Desde o forte protesto nacional de direita no dia 15 de Março, a caracterização de que há uma "onda conservadora" ganhou maior espaço e fôlego. Mais uma expressão para o repertório da esquerda. Não há, porém, como exporemos, base para tal afirmação. O texto, ponto a ponto, visa demonstrar o contrário.
O que, então, explicaria a ação ofensiva das classes médias mais ricas? A resposta encontramos sem dificuldade, a olhos vistos: as lutas em todo o país da classe operária, da juventude e dos setores populares empobrecidos. Tanto em 2013 quanto em 2014 ocorreram milhares de greves. Não só: multiplicaram-se as ocupações urbanas, os protestos estudantis, tivemos as famosas Jornadas de Junho de 2013, as periferias estão mais ousadas. Era de se esperar que, diante de tal instabilidade social, a pequena-burguesia, muito nervosa e temerosa, fosse à ação.
A greve geral da educação no Paraná, as vitórias do metalúrgicos no ABC paulista, a garra e a firmeza dos garis do Rio e dos operários do Comperj, as rebeliões nos call centers são mais do que sintomas ou casualidades. A situação política mudou, alterou-se a nosso favor. A relação social de forças entre as classes é progressiva, mesmo apresentando novos difíceis desafios.
A greve geral da educação no Paraná, as vitórias do metalúrgicos no ABC paulista, a garra e a firmeza dos garis do Rio e dos operários do Comperj, as rebeliões nos call centers são mais do que sintomas ou casualidades. A situação política mudou, alterou-se a nosso favor. A relação social de forças entre as classes é progressiva, mesmo apresentando novos difíceis desafios.
Como sabemos, a contradição e o movimento são leis da realidade. Os últimos anos de unidade pela passividade acabaram em nosso país. Se caminhamos para uma futura revolução, caminhamos, igualmente, para uma contrarrevolução.
Década de 1990 e a atual esquerdização
A queda do muro de Berlim, o fim dos ex-estados socialistas e a ofensiva neoliberal fizeram surgir, em todo o mundo, uma situação reacionária dentro de uma etapa revolucionária.
Fazer greve era uma enorme dificuldade. Falar sobre socialismo e revolução era considerado, de novo, uma utopia. A saída individual se tornou ainda mais valorizada do que a saída coletiva. A vanguarda agora era anti-corrupção e não anti-capitalista. Nesse exato momento havia, de fato, uma onda conservadora.
A principal consequência disso foi a degeneração final do PT naquela época. Tornou-se um partido de esquerda parlamentar, substituiu o classismo pela "ética na política", valorizou alianças com partidos burgueses. O PT, seguindo a onda, se "endireitou".
Isso desemborcou, para além da famosa carta ao povo brasileiro, na primeira eleição de Lula em 2002 e atrasou a consciência das massas, pois viram no voto e no PT uma saída contra suas dores e uma resposta aos primeiros sinais da esquerdização dos assalariados (naquele momento havia elementos de desconforto nas massas expressos no "Fora FHC", no "Não à Alca", contra a guerra de Bush e na rejeição ao caos econômico).
Agora que a luta de classes retorna, que o PT (importante freio) se desmoraliza, que o Estado está mais instável, que se inicia uma reação à crise, etc. estaríamos, logo agora, diante de uma onda conservadora? Não. É ação e reação, luta dos contrários.
E além. O petismo se desmoraliza por suas ações de direita, de austeridade, à favor da burguesia e contra a classe trabalhadora. A base da pirâmide finalmente está se esquerdizando.
Quais as bases desse erro?
