COMO
ELABORAR POLÍTICA MARXISTA
Minimanual
do revolucionário
Crítica à direção do PSTU
J. P.
Ao leitor, tentei escrever um texto mais
claro direto e, em principal, mais curto possível. Diagramação original dava
algo como apenas 30 páginas, mas, para a leitura tornar-se agradável, tivermos
que muda-la (além disso, o último artigo é não obrigatório e longo). Foi
necessário ceder ao conteúdo, aumentando a extensão do material. Aproveite-o:
se eu tivesse uma introdução tal como esta no início da minha ação política,
tudo seria melhor e mais rápido.
Veja-se que os intelectuais marxistas e de
esquerda quase nada sabem das palavras neste livro; se pedirmos que falem sobre
teoria, descrevem por horas seus conhecimentos, como se máquinas; mas se
pedirmos uma política para a atual situação nacional, paralisam, gaguejam,
justificam-se etc. Tal fenômeno é antigo no nosso movimento. E leva-nos à
seguinte observação: os melhores marxistas teóricos, são, via de regra, os
melhores elaboradores de política. Deixar de saber elaborar impede, na maioria
dos casos, uma boa elaboração teórica. O mundo é concreto.
Em meus escritos, costumo passar longe de
polêmicas diretas; mas, diz Moreno, a história de nossa corrente é a história
de nossos erros. Portanto, neste caso, precisamos encarar as coisas mais de
frente, sem rodeios. No avançar do texto, destaco o mar de erros – sem exagero
– de meu antigo partido o PSTU, que foi o maior partido comunista do mundo. Ao
sair da organização, tive de me reeducar ainda mais para perceber os equívocos,
a causa das crises partidárias, as paralizações políticas, as perseguições etc.
Isso demorou, mas valeu a pena.
Algumas palavras de introdução são
necessárias. Faça, treine, tente. Erre, mas tentando ao máximo acertar. Faça
balanço claro dos acertos erros. Saiba porquê errou, porquê acertou. Não tenha
medo de reconhecer que falhou, que cometeu um erro, que desleixou. Estamos
todos aprendendo, tentando acertar. Aceite críticas, ainda que discorde
totalmente delas. Um gênio solitário e correto nada pode sem um grupo coletivo
– as vitórias são coletivas e democráticas.
Nunca imponha pelo grito, pela manobra, pela teimosia, pelo cargo etc.
suas ideias e políticas porque elas soam muito melhores que as demais. Conviva
com pessoas de perfis diferentes dos seus na elaboração política. Ouça as
pessoas comuns próximas de si, do seu cotidiano, o que elas pensam e deixam de
pensar sem tentar ganhá-las para suas posições. Quando começar a acertar muito,
não baixe guarda. Se você está convencido de uma proposta, não recue – seja
teimoso. É preciso ser insistente para se tornar maioria.
GLOSSÁRIO
Análise de conjuntura
Totalidade
Uma visão dialética
A questão internacional
Uma proposta
Caracterização
Mais um exemplo
Erros comuns
Ser maleável ao máximo
Simplicidade e erro
A arte de prever
O caso das reformas
Situação, etapa, época
Programa de transição
Estado, regime, governo
Noções básicas de economia para elaborar
política
Crise de superprodução de capital – e
mercadorias
Capital produtor de juros
Política e classes
Política e questão militar
Política de guerra
Independência nacional
Política, alienação e moral
Política e organização partidária
Regra de ouro
Em caso de governo forte
Em caso de ditadura
Como impedir e combater o fascismo
Quando chamar o “fora governo” ou “fora
ministros burgueses”
Quando chamar pela tomada de poder
Saber ouvir
Eleições e política
Atividades artificiais
Política organizacional
Centrismo
Deixar amadurecer
Lutar juntos, marchar separados
Ousadia!
Dialética – primeiros passos
Como será o socialismo?
ANÁLISE DE CONJUNTURA
Como os marxistas elaboraram suas
políticas? Para isso, faz-se necessário ter uma avaliação tão profunda quanto
possível da realidade, ainda que imperfeita. Uma intepretação errada dos fatos
leva a uma ação também errada ou ao improviso. Traduzir o real da conjuntura
exige algum conhecimento amplo dos diferentes fatores das ciências humanas,
portanto demanda algum esforço. Nosso papel, aqui, é facilitar tal
aprendizagem.
ANÁLISE
Analisar começa por colher o máximo de
dados da realidade que queremos compreender (um país, uma fábrica, etc.). Toda
fonte é válida: estatísticas, vídeos, relatos, etc. Com o tempo, vamos
aprendendo aonde encontrar as informações necessárias (IBGE, Banco Central,
FGV, etc.).
Para o sucesso da análise, o analista deve
evitar ao máximo trabalhar a partir de hipóteses, de teses, de pré-avaliações.
Os fatos imediatos causam fortes impressões sobre nós, muitas vezes levando-nos
a erros de interpretação (porque ainda vemos a parte, não o todo). Por isso
devemos evitar a “análise-justificativa”, da qual fala o argentino Moreno,
quando apenas justificamos artificialmente uma posição elaborada sem critério,
feita por “instinto”.
Na análise, consideramos a TOTALIDADE do
social. Vejamos um por um, elemento por elemento:
1. Infraestrutura,
economia, forças produtivas
O econômico é o fundamento da realidade –
embora, lembramos, seja insuficiente. No país, devemos ver a situação da
indústria, do comércio, dos serviços, como estão as importações e exportações,
a situação do câmbio e a inflação também devem ser listadas etc.
Nos próprios debates entre militantes, nos
jornais, na sociedade, aparecem as questões centrais a serem observados naquela
dada conjuntura. Por exemplo: se a inflação dos produtos centrais cresce muito
na própria realidade, isso “naturalmente” empurra a avaliar as causas dos
aumentos do preço e suas futuras tendências.
Na fábrica, avaliamos como estão os
estoques, se o ritmo de trabalho aumentou, como anda a lucratividade da
empresa, etc. Há algumas perguntas que
surgem, por exemplo, ao se pensar em propor uma greve.
2. Estrutura,
classes sociais, relações de produção
Precisamos avaliar qual a relação de
forças de cada classe social, entre as classes sociais. Em resumo, temos três
classes principais na sociedade: operários, patrões, classe média. De modo
geral, a classe que se demonstrar mais forte, a patronal ou o operariado, tende
a atrair o apoio da classe que está no meio, dos setores médios.
Dentro da mesma classe, comumente é
preciso ver a situação das divisões internas. Por exemplo: temos a burguesia
comercial, financeira, industrial e dos serviços; elas podem ter discordâncias
internas entre si sobre o que fazer diante dos problemas práticos da realidade.
Na fábrica, avaliamos a situação dos
patrões e do executivo da empresa. Também perguntamos se os gerentes de patente
mais baixa estão do lado dos trabalhadores ou dos chefes, por exemplo, diante
da ameaça de fechar a empresa. Entre os operários, como está aquele setor que
não participou ativamente da última greve? E os demais turnos? Quão numerosos
têm sido os protestos, a paralização e os piquetes?
Observação: a união das forças produtivas
com as relações de produção formam uma BASE socioeconômica da qual se ergue uma
SUPERESTRUTURA, que trataremos a seguir.
3. Subjetividade,
mentalidade, superestrutura subjetiva
Embora a base econômica seja central para
compreender a realidade, quem faz a história são os homens, que ainda são
organizados em classes. A superestrutura subjetiva é tudo relativo à mente
humana: moral, vontade, fé, cresças, pensamentos, valores, filosofias, etc.
Para uma análise completa da situação, as mentalidades devem ser levadas em
conta.
Aqui, vemos que as acusações de
“determinismo econômico” do marxismo é um erro completo. Faz diferença, por
exemplo, se a classe trabalhadora de certo país tem tradição de valores
pacifistas ou de luta. Na fábrica, devemos saber como os trabalhadores
avaliaram a última greve, que nível de confiança têm no sindicato, se estão com
raiva ou apenas tristes com as demissões, etc. No país, avaliamos o quanto o
governo é apoiado, se está vivo na memória dos trabalhadores grandes conquistas
ou grandes derrotas, etc.
Em resumo, o objetivo da política
comunista é ganhar a consciência da maioria dos trabalhadores – disputar essa
consciência. Há sempre uma guerra de política na sociedade, por isso devemos
tentar convencer que nossas propostas são as melhores para nossa classe social,
o operariado, e para os setores médios.
4. Instituições,
organizações, superestrutura objetiva
Na análise, devemos observar as
organizações. A organização central a ser avaliada é o Estado, ou seja, a
situação do governo, do regime, a relação entre os poderes, as leis, etc. Aqui, também analisamos a
geopolítica, a luta entre Estados e governos.
Em uma consideração rápida, a
subjetividade (superestrutura subjetiva) gera várias instituições, como
partidos, igrejas, clubes, etc. Mas, uma vez criadas, tais tipos de
organizações influenciam, ao inverso, também a mentalidade dos homens.
No país, devemos avaliar a situação dos
partidos, das instituições religiosas, do movimento sindical, das forças
armadas, dos sindicatos patronais, da
relação com governos de outros países, etc. Na fábrica, é preciso ver a
força do sindicato da categoria (incluso nas finanças), se há comitês de
fábrica, ver se o governo regional é forte para reprimir a greve, etc.
TOTALIDADE
A economia é o principal fator, o motor
central que opera para a mudança dos outros três elementos – mas ele é isso
apenas em última instância, em último
caso, no limite. É verdade que a economia influencia decisivamente as
instituições, porém também é verdadeiro que o Estado, por exemplo, influencia
muito a economia. As partes da
totalidade influenciam uns aos outros, e vice-versa. Os quatro fatores
estão como se misturados na realidade, então o pensamento separa-os na análise,
avalia-os e depois reintegra-os, reuni-os.
UMA VISÃO DIALÉTICA
Se olharmos com atenção, os países com a
economia mais desenvolvida são os mesmos países que têm os melhores cientistas,
os melhores esportistas, etc. O nível de desenvolvimento permite menos ou mais
recursos para funções não produtivas, para o desenvolvimento humano. Países
atrasados têm dificuldade de ter um Nobel de física ou de literatura em
comparação a países avançados. Esse é o raciocínio correto em si, muito usado
por marxistas, mas também insuficiente, incompleto.
A Alemanha dos séculos 18 e começo do 19
era uma nação atrasada em comparação a outras potências da Europa: tinha
elementos ainda feudais, o território ainda não unificado – o velho e o novo
misturavam-se naquele “país”. Mesmo assim, produziu Kant, Hegel e depois Marx,
três maiores gênios. Por quê? Tais grandes pensadores surgiram porque surgiram
em uma sociedade que precisava de grandes pensadores já que era muito
contraditória, combinando elemento avançados e atrasados. Algo semelhante
ocorre na Rússia nos final do século 19 e início do 20: produziu grandes
artistas universais e parte significativa dos melhores pensadores sociais
(Lenin, Trotsky, etc.). Por quê? Porque unia em si o mais atrasado, como o
governo de origem feudal e o atraso do campo, com o mais avançado, como a
moderna indústria e ideias novas vindas da Europa avançada, unindo cultura
entre o oriente e o ocidente.
Além do desenvolvimento do país, o grau de
contradição interna da base social e econômica conta na formação da
superestrutura, das ideias, das criações. A necessidade, aqui, faz a
criatividade; ali, a oportunidade faz a criatividade.
A QUESTÃO INTERNACIONAL
Destacamos um país e uma fábrica na
análise, mas analisar a conjuntura deve ser a partir da totalidade, ou seja, do
mundo. O mesmo procedimento deve ser feito, antes, para a situação mundial:
avaliamos como está a economia, a luta de classes, a subjetividade, as
instituições no mundo e nos continentes. Só a partir daí podemos ter clara a
localização e o papel de nosso país na economia global, na geopolítica, na luta
entre Estados, etc. Com a avaliação internacional feita, partimos para o
nacional.
UMA PROPOSTA
Pode acontecer de se fazer uma análise de
conjuntura com dados, porém com alguma pressa de encontrar respostas… Por isso
é importante dar um “duplo mergulho” na avaliação – ver, rever e aprofundar com
toda atenção. São muitas as organizações que fazem avaliação apressada da
situação concreta e, por isso, erram.
CARACTERIZAÇÃO
Primeiro, permita-me apresentar algo mais
direto e rápido, baseado na conjuntura em que estou escrevendo:
1.
Economia
Crise econômica que dura anos, com
crescimento fraco. O que mais se destaque:
1) com o desemprego e como estímulo do
governo ao consumo pelo crédito, o povo está endividado – logo devemos exigir
cancelamento total da dívida dos trabalhadores e pequenos empresários (isso tem
força socialista, pode forçar a estatização dos bancos e do sistema
financeiro).
2) o desemprego é crônico, há mais
desempregados reais (incluso “autônomos” e os que desistiram de procurar
trabalho) do que o número de assalariados com carteira assinada – logo devemos
exigir redução da jornada de trabalho para 30 horas semanais, com o mesmo
salário, para forçar o pleno emprego, para forçar novas contratações, para que o
desemprego seja baixo; assim, campanha será “Desemprego zero! Escala móvel de
jornada de trabalho!”
3) Exigir “redução e congelamento do preço
dos combustíveis” já que seu preço de monopólio está artificialmente alto.
4) exigir “fora governo” na forma melhor
de “eleições gerais já” apenas e somente apenas se o governo se desmoralizar,
perder apoio da maioria.
2.
Classes
Os trabalhadores fizeram muitas e longas
greves de 2012 até 2016, mas agora estamos na defensiva. A classe média adota
posições de direita. A burguesia está unificada. Logo:
1)
Para a luta dos trabalhadores, um frente única
dos partidos e movimentos de esquerda para lutar por pautas claras; por causa
da defensiva, precisamos nos unir parcialmente.
2)
A proposta de redução do preço dos combustíveis
e, em principal, pelo cancelamento de suas dívidas – atrairá a parte mais pobre
da classe média para o lado da esquerda, ao menos uma simpatia, unificando com
os trabalhadores.
3)
Parte da burguesia odeia o custo maior com o
preço dos combustíveis, logo a burguesia rachará se as massas trabalhadoras e
de classe média adotarem a proposta de redução, por exemplo, em 40% com
congelamento do preço.
O PSTU, partido que, por sua importância,
será a fonte de nossas críticas centrais, chamou o “fora governo” (Bolsonaro) quando este
tinha máximo apoio, assim que assumiu o cargo! Um erro de amador feito por
militantes com décadas de experiência. Mas por quê? Porque a intensão era se
destacar de modo artificial e ganhar para si ativistas ultraesquerdistas por
inexperiência. Ao mesmo tempo, mesmo estando diante de uma severa crise, não
chamou pelo pelo emprego, desemprego zero, porque seus militantes são
funcionários públicos e líderes sindicais; o sindicalismo exagerado leva a
considerar apenas os trabalhadores ativos. O chamado precipitado pelo “fora
governo” tem como uma das fontes o fato de o partido ser formado por servidores
públicos, cuja preocupação é mais quem dirige o estado, ou seja, quem é seu
patrão do que as questões econômicas.
3.
Superestrutura
Os trabalhadores estão angustiados, mas
sem esperança. Devemos 1) mostrar força com frentes de esquerda; 2) sermos
teimosos e insistente, em nossas propostas até que elas se tornem populares,
após certa rejeição. Como a situação não melhorará tanto, o povo pode se
radicalizar e se aproximar de nós.
A maior parte das organizações são
pelegas, oportunistas e são maioria. Nós devemos fazer uma campanha nacional
pelo pleno emprego. Quando ela ganhar força, dobramos aposta: fazemos um
encontro nacional pelo pleno emprego, exigindo uma frente única por tal pauta
com proposta claras. Como o Brasil é continental, tal encontro deve ser em todo
o país ao mesmo tempo.
MAIS UM EXEMPLO
Caracterização é o resultado da análise.
Vejamos um caso de modo muito resumido.
A economia mundial passa por uma
superprodução de capital e mercadoria. A China estimulou sua economia
artificialmente com investimentos, obras, etc., o que aumentou a busca por
produtos brasileiros (minério de ferro, etc.) – mas a demanda alta acabou com a
redução da produção industrial chinesa. Isso pressiona o câmbio a aumentar dos
mais ou menos 2 reais para acima de 4, tornando mais caros os importados, o que
gera inflação aos trabalhadores e à classe média. O Brasil também investiu
artificialmente na economia para evitar a crise de 2008. O alto nível de
emprego gerou lutas sociais fortes e confiantes, com muitas vitórias – isso
tira o lucro dos patrões. O aumento dos juros e o problema de demanda gerou
novo desemprego alto, que por sua vez “quebrou” a onda grevista (que era
baseada no baixo desemprego). O apoio ao governo reeleito de Dilma derreteu
completamente, perdendo qualquer base social. A classe média aristocrática
coloca-se contra o governo pela direita, pedindo o impedimento da presidente
com grandes protestos de rua. Como o governo de “esquerda” foi incapaz de
aprovar ataques novos aos trabalhadores (já que tinha perdido base social, de
apoio), a burguesia se uniu para derrubar Dilma. A proposta de derrubar o
governo não tem apoio nas camadas mais pobres, embora esteja descontente com a
governança, desconfiada com os protestos da alta classe média. O PSDB, há muito
fora do poder, quase ganha as últimas eleições, por isso está inconformado com
o resultado. O PMDB quer derrubar a presidenta para seu vice assumir. A
esquerda divide-se entre ser contra ou a favor da derrubada. O ministério
público e parte do judiciário unem-se para impedir que Lula seja eleito de novo
nas próximas eleições, formando uma farsa judiciária.
