as músicas como robôs musicais, ao contrário, experimentávamos, dávamos propostas para as canções, e uns aos outros, tentávamos, corrigíamos etc. – depois, era quase uma hora inteira sentido aquele sentimento sem nome, agradável, do qual comentávamos. Também senti isso quando as reuniões partidárias da qual participava eram dinâmicas, com observações, propostas, votações etc. É um sentimento fortíssimo porque é raro hoje; mas será natural no socialismo, pois, por exemplo, saberemos que nosso esforço é útil para a comunidade, que ajuda tanto a nós quanto aos outros.

A alienação também é a separação dos seres humanos com a dominação de uns sobre os outros. A dominação de uma classe sobre outra, o machismo, o racismo, a homofobia, a xenofobia são formas de separação daqueles que deveriam estar integrados, unidos. Os que dominam a relação – o patrão, o homem machista, etc. – recebem muitas vantagens por sua vida alienada enquanto o outro polo, o negativo – o operário, a esposa, etc. –, tem uma série de prejuízos nessa forma de alienar-se. A prática machista ou domínio do patrão sobre o empregado são formas de coisificar o outro, de diminuir sua humanidade, de subordiná-lo.

A separação dos homens é ainda mais profunda. Vemos o outro como inimigo, como adversário. Os capitalistas lutam entre si por lucro e os trabalhadores entre si por emprego. Por isso, a missão do socialismo é superar essa animosidade, colocando, finalmente, fim à divisão da humanidade entre possuidores e despossuídos, entre classes sociais. 

A alienação inclui a transformação do dinheiro em um Deus. Hoje, o dinheiro é apenas um pedaço de papel pintado, mas guia nossa rotina e nossos pensamentos. A coisa domina os homens, a criatura domina o criador. Se alguém nos mostra um bolo enorme de notas de dinheiro, logo esticamos os olhos e ficamos afetados – e um desejo estranho de ter aquilo nos possui. Pense-se que sempre nos sentimos mal quando gastamos dinheiro, sentimento que nos pressiona a poupar, a guardar nossas notas.

A humanidade aliena-se em seu desenvolvimento e tal alienação desenvolve-se até que existam condições para o reino da liberdade real. Em sua evolução, a humanidade nega-se a si própria – coisifica-se, etc. – para, depois, afirmar-se de modo pleno. Ou seja: o caminho da liberdade é feito por meio de seu oposto, de seu contrário, de sua negação. Os modos de vida escravocrata, feudal e capitalista são etapas necessárias para que o homem, no futuro, torne-se livre de fato. No escravismo antigo, os trabalhadores eram como coisas, nenhum pouco livres. No feudalismo, o homem na forma de servos medievais torna-se um tanto mais livre, preso ainda à terra, e um pecador. No capitalismo, somos formalmente, juridicamente, livres e iguais – apenas formalmente; ou trabalhamos como as condições difíceis nos impõe ou fracassamos. No socialismo, seremos de fato e finalmente – substancialmente – livres. A história da humanidade é a história por onde ela se torna cada vez mais livre, liberta.

Em relação às coisas, hoje, a alienação aparece assim:

 

1)  Humanização das coisas na proporção da coisificação dos homens;

2)  Valorização das coisas na proporção da desvalorização dos homens;

3)  Integração das coisas – a internet! – na proporção da fragmentação dos homens;

4)  Ganho de características das coisas na proporção da unilateralização dos homens;

5)  Poetização, estetização, das coisas na proporção da brutalização dos homens;

6)  Ganho de cognição das coisas na proporção da perda cognitiva dos homens.

 

Isso tem consequências no perfil das mercadorias, além de tanto outros aspectos, como a crise sistêmica.

 

A ESFERA COISAL

Lukács afirmou que nem a psicologia nem o lado coisal seriam esferas ontológicas próprias. Em acordo com ele, penso que a o mundo das coisas é, ao menos, um colateral, uma falsa modalidade de ser – um é que, ao mesmo tempo, não é. Quando Marx diz em sua grande obra que uma relação entre homens mostra-se como uma relação entre coisas, não trata de apenas um engano; na verdade, as coisas impõe uma lógica de si, uma relação entre elas mesmas tendo o homem como o suporte.