As bases da tese da Onda Conservadora são:
1. A necessidade de proteger o PT;
2. Uma parte da classe média, especialmente a melhor de vida, vai para a direita;
3. Em toda realidade mais instável, como sempre, setores reacionários também se movem;
4. A esquerdização da classe trabalhadora ainda é confusa;
5. Via de regra, os governos de Frente Popular (PT) desmoralizam a imagem da esquerda;
6. A esquerda anti-PT ainda está fragmentada, não apresenta uma terceira via.
Daqui faremos um segundo debate:
Boa parte dos militantes e dirigentes da esquerda está acostumada à rotina, ao não-conflito, aos longos anos de crescimento econômico. Formaram-se enquanto quadros em uma situação de refluxo (da verdadeira onda conservadora existente na década de 1990 e no governo Lula).
Boa parte dos militantes pertence à classe média. Respiram o ar dessa classe. Mesmo sem desejar. Ouvem o que sua classe diz e, especialmente, tem a psicologia dessa classe.
Normalmente possui, a pequena-burguesia, incluindo os intelectuais, pouca tolerância a situações aguçadas, de conflitos e alta tensão. É uma classe que fantasia a vida burguesa, sem pertencê-la, sem ter os mesmos recursos. E giram suas vidas para uma paz constante. Isso lhes tira a força para momentos de crise social.
A classe trabalhadora, sem que queira, convive com conflitos familiares, violência, tensões enormes no trabalho, dificuldades, etc. Isso “treina”, “adestra” a mente para saber ter tolerância e racionalidade em situações instáveis.
Ora, se estamos em uma onda conservadora, como explicar os discursos mais à esquerda de todos os centrais candidatos burgueses à presidência? Como explicar milhares de greves em 2013 e 2014? Como explicar o retorno das rebeliões de base e as inúmeras ocupações dos sem-tetos? E o aumento do voto nulo e das abstenções? E a facilidade maior para expor ideias antes tidas como radicais? Como explicar o prestígio aumentado de alguns dirigentes sindicais combativos? Esquerdização não é apenas ideia, é prática, é ação e organização.
O que sustentou o PT?
1. Controle dos Movimentos Sociais;
2. Aliança estável com partidos burgueses e maioria no parlamento;
3. Crescimento econômico.
Isso começou a ser perdido em 2013, em junho:
1. as greves eram poucas (de 200 a 400). Agora são milhares e com rebeliões de base, participação ativa das categorias. E temos MTST, CSP e outros movimentos, em crescimento, por fora do controle petista;
2. Partidos de direita rompem com o PT. A maior parte do PTB, do PSB e boa parte do PMDB. Os aliados do PT são instáveis.
3. A economia, central, depois de uma década de crescimento e 2 anos de timidez (2013 e 2014), entra em crise. Há um desconforto de massas sobre a qualidade de vida;
A isso somamos:
1. Uma nova geração de trabalhadores jovens que acordam pra vida política sem ter sido educados a se iludir com o PT como seus pais na década de 1980 e 1990.
2. O tempo de governo, os escândalos e erros já tiraram boa parte do messianismo em torno do PT;
3. A base social do PT mudou das grandes cidades para as pequenas e o campo. Das classes médias empobrecidas e operárias para os que recebem bolsa família e os mais pobres entre os mais pobres.
Tudo isso é inédito nesse governo. Porém, dizer o ritmo e como acontecerá a "grande queda do PT" não é marxismo, mas misticismo.
Mas os elementos da realidade apontam nisso e isso já ocorre. Vai depender também das atitudes da esquerda. Esse processo está vivo. E por isso é um "processo de queda", não será um fato ou colapso. Mas um processo (que não tem como a gente medir todo o ritmo). Podemos intervir na realidade para aproveitá-la e acelerar esse processo.
Podemos forjar alternativas?
Se a chamada "'esquerda socialista" está na defensiva é porque ainda não se permitiu a ousadia; não se armou com políticas que movam e chamem a atenção da classe trabalhadora; é porque, na prática, se evita uma unidade de ação prolonga rumo a uma verdadeira Terceira Via. É pelas suas fragilidades que se derrota um exército. Esperamos conseguir resolver essa lacuna, pois o futuro, como o presente, nos reserva oportunidades e riscos.
João Paulo (da Síria)