Como o parágrafo ficou longo, mas inda
longe de esgotar aquela situação, vamos direto para a caracterização. Temos: 1)
crise econômica, 2) recuo forte das lutas trabalhistas – burguesia e classe
média na ofensiva; 3) ódio ao governo e certo desapontamento desconfiado nas
classes trabalhadoras; 4) PT em crise, PSDB tentando voltar ao poder a qualquer
custo, PMDB tentando tomar o poder, a esquerda dividida – o judiciário
pressionando pela queda do governo e fechando o espaço do PT para a eleição
seguinte com a prisão de Lula. Temos, então, uma situação reacionária (tema de
outro capítulo); 5) o imperialismo quer tomar o petróleo e o setor de
construção civil ocupados por empresas brasileiras.
Qual a política para essa situação? Na
economia, queremos derrotar o desemprego – exigimos redução da jornada de
trabalho com o mesmo salário; a classe está na defensiva e a esquerda dividida
– defendemos uma frente única da esquerda pelos direitos que estão sendo
atracados; para ganhar a consciência dos trabalhadores, preparamos panfletagens
e demais materiais para esclarecer o que ocorre e propor nossas medidas
(pressionando também as demais organizações de esquerda a fazer unidade). A
esquerda divide-se entre ser contra o golpe, porque é uma armação da burguesia
para mais facilmente atacar os trabalhadores, ou ser pelo “Fora Dilma”, porque
fez medidas ruins, contra a classe trabalhadora. Entre essas duas posições, há
a posição comunista: o governo merece cair, mas não por um golpe – logo
exigimos “Eleições gerais antecipadas já!”.
ERROS COMUNS
Os erros normalmente ocorrem por deixar de
avaliar a partir da totalidade ou considerar demais apenas um aspecto. Vejamos
exemplos. É importante ver a luta geopolítica entre Estados, mas é um erro
enorme tratar como luta central e “esquecer” a luta de classes. Na guerra atual
entre o imperialismo americano e o candidato a novo imperialismo da China,
devemos tomar o lado dos trabalhadores contra os governos dos EUA e chinês.
Outro erro comum é defender a proposta
mais radical possível para atrair os ativistas para sua organização. No lugar
de propor algo correto segundo a conjuntura, nem mais nem menos profunda,
segundo uma análise rigorosa, pensa-se em qual proposta dá “melhor localização”
ao partido, corrente, etc. É uma tática oportunista. Se a proposta for errada,
leva depois à desmoralização dos militantes.
O oposto ao parágrafo anterior é a
supervalorização do fator subjetivo. Devemos elaborar propostas políticas para
problemas objetivos, materiais; se a situação é de estabilidade, propomos algo
correspondente – se é de instabilidade, pensamos propostas mais radicais. No
entanto, muitos evitam propostas mais profundas porque “a consciência da classe
ainda é atrasada”, “os trabalhadores não vão aceitar”. Nossa meta é ganhar os
operários e setores populares para nossas propostas por meio de uma disputa
social. Devemos considerar o nível de consciência das massas assalariadas
quando pensarmos as propostas centrais, a estética, a linguagem – mas são as
condições reais não subjetivas que determinam o caminho de nossas exigências
políticas (embora o fator subjetivo importe muito).
SER MALEÁVEL AO MÁXIMO
Na guerra, toda tática é válida: qualquer
forma de chegar ao objetivo é usada sem preconceitos contanto que funcione bem para aquela situação. Assim deve ser
também a tática política. Aqui, os comunistas participam das eleições para
tentar aumentar a simpatia social; ali, defendemos voto nulo e nossos
parlamentares renunciam ao cargo; em outra situação, defendemos o voto em outro
partido para aproveitar a popularidade dele.
Para vermos o quanto central é a
plasticidade, variedade, da tática, vejamos Lenin na obra “Esquerdismo – Doença
Infantil do Comunismo”. Os comunistas ingleses eram contra qualquer apoio ao
partido trabalhista (PT); Lenin diz que o melhor é fazer campanha e ajudar
aquele partido traidor a se eleger tão rápido quanto possível – pois um governo
do PT aceleraria a experiência da massa de trabalhadores com a organização
inimiga. Veja: faz toda diferença se numa situação revolucionária os
trabalhadores já têm alguma experiência com o partido traidor no poder ou ainda
têm largas esperanças em seu futuro governo. Isso é um pensamento realmente
sofisticado, esperto no bom sentido.
Vejamos como isso deve ser sério. Na
revolução russa de 1917, o partido comunista Bolchevique já poderia tomar o
poder em junho daquele ano, mas não o fez, adiou ao máximo tal medida… Por quê?
Porque era necessário acumular forças para que a ação fosse a mais perfeita
possível, a mais madura, com mais chances de vitória, como com a necessária
radicalização dos camponeses que aconteceu meses depois. Por outro lado, se
esperasse muito mais, a situação degeneraria e a oportunidade seria perdida, um
fracasso. Quando os desempregados, por estarem em uma situação mais frágil,
ficaram impacientes e começaram a se afastar do partido, a direção partidária
percebeu que era impossível, a partir dali, esperar uma condição ainda melhor –
então começou a ação imediata de implementar o poder operário, a segunda
revolução, em outubro, nem antes nem depois. Se um general bom de manobras
tivesse provocado os revolucionários em junho e estes tivessem caído na
provocação tentando, em resposta, tomar o poder antes das melhores condições, a
revolução estaria perdida (foi o que aconteceu na revolução dos cravos em
Portugal).
É preciso que os comunistas sejam ousados
na política. Quais ações práticas e propostas mais ousadas podemos de fato
apoiar? Em certas situações, a altíssima ousadia é o que existe de mais
sensato. Temos de ter, ao mesmo tempo, cuidado máximo e ousadia tão alta quanto
possível.
SIMPLICIDADE E ERRO
Nahuel Moreno descreve a simplicidade de
propor política: se há inflação, logo exigimos aumento salarial; se o governo
perdeu o apoio, exigir a queda do governo, etc. Porém é comum seitas políticas
errarem nesse aspecto. Ou exigem as propostas mais radicais independente da
conjuntura real (em outro capítulo, falamos do programa de transição) ou
cometem erros simples. Vejamos o caso da conjuntura atual do autor. Desde o
primeiro dia do novo governo, de Bolsonaro, parte da esquerda chamou apressada
o “Fora Bolsonaro”; isso é uma irresponsabilidade, pois não se chama a queda do
governo, por pior que ele seja, enquanto ele tem grande apoio popular; os
ativistas um tanto desesperados e sem educação militante e científica podem
cometer tal erro, não os comunistas. O fato de ser um governo horrível de modo
algum justifica o equívoco. A tarefa é desgastar o governo, ainda não
derrubá-lo, até termos condições de pô-lo fora do poder.
Moreno fala o seguinte: se há várias
greves por aumento salariais, unificamos as greves numa greve geral – o
sistema, então, cai. Isso é um erro. Na década de 1930, os franceses fizeram
uma greve geral pelo simples aumento salarial diante da hiperinflação – o
governo e os patrões cederam a vitória simples… para depois a inflação comer de
novo os salários… Trotsky aprendeu com o erro: em caso de inflação
descontrolada, devemos exigir mais, “escala móvel de tempo de trabalho!”, ou
seja, aumentar o salário sempre que a inflação aumentar, mês a mês, gatilho
salarial. Como a burguesia não aceitará isso, pois lhe tirará o lucro, o
sistema, agora sim, pode cair.
A ARTE DE PREVER
Trotsky afirmou que a política é a arte de
prever. Moreno afirmou que elaborar palavras de ordem, políticas, é uma
verdadeira arte. Na análise, devemos caracterizar quais as possibilidades
limitadas de futuro que a realidade impõe de acordo com as decisões humanas e
as circunstâncias. Incluímos aí a tendência de mudança que desejamos fazer
acontecer como resultado de nossa militância política. Podemos, por exemplo,
prever que um governo cairá, havendo duas formas de cair, por golpe ou, ao
contrário, por revolução.
O CASO DAS REFORMAS
Em nossa época, o tempo das reformas
acabou. Mas pode acontece de um governo frágil ou pressionado pelas grandes
mobilizações, ou ainda diante de um crescimento econômico extra, fazer algumas
reformas para ter apoio popular. Marx ensina que, diante de boas reformas,
devemos fazer uma “revolução permanente”: sempre exigir mais, mais reformas,
melhoria das medidas. Se vem uma reforma, exigirmos uma reforma e meia,
aprofundamento.
O PSTU cometeu erros grosseiros nesse
sentido. O governo do PT fez uma reforma, médicos cubanos para o povo, que
prejudicava a classe média aristocrática dos médicos. Numa posição sindicalista
e sectária, o partido colocou-se contra o programa. Assim fez com o RUNI, Minha
casa Minha vida etc. Não viram a reforma, isolando-se mais do povo. Várias
vezes, o partido quase apenas traduziu posições da classe média para a
linguagem marxista e de esquerda, pois seus membros também são de classe média.
SITUAÇÃO, ETAPA, ÉPOCA
Para fazer uma análise de conjuntura,
faz-se necessário saber os tipos mais gerais de circunstâncias, de como a
realidade está. Apresentaremos de modo resumido os tipos de condições
existentes. Aqui, entra o tema da longa duração na história, como interpretar a
sociedade. Teóricos como Lenin, Trotsky e Moreno dedicaram-se às classificações
a seguir.
SITUAÇÃO
A conjuntura política pode ter as
seguintes situações: revolucionária, não revolucionária, reacionária,
contrarrevolucionária e pré-revolucionária. Vejamos cada uma em comparação à
situação revolucionária.
Lenin chama a situação revolucionária como
a conjuntura quando os trabalhadores já não suportam viver como antes e os de
cima são incapazes de manter a ordem. Essa é uma forma resumida de expressar.
Para complementarmos, mostremos a tempestade perfeita:
1.
Crise econômica
É necessário que a economia esteja em
depressão ou em crescimento fraco após uma forte quebra. Isso motiva as demais
mudanças.
2.
Luta de classes
A classe operária vai à luta com
radicalidade e unidade. A parte mais pobre da classe média vai para a esquerda.
A burguesia divide-se.
3.
Instituições
Os partidos tradicionais, incluso de
esquerda não revolucionária, são desmoralizados perante a maioria do país. Pode
ocorrer de o partido revolucionário crescer. A gestão do Estado tem dificuldade
de fazer o instrumento agir em defesa da “ordem”. Surgem organizações de poder
socialista, conselhos operários e populares.
A situação pré-revolucionária ocorre
quando pelo menos um desses fatores ainda falta amadurecer ou o conjunto dos
elementos ainda está desenvolvendo-se, amadurecendo.
A situação reacionária ocorre, por
exemplo, quando há crise econômica ou crescimento fraco, mas baixíssima luta
dos trabalhadores. Por exemplo: até 2016, houve uma onda de lutas e greves no
Brasil, porém as manifestações e protestos recuaram imensamente por causa da
volta do desemprego durante a crise iniciada em 2015, logo a situação tornou-se
reacionária – a burguesia e o Estado brasileiros foram, unidos, para o ataque
contra os trabalhadores.
A situação não revolucionária é a de
estabilidade econômica relativa e baixas lutas sociais. Nesse período, pode até
haver algumas reformas positivas por parte do Estado. Aqui, a burguesia domina
com alguma tranquilidade.
A situação contrarrevolucionária ocorre
quando há crise e a burguesia destrói a luta operária e popular com métodos de
guerra civil. Aí surge uma ditadura, o regime político fecha-se.
ETAPA
Dentro da etapa ocorrem diferentes
situações. Os 24 anos de ditadura no Brasil foram uma etapa
contrarrevolucionária; dentro dela, ocorreram várias situações
(contrarrevolucionária, reacionária, não revolucionária e pré-revolucionária).
Os chamados anos dourados do capitalismo na Europa, do fim da segunda guerra em
1945 até a década de 1970, constituíram uma etapa não revolucionária, de
relativa estabilidade. Como vemos, a etapa é mais longa que a situação.
ÉPOCA
Há duas épocas: 1) a de reforma e reação;
2) a de revolução. Enquanto a economia se desenvolve mais ou menos bem – em
termos teóricos: em combinação não contraditória das forças produtivas com as
relações de produção –, estamos numa época próspera para o sistema (época de
reforma e reação). Mas quando ocorre de o desenvolvimento social e econômico
chegar ao ponto em que precisa revolucionar a sociedade inteira para continuar
a desenvolver-se, então, só então, chegamos à época de revoluções, de
substituição de um sistema por outro. Dentro das épocas ocorrem as etapas.
PROPOSTA DE ATUALIZAÇÃO
Dentro de uma situação, ocorrem momentos de recuo ou de avanço. Isso é
orientado pela luta de classes, se os trabalhadores estão na ofensiva ou na
defensiva, se o governo está com apoio ou sem, pela consciência geral e pela
situação da superestrutura. Em uma situação não revolucionária, por exemplo,
uma baixíssima taxa de desemprego pode levar os operários para a ofensiva, para
greves cada vez mais duras e longas, porque o medo de perder o emprego é menor
– o momento é de avanço. Mas a ofensiva das lutas aí é relativa, não muda a
situação, que é não revolucionária. Assim, temos quatro tipos de abstração:
época, etapa, situação, momento.
Por várias vezes, o PSTU afirmou que a
situação do Brasil era pré-revolucionária, quando era um exagero, um
impressionismo. Dizer, na prática, que “a nossa hora está chegando” ajudava a
manter o partido junto, disciplinado e acrítico com a direção partidária – mas
foi um erro permanente.
PROGRAMA DE TRANSIÇÃO
Momentos
radicais exigem propostas radicais; momentos de paz social, propostas mais
leves e reformistas. É um absurdo levantar palavras de ordem de poder ou
profundas quando fora de uma crise econômica e social maduras. As seitas
levantam propostas radicais sempre, faça chuva, faça Sol – por quê? Porque são
inexperientes, porque querem se sentir revolucionárias, porque querem se
diferenciar dos demais partidos, porque caem no oportunismo de tentar ganhar
ativistas radicalizados para si de maneira artificial e errada etc. Nas lutas e
nas eleições, apresentamos duas ou três propostas gerais que estão de acordo
com o momento do país, além de um programa de governo completo com planos de
médio e longo prazos, o que fazer e sua fonte de financiamento.
Em resumo,
nos momentos de crise, nosso programa é este:
1) Caso de alto desemprego. Plano de obras
públicas para gerar empregos; redução drástica da jornada de trabalho como de
44 para 30 horas semanais; escala móvel de tempo de trabalho, ou seja, a
jornada durar o tanto, como entre 30 e 44 horas, que faça com que todos tenham
emprego e atendamos a demanda por força de trabalho na sociedade.
2) Caso de alta inflação. O limitado
congelamento de alguns preços, útil em certas circunstâncias, deve dar lugar ao
gatilho salarial ou escala móvel de salário, isto é, aumentar o salário
automaticamente com o aumento dos preços.
3) Empresa em crise. Os trabalhadores
devem fazer uma “inspeção operária da empresa”, para saber como andam as
finanças e a produção na fábrica – e exigir o “fim do segredo comercial”, saber
das contas empresariais para análise rigorosa. Nessa luta, devem consolidar um
“comitê de fábrica” para cuidar dos interesses dos funcionários. Caso os donos
da fábrica queiram demitir ou fechar a empresa, os trabalhadores devem exigir o
“controle operário da produção”, a “gestão operária da produção” – e a
estatização da empresa sem indenizações.
4) Máfia dos Bancos. O capitalismo
endividou os trabalhadores para poder escoar as mercadorias; portanto, exigimos
a anulação total e irrestrita da dívida dos trabalhadores e pequenos
empresários. Se preciso, estatizaremos os bancos e o capital financeiro para
garantir a qualidade de vida da maioria – um banco único do Estado.
5) Economia. As empresas centrais do país,
aquelas que determinam os ciclos do capital, devem ser estatizadas, sem
indenização, sob gestão dos operários.
6) Deve-se formar uma rede única e estatal
de grande comércio de atacado e de varejo, incluso estoques sociais contra a
oferta baixa e a especulação. Nessa empresa, os grandes transportes também
estarão sob sua gestão. Tal medida não deve mexer no pequeno comércio, antes
irá oferecer produtos mais baratos para sua revenda.