O máximo desenvolvimento do ser inorgânico levou ao ser orgânico, ao biológico; o máximo desenvolvimento deste último levou ao ser social, o homem humano; o auge do desenvolvimento deste, o capitalismo, levou ao ser coisal. O anterior é sempre base e suporte do próximo, como na relação homem-coisa em nosso atual modo de vida.

A esfera coisal, seu poder, inclui coisificar o homem. Como diz Marx, há humanização das coisas e, em relação direta, coisificação dos homens; a máquina é o sujeito enquanto o homem é um objeto, uma ferramenta de carne daquela. Assim como o homem, em seu desenvolvimento, humaniza a natureza, que veio antes e de onde veio, a coisa, em seu desenvolvimento, coisifica o homem, que veio antes e de onde veio.

O ser coisal consolida-se com a imitação de movimentos humanos na produção, substituindo braços e cérebros. Mas não para aí: a robótica visa imitar a sensibilidade do homem, até mesmo superá-la. Em nosso tempo, temos vírus de computador que se multiplica, como um ser vivo, e recentemente criamos robôs com a pulsão, a programação, de multiplicar-se a si próprios. A concorrência capitalista, que é uma lei cega imposta pelas coisas tal como estão, leva a que surjam várias tentativas de produzir a melhor inteligência artificial – poderá surgir uma inteligência similar à humana, mas sem emoção?

A integração das coisas tem vindo acompanhada do isolamento dos homens. Tal integração é condição da integração humana no socialismo, mas não condição absoluta – é, hoje, uma aposta social.

O dinheiro é a coisa central, a Coisa das coisas; o valor é a alma objetiva delas, um verbo que se quer fazer carne. Segundo Carcanholo, o valor era apenas um adjetivo da coisa, do objeto, do produto como mercadoria; para ele, tornou-se, como capital, um adjetivo substantivado[23]. Complementamos: tornou-se, depois, substantivo concreto, com a maquinaria e suas consequências humana e coisais, para tender a ir ao substantivo abstrato e, por outro lado, ao mesmo tempo, verbo que se faz carne (isto se relaciona com as quatro eras do capital: a era do capital mercantil, a era do capital industrial, a era do capital financeiro e a era do capital fictício). Com o devido jogo de palavras, o valor é um sujeito oculto, que exige teoria por detrás do preço, e um sujeito indeterminado, sem determinações. Como o espaço-matéria e energia-massa; o valor é um sujeito simples que se torna sujeito composto, valor e capital, valor-capital, que podem, como vimos, entrar em contradição.

A esfera coisal tem sua grande história já no início do ser social, como ferramenta e produto. Marx diz que temos a coisa, o objeto, mas, por outro lado, a coisa nos tem – isto é ontológico. Relacionamo-nos pessoalmente com as coisas, nós as afetamos assim como elas nos afetam. Hoje, elas ganham poesia, estética, enquanto nosso mundo perde arte. O mundo das coisas, embora misturado conosco, opõe-se ao mundo dos homens. O valor, o capital, o coisal faz de nós um meio, encarnações e representantes deles.

Os objetos não são neutros. O dinheiro é típico do capital e do capitalismo, incompatível com o socialismo. O mero microfone, usado por líderes autoritários, é condição para a vida socialista com suas assembleias de bairros e fábricas. Ademais, temos a concepção correta da lei geral da história humana “produtividade crescente”, mas ela é apenas quantitativa. Temos ainda a produtividade qualitativa. Quando o socialismo cumprir, em poucos anos ou décadas, todas as necessidades humanas em quantidade, com a ajuda de mudanças qualitativas, terá ainda mais condições de garantir maior qualidade aos objetos.

A alienação, em resumo, apresenta-se assim:

O sujeito é o objeto

O objeto é o sujeito

De tal modo: o sujeito é o sujeito por seus predicados – o objeto é o objeto por seus predicados.