7) Combate ao fascismo. Os trabalhadores
defendem-se com piquetes de greve, quando usam da força para impedir a produção
e a repressão; para enfrentar o fascismo e suas milícias, organizamos os
destacamentos de combate defensivos; à beira da revolução, surge a necessidade
de as armas deixarem de ser um privilégio de poucos, por isso o povo armado
deve formar milícias operárias.
8) Poder operário e popular. Apenas em
situações de grave crise, próximo de ou durante uma situação revolucionária,
surgem organismos de poder paralelos, as assembleias ou os conselhos que
aparecem nos locais de trabalho e nos bairros populares. Em alguns casos, o
partido marxista chama pela criação de tais organismos ou os amplia por todo o
país. Todo poder aos conselhos! Todo poder aos comitês de fábrica!
Exigências
como maiores impostos sobre lucros e heranças com redução dos impostos sobre os
trabalhadores e a classe média são importantes, devem ser defendidas; porém não
resolvem o problema global.
As propostas
acima são nomeadas “transicionais”, ou seja, soam como reformas viáveis, ainda
que difíceis, mas empurram para o revolucionamento total do modo de vida já que
enfrentam as leis do atual sistema. Por exemplo: o capitalismo precisa de
desemprego para reduzir os salários e a luta social, em especial em momentos de
crise, logo, impor o pleno emprego permanente com a escala móvel de tempo de
trabalho é inaceitável para a burguesia, necessária e urgente aos
trabalhadores.
Duas
considerações ainda precisam ser feitas.
Os partidos
centristas, por serem formados por militantes de classe média servidora
pública, defendem, sem perceber, o fortalecimento do Estado burguês como com o
fim do pagamento da dívida estatal, ruptura com o Euro/EU, “fora governo” de
plantão, estatização indiscriminada etc. São propostas em si corretas, mas
apenas terão toda força se combinadas com propostas de transição prioritárias
para o momento político.
Outro ponto,
as grandes empresas de agronegócio e do campo serão estatizadas pelo governo
socialista. A pauta da reforma agrária é da revolução burguesa, não da
socialista, contra a poder agrário feudal. Os comunistas tiveram de defender
tal exigência porque no século 20 o campesinato ainda era muito forte, porque o
tempo da revolução socialista ainda faltava chegar. A situação agora é outra. O
Estado operário e popular fará uma reforma agrária secundária, mas manterá,
agora unificada e estatizada sob gestão de seus funcionários, a grande terra, a
grande propriedade. Isso tem pelo menos dois motivos: 1) por escala de produção
superior, a fome será apenas lembrança de um passado bárbaro, 2) a exportação de
grãos e outros derivados ajudará na manutenção das necessárias importações.
ESTADO, REGIME, GOVERNO
Como dissemos, o Estado sempre serve a
alguma classe, servindo para o funcionamento tão bom quanto possível de uma
sociedade baseada na exploração do homem pelo homem. A ferramenta, então,
define-se para qual projeto de sociedade ela funciona.
O regime
de um Estado é a forma como as instituições são organizadas – qual
instituição lidera o aparato? Vamos aos exemplos práticos. Se as forças armadas
controlam com mão de ferro o Estado em uma ditadura que permite um parlamento
com apenas dois partidos oficiais, então temos um regime bonapartista ou uma
ditadura militar. Se o parlamento e a presidência são eleitos por voto
universal, então temos um regime democrático burguês. Se um exército partidário
liderado por um partido fascista concentra o poder para si impedindo a
existência de qualquer outro partido, então temos um regime fascista. Se o
regime militar fecha-se ao ponto de alta repressão, censura e mesmo a proibição
de um parlamento, então temos um regime semifascista.
Há inúmeros tipos de regime de Estado
classificáveis; o que importa é evitar confundir regime e Estado. Por exemplo:
um Estado pode ser socialista, porém ter um regime indesejável, sem democracia
socialista, ou seja, uma ditadura estalinista; nesse caso, defendemos o tipo de
Estado – e lutamos contra o tipo de regime porque há aí uma contradição.
Já o governo
é formado pelos grupos que assumem a direção do Estado no regime. É um conceito
mais simples e direto. Merece destaque os complicados “governos de frente
popular”, que são tema de outro capítulo.
A DEMOCRACIA
Assim como o Estado, a democracia também é
de classe. Na sociedade escravocrata da Grécia, surgiu a democracia escravista
ou grega, onde os homens livres, ou seja, senhores de escravos e comerciantes,
poderiam debater e votar os rumos da cidade de Atenas. Escravos, estrangeiros e
mulheres ficavam de fora dessa forma democrática bastante limitada.
Com o capitalismo, surgiu a democracia burguesa.
O projeto inicial dos patrões era o modelo de Atenas, apenas homens ricos
votando, mas tiveram que abrir o voto para trabalhadores e mulheres tão devagar
quanto possível.
A democracia burguesa é uma farsa bem
armada: os trabalhadores, que são maioria, votam, mas não decidem. Essa
democracia elege supostos representantes que agem como querem depois de
eleitos. Em geral, os políticos são financiados por empresários para que ganhem
as eleições e depois lhes deem vantagens. A estrutura das eleições é feita para
direcionar o voto popular para candidatos da ordem como o fato de partidos
maiores terem mais tempo de TV para propaganda eleitoral. É claro: a função é
iludir aqueles a viver de salário de que alguma mudança é possível de forma
passiva, sem luta, apenas “votando certo”. O modelo formalmente democrático é
melhor do que uma ditadura, pois facilita a classe trabalhadora grevar,
organizar-se, organizar um partido para si, etc. Porém evitamos a ilusão: se
for preciso, até os melhores democratas usarão a força, até o exército, para
garantir a exploração de classe trabalhadora.
A democracia socialista ou a ditadura do
proletariado é a democracia real, da maioria. É uma democracia participativa e
direta: nos locais de trabalho e nos bairros populares formam-se assembleias de
base que debatem todos os assuntos necessários e votam qual decisão tomar,
então se elege um comitê de representantes responsáveis por garantir a
aplicação daquilo votado e encaminhar questões de rotina. Esses representantes
não têm privilégios, evita-se dar “vantagens” aos que ocupam o cargo para
afastar oportunistas ou mesmo a acomodação daqueles honestos. Os diferentes
partidos que aceitarem o novo poder levarão aos trabalhadores suas propostas
por meio de debates abertos físicos, via TV e internet – poderão disputar os
cargos dispostos pela sociedade. Os mandatos públicos em tal sociedade serão
perdíveis, revogáveis, a qualquer momento se assim os representados o quiserem
– se o político desagradar seus representados, ele pode ser imediatamente
substituído por outro através de uma votação nova. Por meio das assembleias
gerais ou por meio dos representantes, são eleitos os cargos mais altos, os
representantes da cidade, do estado, do país. Além do mais, votações via
internet permitirão ações ainda mais diretas da maioria da população sobre seu
Estado.
O Estado socialista é uma “ditadura”
porque impede que os ricos retornem ao poder; assim, é também a dominação de
uma classe sobre outra.
PELO FIM DO ESTADO!
O Estado socialista ainda é uma influência
de gestão sobre coisas e sobre homens; além disso, o exército regular será
mantido por algumas décadas (já no início do socialismo, todos os trabalhadores
terão direito de armar-se, de ter armas e saber manejá-las, tirando o controle
da força das mãos uma casta estatal, de um grupo, etc.). Isso muda na próxima
fase, depois do socialismo, no comunismo. Quando a nova sociedade consolidar-se
por todo o mundo, um grupo destacado de militares será desnecessário e até
mesmo o armamento popular será algo em desuso. Com o avanço da ciência, da
tecnologia e da sociedade, as classes sociais deixarão de existir, havendo
então apenas indivíduos integrados nas suas comunidades. A gestão será somente sobre as coisas enquanto os homens terão ainda
mais autonomia de ação. Como todos viverão bem, não haverá necessidade de
sindicatos e partidos. As diferentes organizações sociais se fundirão em uma
organização geral única que dispensará a força bruta. Isso levará um bom tempo,
por isso nossa geração não verá isso acontecer, infelizmente – porém podemos
dar os primeiros passos.
NOÇÕES
BÁSICAS DE ECONOMIA PARA ELABORAR POLÍTICA
CRISE DE SUPERPRODUÇÃO DE
CAPITAL – E MERCADORIAS
Mais ou menos de 10 em 10 anos, ocorre uma
crise econômica no capitalismo. Em geral, a causa de fundo de tais explosões é
a chamada superprodução de capitais
(máquinas, matérias-primas, etc.) que produz uma superprodução de mercadorias.
Isso merece máximo destaque. No feudalismo ou no escravismo antigo, as crises
eram de baixa produção, de subprodução, pois, se acontecia uma seca anormal ou
inverno rigoroso, a produção no campo caía a níveis muito baixos e perigosos.
Sob o atual sistema, isso é diferente, pois a crise – e sua miséria – ocorre
por haver máquinas demais, matéria-prima demais, empresas demais, mercadorias
demais, etc.
Vejamos, parágrafo a parágrafo, os fatores
que produzem as crises periódicas.
Na busca de lucro, novos e velhos patrões
investem em meios de produção e em força de trabalho. A quantidade de empresas
e de máquinas aumenta, a lucratividade é disputada a ferro e fogo. Mas se há
ainda mais investimentos, ocorre um problema: a população trabalhadora nunca
cresce na mesma velocidade do crescimento das fábricas e do número delas. O
desemprego cai ao ponto de quase faltar mão de obra disponível; então as greves
aumentam e ficam cada vez mais fortes, os trabalhadores têm aumento real de
salários. Isso arranca dos patrões parte de seu lucro, que passa a pagar os
funcionários. Cai a taxa e a massa de lucro.
A euforia da fase de crescimento da
economia produz muitos investimentos, por isso aumenta o número de
concorrentes. Como todos estão disputando mercado, os lucros caem, são mais
divididos – e o preço das mercadorias caem ainda mais com a grande oferta.
Em geral, tem-se a tendência à deflação
dos preços, menos o preço da força de trabalho, que cresce. Mas tal pleno
emprego é muito diferente de equilíbrio. Enquanto as mercadorias de algumas empresas
ficam mais baratas, as de outras ficam mais caras por causa da demanda
aumentada. Por exemplo: duplica ou triplica o número de fábricas de fiação, mas
as empresas no campo que vendem o algodão para elas não conseguem aumentar na
mesma proporção a oferta dessa matéria-prima da fiação – leva um tempo para
cultivar mais plantações algodoeiras. Os preços aí sobem: por mais um meio, o
lucro cai para vários capitalistas.
Um pouco antes das crises, o mercado está
no seu máximo, por isso a demanda de dinheiro cresce. Além do mais, os
capitalistas investem mais em busca de novos lucros, fazendo empréstimos novos.
Quando as mercadorias acumulam-se demais no mercado, sem serem vendidas ou
vendidas abaixo do preço comum, os empréstimos encontram dificuldade de ser
pagos. Esses fatores fazem subir a taxa de juros, fazem com que o capitalista
industrial passe uma parte maior do mais-valor, do lucro, para o banqueiro. Os
economistas vulgares pensam que a crise vem porque sobem os juros, já que
sempre sobe os juros antes das crises se revelem em suas formas destrutivas.
Eles veem apenas a aparência, então invertem causa e efeito. É porque a crise
está dando seus primeiros sinais que os juros sobem.
CRISE E CONTRATENDÊNCIA
Do
ponto de vista do capital, a crise é, na verdade, uma solução temporária – e o
pleno emprego, ou seja, a economia a todo vapor, é, na verdade, uma crise. Isso
faz sentido, embora seja a quebra econômica uma tragédia aos trabalhadores.
Vejamos as contratendências à tendência destrutiva das crises de superprodução
de capital:
1.
Baixa do preço;
Com as falências e com o desemprego, o
consumo geral cai – a demanda cai em relação à oferta de mercadorias. As
empresas que resistem à quebradeira, normalmente as maiores, podem comprar
matéria-prima, máquinas, etc. por um preço mais vantajoso.
2.
Redução dos salários;
Na crise, o desemprego aumenta, por isso
as greves param de ter força, o medo da miséria volta. O patrão consegue
novamente impor baixos salários, maior jornada de trabalho e mais intensidade
do trabalho. Além do mais, como a crise é superprodução e há queda da demanda
por desemprego, as mercadorias que o operário compra com seu salário ficam mais
baratas.
3.
Falências;
A falência de muitas empresas, especialmente as menores,
faz com que a concorrência reduza e, então, menor quantidade de capitalistas
embolsa o lucro total da sociedade.
4.
Novas mercadorias;
Finalmente, as mercadorias acumuladas nos
mercados são vendidas ou perdem validade. Então demanda-se nova produção.
SUBCONSUMO?
A economia vulgar diz o quase óbvio fato
de que as crises são por demanda baixa, por subconsumo. Eles deixam de observar
que a estrutura de classes da sociedade capitalista limita o consumo geral
inevitavelmente. E mais. Logo antes da crise, o consumo dos trabalhadores
aumenta, não se reduz, porque o pleno emprego, mais demanda que oferta de força
de trabalho, empurra para a elevação dos salários – ocorre que, mesmo assim, a
oferta cresce ainda muito mais rapidamente. O problema não é a falta de
demanda, mas vender as mercadorias a preços que compensem. Daí a crise. Mais
ainda: as crises ocorrem porque a queda da taxa de lucro, tema de capítulo
anterior, depois afeta negativamente a massa de lucro porque o pleno emprego
suga lucro do empresário com os aumentos salariais, etc.
CAPITAL PRODUTOR DE JUROS
Todos odeiam os bancos. Tanto
trabalhadores quanto empresários produtivos chamam os banqueiros parasitas,
oportunistas, aqueles que vivem da desgraça alheia sem nada de fato contribuir.
A rejeição tem justificativa, no entanto os bancos são vitais ao sistema
capitalista na medida em que reúnem quantidade de dinheiro enorme capaz de
financiar novos e grandes investimentos na economia real.
De início, lembramos que há várias formas
de produzir juros. Um comerciante pode adiantar mercadorias a outro comerciante
em troca de juros sobre o preço delas – juro comercial; quando um capitalista
aluga sua máquina a outro capitalista, há também relação de juros. Mas o
destaque deste capítulo é o capital financeiro.
CICLO DE JUROS
O mais evidente sobre a taxa de juros é
sua dependência entre oferta e demanda de dinheiro. Se os capitalistas
industriais compram mais barato a matéria-prima e a força de trabalho, logo
sobra dinheiro, que é guardado no banco até ser novamente necessário ou até
acumular numa quantidade alta o bastante para comprar nova máquina, etc. – com
maior quantidade de dinheiro no banco, os juros caem.
Há uma luta social entre os empresários,
industriais e comerciantes, e os banqueiros por qual será a taxa de juros.
Observado em ciclos longos da economia, de crescimento e crise, para além dessa
luta, percebemos um movimento comum, geral e tendencial.
No início dos ciclos econômicos, depois da
crise, com crescimento inicial, os juros são baixos; com o crescimento maior da
economia, os juros sobem, mas ainda são baixos; com o altíssimo aquecimento da
economia, os juros sobem, são altos; com a quebra súbita da economia, com a
crise, os juros atingem o ponto máximo para o alto; após a destruição da crise,
os juros caem aos níveis mais baixos. E o ciclo se repete novamente, novamente,
etc. Expliquemos o motivo desse movimento. Logo depois da crise, o juro é muito
baixo porque há poucas empresas, gasta-se menos com salários e matéria-prima,
demandando menos dinheiro, investe-se pouco, os preços das mercadorias são
baixos; com o aquecimento da economia, demanda-se mais dinheiro, mas ainda um
tanto limitado; com a euforia do grande crescimento, há investimento em todo
canto, demandando cada vez mais dinheiro, e os juros sobem; com a crise, todos
correm nervosos aos bancos para pagar suas dívidas, suas contas, e os
empréstimos se tornam mais arriscados, os juros atingem o máximo; após a
destruição da crise, a demanda por dinheiro desaba, caindo os juros ao mínimo.
JUROS E DÍVIDA PÚBLICA
Com a existência moderna de bancos
centrais, formalmente as taxas de juros são determinados pelo Estado. Apenas
formalmente, repito. Eles são obrigados, geralmente, a seguir os ciclos dos
juros como parte do ciclo da economia real. Se o governo, banco central, emite
dívida nova, ele tira dinheiro dos bancos, que compram os títulos da dívida
pública, os juros sobem por isso; se o governo compra de volta os títulos da
dívida pública, retirando-os do mercado, ele joga dinheiro no mercado
financeiro, logo os juros caem.
Se os juros da dívida pública sobem, os
bancos correm para comprar mais títulos, gastando dinheiro, por isso os juros
bancários também sobem. Se os juros da dívida pública caem, tornando-se menos
atraente, os bancos investem menos nesses títulos, e os juros caem. Tal
movimento com títulos da dívida se deve porque é um investimento seguro,
garantido, pago com impostos ou com novas dívidas.
Essa relação entre taxa de juros e dívida
pública não está no livro III de O Capital de Marx, sendo um acréscimo comum
sobre o mundo financeiro hoje.
TAXA DE LUCRO E TAXA DE JUROS
O juro vem do trabalho não pago do
operário, o mais-valor (a mais-valia), vindo de modo indireto ao bolso do
banqueiro quando o comerciante e o industrial têm de pagar suas dívidas. Dessa
forma, a taxa de juros é regulada e
limitada pela taxa de lucro. Ora, vimos em outro capítulo, com o
desenvolvimento do capitalismo, a tendência é cair cada vez mais a taxa de
lucro. Logo a taxa de juros também tende a cair ao mínimo!
Em nossa época, tornou-se comum taxa de
juros real próximo de zero como sintoma da queda da taxa de lucro aos atuais
níveis. Com o crédito muito barato, especuladores e investidores aventureiros
têm levado dinheiro para o cassino da bolsa de valores, gerando uma hiperinflação
de ações das empresas.
CAPITAL FICTÍCIO
Há duas formas principais de capital
fictício: dívida pública e ações. No caso da dívida pública, o capital é
fictício porque o Estado simplesmente gasta o dinheiro; ao juro recebido pelo
título da dívida acrescenta-se que o emprestador nada perde, nada de fato dá,
pois os próprios títulos podem ser usados como dinheiro.
Já as ações são um título de direito sobre
a propriedade ou sobre o lucro futuro de uma empresa. Uma ação pode dar direito
a, por exemplo, 1% da empresa, logo, 1% do lucro. É como se o mesmo capital se duplicasse,
mantendo seu lado real e físico e, por outro lado, como um título de direito.
Essas chamadas ações podem ser vendidas no mercado, podendo ficar até mais
caras do que o lucro que realmente podem render (o que produz uma crise). Hoje,
com o crédito barato, a procura por ações em um verdadeiro jogo alucinado
atingiu um ponto máximo e absurdo.
TAXA DE JUROS E TAXA DE CÂMBIO
Quando o Brasil exporta muito e,
principalmente, por altos preços, os exportadores vendem em dólar ao mercado
mundial. Depois, trocam esse dinheiro mundial por dinheiro da nação, o real,
com o governo, com o Banco Central. Assim, se faltar dólar porque vendeu pouco
e/ou barato aos outros países, o preço do dólar em real sobe (precisa de 4
reais para comprar 1 dólar, por exemplo); quando vende muito e a preços altos,
o dólar fica mais barato por ele ser mais abundante no Banco Central.
Esse dólar acumulado tende a ir, a maior
parte, para uma conta nos bancos e na dívida pública dos EUA. São nossas
reservas internacionais.
Quando a taxa de juros da dívida pública
sobe, aumenta também a entrada de dólar, pois os investidores internacionais do
capital especulativo querem investir nos títulos da dívida em busca de um lucro
extra qualquer. Com mais dólar, fica mais barato importar – isso derruba os
preços, empurra para reduzir a inflação (Marx não percebeu isso, que é uma
contribuição de Serrano).
BANCOS E SOCIALISMO
Há dois fatores que fazem dos bancos um
aviso do socialismo. Primeiro, eles forçam o desenvolvimento da indústria e da
economia até o limite do sistema, dando base para a abundância socialista e as
duras crises do capital. Segundo, ao controlar empresas e o dinheiro, serão a
base para a futura contabilidade geral da sociedade com economia planejada
socialista.
POLÍTICA E CLASSES
É preciso ter clareza que quase toda medida de governo
busca ou mais lucro ou diminuir a luta de classes, contra o nosso lado. Mas
eles dirão que suas medidas são “pelo bem país”.
POLÍTICA E QUESTÃO MILITAR
Se o leitor quer saber elaborar política
apenas na sua empresa, tudo bem. Mas se há o risco de se tornar dirigente
político em nível de cidade, estado país, ou mundo – então tem que saber o
básico do básico de arte militar. Lembre-se que o marxismo foca na totalidade
do real. Se vais fazer uma análise internacional, provavelmente a situação de
alguma guerra terá de ser compreendida. De começo, indico o canal de notícias e
análises militares “Hoje no mundo militar”, no youtube, com vídeos novos todos
os dias. Quando com tempo livre e sobrando, assista documentários sobre guerras
e, em principal, lenha livros sobre. O Da guerra, de clausewitz, apesar de
desatualizado, é merlhor para entender os princípios gerais. Aqui, vamos fazer
um exposição breve dos elementos, para ajudar a organizar e desenvolver teus
pensamentos:
PARA UM MANUAL MILITAR
Existem regras gerais, universais, para a arte da
guerra? Há, pelo menos, afirmações que são encontradas de modo semelhante entre
os principais tratados militares da história. Aqui, como um glossário geral,
apresentamos certas “leis” que se repetem mesmo com alterações significativas
na concretude dos conflitos. Abaixo, desenvolveremos cada um dos pontos.
1. A
guerra é resultado da economia
Razão militar
Os filmes costumam afirmar a luta do poder pelo…
poder, como algo abstrato e vazio. É um grande engano; via de regra, a guerra
tem objetivo de gerar riquezas ao vencedor ou ao agressor. Pode-se invadir uma
ilha próxima para ter apenas melhor localização militar, mas mesmo
indiretamente há o objetivo lucrativo.
O Estado socialista, que visa ao bem-estar da maioria,
com economia planejada e centralizada, tem mais facilidade de girar recursos
para o conflito, rumo à vitória.
Cada época com sua forma de guerra
Cada época exige uma forma de fazer guerra. O
problema, então, é que se cristaliza um modo militar obsoleto, mas que teima em
manter-se até o último grão de minuto.
O escravismo no início tem um modo militar diferente
de seu auge-crise. Via de regra, quando a força militar deixa de ser feita com
os cidadãos livres armados, quando se profissionaliza a força de guerra, a
decadência ocorre; foi assim no escravismo e é assim hoje, no capitalismo. Uma
casta com desejos próprios surge e desestabiliza o estado.
O modo militar feudal baseava-se no feudo isolado,
em autodefesa desde os cavaleiros em postos de comando. Ora, isso resolveu a
crise militar anterior, do escravismo romano – mas também se tornou atrasado.
Os novos exércitos inglês e francês mudaram radicalmente o modo de guerrear, de
acordo com o mundo novo, burguês; por exemplo, o cargo de comando passou a ser
dado por mérito, não mais por origem de sangue; com o crescimento das cidades,
o abastecimento das tropas passou a ocorrer nos locais urbanos por onde se
passava por meio de compras, confisco ou em harmonia com o poder local.
O socialismo substituirá progressivamente, desde seu
começo, o exército por o povo armado, com leves e pesados calibres, e com
treinamento básico, até que o comunismo tenha armas apenas para jogos e
esportes, numa humanidade unificada. Isso é condição da democracia, do bom governo,
da segurança e da superioridade militar socialista em seu começo, quando ainda
haverá países capitalistas. Diz Maquiavel: apenas o mau governante teme seu
povo armado.
De qualquer modo, vale destacar a regra geral:
raramente o objetivo é destruir totalmente o inimigo, mas tornar para ele
demasiado custoso manter o conflito.
Empresas de guerra
Se a guerra em si, de modo direto, passa a ser fonte
de lucro, seja do infante ou seja do exército, então o Estado ou o governo cai.
Se o capitalismo hoje se levasse a sério, proibiria empresas de mercenários,
empresas privadas de produção para guerra etc. Mas o caminho é, agora, o
oposto: até pseudoestados como o de Israel dependem da construção civil e da
empresa militar para sua economia, logo necessita de guerra para tomar terras,
reconstruir e aumentar as ações na bolsa de suas empresas militares.
A guerra, se injusta em especial, tantas vezes
derruba o governo ou mesmo o sistema nos países em conflito.
2. A
guerra é a continuação da política
A máxima acima vem de Von Clausewitz, de imediato
apropriado pelo marxismo. O silogismo torna-se este:
A guerra é a continuação da política (por outros
meios),
A política é economia concentrada;
Logo, a guerra é a continuação da economia.
Desenvolvamos, portanto, as reflexões necessárias
sobre.
Vejamos a guerra do Vietnã. Os EUA venceram quase
todos os conflitos militares naquele país asiático, mas perdeu a guerra porque
o seu prolongamento do conflito fez o governo perder apoio de sua população.
Também os EUA não invadem sua vizinha Cuba por fala de condições políticas, não
militares.
Há vantagens em estar de acordo com a história
Estar do lado certo, junto ao futuro, dá alguma
força; mas não absoluta, nenhuma garantia de vitória certa. Diante da
superioridade militar do lado sul na guerra civil americana, Marx, ainda assim,
apostou no norte industrial por estar de acordo com as leis do desenvolvimento
capitalista.
Che Guevara cometeu um pesado erro vanguardista e
blanquista ao pensar que, em geral, pode uma pequena guerrilha vencer um
exército nacional sem as devidas condições econômicas e políticas favoráveis.
Para ele, a própria guerrilha faz suas condições. É um grande erro, que levou a
perdemos muitos lutadores.
O programa
O primeiro passo para vencer uma guerra é convencer
cidadãos, na prática, de sua justa luta. Quando os operários russos conquistaram
jornada de 8 horas diárias e os camponeses ganharam terras novas, eles foram
com máxima disciplina para a luta contra 14 – 14! – exércitos entre os mais
poderosos do mundo. E venceram. Na guerra civil americana, o general do norte
decretou: está abolida a escravidão em todo o território. Isso atuou para
desestabilizar o sul escravista, facilitando a vitória.
Como o perfil afeta o perfil da guerra
Na guerra civil russa, os 14 exércitos invasores
agiram cada um por si, em disciplina nacional, em busca de um pedaço próprio do
território russo. Na outra ponta, o exército vermelho reuniu sob sua força,
desta vez, unificada 5 milhões de combatentes. Veja-se que causas econômicas e
políticas afetaram o perfil dos exércitos e da guerra, pendendo para a vitória
de um lado contra o outro. O grande exército da URSS Pôde, assim, enfrentar um
por um os invasores separados.
Ainda na revolução russa, uma nova guerra “mundial”
logo em seguida da primeira grande guerra, somado com a nova pátria socialista,
levou a uma onda de greves e protestos nos países invasores, em solidariedade
com a URSS, o que desestimulou o conflito.
Educação política
Os soldados e o povo devem ser convencidos.
Portanto, uma luta por suas consciências deve ser permanente. Não basta fé,
pois é preciso ter clareza do motivo de estar lutando.
Evitar sentimento de “vitória antecipada”
Dizer, por exemplo, “fascistas não passarão!” revela
mais o medo de que passem – e podem passar, mesmo – do que uma palavra de ordem
útil; ela, na verdade, desarma o lado antifascista. A arrogância de vitória
certa já foi a ruína de muitos em batalha. Por isso, deve-se manter o sinal de
alerta, sempre e sempre. Em geral, o exército mais fraco é o mais criativo e
ousado exato por medo da derrota.
O desânimo e o medo total devem igualmente ser
evitados. A esperança de vencer, portanto, deve ergue o moral dos soldados.
3. A
quantidade de soldados importa
Muitos soldados, ainda que medianos, ganham de
poucos soldados bem treinados. O número tem grande peso. Um exército gigantesco
contra um pequeno pode, ainda assim, perder, pois o defeito da força é confiar
apenas na força. Assim, a tática fabiana de evitar conflito direto e cortar, em
ataques surpresa, a comunicação e a logística do poderoso (e custoso) inimigo
pode levar à vitória. A concentração alta de um exército leva à fragmentação
guerrilheira de outro pequeno. Nem tudo é número: quem é dono de fato do
território também tem certa vantagem, mesmo que em minoria.
Nos países, aqueles exércitos que não têm grande
tecnologia investem na quantidade maior de materiais menos avançados e de
soldados.
A quantidade é, ela mesma, uma qualidade.
4. A
qualidade dos militares importa
Engels, ao tratar das primeiras e fracassadas
revoluções burguesas, toma nota que mendigos, vagabundos, ladrões etc.
participarem de exércitos, o que atrapalhou, por exemplo, a disciplina.
Na guerra, basta um treinamento médio, mas com
alguns grupos de “elite” melhor preparados.
Classe dos soldados
Trotsky, ao fundar o Exército Vermelho, fez questão
que a primeira leva de oficiais e soldados fossem operários, base social do
novo Estado. Só então chamou os camponeses, mas apenas aqueles que não
exploravam trabalho alheio.
Os operários, e os camponeses, são gente prática,
disciplinada “naturalmente” no trabalho duro, acostuma com pouco e tensão, útil
para diferentes serviços. Já os membros da classe média, em geral, não têm tais
características e psicologia.
Comandante
O perfil do comandante, sua personalidade, afeta o
perfil geral do seu exército e da guerra. Se for, por exemplo, um homem
disciplinado, mas, ou por isso, sem criatividade, afeta toda a operação.
Perfil nacional
Euclides da Cunha observou que o soldado brasileiro
não serve para manobras complexas, logo seu comandante, além de demonstrar
vigor, deve dar instruções gerais aos subordinados e, então, confiar em suas
iniciativas próprias. Cada país tem, assim, uma cultura particular que deve ser
levada em conta no perfil do soldado.
Soldados dos países ricos e pobres
Um soldado brasileiro é, via de regra, mais
tolerante à tensão do que um suíço. São vidas reais muito diferentes, um deles
precário desde o nascimento. Eis uma armadilha para os imperialistas.
Higiene
Tantas vezes, a principal causa de baixas no
exército são as doenças, evitáveis algumas delas. Por isso, manuais simples
sobre como ferver ou filtrar a água são muito úteis e devem ser seguidos à
risca.
5. Priorizar
outros setores que não a infantaria costuma levar à derrota
Os EUA no Vietinã, a URSS no Afeganistão – ambos
priorizaram a maquinaria sobre a infantaria, e perderam. É irresistível a um
comandante usar sua vantagem, seus tanques etc. Isso é uma lei poderosa:
deve-se priorizar a infantaria, os soldados.
Veja-se que com a alta urbanização e a guerra
urbana, a infantaria ganha ainda maior importância para manobras de terreno (os
soldados lidam melhor com o caos da cidade em guerra do que as máquinas). Já o
maquinário pesado exige muito custo de manutenção e conserto, além de exigir
muita energia, o que por também exige ainda mais da logística. Os custos
necessários, como manter operadores especializados no uso e no trato do
material tecnológico, multiplicam-se. Nas batalhas, armas baratas ou
semicaseiras podem prejudicar meios pesados. A máquina é necessária ao combate,
mas sua prioridade é causa comum de derrotas.
6. É
necessário desestimular o inimigo
Tratar bem quem desiste no outro lado – punir com a
morte quem do seu lado desiste. Eis uma regra de ouro, pois evita que se lute
até o limite.
Aqui, propagandas sobre os soldados do inimigo
também são válidos.
Nunca cercar totalmente o inimigo, sempre deixar uma
brecha para ele fugir – ou, então, sempre lutará com máxima disciplina e
heroísmo.
7. Sempre
que possível e útil, engane o adversário
Sun Tzu diz algo do tipo: 1) se és mais forte,
pareça mais fraco para o inimigo tomar uma ação precipitada; 2) se és mais
fraco, pareça mais forte para o inimigo ter dúvidas, hesitar.
Deve-se ter a sabedoria de enganar quando necessário,
de modo criativo, ou ocultar informações. Na guerra da Ucrânia o exército
ucraniano deu a intender que atacaria uma cidade para fazer os russos
esvaziarem outra, o que deu certo, permitindo retomar o território em outro
ponto.
8. Sem
fórmulas fixas, deve-se avaliar sempre a situação concreta e o todo
Inexiste norma ou modo de combate exemplar. Um bom
comandante primeiro colhe todos os dados possíveis, trata de adivinhar as ações
do inimigo e toma postura ativa, iniciativa.
9. A
guerra é uma otimização do uso de energia
É preciso não esgotar, extensiva ou intensivamente,
seus soldados, ainda que se exija grande disciplina deles. Nesse sentido, a
logística é importantíssima para abastecer as tropas. Um comandante tem de
pensar em termos energéticos.
10. A
defesa territorial ativa costuma ser superior ao ataque
Pensa-se a defesa como passivo e o ataque como
ativo. Mas, por exemplo, quem está na defensiva, pode tomar a iniciativa de
cercar o inimigo ou operar surpresas. Dito isso, de imediato, temos esta lei: a
vantagem defensiva, como defender o próprio território, usada em geral pelo
mais fraco, serve para, assim que possível, ir, mudar, para a ofensiva.
A coisa acontece muito assim: o lado invasor,
ofensivo, vai pra luta com força máxima, arrasa cidades e avança com força
imensa por boa parte ou quase todo o território do inimigo. Parece que ele vai
ganhar fácil, mas há um engano: 1) ficou mais longe de seu próprio país, logo
tem custos maiores de manter o exército por causa da distância; 2) logo,
sabotadores podem cortar seus transportes e comunicações; 3) logo, o povo do
país invadido é hostil e os sabota; 4) logo, concentrou-se os soldados inimigos
em um pequeno território, o que lhes dá uma vantagem, mais força; etc. Então, começam
as demissões de generais do país invasor, pois seu exército começa, passo a
passo, a perder o território antes conquistado. Veja-se: o atacante invasor vai
com máxima força, mas essa força vai caindo cada vez mais por morte, por
doença, por cansaço, por falta de recursos, por desgaste político etc.
Terreno
Quem está na defensiva tem a vantagem de
posicionar-se em pontos vantajosos antes, como locais altos (por onde vê, atira
e localiza-se melhor – mas, em si, não é uma vantagem absoluta, mistificada).
Uma das vantagens é, assim, ao conhecer o cenário,
poder operar surpresas contra o invasor.
Povo
O apoio popular na marcha, na logística, na moral,
na camuflagem entre o povo fortalece o exército que está defendendo o
território. Franco atiradores, selecionados para matar alvos específicos, podem
misturar-se na população, por exemplo.
O povo armado em milícias pode ser condição da
vitória da defesa, antes de ir ao ataque. Pequenos grupos de cidadãos armados
podem ter a iniciativa, com apoio simpels do exército, de atacar e recuar os
flancos (lados) do exército invasor
Logística
Quem defende território pode ter facilidade de
comunicação e transporte. Já quem avança sobre outro país, tem este custo
aumentado. Na II Guerra, a Alemanha avançou por demais na grande Rússia, o que
dificultou a retaguarda e a manutenção das tropas; além disso, permitiu que
grupos especiais atacassem suas provisões a caminho.
Desgaste
O exército que avança, que invade, na ofensiva tem
desgaste maior. Uma defesa ativa, não passiva, aumentar ainda mais o desgaste
militar. Assim, na guerra assimétrica, de um grande exército contra um pequeno,
este aposta no prolongamento do conflito, tornando muito custoso ao inimigo.
11. Davi
pode vencer Golias – não há situação completamente sem saída
O século 20 é cheio de exemplos em que o lado mais
fraco derrota o mais forte, usando, por exemplo, de sua leveza, de seu
agilidade, ou seja, do movimento.
Os elementos são estes: movimento e energia – tempo
e espaço, campo – matéria e massa. O comandante pensa sobre tais aspectos. Se
não tem matéria e massa, deve compensar com outro, equivalente, como a
mobilidade, movimento. Exércitos pequenos (matéria) em grandes territórios
(espaços) apostam na manobra e na velocidade (movimento); uma pequena guerrilha
contra um grande exército (matéria, massa) aposta na mobilidade (movimento); um
exército sem grande tecnologia (matéria) aposta em maior infantaria (matéria);
um pequeno grupo militar (matéria) pode vencer ou repelir outro grande
(matéria, massa) se se localiza numa montanha (espaço-matéria) embora um
terreno elevado não seja uma vantagem absoluta ou garantia.
A pequeníssima Chechênia venceu da grande Rússia
compensando com mobilidade e uso do terreno montanhoso. Os comboios com tanques
russos teriam de passar por regiões montanhosas com estradas estreitas, então a
guerrilha inimiga quebrava alguns carros de combate russos para inutilizar toda
a estrada, impedindo aproximação. Além disso, a aviação russa destruiu a
capital chechena, mas isso facilitou o movimento de infantaria e dos
guerrilheiros no ambiente urbano, não do pesado exército russo, o que facilitou
ataques e manobras. Davi, de fato, pode vencer Golias.
12. Ousadia,
ousadia, ousadia!
Às vezes, é preciso a defensiva ativa ou mesmo
recuar, nada de ofensiva permanente artificial. Clausewitz diz que a máxima
ousadia às vezes é o que há de mais sensato. Tal afirmação tem reforço nos
comandantes do Exército Vermelho, como Tukachev. Na origem, a palavra de ordem
vem dos revolucionários da revolução Francesa, os jacobinos. E a história
comprovou que ousadia imensa, bem calculada, muitas vezes define resultados.
Portanto, ousadia!
POLÍTICA DE GUERRA
A guerra entre candidatos a império deve ser boicotada.
Outro caso, exceção clara se for uma luta de países socialistas contra países
capitalistas, pois sempre defendemos a sociedade com traços socialistas. Se os
países nazistas imperialistas se unem contra os imperialismos “democráticos”,
cabe analisar se tomamos os lados contra as nações fascistas ou o boicote total
ao conflito. Se um país dominante entra em guerra contra um país atrasado,
sempre apoiamos este contra aquele. Se dois países fracos e dominados entram em
guerra, tomamos o lado do invadido contra o invasor, contra o atacante.
INDEPENDÊNCIA NACIONAL
Neste campo, seguimos o seguinte princípio: 1)
queremos unidade humana, logo militamos contra a separação dos povos; mas, 1)
se um povo decide livremente por separar-se, logo defendemos com unhas e dentes
seu direito de independência.
POLÍTICA, ALIENAÇÃO E MORAL
Por que fazemos uma festa do sindicato?
Não é apenas para aumentar o prestígio da direção da entidade. Fazemos isso
porque o capitalismo nunca garante o lazer como se deve – isso é alienação. Os
comunistas sempre dizem a verdade aos trabalhadores, mesmo que seja difícil,
mesmo que nos isole por algum tempo. Fazemos assembleias democráticas dos
sindicatos porque queremos o fim da alienação, o socialismo, logo devemos
“ensaiar”, “treinar” o futuro livre por meio do poder dos trabalhadores do
sindicato decidir os rumos de seu sindicato, que tem um minipoder. Não
roubamos, nem deixamos roubar. Assim, toda nossa elaboração política tem um
sentido: o socialismo, a liberdade humana, o fim da alienação – e praticamos
isso desde já. Nosso objetivo, e o praticamos em toda ação política, é a
humanização da humanidade. Por exemplo: se fazemos uma greve que ganha o
aumento salarial, mas lideramos o sindicato sem assembleias, de modo ditatorial
e burocrático, logo o resultado é negativo.
POLÍTICA E ORGANIZAÇÃO
PARTIDÁRIA
O processo é simples. A política nacional,
elabora o congresso e a direção nacional do partido; política da fábrica,
elabora a célula da fábrica. O processo no geral é o seguinte: 1) acontece um
fato importante novo; 2) após debate, o partido prepara uma política; 3) essa
política vai para todo o partido por meio de seu jornal e boletins internos; 4)
então, cada célula de base debate o texto e vê como pôr em prática a proposta
na sua categoria, no seu local de trabalho.
De novo, devemos dar o exemplo do PSTU. De
modo ultraesquerdista, a direção do partido elabora a proposta mais radical
possível; Se há alguma inflação, deve exigir “todos às greves por reposição dos
salários reais!”. Mas a direção chama logo: “Escala móvel de salários!” ou
“salário mínimo do DIEESE, 6000 reais!” Então, os militantes de base, coitados,
leem o texto e encontram conexão alguma com a realidade deles. Eles leem o
jornal com a política votada, adoram se sentir radicais e revolucionários,
depois vão para casa ou o local de trabalho falar algo completamente diferente
daquilo que está escrito. O erro nunca é deles, mas da direção nacional.
Outro erro comum, também de décadas. O
congresso do partido tem uma pauta chama política. Ela deve: 1) dizer qual
situação estamos; 2) qual tipo de proposta é central – econômicas, mínimas,
democráticas, de transição ou de poder? 3) votar a tática eleitoral; 4) definir
quais as propostas práticas de política para um ou dois anos. Exceção de 1 e 3,
o resto nunca ocorre. No lugar de definir quais as palavras de ordem da
situação política do país, o documento político do partido faz uma lista de
bolo enorme com quase todas as propostas possíveis para um partido de esquerda
radica. E ponto. Nada é aprovado, nenhuma proposta de agitação política
específica do tipo” abaixo o governo”, “cancelamento da dívida dos
trabalhadores” etc.
REGRA DE OURO
Nós, comunistas, somos inimigos
inevitáveis de todos os governos do mundo – contra eles declaramos guerra
permanente. Apoiar um governo “contra o fascismo” ou porque ele é
“anti-imperialista” e “progressista” é trair a tradição marxista. Nenhum
governo é capaz de controlar o capitalismo para os trabalhadores – o sistema
deve ser derrubado.
Podemos, no máximo, fazer uma unidade, não
frente, de ação com o governo, por exemplo, para lutar contra a invasão de
nosso país, para derrubar uma tentativa de golpe de estado etc. Mas nunca
entramos no governo, sequer o apoiamos criticamente.
Nossa estratégia é derrubar o Estado dos
ricos, mesmo que isso demore, mesmo que isso exija certo isolamento por algum
tempo – resistimos, preparamo-nos para vitória futura, não tão longe quanto
parece.
EM CASO DE GOVERNO FORTE
Caso o governo seja muito forte, fazemos
ainda a crítica, mas somos mais maleáveis. Fazemos exigências ao governo: Faça
isso, impeça tal demissão, reestatize tal empresa etc. Os trabalhadores
concordarão com as nossas exigências e esperarão do governo uma boa resposta –
mas, em geral, se frutarão ou terão de lutar com dureza. Isso acelera a
experiência deles como governo, tornam-se mais críticos e, então, nós ganhamos
moral.
O PSTU fez isso, mas deixou de fazer a
outra etapa, a segunda etapa: a denúncia. Caso o governo traia, recue ou negue
a proposta – devemos, com linguagem cuidadosa, denunciar o governo aos mesmos
trabalhadores.
EM CASO DE DITADURA
Nesse caso, temos que focar, durante a
rotina, nas propostas mínimas (salário etc.) e democráticas (eleições
etc.). Numa crise do regime ditatorial,
levantamos propostas como “Assembleia constituinte!” ao mesmo tempo em que
levantamos propostas mais socialistas, mais radicais como “contra o desemprego,
escala móvel de tempo de trabalho!”
Nossos partidos se tornam pequenos e devem
ter células muito independentes e ocultas umas das outras.
COMO IMPEDIR E COMBATER O
FASCISMO
Se o fascismo cresce, quer dizer que a
esquerda está frágil e cometeu muitos erros. Por isso, devemos chamar uma
frente única antifascista com toda a esquerda. Devemos organizar grupos de
defesa dos sindicatos, partidos, greves e protestos – que serão atacados por
bandos nazistas. No Brasil, os trotskista liderados por Mário Pedrosa chamo a
frente única e promoveu um ataque contra o desfile dos fascistas brasileiros,
os integralistas. Depois desse ataque, tal movimento sombrio nunca mais se
reergueu. Além disso, temos que ter política, propostas práticas, que atraiam
os trabalhadores e, pela força de sua luta, parte da classe média. Em geral, se
há um risco fascista, há, oposto, um risco de socialismo – o parlamento
corrupto burguês pode ser destruído por uma ditadura totalitária, ou, ao
contrário, por uma democracia superior e verdadeira. Nesse sentido, não
defendemos em exato a democracia corrupta atual, pois focamos nos problemas econômicos
centrais dos trabalhadores na crise. Claro, a pior democracia é mil vezes
melhor que a mais leve ditadura.
Mais um detalhe: chamamos por uma frente
de combate físico antifascistas. Se os reformistas aceitam, a luta cresce; se
os reformistas negam, seus liderem se desmoralizam, então os comunistas
crescem. Dos dois modos, ganhamos.
O PSTU chamou uma frente apenas com
revolucionários para combater o fascismo, o governo de extrema-direita. Assim,
seu movimento agregou apenas eles, alguns centristas e todas as seitas
lunáticas do país. De nada serviu.
QUANDO CHAMAR O “FORA GOVERNO”
OU “FORA MINISTROS BURGUESES”
Apenas lançamos a proposta de “fora
governo”, se chamamos, ou melhor, o “eleições gerais já!” se o governo perdeu o
apoio da maioria ou dos trabalhadores. Somente, apenas. Quando Lula se elegeu
pela primeira vez, o PSTU chamou no seu jornal “Fora ministros burgueses”.
Assim, brincaram – sem exagero – de revolucionários. Simplesmente, imitaram a mesma
proposta levantada pelos comunistas na revolução russa contra o governo de
esquerda. Nesse caso, a situação era revolucionária, risco de tomar o poder. No
caso do petismo, nada disso.
QUANDO CHAMAR PELA TOMADA DE
PODER
Somente chamamos a tomada do poder quando
isso está tão maduro quanto possível, quando a oportunidade não puder passar.
Na crise da corrupção do mensalão ou na queda de Dilma, o PSTU chamou, veja só,
“Fora todos”, ou seja, a queda do regime burguês antes da hora, sem condições.
Nos grandes protestos de 2013, chamou o “Nem governo nem PT: Trabalhadores no
poder!”, ou seja, quando era hora de ganhar o povo para nossas propostas
práticas para educação saúde e transporte, a direção do parte chamou a proposta
mais radical possível na história do movimento universal comunista… Mais uma
oportunidade perdida. Havia organismo de poder operário e popular? Não. Havia
possibilidade de armar o povo? Não. Havia crise econômica forte? Não. Enfim,
curioso que esse tipo de erro não tenha gerado uma crise direta na organização.
SABER OUVIR
Sempre há aqueles sujeitos intuitivos e
apressados que fazem análises do que está acontecendo no mundo e no país. Ouço
várias opiniões, algumas contrárias, antes de tomar uma decisão. Aqui e ali,
alguém tem uma sacada que ajuda a pensar a essência da coisa, do momento. Na
reunião do partido ou do sindicato, até antes, vale a pena ouvir antes de
decidir. Parte de colher dados é saber a interpretação apressada, mas talvez
útil, dos outros.
No mais, importantíssimo: se necessário,
consulte um e mais de um especialista sobre pontos específicos.
ELEIÇÕES E POLÍTICA
Participar ou não das eleições? Depende da
realidade. Numa situação, participamos; noutra completamente diferente, pedimos
com vigor o voto nulo; noutra, chamamos nossos deputados a renunciarem. A
situação manda. A eleição é nossa oportunidade de provar a todos que existimos
e temos projeto de poder. Por isso: 1) apresentamos 2 ou 3 propostas centrais;
2) aparecemos como os mais sérios e preparados, o que levam a política a sério;
3) somos responsáveis com a estética do material de campanha, ainda que
simples; 4) apresentamos um projeto de governo tão radical quanto radical é o
momento político, nem mais nem menos – programa com começo, meio e fim, de onde
virá o dinheiro necessário etc.
Mais uma vez, o PSTU erra. Tornou-se uma
espécie de piada política para a maioria do povo e a fama de lunáticos
deslocados da realidade. Isso se deve aos elementos citado: 1) apresenta as
propostas mais radicais possíveis; 2) não tem propostas práticas; 3) estética
irresponsável; 4) mito improviso. Ora, isso ocorre porque o objetivo partidário
é o sindicato, não o poder real, tornou-se partido sindicalista; então, para
provar aos ativistas ultraesquerditas que não é reformista, participa das
eleições da pior forma possível, incluso com expressões teatrais e
caricaturais.
ATIVIDADES ARTIFICIAIS
Se o partido se enche de atividades
artificiais, sem sentido real, sem finalidade, sem projeto, apenas para cumprir
datas ou ter o que fazer – os militantes se afastam aos poucos, pois militar
para de fazer sentido. O teatralismo, o como se, toma conta. Outro erro em que
cai o PSTU.
POLÍTICA ORGANIZACIONAL
De modo algum podemos usar 100% das forças
do nosso partido. Tentar isso de modo permanente quebra militantes, estimula
afastamento e gera crise partidária. A tentativa de parecer muito mais forte do
que de fato é paralisa o partido, gera crise. Um partido revolucionário do Peru
entrou em crise porque, no meio de uma onda de luta, tentou estar em todos os
espaços e cantos de protestos ao mesmo tempo.
O PSTU esgota seus jovens militantes,
depois os substitui por uma nova leva. Só os militantes de classe média, com
tempo e dinheiro prosperam na organização porque se exige demais. Vejamos outra
causa disso. Os militantes têm que participar de 3 a 4 células do partido na
semana! Só a classe média pode isso, então cresce dentro do partido. A boa
solução do PSTU foi esta: militante que participam só da direção regional;
outros, só da direção zonal; outros, só da célula de base. Perfeito, mas parece
que nunca funcionou por o modo errado é útil para limitar-se aos sindicatos, ao
mero sindicalismo.
O modo como nos organizamos afeta nossa política, e também
é afetado por ela! Sempre pergunte: qual a real situação da organização e dos
militantes? O Moral esta alto ou baixo? Qual o nível de disciplina? E as
finanças? Qual o perfil de classe dos membros?
CENTRISMO
Se nossa proposta política é a correta,
então devemos ser teimosos e insistentes na sua defesa – mesmo que, de início,
fiquemos isolados ou em minoria. O centrismo faz diferente, não suporta ficar
isolado e perder uma votação; por isso, procura meios-termos, acordos,
mediações etc. Tal postura tem muita relação com militantes de classe média,
menos duros, menos tolerantes ao isolamento.
DEIXAR AMADURECER
Apenas aprovamos uma política se todas as
suas condições estão maduras, deve-se deixar a coisa amadurecer. Tomamos o
poder apenas na situação melhor possível, para não sermos derrotados no
processo. O PSTU tentou por duas vezes fazer uma nova entidade nacional
estudantil – a CONLUTE antes e a ANEL depois – de modo precipitado, antes de
uma crise séria, entes de uma luta nacional etc. Os dois projetos, então,
faliram.
LUTAR JUNTOS, MARCHAR
SEPARADOS
O que isso significa? Que nos unimos com
outras correntes para fazer um protesto, mas na luta agimos com nossos próprios
grupos, temos nossos próprios panfletos diferente dos deles etc. Há algo que
nos unifica, mas também algo que nos separa, o eixo político.
OUSADIA!
De nada serve esperar passivamente a ordem
do comando superior, pois temos de ser criativos. A corrente FT, embora seja
uma seita, teve a ideia de fazer uma rede internacional de sites de esquerda
chamada Esquerda diário (até o nome é ótimo). Foi um sucesso: partidos
pequeníssimos passaram a ter grande audiência para seus artigos. A ideia
genial, a iniciativa, passou a dar errado, porém, porque eles confundiram
material de propaganda (feita para militantes) com material de massa (feita
para gente de esquerda que não milita). Assim, esvaziou-se.
No PSTU, a criatividade é castrada, pouco
incentivada. A iniciativa tem de vir, quando vem, da direção partidária. Assim,
demorou muito para eles terem um único canal individual no youtube, por
exemplo.
Lembramos que ousadia não é
irresponsabilidade, pois planejamos, medimos, meditamos, debatemos antes. Em
2017, o PSTU estava em crise interna, baixo moral, depois de uma crise e uma
ruptura. O que fez a direção partidária para resolver isso? Aproveitou um
protesto nacional de vanguarda, não de massas, para radicalizar, para ser
utraesquerdista, invadir prédios do governo, depredar (nada contra em si, mas
no contexto). A TV boicotou falar do ato com “violência”, mas teatral… Assim os
seus militantes faziam declaração orgulhosas e emocionadas na internet do
“partido revolucionário”, “de luta”, “o lado certo” etc. Foi um ato liderado
por um dirigente do PSTU, mas no fundo, era uma ação para os militantes do
partido, não para as massas.
DIALÉTICA – PRIMEIROS PASSOS
É difícil falar de dialética em poucos
passos, mas tentemos. Primeiro, a dialética descobre que a realidade é, de modo
inevitável, contraditória, em conflito – e tal conflito não é apenas
destrutivo, também é construtivo (qual a contradição na nossa conjuntura?).
Segundo, apenas entendemos a realidade se vemos por todos os ângulos, se vemos
o todo e a totalidade. Terceiro, a realidade é movimento, ou seja, nada é
eterno, tudo muda, tudo está em transformação e desenvolvimento – de onde vem
esta realidade e para aonde ela tende a ir? Para aonde queremos que ela vá na
medida do possível?
Em geral, as aparências enganam, por isso
fazemos uma boa pesquisa dos fatos para, só depois, chegar em alguma conclusão
(a essência real da realidade). Não se prenda à primeira impressão!
Nada é algo em si, pois depende de seu
contexto, de seu entorno, do que está em volta. Uma proposta de greve geral
parece revolucionária, mas ela pode ser antirrevolucionária, um erro completo,
se o correto para a situação concreta seria chamar já o poder operário, a
tomada do poder. Assim, a proposta de greve geral geraria nossa derrota por
décadas! Uma cadeira de bar serve para sentar; mas, no contexto, durante uma
briga, torna-se uma arma de abrir crânios! Um sindicato pode ser só um sindicato
bom, pode ser um sindicato que serve aos ricos contra a revolução ou pode se
tornar até um organismo um Estado socialista! Uma forma pode ter vários
conteúdos!
Via de regra, entre duas posições
políticas opostas e estremas, costuma ter uma terceira resposta, uma terceira
via ou, às vezes, um meio-termo, um caminho do meio. Entre aqueles que
defendiam o “Fora Dilma” e o “Fora todos” contra os que defendiam “defender o
governo contra o golpe”, havia uma terceira resposta, que superava os dois
erros: chamar “Eleições gerais já!” Isso derruba o governo ao mesmo tempo em
que coloca o povo na jogada, força mais democracia (menos alienação) e impede o
golpe.
Cada fase, cada etapa, tem suas
contradições inevitáveis que devem ser resolvidas ou, pelo menos, bem lidadas,
bem convividas. Se meu partido cresce, ele fica mais diverso, logo ele deve ser
democrático de tal modo que diferentes opiniões – que vêm de diferentes
experiências de vida e de classe – sejam toleradas e organizadas.
Há dois tipos de salto de qualidade, de
natureza: 1) algo muda aos poucos, passo a passo, até tornar-se outra coisa,
como a criança que se torna adulto; 2) algo muda apenas em quantidade, aos
poucos, mas se vê forçado a saltar para outra natureza, outra qualidade, de
repente, como a água que – após ir esfriando – se torna gelo de uma só vez, não
aos poucos. O partido revolucionário cresce, em geral, de uma vez, por saltos,
ganhando, por exemplo, vários ativistas de uma tacada após uma vitoriosa greve.
O desenvolvimento é desigual, nunca de
modo igual em todas as suas partes. Nós desenvolvimentos mais habilidade em
matemática do que em geografia, por exemplo. Podemos ser ótimos administradores
sindicais, mas péssimos em discurso – algo normal. Tentamos, então, diminuir
tal desigualdade, diferença, do desenvolvimento das partes em questão. Um setor
da economia cresce muito mais do que outro. Garrincha foi um gênio da bola
exato por suas pernas desigualmente desenvolvidas.
A forma como vivemos, e nossas
experiências práticas, determinam a forma como pensamos. A classe social à qual
pertencemos determina nossa moral, nossas ideias, nossas simpatias, nossa
disciplina etc. A matéria determina a ideia, ou melhor, a cabeça segue o chão
que os pés pisam. O modo de viver faz o modo de pensar.
A noção de causa antes e feito depois é
melhor superada por uma noção de interação, de causalidade recíproca, de ida e
volta. A economia afeta a cultura; a cultura também afeta a economia.
EXTRA:
COMO SERÁ O SOCIALISMO?
Pelo que
lutamos, qual a nossa estratégia? É preciso ter em mente que nosso futuro será
a extinção ou a liberdade, o socialismo. Neste ensaio saberás, em geral, como
está o mundo e para aonde ele pode ir.
A PRODUÇÃO –
CRISE DO VALOR
Pela
primeira vez na história da espécie humana, produzimos tudo necessário e na
quantidade necessária para satisfazer todas as necessidades da humanidade – e,
ainda, fazer sobrar recursos para investir no desenvolvimento da economia
social. O tempo da falta e da escassez pede para ficar no passado, mas o mundo
do capital mantém a fome e o desemprego! Embora seja imoral a exploração do
homem pelo homem, ela tinha um sentido histórico, pois a abundância antes nunca
era suficiente para todos no escravismo, ou no feudalismo, ou no capitalismo
até há poucas décadas. Agora, tudo mudou. Temos uma superprodução crônica
latente, crises cada vez mais duras de superprodução de capital e de
mercadorias, todos os poros e cantos do mundo estão possuídos pelo mercado.
Que as
máquinas trabalhem no nosso lugar! A última revolução industrial empurra para
encerrar a era de produção de valor por meio do trabalho manual explorado; os
robôs e as máquinas automatizadas podem trabalhar duro para nós, por nós; mas,
sob o capitalismo, a introdução da moderna tecnologia produz desemprego
crônico, expulsão de operários das empresas. De um lado, muito mais produtos
por causa da produção alta permitida pelas máquinas, e, de outro, muito mais
desempregados sem condições de consumir – a conta não fecha!
A internet e
a informática, juntas com a robótica e a automação, permitem uma produção
organizada, planificada, planejada – evitando tanto o desperdício e o excesso
fontes de duras crises quanto a falta, ou seja, a demanda será igual à oferta.
Com a computação, a produção automatizada produzirá exato de acordo com a
demanda, um pouco a mais para ter estoques em caso de aumento repentino da
procura. Assim, teremos uma economia científica e estável, baseada em
protocolos e dados.
As empresas
ainda com trabalho manual serão estatais, geridas pelos próprios operários em
democracia direta – e de acordo com um plano geral da economia. Serão eleitos
em assembleia os poucos representantes de direção da fábrica, com salários
limitados e mandatos perdíveis a qualquer instante se assim os funcionários em
assembleia decidirem.
Para haver
democracia operária e popular, sempre é necessário tempo livre e energia aos
cidadãos, nunca esgotamento por longo trabalho. Por isso, desemprego zero! A
jornada de trabalho, que será reduzida de imediato – por exemplo, para 30 ou 20
horas semanais –, será móvel, com o mesmo salário; isto é, se o desemprego
aumenta, logo reduzimos a jornada para todos trabalharem; se a demanda da
produção por trabalho aumenta, logo aumenta um tanto e pouco a jornada para a
sociedade manter o equilíbrio.
Apenas com o
início da automação e da informática o socialismo, sua democracia e sua
economia racional, tornou-se possível. Em resumo, o comunismo avançado e
consolidado será, grosso modo, isto: as máquinas trabalham – nós cuidamos da
comunidade já que temos imenso tempo livre.
O socialismo
acelerará a substituição do trabalhador pela máquina, dando mais produtos e
mais tempo livre ao ser humano. Já o capitalismo impede a plena robotização da produção,
pois prefere manter o trabalhador ativo para lhe pagar salários baixíssimos com
jornadas extensas ou intensas. Sob o capital, a automação impede a automação –
pois a introdução da moderna maquinaria demite operários, que, desempregados,
fazem aumentar a oferta de força de trabalho, logo seu preço – o salário – cai,
compensando manter o trabalho manual barato no lugar de implementar de vez a
nova tecnologia.
Afastando-se
cada vez mais do trabalho manual na produção material, os cidadãos dedicarão mais
tempo livre para a família, para a arte, para o ócio, para cuidar do Estado,
para o setor de serviços como educação e saúde.
O
crescimento da produção primitiva foi a base do surgimento do escravismo
antigo. Depois, os problemas de produção no escravismo foram a base para a
então nova produção feudalista, mais ainda produtiva. Em seguida, o avanço da
produtividade feudal foi a base para a produção capitalista. A altíssima
produção no capitalismo põe, por sua vez, em crise a sociedade do mercado, como
veremos.
DISTRIBUIÇÃO
E A CRISE DO DINHEIRO
O dinheiro é
o verdadeiro Deus de nossa sociedade, domina todas as nossas vontades e
valores. Parece, portanto, impensável uma sociedade sem ele, sem esse demônio.
O escravismo e o feudalismo, porém, baseavam-se na distribuição somente de
produtos, não de mercadorias. Por outro lado, o sistema de preço, o mercado,
faz todo sentido apenas em sociedades de baixa abundância, quando existe falta
real; mas, quando surgiu a altíssima produtividade em nossa época, o preço e o
comércio deixam de ser uma força social positiva – o preço, o valor, não se
realiza!
No
socialismo, os atuais grandes supermercados, estatizados, sob gestão popular,
serão a primeira forma social de distribuição gratuita dos produtos – que no começo,
apenas no início, serão ainda mercadorias já que ainda precificadas.
O que for
produzido de maneira científica com a ajuda da alta tecnologia, será
distribuído de modo científico, como trens e caminhões de direção automática.
Todo cidadão terá um cartão magnético ou dados em aplicativo de celular
comprovando que foi útil para com sua comunidade, ao trabalhar ou ao estudar,
assim tendo acesso gratuito aos produtos nos depósitos sociais presentes em
cada bairro. Os produtos não serão mercadorias, pois não terão preço. Ou
melhor: os dados magnéticos e eletrônicos entregues nos depósitos, de modo
algum serão dinheiro, pois não circularão nem se acumularão em poucas mãos –
apenas dirão ao centro de comando virtual que um tipo específico de produto
saiu dos estoques sociais, logo sendo reposto. O dinheiro, este inimigo da
humanidade, que nos torna escravos das coisas, é tanto ele mesmo quanto sua
própria acumulação. O dinheiro tem por natureza sua acumular-se, dinheiro em
busca de mais de si; por isso ele deve deixar de existir no socialismo – o
dinheiro desconhece limites. O mundo dos homens deve dominar, de modo planejado
e unificado, o mundo das coisas.
Na medida em
que aumentam a produtividade e a quantidade de trocas, a história do dinheiro
aponta para seu próprio fim. Tornou-se cada vez mais material: primeiro, ferro;
depois, bronze; depois, prata; depois, ouro – para, em seguida, ir para a
desmaterialização: de ouro para prata, para bronze, para papel, para bits
(elétrons) quase imateriais. Em nosso tempo, o dinheiro é fictício, mantido de
modo artificial pelo Estado capitalista, um papel pintado, ou menos que isso,
quase nada. O dinheiro, hoje, é um nada que é, porém, tudo. O moeda em papel e
tanto mais, hoje, quando eletrônico não tem medida, pode ser criado, e
destruído, com imensa facilidade, sem limites aparentes, o que é o mais
poderoso sintoma de seu futuro fim. Como o sistema anterior dá base para o
sistema posterior e superior, o dinheiro virtual de nossa época com internet
permite o controle científico do consumo e dos estoques sociais no comunismo.
Mudanças
radicais no modo de vida ou mesmo a crise do escravismo romano e da servidão
feudal foram acompanhadas do alto endividamento, uma das bases de crises
sistêmicas. No capitalismo, ocorre do seguinte modo: temos a constante ameaça
de uma superprodução crônica, por isso o capital e os governos apostam no
endividamento para estimular o consumo, para escoar as mercadorias. Temos,
portanto, assalariados, governos e empresas muito endividados, sem condições de
pagar aos agiotas. Então, exigimos a anulação total e irrestrita da dívida dos
trabalhadores e pequenos empresários nem que seja necessário para isso
estatizar todo o sistema financeiro. A dívida do Estado também deve, por isso,
ser boicotada.
O grande
endividamento capitalista tem um segredo socialista. Como dissemos, graças à
grande abundância, não haverá no futuro o dinheiro entre o cidadão trabalhador
e o produto estocado. Hoje, a superprodução crônica latente de capitais e de
mercadorias leva ao estímulo de consumo por meio da dívida, por meio de
pagamento, ou seja, recebe-se o produto sem dar de imediato o dinheiro ou todo
o dinheiro do preço daquela mercadoria. Ora, a grande ausência do dinheiro nas
trocas imediatas, hoje, na forma de dívida, de promessa de pagamento apenas no
futuro, torna-se o sintoma oculto da completa ausência futura do dinheiro na
sociedade. Em ambos o casos, no socialismo e no endividamento capitalista, por
causa da alta produtividade, base do fim dos preços.
OS PRODUTOS
Em sua
última era, o capital fragiliza os produtos, diminui suas qualidades e
resistências em nome da quantidade maior para venda. Mercadorias cujo uso
poderia durar longos anos, são feitos para quebrarem logo e forçar nova compra
similar. Para preservar a renda dos trabalhadores e o meio ambiente, o
socialismo tomará medidas sobre a qualidade das coisas produzidas como aumento
da durabilidade, virtualização do que for possível, redução de tamanho e da
materialidade naquilo onde for viável de modo positivo.
Hoje, há
humanização das coisas na proporção da desumanização dos homens. Há valorização
das coisas na proporção da desvalorização dos homens. Há integração das coisas
– a internet! – na proporção da fragmentação dos homens. Há ganho de
características das coisas na proporção da unilateralização dos homens e de
seus pensamentos. Há ganho de cognição das coisas (inteligência artificial
etc.) na proporção da perda cognitiva dos homens. Há ganho de poesia e estética
das coisas na proporção da brutalização
dos homens. É necessário desvirar o mundo!
O socialismo
passa longe de ser um voto de pobreza: queremos que todo o povo tenha acesso a
uma vida digna, com os produtos comuns da sociedade – sempre respeitando os
limites dos ciclos da natureza.
CRISE DOS CUSTOS
IMPRODUTIVOS
A
concentração de humanos em grandes cidades com baixa qualidade de vida leva a
sociedade e o Estado a elevarem os custos de manutenção do modo de vida atual.
Assim, por exemplo, diante da desigualdade, o aparato da polícia deve crescer,
o que é um custo parasitário. Mas, no socialismo, com o fim da pobreza e o povo
armado, um grande aparato de segurança será desnecessário socialmente.
Apenas na
produção material se faz o valor de uso, a coisa, e o valor, a riqueza de nosso
tempo, como energia invisível nos objetos. Em nossa época, pelas causas acima,
serviços que não produzem nem objetos nem valor sugam de modo parasita parte do
valor global e disputam lucro sem dar, em troca, mais da riqueza econômica de
nossa época. O setor de serviços, superinflado, disputa lucro, e dinheiro,
contra a origem da riqueza, a produção. Apenas no socialismo muitas formas de
serviços deixarão de existir, como segurança privada, ou serão mais baratas.
A luta e a
concorrência entre poderosas empresas de monopólio forçam umas às outras, e
vice-versa, a aumentar muito os falsos custos de produção, custos improdutivos,
como capatazes, mais gerentes, setor de propaganda, espionagem e
contraespionagem industrial etc. O socialismo encerrará ou diminuirá tais
custos ao colocar a cooperação acima da disputa. Por exemplo, a vigilância
sobre o trabalhador será desnecessária porque será ele mesmo disciplinado por
si, ao ganhar salário por peça produzida, e por seus colegas; o custo com
propaganda será quase nulo, se existir; a espionagem empresarial será algo do
passado já que as empresas concorrentes estarão unificadas.
No
escravismo romano, a ampliação dos campos de trabalho forçado exigia também
aumento dos custos improdutivos com o controle prático da vida; mais capatazes,
mais soldados, mais burocratas etc. eram necessários para vigiar a quantidade
maior de escravos e a extensão acrescida da propriedade. No capitalismo com
concorrência de monopólio, as empresas em luta encarniçada forçam umas às
outras a acrescentar falsos custos de produção para vencer suas guerras
mercantis. No caso escravagista, a solução foi encontrada em outro modo de
vida, superior, o feudalismo, pois o antigo escravo passa a ser um servo, mais
livre, dono de suas próprias ferramentas e direito a plantar uma parte da terra
para si; a então nova sociedade superou custos improdutivos da sociedade
anterior, pois, por exemplo, tornou-se desnecessário uma vigilância tão direta
sobre a classe dominada, sobre o trabalhador. Do mesmo modo, o socialismo
reduzirá ou encerrará muitos dos custos improdutivos, capitalistas, nas
empresas e na sociedade.
URBANIZAÇÃO
A crise
sistêmica do império escravista romano teve como um dentre seus eixos a alta
urbanização. O fim do feudalismo na Europa também conheceu aumento da
urbanidade. As grandes cidades unem uma quantidade enorme de explorados e
oprimidos, logo temos cenário que facilita rebeliões e revoluções. No capitalismo
recente, pela primeira vez na história, temos mais pessoas na cidade que no
campo, e mundo urbano é a casa da democracia socialista, direta e
participativa. As revoltas tornam-se mais fortes e com as muitas exigências
“urbanas”, de salários ao saneamento passando por transporte.
No
socialismo, a urbanidade será organizada, planejada. É muito provável que em
cada bairro teremos um centro, de caráter social, onde estarão restaurantes,
lavanderias, creches, escolas, postos de saúde, praça, locais de esporte,
cinema, palco, espaço de assembleia do bairro, depósitos de produtos e assim
por diante – todos públicos, gratuitos e de qualidade. Em muitos casos, ao
redor de tal centro; as casas serão, de modo voluntário, substituídas por
espaçosos apartamentos dotados de varanda, paredes grossas, personalizados, com
todos os serviços residenciais necessários, semelhante ao que hoje é apenas
luxo.
De imediato,
há muitas casas sem gente – e muita gente sem casa. Prédios e moradias estão
sem função social alguma, nas mãos dos bancos e dos especuladores. Logo em seu
início, o governo comunista garantirá a distribuição de todas as habitações
disponíveis, antes nas mãos de poderosos, para os seus cidadãos. O problema da
habitação terá fim imediato.
CRISE DAS
CLASSES SOCIAIS
Um dos
objetivos do socialismo é o fim da divisão da humanidade em classes sociais, em
ricos e pobres, em patrões e assalariados. Queremos o fim da exploração do
homem pelo homem! Isso é antecipado sob o capitalismo de duas formas: 1) o
desenvolvimento das empresas afasta o investidor da administração real do
negócio, tornando-o mero acionista, sem relação prática real com a fonte de
riqueza, tornando-se parasita social; por outro lado, 2) a classe operária é
afastada da produção por máquinas automatizadas e robotizadas, gerando duro
desemprego e dificuldade de realizar-se enquanto classe. As duas classes
principais da sociedade, a burguesia e o proletariado, afastam-se da produção e
dos demais setores (comércio virtual, transporte automático etc.). Assim,
estamos mais pertos de tratarmos uns aos outros como indivíduos, sem distinção
de classe, sem sermos julgados pelo que temos no bolso.
Por ser
concentrado e por estar na produção, as revoluções socialistas tendem a ter, no
começo, liderança do operariado. Mas, depois, poderão acorrer revoluções
sociais de liderança popular pela reunião urbana de grandes setores populares,
pela fragilização parcial do operariado em nosso tempo e porque revoluções
vitoriosas facilitam outras revoluções.
No
escravismo antigo, o trabalhador escravizado era tratado como coisa. No
feudalismo, o trabalhador era considerado mais humano, um pouco mais livre, mas
formalmente preso à terra. No capitalismo, somos formalmente – apenas
formalmente livres, um tanto mais livres. No socialismo, seremos
substancialmente livres, de fato libertos; para além da sempre ameaça de
trabalhar ou morrer de fome, de viver para trabalhar no lugar de trabalhar para
viver. Com o aumento da produtividade, na história de nossa espécie, o homem
social é cada vez mais individual, mais pessoal, com mais opções, mais livre. A
divisão da humanidade entre senhor e escravo, senhor feudal e servo, patrão e
assalariado, credor e devedor será algo do passado remoto, um passado de
barbárie, nada natural ou tolerável. A burguesia tornou-se uma classe
desnecessária, fictícia, já não é classe
alguma. Uma fábrica sem trabalhadores é uma fábrica parada – uma fábrica sem
patrão é uma cooperativa, no mínimo. Está na hora da gestão operária, com
assembleias de base regulares e livres de seus funcionários, nas fábricas ainda
não totalmente robotizadas ou automatizadas. A existência de patrões, o homem
escravizando outro homem, tornou-se desnecessária! Lucro é roubo!
UM PLANETA
SEM FRONTEIRAS
Na
antiguidade europeia, todos os caminhos levavam à Roma escravista; mas o
crescimento enorme de seu território exigiu mais do Estado e do exército,
levando à instabilidade, um dos fatores de sua crise sistêmica. Na crise
sistêmica do feudalismo, os feudos e os pequenos principados feudais foram
atacados pela pulsão da então nova sociabilidade, a capitalista, levando à
formação de estados nacionais unificados.
O capital
não tem pátria. As condições para a humanidade unificar-se como espécie, como
indivíduos iguais na diferença e livres, estão dadas. O mercado está em todo
canto, as fronteiras mal resistem à integração internacional. Assim, o
capitalismo antecipa dentro de si o caráter planetário da próxima sociedade.
Bastará, então, o poder operário e popular mundial, radicalmente democrático,
para concluir tal tarefa.
Por
enquanto, vivemos tempos de conflito armado. A guerra é a continuação da
economia por outros meios. Portanto, a luta entre os países por mercados e por
qual nação será a casa prioritária do capital, levará a guerras cada vez mais
duras, talvez uma guerra mundial. Deveremos boicotar este crime tanto do lado
dos velhos imperialistas quanto dos novos candidatos à nação dominante. Não há
motivos para que um trabalhador mate outro trabalhador em nome dos desejos de
lucro dos patrões de seu país.
A revolução
tende a começar em um país apenas, um relativamente atrasado em geral, e vai-se
espalhando por todo o globo terrestre em poucas décadas. Mas a vitória nunca
está garantida: para facilitar o sucesso da humanidade, os trabalhadores
conscientes de todos os países devem se unir num partido mundial da revolução.
O socialismo
apenas poderá existir se se consolidar em todo o mundo em poucas décadas, pois
recua aquilo que deixa de avançar. Uma dentre as vantagens do capitalismo sobre
os sistemas anteriores é seu caráter mundial; junto disso, a matéria-prima, a
tecnologia e o conhecimento são desigualmente distribuídos em todo o mundo. A
integração internacional completa é urgente para um modo de vida que tem de ser
superior ao mundo do capital. O socialismo será planetário, ou não conseguirá
existir isolado.
Neste campo,
seguimos o seguinte princípio: 1) queremos unidade humana, logo militamos
contra a separação dos povos; mas, 1) se um povo decide livremente por
separar-se, logo defendemos com unhas e dentes seu direito de independência.
A pátria dos
trabalhadores é o mundo!
O COLAPSO
AMBIENTAL
No Egito
antigo, em seu auge, a forma crescente e em monocultura de plantar à beira do
rio Nilo gerou uma sequência de crises ambientais importantes. Na Roma
escravista antiga, em seu auge, a forma de exploração da terra levava ao seu
esgotamento e à perda da produtividade. Isso foi resolvido apenas com o próximo
sistema, o feudal, que colocava uma parte da terra para descansar no ano
enquanto usava outras. No entanto, o aumento da quantidade de feudos, no auge
de tal sistema, destruiu florestas e nascentes de rios, o que produziu nova
crise ambiental. Do mesmo modo, mas muito mais intenso, o capitalismo em seu
auge também produz dura crise do meio ambiente. Apenas podemos salvar a
natureza e a espécie humana se destruirmos a causa do problema, o capital: o
dinheiro, além de não ter pátria, não conhece limite algum – a concorrência e a
atração pelo lucro forçam a desconsiderar os custos ambientais necessários na
sociedade. Por isso, socialismo ou extinção! Se a sociedade obriga grandes
empresas privadas a tomarem todas as medidas necessárias, muitas delas
faliriam, gerando dura crise econômica. Ou defende-se o meio ambiente ou
defende-se a propriedade privada. A crise do capital e o socialismo lembrarão
ao homem que a natureza não está fora dele, mas é ele mesmo parte dela.
A economia
planejada, sem concorrência, do socialismo tomará medidas como: medidas
ambientais obrigatórias, reciclar e reutilizar a maior parte do material que
hoje torna-se lixo, aumentar muito a resistência dos produtos, investir com
prioridade máxima em fontes limpas de energia. Tais medidas, se tomadas hoje
sob capital, gerariam duras contradições, falências, conflitos, desemprego etc.
Ou muda-se tudo ou nada muda. O capitalismo é como um canibal faminto que
devora o próprio braço. Se, por exemplo, a lâmpada que dura hoje 3 meses
passar, por mudanças em sua forma, a durar 15 anos ou mais, as empresas
produtoras da mercadoria faliriam por falta de procura, o que geraria
desemprego e crise. Apenas a economia planejada típica do socialismo pode
garantir tal resistência alta do produto, levando os trabalhadores, que seriam
desempregados, para empregos ainda melhores e com bons salários. Se
reutilizarmos e reciclarmos a maior parte do que hoje é perigoso lixo, várias
empresas produtoras de matéria-prima, insumos, faliriam, o que geraria
desemprego e crise. De novo, apenas o socialismo pode organizar sociedade de
modo a reduzir ainda mais a jornada de trabalho, impedindo o desemprego. Apenas
uma sociedade superior pode respeitar os ciclos e os metabolismos da natureza.
RISCO DE
EPIDEMIAS E PANDEMIAS
O auge-crise
do escravismo romano produziu suas epidemias. Depois, o auge do feudalismo
produziu pandemias violentas. Agora, o auge do capitalismo produz pandemias
mais uma vez, como repetição das crises sistêmicas em todas as épocas. A causa
geral é a urbanização e a integração combinada com desigualdade social, com
pobreza. No capitalismo, temos fatores adicionais como armas biológicas, os
transportes avançados (veja-se que a aviação comercial é recentíssima), a
alimentação artificial, o descongelamento de calotas polares fazendo ressurgir
antigos riscos microbianos etc. A mudança revolucionária da sociedade, como a
elevação geral da qualidade de vida e da educação de higiene, diminuirá muito o
risco de pandemias, junto com um a sistema unificado e mundial de saúde
pública, gratuita e de qualidade.
CRISE DAS
MENTALIDADES – CRISE MORAL
Uma onda de
depressão e suicídio cobre o mundo. O declínio geral da psique revela-se no
salto para a morte de operários na China, na depressão e isolamento no Japão,
nos muitos problemas mentais na caótica São Paulo. Isso demonstra como a cabeça
segue o chão que os pés pisam: as duras crises econômicas e sistêmicas geram
dificuldades que deterioram a saúde mental da maioria.
A essência
humana sob o capitalismo é guiado pelo dinheiro; somos, portanto, egoístas,
concorrenciais e acumuladores de bens para sobreviver na selva de concreto. Mas
tal natureza social entra em contradição com nossa natureza real, natural; pois
somos, no fundo, seres integrados, seres mutualistas, nem egoístas nem
altruístas, e seres ativos, ou seja, criativos e afirmadores de si próprios. O
inferno é falta do outro, mas nunca estivemos tão isolados.
O
capitalismo promete alta felicidade caso acessemos as mercadorias, mas frustra
o tempo todo nossas tentativas de acessá-las – eis a contradição. A sociedade
socialista garantirá a paz psicológica ao garantir emprego, baixa jornada de
trabalho, espaço de lazer e esportes, bela urbanização, estabilidade, convívio,
serviços públicos amplos e eficientes. Mudando o modo de vida, mudamos a
psicologia, pois a matéria determina a ideia.
O Dinheiro é
a fixação mental da nossa época, nossa tara monotemática. Assim, diante da
decadência social, hoje temos uma luta ainda mais forte de todos contra todos –
mas nenhuma sociedade pode se manter por muito tempo sem uma boa ética. A
disputa moral, ética, faz parte da luta socialista.
A decadência
do modo de vida escravista na Roma antiga produziu declínio da mentalidade na
época, junto com uso amplo do chumbo. No final do feudalismo, a decadência sistêmica
também gerou decadência mental, junto com a contradição entre impulsos novos ou
maiores e a dura repressão religiosa conservadora. O declínio da mente sob o
mundo do dinheiro, hoje, consegue ser ainda mais degenerativo. Vivemos tempos
de forma sem conteúdo, café descafeinado, mercadoria sem valor, arte sem
mensagem, trabalho sem sentido, suco artificial, indivíduo sem pulsão. É o
jarro vazio de nossa época, que deve ser combatida e revolucionada por um modo
de vida pleno de sentido. Por enquanto, insistimos, o fracasso pessoal quase
nunca é culpa do indivíduo isolado.
CRISE DA
ARTE
Com a arte
múltipla do cinema, da TV e dos jogos de videogame, além da internet, que funde
diferentes artes, que é fruto do desenvolvimento técnico, as outras formas artísticas
entram em decadência, tornaram-se menos necessárias. Os artistas oficiais
compensam isso com o bizarro, com a forma pela forma, matéria pela matéria,
novidade pela novidade, e, ao mesmo tempo, podem fazer algo ruim e sem esforço
real e finalista porque, afinal, ninguém consome seus produtos. Temos a falsa
arte, a ficção da ficção; se, ao sair de dentro de um museu de arte
contemporânea, o visitante tem a sensação de que não entendeu muito bem o
exposto, na verdade nada havia a entender, nenhum conteúdo havia. A solução
para a crise artística é elevar a cultura geral do povo, aumentando a
quantidade de artistas e a quantidade de gente sensível para os diferentes
modos de arte. Somente o socialismo pode garantir educação e tempo livre para
tal avanço. Não haverá poesia na vida enquanto houver burguesia!
Para os
marxistas, a arte deve ser livre tanto de imposições financeiras quanto de
políticas. Valorizamos os artistas esforçados que fazem denúncias sociais, mas
nunca impomos nossos valores aos poetas, pintores, cineastas etc. Propomos aos
artistas independentes e revolucionários a formação de uma associação
internacional própria. Liberdade da arte – para a revolução! O socialismo trará
a todos o direito não só ao pão, mas também à poesia!
CRISE DA
FAMÍLIA MONOGÂMICA
No
capitalismo, a família é uma ficção, uma fraude, uma fonte de traumas e
conflitos constantes. Por exemplo, os pais mal acompanham o desenvolvimento dos
filhos, pois guiam todo tempo ao trabalho ou a algo relacionado a manter a casa
em pé. O socialismo não acabará com a família, antes fundará uma nova e mais
saudável, que respeite as mulheres e os filhos. A crise da família monogâmica
burguesa já trouxe algumas vantagens: sexo causal, relacionamentos com duração
somente enquanto haja amor recíproco, mais diretos às mulheres, mais liberdade
aos homens quanto aos seus perfis pessoais etc. Entre as causas dessa crise
estão a entrada da mulher no mercado de trabalho, a altíssima urbanização
reduzindo o controle social dos perfis, a existência de ferramentas como
pílulas anticoncepcionais etc. O nome político do amor chama-se socialismo. Ao
garantir qualidade de vida aos indivíduos, os casamentos serão apenas por amor
e durarão apenas enquanto este durar.