A verdadeira unidade-identidade de sujeito e objeto, sem alienação, estará posta como tarefa socialista.

 

 

Bibliografia

Aristóteles. (2002). Metafísica. São Paulo: Loyola.

Bohm. (2015). Causalidade e acaso na física moderna. Rio de Janeiro: Contraponto.

Darwin, C. (1974). A origem do homem a seleção sexual. São Paulo: Hemus.

Feynman. (2012). Sobre as leis da física. Rio de Janeiro: Contraponto.

Hegel. (1992, 2002). Fenomenologia do espírito. Petrópolis: Vozes.

Hegel, G. W. (2016). Ciência da Lógica 1. A doutrina do Ser. Petrópolis: Vozes.

Levins, R., & Lewontin, R. (2015). El biólogo dialéctico. Buenos Aires: RyR.

Marx, K. (2008). O capital 3. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.

Marx, K. (2013). O capital I. São Paulo: Boitempo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



[1] O ideal é ir do mais abstrato ao mais concreto, do mais imaterial ao mais material – como campo antes de matéria, este antes de massa etc.

[2] Este é um esforço de condensação e seleção da teoria, na relação homem-homem. A alienação em Marx se expressa em: “1) alienação dos seres humanos em relação à natureza; 2) à sua própria atividade produtiva; 3) à sua espécie, como espécie humana; e 4) de uns em relação aos outros.” (Mészáros, A teoria da alienação em Marx, 2006, p. 14)

[3] Nosso ancestral evolutivo já vivia abaixo das árvores, no solo, porque sua morfologia fazia-o habilidoso para andar e correr; por isso, adaptou-se ao ambiente de savana.

[4] No mais, vale observar, o paleontólogo Nacho Martínez Mendizábal teorizou que o gênero homo, diferente de nossos primos primatas, perdeu o tamanho dos caninos, pois, ele diz, tais dentes elevados serviam para disputas internas, contra membros da própria espécie, e, entre nossos antepassados, a cooperação superou tal tipo de conflito, moldando a morfologia dentária.

[5] A grande dádiva do marxismo não é apenas, nem no seu começo, afirmar que o homem é diferente e especial como dizem a religião e boa parte da filosofia. Ao contrário, descobre, pouco antes de Darwin dar a forma teórica ímpar, que o homem é um ser natural, biológico, antes de ser de fato social. Isso é parte do significado de que o homem precisa comer e de abrigo antes de poder fazer filosofia. Sobre isso trata Mészáros no capítulo sobre moral em seu “Teoria da alienação em Marx”.

[6] Quem vem antes, a essência ou a existência? O processo de formação da existência é, também, o processo de formação da essência (Sartre pensa que a existência precede a essência porque ele vê o indivíduo, não a humanidade – por outro lado, na formação do indivíduo humano, sua maturação existencial avança para consolidação da essência humana em geral; uma criança têm uma fase egoística, pois ainda é um homem em formação). Além da formação de nossa espécie, o longuíssimo período de comunismo primitivo, igualdade e comunidade da escassez, operou uma seleção social com seleção natural, facilitando a reprodução e perfil daqueles que têm a essência humana em geral.

[7] O trabalho sobre a noção, até aqui mistificada, de essência humana pode receber a crítica de que usamos o método dedutivo para percebê-la. Marx também usa tal metodologia para expor um novo objeto, o valor, no Capítulo I d’O Capital.

[8] Os psicólogos evolutivos (Robert Trivers) chamam altruísmo recíproco, reciprocidade. A expressão mutualismo, tomado emprestado da biologia, a associação de populações diferentes de modo vantajoso a ambos, é limitado, mas o mais próximo que consideramos para corresponder ao objeto.

[9] Vale a pena comentar em nota a questão, famosa hoje, do gene egoísta. O egoísmo do gene é base de nosso egoísmo natural, pois os genes focam em reproduzir a si mesmos? Ora, isso fica muito mais claro e correto se incluímos a categoria suprassumir; esta expressão, o suprassumir, é, ao mesmo tempo, concentrados dentro de si, misturados, os significados diferentes e opostos destruir, superar, guardar (conservar) e elevar. O lado egoísta do gene não é totalmente negado na realidade, nem totalmente afirmado nela, pois é suprassumido, como no fato de as espécies, como nível acima, que apareceu antes – do “ponto de vista do gene egoísta” – como mero nada ou instrumento, procurarem a perpetuação das próprias espécies; permanece, então, a possibilidade do altruísmo, da solidariedade, da comunidade, da comunhão, do mutualismo. No lado humano, acrescenta-se que o homem é a afirmação da natureza e, mas, ao mesmo tempo, sua transcendência.

[10] A concepção aqui exposta pode dar base a outras observações e pesquisas. Exemplo: abstraindo o uso como ração, incomum hoje no ocidente; nós adestramos os lobos para que servissem de companhia (integração), fossem capazes de guarda (relações mutualistas) e auxiliares na caça (ser ativo).  Desenvolvemos raças de cães para satisfazer diferentes necessidades. A demonstração dos tipos caninos é um tanto unilateral, pois os três elementos, abstraídos, estão como se misturados dentro da realidade; porém serve de primeira aproximação clara ao tema.

[11] Freud está em relação a uma nova teoria da psique como Ricardo em relação a Marx. Considerar o aspecto natural do homem é uma das forças da psicanálise, embora seja uma ciência social, mesmo que seja negada esta localização pelo seu fundador, que a considerava parte dos estudos biológicos (possivelmente para dar ares mais científicos ao seu legado contra os ataques que sofria). Dito de outra forma, dar-se, com a psicanalística, primeira base materialista para a psicologia, embora deva ser superada.

O Behaviorismo, por sua vez, também avança certos aspectos, mas de maneira unilateral. É tão ciência quanto o freudismo. Nega-se os avanços de Skinner porque se tem, entre os seus críticos, uma concepção burguesa de homem, como se livre e autônomo, longe de quase determinismos do ambiente, o que é falso. No mais, tal concepção percebeu que a repressão sobre os jovens não é um método válido como em animais, pois gera reações, manobras, problemas, etc. Mais um pouco e seria percebido que isso se deve a uma essência humana.

[12] Para curiosidade, basta observar que nossa mente torna-se mais ativa – consciência estimulada – quando percorremos um caminho novo, mas, quando refazemos o mesmo caminho ou voltamos, a mente sente até o tempo passar com mais velocidade, como se a jornada fosse encurtada, pois está acostumada ao ambiente, repetição.

[13] Uma hipótese lateral: nas tentativas de provar a teoria de Einstein por eclipse solar ocorreu céu nublado atrapalhando. Talvez, não foi por acaso: o alinhamento gravitacional da Lua e do Sol pode ter afetado partículas da atmosfera, atraindo-as, concentrando-as, fazendo o céu nublado em alguns pontos. Mas, mesmo se correto, isso faz parte das mil e uma leis possíveis no universo, que não falam diretamente dos fundamentos das tantas legalidades.

[14] Uma pista para pesquisa da história da ciência é ver tais fatores, dinamismo e stress, como estímulos. Einstein produziu seus milagres quando numa posição não favorável; Platão e Aristóteles surgem na decadência grega; Darwin e Wallace viajaram pelo mundo, tendo este último “sacado” a teoria da evolução enquanto evolução enquanto estava com uma doença tropical; Newton fez seu grande trabalho isolado por uma pandemia; Marx viveu uma vida militante (dinâmica) e precária, como Lenin e Trotsky.

[15] Vale repetir. A expansão do espaço leva à expansão da onda de luz, que desvia para o vermelho. O espaço não é barreira para luz, é "transparente", porque a luz é o próprio espaço em movimento, de modo concentrado. O oposto da luz não é a sombra e a escuridão, mas a transparência; porém, logo vemos que são o mesmo, um identidade interna.

[16] Para Gleiser, apenas a matéria escura é “bolhas de espaço” enquanto considero tudo, matéria e luz, como formas de espaço, espaço condensado.