A LUTA
CONTRA AS OPRESSÕES
Os
capitalistas precisam dividir os trabalhadores para conquistar o lucro. As
mulheres, os negros, os jovens, os estrangeiros e os homossexuais da classe que
carrega o futuro nas mãos serão os mais beneficiados pelo socialismo, por isso
tendem a ser os mais dedicados à causa revolucionária. O desenvolvimento
técnico – como a entrada da mulher no mercado de trabalho e a criação de
anticoncepcionais – e a urbanização alta – facilitando rebeliões ao reunir
grande número absoluto de oprimidos e diminuindo o controle coletivo sobre as
individualidades – colocam em crise a imposição das opressões.
Não há
capitalismo sem machismo. A opressão do homem sobre o homem começou com a
opressão do homem sobre a mulher, pois a propriedade privada levou a que os
homens da classe dominante soubessem quem era seus descendentes, que herdariam
a riqueza.
Não há
capitalismo sem racismo. Enquanto o machismo inicia com a fundação das classes
sociais no mundo antigo, o racismo é fruto maldito do capitalismo, pois era
preciso justificar a escravização de homens e mulheres africanos com o
argumento da pele inferior. O trabalhador branco apenas será livre quando o
negro também o for.
Não há
capitalismo sem homofobia. O preconceito contra outras formas de sexualidade
inicia quando as classes dominantes antigas necessitaram do crescimento
populacional de seu povo.
Não há
capitalismo sem xenofobia, rejeição ao estrangeiro. O capitalismo precisa da má
condição de vida ao trabalhador vindo de outro país, imigrante, para pagar
baixos salários, reduzir os salários gerais e colocar os assalariados uns
contra os outros. Paz entre nós, guerras contra os senhores! O ódio contra
membros de outra nacionalidade também justifica idelogicamente a guerra por
lucro de uma contra outra nação.
O feminismo
marxista, por exemplo, operário e popular, difere-se radicalmente do feminismo
de classe média. Este foca na linguagem e no individual, nos cargos. O
feminismo comunista é mais responsável e maduro, próprio da mulher
trabalhadora, que precisa, além da liberdade de vestimentas, de creches, de
lavanderias e de restaurantes públicos, gratuitos e de qualidade.
O feminismo
burguês foca em dar cargos e poder às mulheres. Para o feminismo marxista, além
de destaque feminino, é urgente destruir o próprio poder, o cargo, inevitavelmente
machista, racista e homofóbico – mesmo se liderado por uma mulher, por um
negro, por um homossexual. Por exemplo: quase impossível que a maioria das
grandes patroas ofereçam creches gratuitas às suas funcionárias, pois isso lhes
tira lucro e vantagens sobre os concorrentes.
Apenas o
socialismo pode consolidar diretos aos setores oprimidos.
DESPOTISMO
ESCLARECIDO BURGUÊS
Quando o
sistema escravista romano entrou em crise, o poder estatal estatizou a
religiosidade dos escravos, a fé cristã, como forma de evitar as inevitáveis
revoltas dos trabalhadores. Quando o feudalismo estava decadente, ao parir o
capitalismo por dentro de si, o absolutismo tornou-se “esclarecido”: unificou
impostos e o território, aprovou leis comerciais, criou um parlamento limitado
– isso para agradar a nova classe ainda não dominante, a burguesia. Do mesmo
modo, o capitalismo decadente em seu auge produz um despotismo esclarecido.
O despotismo
esclarecido de nossa época serve para 1) aumentar a produtividade dos trabalhadores;
2) aumentar a passividade destes. É caso da eleição de um negro para a
presidência dos EUA, a vitória de partidos de esquerda nas eleições a partir do
século 20, a legalização e estatização dos sindicatos, a esquerdização recente
da Igreja Católica, o operário ter direito a pequenas ações da empresa em que
trabalha e participação nos lucros e resultados, além de eleger um diretor da
corporação, ou o uso atual da falsa e corrupta democracia dos ricos para
substituir a luta social pelo voto passivo. Porque as bases do socialismo
provável estão maduras, porque há crise em todo canto; a classe dominante, os
grandes patrões e os governos, usam da falsificação e do teatro para atrair os
trabalhadores e o povo. Governos “socialistas”, “operários”, “anti-imperialistas”,
“de esquerda”, “progressivos” enganam a nação para evitar a mudança socialista
do país, para manter de pé o Estado dos patrões.
CRISE DO
ESTADO BURGUÊS
No
escravismo romano, o crescimento do número de terras e de escravos, exigia mais
impostos, exigia retirar mais dos frutos do trabalho manual para sustentar
funcionários e soldados, além de guerras e lutas contra as revoltas
antiescravistas. O sistema todo começou a entrar em colapso. Também no fim do
feudalismo, o crescimento da urbanidade e das revoltas, exigiu mais do Estado,
que ruiu, dando lugar ao estado capitalista. Agora, o Estado burguês é corroído
pela própria lógica de lucro, na medida em que a taxa de lucratividade tende a
zero nas próximas décadas; pois: o problema de lucro exige 1) reduzir impostos
sobre os ricos e aumentar sobre os pobres, 2) privatizar empresas estatais, 3)
os custos de manter a sociedade em funcionamento (os serviços) aumentam com a
urbanização elevada, 4) as empresas de guerra tornaram-se poderosas e por isso
influenciam o governo rumo ao conflito, 5) a dívida pública tende a aumentar
continuamente para o Estado enfrentar as crises e a urbanidade, 6) o
desenvolvimento das comunicações e transportes facilita o capital não ter
pátria e fluir com facilidade de um pais a outro, 7) a integração planetária
sob o capitalismo transforma uns países
subordinados a outros como com a perda da emissão de moeda própria.
Com a
destruição e substituição do aparelho burguês, o Estado socialista será
radicalmente democrático: assembleias, conselhos, existirão em todos os bairros
e locais de trabalho. Os cidadãos votarão tudo o necessário em tais reuniões
periódicas; depois de decidido o central, elegerão membros para cuidar do
cotidiano dos conselhos e garantir a aplicação daquilo aprovado. Tais
representantes 1) poderão perder o mandato a qualquer momento se assim a
próxima assembleia obrigatória decidir; 2) não ganharão um salário muito mais
alto em relação aos seus representados; 3) em alguns casos, a eleição será por
sorteio regular, não por voto. Tais conselhos serão criados também na cidade,
no país e na esfera internacional. Votações por internet serão comuns; também
no mundo virtual, além da TV, todas as correntes e partidos terão liberdade de
defender suas ideias, de tentar ser maioria. Isso substitui a farsa da
democracia atual, degenerada e serviçal dos ricos, quando o povo até vota, mas
não decide. A pior democracia é mil vezes melhor que a mais branda ditadura;
mas não é suficiente – apenas com liberdade real, sem ricos e pobres, haverá
democracia real.
Como no
socialismo ainda haverá classes sociais e muitos setores de classe, será
impossível um governo de todo técnico – porém podemos antecipar isso. Ao lado
de um parlamento eleito e com mandatos perdíveis a qualquer momento, sem
privilégios salariais; deve-se formar um parlamento científico com cargos
assumidos por eleição, por concurso e por votação desta mesma instituição que
reunirá cientistas, engenheiros, especialistas, estatísticos etc., ou seja, a
nata intelectual e criativa do país. Eles cuidarão dos planejamos de longo
prazo – 5, 10, 30 anos –, além de pensarem leis e medidas que serão aprovadas
ou negadas pelo outro parlamento.
Ao
concentrar o grosso das grandes empresas nas mãos do Estado, este poderá se
financiar com imensa facilidade (além de criar dinheiro virtual com facilidade,
enquanto esta coisa existir, o que deve ser breve). Além disso, muitos custos
estatais para manter a sociedade serão reduzidos, como a força policial muito
menor ou mesmo inexistente diante da qualidade de vida geral e do povo armado.
De imediato,
nos primeiros anos da revolução, os impostos – que serão, em geral, sobre renda
e lucro, não sobre consumo (dos artigos básicos) – serão reduzidos sobre os
trabalhadores e a classe média, e será crescente sobre os ricos. Artigos de
luxo serão pesadamente taxados para financiar a moderna indústria socialista de
consumo popular; haverá proibição de herdar riquezas, além de pesados impostos
sobre grandes heranças; imposto alto sobre lucros e dividendos empresariais;
impostos sobre a exportação de certos produtos vitais e sobre importação de
certos concorrentes; imposto altíssimo sobre remessas de dinheiro para o
exterior; importante e progressivo imposto sobre grandes empresas privadas de
serviços e seus lucros – saúde, educação, alimentação etc. – para financiar
serviços gratuitos e públicos do mesmo tipo, enfrentado de frente a tendência
de privatização desse setor; o fim do pagamento da dívida pública, que pertence
apenas ao Estado anterior, que faliu. Temos vários exemplos de como tirar dos
ricos e melhorar a vida da classe trabalhadora, do povo e do novo Estado nos
primeiro anos do novo modo de vida. Mas tais soluções, que devem ser exigidas
já no capitalismo, ainda assim, são temporárias, pois o processo
aprofundar-se-á, por exemplo, com a estatização das maiores empresas e com o
fim do dinheiro.
Não é
possível haver democracia real aonde a sociedade está fraturada entre ricos e
pobres, dominantes e dominados. Mais: os trabalhadores passam quase o dia
inteiro dentro das empresas cujos destinos afetam toda sua vida, logo deve
existir máxima democracia nos locais de trabalho e nas fábricas; os operários
têm o direito, por seu esforço disciplinado e diário, de votar os rumos da
economia onde trabalham. A falsa democracia atual é apenas uma forma de os
pobres não matarem os ricos. A democracia escravista antiga, fundada na Grécia,
excluía os escravos. O feudalismo, por ser rural, não dava espaço às formas
democráticas; mas, no seu fim, viu-se obrigada a abrir um parlamento apenas
parcial. O objetivo da burguesia era similar à democracia dos ricos antigos,
apenas homens endinheirados votarem. A luta dos trabalhadores permitiu que eles
mesmos e as mulheres votassem, além de conseguir com muita luta formar seus
próprios partidos operários e sindicatos. A democracia socialista será a forma
mais profunda e completa de democracia existente, a democracia de fato, por
onde o povo governará.
CRISE DO
APARATO MILITAR
O aparato e
o modo militar romano, causa de sua glória escravista, foi também um fardo de
modelo que o levou às derrotas e ao seu fim. O feudalismo resolve isso com
muralhas de castelos e grupos de defesa locais. No fim da era feudal, os
defensores do então novo sistema, o capitalismo, fundaram modos de guerra
novos: o novo exército na Inglaterra, que se baseou no mérito no lugar do
medieval posto de comando por sangue; Bonaparte inaugurou o serviço militar
obrigatório, o abastecimento de tropas nas cidades por onde passavam etc. Mas o
sistema militar burguês também encontra sua crise, seu limite, após largo
desenvolvimento. A luta entre Estados força investir na artilharia e em
máquinas; mas, na história humana, aqueles que investiram mais em outros
setores do que na infantaria, nos soldados, conheceram quase sempre a desgraça
– ao fortalecerem-se para enfrentar uns aos outros, facilitam um tanto a
vitória de exércitos revolucionários e das revoluções. Máquinas caras e
modernas podem ser danificadas por armas e munições baratas ou semicaseiras, além
do alto custo de manutenção, abastecimento e especialização de operadores. Em
nossa época, depois de duas grandes guerras mundiais, o conflito armado não
revolucionário ou não anti-império perde sentido na cabeça dos cidadãos. Um
sistema de milícias operárias e populares, com todo o povo trabalhador armado
com leves e pesados calibres, substituindo os aparatos militares, surgirá após
a dissolução do exército revolucionário e ao mesmo tempo deste.
Na
revolução, os trabalhadores lutam apenas por reformas, para melhorar suas
condições, para levar dignidade ao país de modo sempre pacífico. Quando a
burguesia vê que vai perder a luta geral sem sangue algum, toma a decisão de
usar o exército e os bandos fascistas para derrotar o movimento dos
trabalhadores com métodos de guerra civil. Sempre são os grandes patrões e seu
Estado que cruzam a linha, passam do limite, iniciam a violência contra os
assalariados desarmados. Assim, eles obrigam os operários e setores populares a
se defenderem para manter-se vivos e melhorar de vez sua nação. O exército
racha ao meio, uma parte da baixa patente vai para o lado da revolução. Nessas
condições, ou muda tudo ou nada muda. Toda revolução é impossível – até que se
torne inevitável.
CRISE
CIENTÍFICA
A filosofia
antiga quase estagnou nas obras de Aristóteles e Platão. Depois, o pensamento
medieval entrou em crise com as descobertas vindas do desenvolvimento inicial
do capitalismo. Nos últimos 500 anos, experimentamos verdadeiras revoluções
científicas, que agora estagnaram mais uma vez. A etapa burguesa da ciência,
que foi progressiva em geral, escolheu o caminho do menor esforço, qual seja,
saber o “como” funciona o mundo, mas não o motivo, o “porquê”. Agora que
sabemos a maior parte das leis gerais, chega a hora de saber a razão de tais
leis.
Nunca
tivemos tantos doutores em filosofia, e nunca eles foram tão inúteis! A maioria
dos artigos, teses e dissertações “científicas” são descartáveis, imprestáveis,
enquanto uma cientificidade que foge das questões gerais e centrais surge. Isso
começa com a educação de base. O desenvolvimento tecnológico permite elevar a
educação, como a autoeducação parcial do aluno via internet, mas torna
desnecessário ao capital o trabalho qualificado, o que desestimula investimento
educacional. Os países dominantes oferecem educação melhor ou atraem para si as
poucas grandes mentes da humanidade, ao mesmo tempo, a maioria tem cultura
limitada em meio à sociedade tecnológica. Eis outra contradição.
Um das bases
do socialismo é termos a condição de percebermos isto: somos um modo de o
cosmos conhecer a si mesmo. Para haver socialismo, devemos saber as leis gerais
e a história do universo, pois isso tem repercussões técnicas e filosóficas.
Para a
ciência de base sair da estagnação, precisaremos de um novo paradigma
científico, o dialético, que nomeamos empírico-dedutivo. Nós devemos ir direto
aos dados, aos fatos, possíveis e disponíveis para o objeto de estudo – sem
elaborar premissas, postulados, técnicas, conceitos ou hipóteses artificiais.
Mas os dados, além de revelarem, enganam e escondem – as aparências enganam!
Dito isso, usamos a razão para ver o não empírico do empírico, a unidade
interna na diversidade externa, o conteúdo na forma, a essência no aparencial,
para ver o falso nos fatos; pois o essencial é invisível aos olhos.
A
cientificidade antiga, cujo auge foi Aristóteles, dizia: A=A, algo é igual a si
próprio. Esta formulação simples é necessária para conhecer e classificar os
seres, uma lógica de museu. É própria ao começo da ciência. No século 19,
consolidando uma revolução científica, Hegel disse: A=A e não-A. Isso significa
que o infinito e o finito, sendo diferentes, são também o mesmo; forma e
conteúdo são o mesmo; o interno e o externo são o mesmo; massa e energia são o
mesmo (o abstrato é o concreto em processo); espaço e tempo são o mesmo; a luz
é tanto onda quanto partícula. Hoje, podemos preservar as duas fórmulas, uma
dentro da outra, com uma terceira: A=A e… não-A. Na primeira lógica, a formal,
temos, por exemplo, a luta política aqui e a luta econômica ali, separados. Na
velha dialética, sabemos que a luta política é, ao mesmo tempo, luta econômica
e a luta econômica é, também, luta política. Mantendo as duas fórmulas
anteriores, descobrimos com a nova dialética que uma onda de greves econômicas
tornar-se política e, vice-versa, uma grande luta política passa para uma série
de greves econômicas.
É necessário
uma concepção geral de mundo. Tudo (o Ser) é energia em busca de mais energia
ou mais de si, tudo é espaço condensado (concentrado, formas de espaço), tudo é
espaço-matéria, tudo é trabalho, tudo é produção, tudo é histórico em
desenvolvimento e geográfico, tudo é totalidade integrada em automovimento
contraditório. De modo geral: movimento = energia = tempo = espaço = matéria (=
luz = campo = massa). Se tudo é igual a tudo, logo tudo é um, ainda sendo
também diverso. Assim, o cosmo, o Ser, tem três movimentos gerais: 1) toma-se
como energia (espaço) em busca de mais de si, 2) ir-se do simples ao complexo,
3) desenvolve-se em novas interconexões. Junto disso, as categorias centrais do
mundo e, logo, do trabalho científico são totalidade (integração), contradição
(relação) e movimento (espaço-matéria).
As ciências
gerais caíram em erros unilaterais e opostos, o fetichismo (substancialismo
absoluto) e, na outra ponta, o relacionalismo. Para uns, por exemplo, o homem é
determinado pela sua biologia; para outros, os pós-modernos, tudo é construção
social. A verdade está em uma terceira formulação, terceira fórmula, que supera
ambos os erros contrários e extremos.
A verdade é
revolucionária.