[17] Veja-se que, para nossa cosmologia sustentar-se, reiniciando o universo, mesmo se os maiores buracos negros “suam” espaço, a taxa relativa é pequena relativamente, o que faz com que a atração seja, no futuro, maior, superante, consumindo espaço e matéria para dentro de tais titãs, o que reunirá tudo de novo em um pequeno ponto, na singularidade, ou próximo disso, podendo, por exemplo, por tal salto, a partir de certo nível de concentração, ricochetear, ao desabar para dentro de si, criar um impulso para fora, na direção oposto, para expansão, semelhante a um buraco branco.

[18] As hipóteses que apresentamos aqui são suficientes, têm uma visão de mundo, de cosmos. Podemos agregar, ademais, uma especulação extra. O espaço (energia escura) e água são muito parecidos. A água aumenta o volume quando esfriada, congelada, por a estrutura molecular fazer espaços vazios entre os átomos. Pois bem; por esfriar, por reduzir energia, esta mesma transforma-se, o espaço decai em energia escura, ou melhor, a energia escura, que é o espaço, expande-se com o esfriamento do universo, torna-se menos condensado nesse sentido. Isso pode ser apenas uma das causas da expansão cósmica.

[19] Em sua dialética ontológica “inferior” à nossa, Hegel já demonstrava que o contínuo dava-se pela reunião de discretos, ou seja, mesmo sendo discreto uma direção ou sentido, por ser linha, o espaço, ao reunir linhas de espaço, torna-se contínuo em todas as direções.

[20] Como se não bastassem os riscos de desmoralização pela concretude das propostas neste capítulo, apresento nesta nota uma outra. Os fótons não são partículas, mas modo de manifestação de campos de luz… Diria Sagan: valorizemos as especulações, mas não as confundamos com fatos científicos. Num dos lares nos quais habitei nos últimos anos, havia uma janela de vidro (ou plástico) que recebia muita luz solar e que era, também, coberta por uma camada de película (penso, bases do fenômeno a seguir). À noite, quando eu apagava todas as luzes internas, da casa, e olhava pelo vidro, via a luz das lâmpadas das demais casas. O que acontecia? Não “via” a luz, mas um campo, de derivação eletromagnética, por evidente, que tinha formas de linhas redondas, formando formas como cilindros de linhas etc. Pois bem; percebi que a luz intensa na parede de um quintal, e de outros, não era luz, mas a fenomenologia de um campo até ali, antes, invisível que batia naquela parede… Assim, por generalização, a luz mais longe é mais fraca porque sua linha de campo é mais larga e, por isso, fraca com o passar da distância. A luz do Sol é seu campo, já está aqui, caso a linha não se expanda; vem até nós, caso a linha se expanda (por isso a luz não passa no tempo? Eis uma hipótese). O fóton é espaço condensado na forma de linhas de campo, linhas de espaço (ainda que concentrado). A luz, na verdade, torna-se uma sombra clara, cristalina, e visível de uma entidade invisível, ligado ao espaço e ao eletromagnetismo, mas de modo ainda mais profundo que o já considerado pela ciência; pois ele não é em si, torna-se mera manifestação de algo, isto sim, real, mais real, essencial. O fóton é e não é uma partícula, embora não seja. A aura ao redor da lâmpada é a forma de aparecer, aos nossos limitados olhos, um campo, com suas linhas, que ali está, ali está mais concentrado.

[21] Hegel disse que a língua alemã facilitou perceber a dialética. Martin Heidegger exagera essa conclusão ao dizer, de modo nazista, que apenas é possível filosofar em Alemão. Resposta melhor: além de facilitar conhecer e adquirir culturas, saber várias línguas facilita pensar, embora não seja algo absoluto. Isso a neurociência já quase sabe.

[22] O socialismo é a imanente transcendência imanente deste mundo em outro. Duplicação do mundo no tempo e na previsão teórica.

[23] Como o adjetivo “plástico” realizou, no grande desenvolvimento das coisas, sua substantivação por meio do material chamado “plástico”, com variadas possibilidades de uso, derivado do petróleo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário