ENSAIO: POR UMA DIALÉTICA MARXISTA
CONCLUSÃO
A união das
reflexões derivará, portanto, em simplificado, isto:
Movimento =
tempo = energia = espaço = matéria
Ou
Energia =
espaço = matéria(-massa)
Tal é nossa
proposta de teoria de tudo, do todo – simples e elegante equação unificada. Espaço = matéria. A equação encontrará
logo caminhos e provas, por exemplo, deixando de lado a quarta dimensão
espacial que se expressa também como tempo, 1) espaço é tempo para Einstein; 2)
sabemos que a aceleração (movimento) altera a massa-matéria, além do tempo; 3)
Dizemos E=m, energia é igual à massa-matéria, mas E (energia) também é igual
àquela constante, velocidade da luz ao quadrado, ou seja, ao movimento. Os 5
elementos de
base da física são, portanto, o mesmo e unidade na sua diversidade.
MÉTODO
DIALÉTICO
No início do
século 19, Hegel tornou-se imortal por sua grande Lógica, o moderno método
dialético. Suas contribuições, ainda hoje, em permanência ao que parece, são
insuperáveis; uma dialética superior soa impossível. Além disso, deu-se-nos uma
dialética materialista, embora de cabeça para baixo. A força hegeliana é o
fato, entre o outros, de ser não unilateral, de suprassumir as grandes
oposições da filosofia. Este ensaio, portanto, toma a Ciência da Lógica como
sua base correta e primeira, mas incompleta. Por isso, também, trata-se de um
ensaio.
Quando
perguntamos a um hegeliano ou marxista “O que é ou como procede o método
dialético?”, logo gaguejam, ficam desconfortáveis, improvisam. De um lado, de
fato inexiste um procedimento investigativo fixo, o que perdoa tais
intelectuais – na dialética, pesquisar é estar dentro de um labirinto, tentando
descobrir o caminho correto; de outro, como disse Hartmann, o método dialético
é irmão do fazer artístico, criativo e associativo, que “saca” a realidade até
ali invisível.
O método
dialético é, em resumo grosseiro, o inverso do método hipotético-dedutivo, ou
seja, em linguagem inferior e falha, um método empírico-dedutivo. Parte-se
sempre da empiria para alcançar a verdade do mundo, mas, como os dados mentem e
escondem, além de revelarem, usa-se a razão para perceber aquilo oculto ou deformado.
A partir da e na aparência saber a essência, da e na forma saber o conteúdo, da
e na externalidade saber a internalidade, da e na diversidade saber sua
unidade, do e no fundamentado saber o fundamento – nunca fora deles, mas neles
mesmos. Assim, o empírico faz parecer que há apenas custos de produção somados
a um cálculo do patrão para ter um preço de produção de suas mercadorias, mas
Marx vai para além ou para dentro da empiria e descobre que há, na verdade,
trabalho necessário com trabalho gratuito do operário ou mais-trabalho, valor e
mais-valor, exploração e roubo. É verdade que os dados empíricos são vitais e
são o começo da pesquisa, como diz o empirismo, mas também é verdade que os
dados empíricos, ao mesmo tempo, escondem a verdade e enganam, como diz o
racionalismo, logo usamos a razão para ver a conexão interna da realidade, para
perceber os enganos da aparência dos dados, para ir além e abaixo ou dentro
daquilo empírico.
Eis o método
dialético.
Em minha
pesquisa, além de procurar nos dados a verdade, evitando a mera descrição,
percebi que o marxismo caiu em teorias opostas, em oposições. Minha tarefa,
portanto, foi listar as principais polêmicas e, colocando-as em movimento,
resolvê-las – com o raciocínio, claro, mas em base à empiria. Eis, de outro
modo, o método dialético.
A verdade é
não empírica. Descobrimos na pesquisa empírica aquilo que não é palpável,
tocável, mas que se revela ao pensamento desde a própria empiria. A dialética é
a verdadeira fusão – mais do que mera aglutinação, como é o caso do
hipotético-dedutivo – de empirismo e
racionalismo; pois ao pensamento deve-se dois lados ativos, após colher o
material necessário: 1) perceber os enganos dos dados; 2) perceber a verdade
daquilo pesquisado.
Daqui para
frente, teceremos comentários e propostas críticas de atualizações da obra
Ciência da Lógica de Hegel. Uma crítica possível, mesmo que parcial, tem, de um
lado, de agregar o melhor daquilo criticado para si, de outro, acertar o outro
exato no seu ponto mais forte, de base – o ser e o nada.
ENERGIA
Na Lógica de
Hegel, pouco há, se algo há, sobre energia. Portanto, sua lógica ontológica não
cabe aí. Em nossa ontologia lógica, ontologia da lógica, a realidade é energia,
mais precisamente, energia em busca de mais energia. Isso é óbvio na filosofia
para o mundo do ser vivo, mas também vale para o inorgânico e para o social.
Naquele, como na gravidade enquanto atração por curvatura do espaço-tempo –
massa é energia, a energia-massa (ou a matéria sem massa que tem energia, como
a luz) curva o tecido espaço-temporal; neste, no mundo humano, como com
colheitas cada vez melhores, com busca de melhor energia, pela exploração da
força (energia) de trabalho do operário. Em geral, quando se considera que o
homem também é energia em busca de mais de si, ocorre apenas reduzindo este ser
ao biológico, à vida, à sua condição animal; mas ele é mais do que isso.
O Ser é
energia em busca de mais energia, logo relação consigo, relação consigo como
com um outro. Que tal relação seja instável, que há falha e contradições,
veremos no decorrer do texto.
A ciência
oficial ainda considera energia apenas um conceito. Mas as diferentes formas de
energia, mesmo se as supomos como conceituais, apontam a energia em geral, uma
categoria real da realidade, embora não empírica, como é o caso da
energia-valor na economia capitalista (vale destacar: a mercadoria é unidade do
valor-energia e valor de uso-matéria-espaço-tempo condensado).
Cada
modalidade do Ser é, por assim dizer, melhor que o anterior na captação energética;
em relação ao biológico, o inorgânico é passivo – o social suprassume aquele.
Mas energia é insuficiente.
ESPAÇO-TEMPO:
O ELEMENTO PRIMEIRO
Vários
filósofos indagaram-se qual a composição primeira, central, da realidade.
Chegaram a algumas respostas: o ar, a terra, o fogo, a água, o éter. Com o
desenvolvimento da física e da química, parece que o assunto saiu do campo
amplo da filosofia. Mas o raciocínio especulativo ainda pode ter seu valor,
embora os riscos e a boa mão calibradora da ciência.
Raciocinemos
juntos. Se pudéssemos dissolver as partículas subatômicas e seus possíveis
campos, o que teríamos? O conceito real, a categoria irredutível, mais simples
é – o espaço. Assim: tudo, portanto, são formas de espaço; espaço concentrado,
condensado. Ou seja: mais do que curvar o tecido do espaço-tempo, toda matéria
é o autocurvar do espaço-tempo para dentro de si (desde Einstein, a ligação de
espaço e tempo faz-se necessária).
É possível
supor, a partir desta conclusão, que o átomo, o indivisível, é o maior, ou
seja, o espaço, não o menor. Se correto, há unidade do contínuo e do discreto,
este vindo daquele. Porém, diferente dos demais temas deste capítulo, tais
pensamentos, filosóficos, carecem de base científica e empírica próprias, logo
podem ser negados sem maiores esforços pelos cientistas naturais caso se
demonstrem falsos.
A tendência
de uma totalidade, em geral, é ir-se do simples ao complexo. Isso no seu
histórico, no seu evolver. O espaço(-tempo) é o que há de mais simples no
cosmos, logo, se não veio antes na temporalidade, vem antes – é primeiro – pelo
menos lógico-ontologicamente .
Diz o
princípio do impenetrabilidade: dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço ao
mesmo tempo. Por qual motivo? Porque, respondemos, dois corpos são, em si mesmos,
cada um, espaço-tempo. É a tautologia de que dois espaços-tempos não poderem
ocupar o mesmo espaço-tempo; porém o espaço-tempo pode revelar-se, digamos,
condensado.
Demócrito
afirmou que existem apenas o átomo (ser) e o vazio (não ser). Ele intuiu ainda:
há, de fato, unidade de ambos, o átomo é o vazio, o átomo vem do vazio, embora
diferentes e opostos; em nossa linguagem e atualização, o espaço-tempo que se
expressa também na matéria, com ou sem massa.
Tal modo de
ver o mundo pode gerar uma ontologia geral, além de no inorgânico, além do
também geral proposto aqui. Na geografia, Milton Santos afirma que “O espaço é
acumulação desigual de tempo” (Santos, 2004). Podemos extrapolar para
observações biológicas como, quanto maior o animal é, mais tempo vive,
contrariando os problemas de reprodução celular (maior possibilidade de
câncer), pois são seres com mais espaço-tempo concentrado em si (embora ainda
seja necessária uma explicação propriamente científica, não apenas filosófica).
Porém, apesar dessa elaboração-especulação, pensamos que a ontologia extraída
de Marx, o Ser é histórico, como suficiente e insuperável para a ciência e a
filosofia, sendo esta caracterização possível do espaço-tempo apenas uma
expressão, também hipotética, particular da ontologia marxista.
O
espaço-tempo e a matéria ou as partículas são apenas um, mas que de fato são
dois.
O Ser,
enquanto ente, como espaço-tempo condensado aparece como em si – e como energia
em busca de mais energia aparece como para si.
Espaço-tempo
e energia são, na verdade, não apenas em unidade, mas propriamente o mesmo, uma
identidade.
SER,
MATÉRIA, MATERIALISMO
Ser, puro
ser. Tudo existente, enquanto tudo, é matéria, abstraída de suas formas. Apenas
há a realidade material, pura matéria – nada para seu além sobra. No seu
começo, se podemos falar de começo, o ser é o máximo simples, sem determinação,
sem qualidades, sem características – beira ser o nada, mas não cai nele porque
cai dentro de si mesmo (o espaço é, na verdade, o sem qualidades, a
transparência transparente).
Aqui, por
força negativa da abstração, nenhum movimento.
A matéria,
aqui, é mais do que a matéria empírica da física, diferenciada da massa e da
energia. A própria energia é matéria, pois é material.
MOVIMENTO
Movimento,
puro movimento. Ele é o fluir absoluto, sem começo nem fim, sem causa primeira.
O movimento
é absoluto se tomado em isolado. Até mesmo ficar parado é ato de assim estar,
movimento.
A
contradição certamente faz o movimento, mas o movimento, ao contrário, também
faz a contradição. No concreto, vai-se da identidade para a diferença, para a
diversidade, para a oposição, para, enfim, a contradição; e, supõe-se, de volta
à afirmação da unidade agora interna dos opostos contraditórios.
DEVIR
A verdade da
matéria e do movimento é sua unidade necessária – o tornar-se, o vir-a-ser, o
devir.
O devir é
mudança, movimento, deslocamento, desenvolvimento.
De imediato,
a matéria parece se sustentar sozinha, enquanto o movimento precisa dela – mas
tanto o pensar filosófico quanto o empírico logo vê que um somente há com o
outro, são apenas um.
Ao movimento
corresponde a energia; à matéria, o espaço-tempo.
SOBRE O NADA
O nada –
nada é. Melhor dito, o ser, que vai de ente em ente, põe o nada. É no ente em
que a perecibilidade, unidade com o nada, ocorre, não no ser. Mas o ente
pertence ao ser, logo o nada está junto com o ser, mas no ente – o ser, como o
geral, não degenera nem sucumbe em razão do nada, a não ser externamente, como
externo de si próprio. O que há, portanto, é ser em movimento – ser é
movimento!
Como
veremos, energia é a categoria que aposenta as funções de lastro do nada.
DETERMINAÇÕES
DE DESENVOLVIMENTO
Para tentar
chegar a uma dialética hegeliana pós-hegeliana, talvez devamos perceber que há
uma forma de organização das categorias não percebida por Hegel: aquelas que
passam uma para as outras não somente no campo lógico, mas também no concreto.
Assim, já é o caso do Um e dos Muitos, onde o Um repele a si mesmo, desde o
vazio, tornando-se Muitos, os muitos Uns. Mas há outros. Em Hegel, passa-se
logicamente da 1) relação de duas medias; 2) relação com várias medidas; 3)
afinidade eletiva. Pois bem; Marx mostra o avanço tanto lógico como histórico
da relação entre duas mercadorias (1), porque entre tribos diferentes que
trocam casualmente, para troca entre várias mercadorias (2); depois, para
prioridade em trocar por ouro, o dinheiro (3). Hegel ainda diz da identidade
que passa a ter a diferença dentro de si, tornando-os externos, logo
diversidade; então esta torna-se oposição, que cai na contradição. Esse
movimento lógico tem similar também no movimento concreto, histórico, temporal,
processual: 1) a relação entre operário e burguês é entre idênticos, livres e
no comércio; mas são, tornam-se, diferentes, um comprador e um vendedor; também
tornam-se diversos, um operário e outro o seu burguês; na produção, entram em
oposição e, como com a luta de classes, em contradição. 2) o movimento lógico é
o perfeito e o completo, o puro, sendo expressos imperfeitamente no processo
real: com um ancestral comum, idêntico a si mesmo, seus descendentes são cada
vez mais diferentes do inicial – depois, começa a diversidade: diferentes raças
e diferentes espécies novas por mutação – como se depois, começa a oposição
entre eles – que cai na contradição, no conflito, ou no homem como animal
altamente desenvolvido que está levando os demais à extinção; 3) a língua
romana espalha o latim por boa parte da Europa – identidade; logo começam a ter
sotaques em cada local, em cada região – diferença; estes sotaques evoluem para
novas línguas latinas que entram em oposição – diversidade. Tal tipo de
determinação também se revela quando o nem positivo nem negativo passa-se para
o positivo e o negativo, que, pela reação do negativo, passa para um novo nem
positivo nem negativo. Assim o caos (em outro nível, o acaso) passa-se para a
ordem; o concreto passa-se ao abstrato, que se passa para o novo concreto; o
primeiro elemento desenvolve-se em tríade e colateral; o real funda a ficção em
seu próprio desenvolvimento. Há um desenvolvimento desigual e combinado. O
simples desenvolve-se no complexo. O mero processo de agregar externamente os
materiais ou matérias passa para a interpenetração delas, umas nas outras. A
lógica de Hegel, no Conceito, passa, sem movimento real e apenas “mental”, do
universal para o particular e, desse, para o singular (na realidade, ocorre o
inverso “mentalmente”); há, no entanto, objetos reais que vão, em concreto, do
“exemplar” singular, individual, para o particular e geral-universal – teve de
existir o primeiro urso branco, apenas singular contritamente universal em si,
para, por reprodução, por seleção natural, surgir uma grande quantidade de
ursos brancos, uma espécie com possíveis particulares. A matéria vai-se do
processo de materialização para a desmaterialização. Mas permanecem relações
categoriais que não são, e não são transformáveis em, determinações de
desenvolvimento. A passagem do finito para o infinito, por exemplo, não é
passar algum, pois o infinito já está ali; a passagem, por separação, do ser ao
nada, e vice-versa, não tem verdade alguma, verdade esta que apenas existe no
devir (mas podemos supor que do nada veio o ser; ou, ao contrário, o ser funda
o nada dentro de si mesmo, algo, creio, ainda não pensado).
Este resumo,
no anterior parágrafo, é aquilo quer vamos expor a seguir. As categorias da
Lógica de Hegel passam umas para as outras. Nas determinações de
desenvolvimento, vale a ironia, o passar não é passar algum, pois é como se o
objeto fosse visto por diferentes ângulos.
Quem deu o
primeiro passo real rumo à atualização da dialética de Hegel, rumo às
determinações de desenvolvimento, foi Trotsky com a lei do desenvolvimento
desigual e combinado.
ALGO E OUTRO
Algo e
outro, em Hegel, confunde-se com as palavras, como o jogo de palavras. Para
ele, algo e outro são o mesmo. Mas ele são isso porque ambos são energia,
espaço-tempo concentrado.
Nisso, a
determinação é a constituição para dentro, desenvolvido em si, ou seja, este
passa para aquele, não só logicamente, mas também no tempo, no desenvolvimento.
A razão é a determinação do homem por sua constituição física.
FINITO E
INFINITO
O infinito
qualitativo exige uma dimensão, digamos, para dentro, uma quarta dimensão
espacial. Tal dimensão, se existir, manifesta-se como tempo e como energia. O
infinito está já aí, sendo o finito apenas seu exemplar cósmico – o infinito
está diante de nós, no maio de nós, não avançamos até ele. O bom infinito
produz o mau infinito dentro de si, o infinito da progressão.
Aqui vermos
o erro de Hegel ao esquecer o conteúdo. O que é infinito, o infinito, senão o
espaço? Ele abarca o finito dentro de si, além de o formar. Quando a Lógica diz
que o Ser passa a ter a determinação da infinitude, diz apenas que o espaço,
como o vazio, está no centro da ontologia. Finalmente, resolvemos a questão,
encontramos o fundo.
UNO E
MÚLTIPLOS (UM E MUITOS)
O uno
cósmico, em seu momento completo, é o expandir (muitos) e contrair (um) eterno
do nosso universo, o multiverso no tempo, gerações de universo, um opôs o
outro. Isso deve ser esclarecido: para Hegel, após a repulsão do Uno em vários
unos, dividindo-se, há apenas a atração relativa dos novos unos, dos muitos;
mas há, no cosmos, a atração absoluta quer “reinicia” o universo. Dentro dele,
há, em processo similar e imperfeito, o uno que passa a si próprio para o
múltiplo por autorrepulsão, que depois passa para a atração dos muitos unos num
único uno produtivo de unos (a fábrica produz mercadorias, o Sol produz átomos
novos etc.). Pois bem; o começo cósmico pode ser do uno e do vazio, este
empurrando para aquele decair em muitos unos; mas, nas demais realidades,
ocorre energia de atração e de repulsão, além de espaço-tempo curvo. De outro
modo: a matéria concentrada não tem estabilidade energética, logo expande-se,
fragmenta-se. Há contradição entre energia e matéria dentro da identidade uma
com a outra. No cosmos, no multiverso, é provável que alguns universos
expandam-se enquanto e exato porque alguns contraem-se, e/ou vice-versa,
estando necessariamente conectados entre si. Assim, fundimos as hipóteses do
multiverso no tempo e, oposto, no espaço – um multiverso, em outro sentido, no
espaço-tempo.
Há mais.
Para Hegel, a união dos muitos unos por meio da atração, que ele não explica,
é, como dissemos, produtivo. Mas para ele, produz algo que vai do nada ao ser…
Na verdade, a energia acumulada e o espaço-tempo, como matéria em geral, são a
base para a produção e a reprodução. No concreto, a fábrica reúne os unos
(mercadoria matéria-prima, mercadoria máquina, mercadoria força de trabalho
etc.) que produzem de si novos unos, novas mercadorias; um organismo pluricelular
alimenta-se, adquirindo material e energia, logo produzindo novas células.
O uno
isolado – indivíduo, átomo, vida –, isolado no espaço-tempo em geral, é
instável quando isolado por falta ou por excesso de energia.
INTENSIVO E
EXTENSIVO
Para Hegel,
o intensivo corresponde ao nada – para nós, a intensidade é, em primeiro,
energia. Logo, o espaço-tempo, como matéria em principal, é a extensividade.
Mas a intensidade é, também, espaço tempo condensado; mas a extensividade é,
também, energia que se propaga. Temos a unidade do intensivo e do extensivo.
Hegel focou
na identidade do intensivo e do extensivo, como o grito mais intenso
propagar-se por um espaço mais extenso. Aí vemos a unidade e identidade de
energia e espaço-tempo.
Mas há ainda
a oposição e a contradição entre intensivo e extensivo, exposto empiricamente
por Marx. Uma jornada de trabalho mais extensa, para explorar mais a energia de
trabalho, reduz a intensidade, a capacidade do operário de pôr energia na
produção. Uma jornada mais intensiva empurra para jornada menos extensiva,
concentrando maior gasto energético num tempo menor. Um opõe-se e contradiz o
outro na unidade de ambos como um.
DIVISIBILIDADE
Hegel trata
do problema kantiano, antinomia, de se a matéria é ou não é divisível até o
infinito. Os dois argumentos são poderosos, este e seu oposto – qual tem razão?
Primeiro, a divisão não é arbitrária em qualquer tamanho, mas é estável apenas
em proporções dadas. Segundo, a última dissolução é o espaço-tempo ou energia.
O espaço-tempo é, portanto, tanto contínuo quanto, ao mesmo tempo, discreto.
Hegel apenas cita o problema, alertando o erro de raciocínio do adversário,
sem, se bem observado, oferecer uma resposta (mesmo limite ao tratar da parte e
do todo, na parte que é todo divisível ao infinito).
MATEMÁTICA
A matemática
é uma invenção ou existe na realidade? Sobre, a resposta correta deve revelar a
causa da longa polêmica. Um e outro e, ao mesmo tempo, nem um nem outro. A
matemática é uma construção humana feita para corresponder à realidade. Parece
existir no real porque quer ser retrato dele, ao menos no quantitativo. Mas aí
há um nó. A matemática não surgiu de dentro para fora do sujeito apenas ou
primeiro; antes, "veio" de fora, do mundo, para dentro do pensamento.
Quando se fala em matemática como invenção parece algo como na arte, uma pura inspiração,
algo quase arbitrário, um raio em céu azul. Nada disso. A quantidade existe na própria
matéria. Dito isso, fica clara, além de resolvida, a oposição, o ou-ou, de
longa data.
CONTRADIÇÃO
DA QUANTIDADE E DA QUALIDADE
O marxismo
percebeu que quantidade e qualidade podem entrar em contradição. Vejamos dois
casos. Para vender mais quantidade de mercadorias, os patrões fragilizaram a
qualidade das mesmas mercadorias para forçar o consumidor a logo comprar um
novo exemplar. Hoje, a produção científica se mede pela quantidade de artigos
publicados, mas isso diminui a qualidade de tais artigos, pois produzir algo
relevante leva tempo. Como a quantidade vem da qualidade como sua base, ao deteriorar
a qualidade, a quantidade acaba, por fim, a deteriorar a si mesma – embora de
início a medida tome partido da quantidade, tal contradição tem de ser
resolvida por causa da deterioração do seu oposto, logo de si mesma. Ou a
destruição de ambos.
MEDIDA
1.
O que os
qualitativamente diferentes têm em comum enquanto diferença apenas quantitativa
por debaixo que faz a diferença qualitativa é a energia/espaço-tempo de cada
um. O que torna as mercadorias iguais é a quantidade de trabalho nelas, de elas
serem fruto do trabalho humano (lembremos que energia é capacidade trabalho).
2.
Na medida,
Hegel diz que tudo tem a medida necessária, não arbitrária – e uma alteração
importante na medida, destrói ou muda o ser aí. Pois bem; isso está relacionado
com energia (em busca de mais de si) e espaço-tempo (condensado). As coisas
inorgânicas têm sua proporção dada pela quantidade de energia concentrada. Na
biologia, os animais não podem ser grandes em demasia, pois o calor gerado
seria imenso, inadministrável; além disso, outro exemplo, as células não podem
crescer tanto porque a relação de volume e superfície, aquele acima deste,
limita a relação com o ambiente, dificultando trocas para com ele. No social,
este livro é exemplo, embora apenas oculto e implícito. O inchaço do Estado nas
crises sistêmicas exigiu deslocamento de espaço-tempo e energia de sua base
necessária, por exemplo.
CAOS E ORDEM
O caos não
suporta a si próprio e, nessa autointeração e autorrelação caótica, não tendo
lei alguma, tem a lei de passar a si mesmo para seu oposto – a ordem. O caos,
por ter uma lei que não é lei, tem como se a ordem dentro de si. A ordem, que
veio do caos, por outro lado, ainda é dinâmica, por isso tem como se o oposto,
o caos, dentro de si.
Na coisa, a
ordem é preenchida pelo caos; mas não há separação por uma parede entre caos e
ordem dentro dela, logo a coisa é unidade de ambas ao mesmo tempo.
O caos
absoluto é liberdade negativa; e é um sistema, porém não sistemático. A unidade
de caos e ordem cai-se na probabilidade.
O socialismo
é a ordem, como liberdade positiva, ou seja, é de um lado uma economia central
e democraticamente planejada e, por outro, uma livre associação dos produtores.
O caos é
mais do que mero acaso, pois é acaso enquanto totalidade.
POSITIVO E
NEGATIVO
Neste
ensaio, somos obrigados a repetir temas tratados, adiantados ou esboçados ao
longo da obra – vale como revisita. Foi assim que antecipamos: 1) o nem
positivo nem negativo 2) passa para a oposição contraditória do positivo e
negativo; 3) então, dessa dialética, surge um novo nem positivo nem negativo.
Eis o movimento puro e uma pista para a pensar científico.
No início do
universo, a matéria decaiu do nem positivo nem negativo para uma sopa quente de
prótons, positivos, separados dos elétrons, negativo. Com o esfriamento do
universo, a atração dos opostos permitiu a união do positivo com o negativo, do
próton com o elétron, formando átomos completos neutros (nem positivo nem
negativo). Veja-se que o átomo neutro tem dentro de si os opostos, o positivo e
o negativo. Também os opostos, elétron e próton, podem se fundir formando o
nêutron. Existe na física a polêmica sobre se o neutrino, uma partícula
pequeníssima, tem um antineutrino, um oposto, ou se, outra hipótese, ele é a
antipartícula de si mesmo; talvez seja melhor afirmar que ele é “nem positivo
nem negativo”, diferente do elétron e do próton.
(DES)MATERIALIZAÇÃO
Em minha
pesquisa, percebi que a matéria da forma vai da materialização para a
desmaterialização (claro é que se faz preciso, antes, materializar para,
depois, desmaterializar). A forma-dinheiro foi do menos material ao mais
material – do cobre para a prata, para o ouro – para então, em seguida, ir rumo
ao menos material como mais perecível – do ouro para a prata, para o cobre,
para o papel, para o bits. Na vida, surgiram animais cada vez mais materiais
até surgir os gigantes (como dinossauros e outros seres), então começou a
desmaterialização, a diminuição do tamanho das novas espécies. A quantidade
maior de trocas e de dinheiro está ligada à desmaterialização deste; o menor
tamanho de certos animais está ligado à possibilidade de maior quantidade
deles. A maior materialização, nos dois exemplos, diminui a perecibilidade,
aumenta o tempo de vida.
Se há
retorno à materialização, após desmaterialização, é algo pertencente ao
empírico.
FORMA E
CONTEÚDO
A união da
forma e da matéria – é o conteúdo. Vejamos um caso. Se eu tenho uma pintura
retratando um jogo de futebol, esta mesma pintura tem a forma (da bola, dos
jogadores, do campo, etc.) e também, junto, a matéria, a tinta principalmente,
com diferentes cores. Ora, esta forma e esta matéria, unidas, passam uma
mensagem fictícia, artística, um conteúdo. Elas têm um conteúdo.
Vejamos
outro caso. Marx diz que a relação de contrato entre trabalhador e patrão,
quando aquele está no mercado trabalho procurando emprego, tem a forma de uma
relação entre iguais – ambos, operário e patrão, são livres, estão no mercado,
estão fazendo um contrato livremente aceito. Mas o conteúdo é outro, de
exploração, em que ou o operário vende sua força de trabalho para ser explorado
por outro ou morrerá de fome.
Vamos para a
terceira visão, comum no marxismo. Vale o alerta: neste parágrafo temos uma
dedução marxista entre base e superestrutura enquanto conteúdo e forma; o que
farei aqui é formalizar a ideia, adicionando o duplo caráter. Vejamos. A
economia e a luta de classes, as classes sociais, são o conteúdo – já o Estado,
os partidos, as organizações são a forma. Nesse modo de ver, tanto o conteúdo
quanto a forma têm, cada qual, dupla natureza, duplo caráter. O conteúdo
(economia, classes) é 1) muito mais dinâmica, mas 2) também mais instável,
inconstante; por outro lado, a forma é 1) conservadora, lenta, paralisadora,
mas também 2) conservadora no sentido de conservar, de preservar (as conquistas
etc.). Assim, os conflitos e as instabilidades do conteúdo fazem surgir, de si
mesmo, uma forma para “compensar”. Mas o conteúdo se desenvolve a tal ponto em
que a forma conservadora torna-se um fardo, algo muito atrasado – o conteúdo
renovado supera aquela forma e funda uma forma nova, para suas novas
necessidades de desenvolvimento.
Uma forma
pode estar em contradição com seu conteúdo: um partido comunista pode estar
organizado de forma incompatível com seu conteúdo, com o perfil dos membros e
com seu programa.
É lógico,
também, que se vai do menos formal para o mais formal, da arte pré-história à
nossa sublime, do organismo ameba quase informe até células mais formais como
neurônios e seres complexos formatados.
TODO E PARTES
Hegel afirma
que a força mantém a unidade das partes e do todo, as partes juntas como um
todo. Mas a categoria força entrou em crise categorial na ciência moderna (Jammer,
Conceitos de Força - Estudo sobre os fundamentos da dinâmica, 2011), substituída por
campo (para nós, espaço-tempo) e, dizemos, energia.
Mas essa
energia-força não apenas mantém a unidade do todo, mas forma o próprio todo,
seja reunindo as partes, seja desenvolvendo uma parte em várias partes. No
segundo caso, uma parte não suporta a quantidade de energia em si, então
desenvolve-se em multiplicidade integrada, em várias partes com interrelações.
Vale
destacar que Hegel trata do todo e das partes, mas sem dizer como o todo
forma-se, além do fundamento e das condições tratados bem antes em sua obra. O
todo e a parte já estão aí, além de reciprocamente relacionados em sua unidade.
O todo é um reunir atrativo de partes, pela força; um todo vem, também, de
outro todo que se suprassume; uma parte do desenvolver do todo, sendo uma parte
que é também em si um todo, embora não realizado, desenvolve-se e pluraliza-se,
então, se era apenas um antes, igualmente é um depois. Em especial, da parte
rumo ao todo: o crescimento e desenvolvimento de um todo dar-se, por isso, pela
força ou energia que concentra em si, causa e consequência de seu evolver, como
espaço-tempo condensado, em que uma parte torna-se um todo de partes unitário.
Provável,
Hegel inspirou-se no fato de a força gravitacional manter unido o todo do
sistema solar, de suas partes. Ora, hoje sabemos que a gravidade não é uma
força, mas curvatura do espaço-tempo causado pela massa-energia. E mais. A
gravidade (a energia, o espaço-tempo curvado) transformou a poeira estelar, por
meio desse próprio material, em Sol e seus planetas, em central e orbitantes.
No
capitalismo, a energia-valor vinda da energia-força de trabalho mantém o todo
como todo, um modo de vida, o capital como autoprocesso.
GERAL,
PARTICULAR, SINGULAR
Para Hegel,
o movimento dialético é de o universal que, diferenciando-se, vai, dentro de
si, à particularidade, que se singulariza. Observou tudo de modo invertido;
logo comentaremos o motivo de seu erro.
Hegel deixa
de ver que o singular evolui, evolve-se, para o particular e o universal. A
descoberta disso deve ser creditada, primeiro, a Marx: o pequeno mundo singular
do mercado na Idade Média desenvolve-se até ser a totalidade universal
capitalista hoje. O singular já é o universal, mas não realizado.
GÊNERO
Na Doutrina
do conceito, Hegel pensa o gênero apenas como o comum no sincrônico na
estrutura das espécies. Mas também é assim no diacrônico, no processo. Por
exemplo: na verdade, não existe peixe, pois para existir algo assim comum a
tantos seres, eles deveriam ter um ancestral único comum, mas não o há.
Os erros de
Hegel nessas matérias devem-se ao fato de ele não ter ainda diante de si a
Teoria da Evolução das Espécies, que dirá da do Big Bang. Mesmo para um gênio
isso pesa, o fator histórico e o nível de desenvolvimento da ciência; para ele,
valia a grande classificação, um ao lado do outro, das espécies; igualmente,
valia ao movimento repetitivo e tedioso, aparentemente estático, do cosmos, da
física de sua época.
POSSIBILIDADE
E NECESSIDADE CRESCENTES
Piaget
atualizou a dialética ao afirmar que há a POSSIBILIDADE CRESCENTE. Algo é cada
vez mais possível. Segundo Nahuel Moreno, ele fundiu os opostos, a
possibilidade e a necessidade, nesta formulação, da crescente possibilidade.
Assim, apenas ao final a necessidade é imposta na realidade. O socialismo é
cada vez mais possível dentro do capitalismo, mas somente poderá surgir quando
o capitalismo estiver muito maduro, no final, com a alta possibilidade que se
desenvolveu.
Penso que,
ao mesmo tempo, ocorre a necessidade crescente. Mas ela é mais firme quando a
necessidade se realiza após o caminho da possibilidade crescente; pois, a
partir daí, a necessidade é cada vez mais necessária (até o ponto de não
retorno).
Além disso,
é possível que a possibilidade teste-se a si mesma antes de se tornar necessidade
plena. Assim, antes de surgir o capitalismo, tentou-se revoluções burguesas
fracassadas. Antes de surgir o socialismo, tentou-se revoluções socialistas
fracassadas.
CAUSALIDADE
D’O Capital,
de Marx extraio a ideia de que há causa com efeitos opostos. Uma desvalorização
da moeda brasileira no câmbio produz industrialização, pois compensa comprar
dentro do país no lugar de importar, mas também produz, ao mesmo tempo, o
oposto, desindustrialização, pois algumas indústrias nacionais necessitam importar
insumos e máquinas do exterior.
Há duas
formas de tal causalidade: 1) a causa produz um efeito, que, por sua vez,
produz um efeito oposto (instalar um novo maquinário derruba a taxa de lucro
numa empresa, mas, por produzir matéria-prima mais barata individualmente,
aumenta a taxa de lucro de outras empresas, pois reduziram o custo com
capital); 2) a causa produz efeitos opostos ao mesmo tempo ou quase.
Um efeito
pode vir de diferentes, opostas ou combinadas causas. Para a economia vulgar, a
inflação sempre vem do excesso de dinheiro – mas pode ter, na verdade, várias
origens, como desvalorização do câmbio, monopólios etc. E mais dinheiro
circulando pode mesmo não gerar nenhuma inflação se a velocidade de circulação
da moeda cai, por exemplo.
Uma causa pode
gerar um efeito ou seu oposto. Novack observou que a industrialização alta
produziu um império capitalista nos EUA enquanto produziu miséria e, depois,
revolução socialista na Rússia. Mesma causa, efeitos opostos (porque em
circunstâncias diferentes).
Os teóricos
da complexidade observam que uma grande causa pode produzir um pequeno efeito
enquanto uma pequena causa pode produzir um grande efeito. Por quê? Por causa
das condições, das circunstâncias em que ocorrem. São as condições ao redor que
fazem, por exemplo, uma pequena causa ter grandes consequências.
Além disso,
a causalidade não mecânica pressupõe a possibilidade do atraso da causa sobre o
efeito. Isso se dá porque há a inércia e um passado ou estrutura. Uma crise
econômica afeta a consciência dos trabalhadores, mas com atraso.
COISA EM SI
E MATERIAIS
Para nosso
trabalho, existe a coisa, não a coisa em si. Hegel descobre que a coisa em si
nada é de fato, apenas é suas propriedades reunidas. Estas, então, são apenas
materiais, matérias. A coisa se dissolve. As matérias entram e saem dela, e ela
não é sequer um limite ou uma barreira para estes materiais. A coisa é um
“isto” (em que as matérias estão reunidas) e um “também” (menos ou mais
matérias).
Destaco que,
para Hegel, os materiais fluem como querem na coisa; mas, se bem observado,
elas estão em conexões necessárias uma com as outras, na interpenetração, logo
não fluem tanto; ao mesmo tempo, a coisa, e em estado superior como o ser vivo,
tende a ser unidade tanto de matérias com interpenetração quase estável quanto,
em agregado, os apenas juntos e externos uns aos outros. Por exemplo, diz-se
que grande parte do corpo humano são bactérias e vírus em nós; mas o que
permite que elas sejam conosco é a interconexão daquilo que permite sermos o
que somos, para além ou por debaixo de nossos necessários agregados. Enfim, o
mero agregado, onde as matérias são separadas uns dos outras, passa para a
interpenetração.
Mais uma
observação importa. Kant diz que há limites ao conhecimento – que apenas abemos
do fenômeno, nunca da coisa em si mesma; já Hegel afirma que não sabemos se
tais limitações existem ou não, apenas saberemos pesquisando, tentando (e
sabemos da coisa em si por meio de suas determinações, de suas propriedades).
Muito conhecimento antes impossível agora é claro e possível por causa do
desenvolvimento histórico, especialmente o técnico. Pois bem; parece provável
que os buracos negros são, enfim, a coisa em si incognoscível, do qual mal
podemos saber apenas dos fenômenos (têm apenas três características
destacáveis: massa, spin e carga). Na Lógica de Hegel, a coisa em si vai para
fora, expõe-se, o interno vai para o externo. Mas o alto evolver do cosmos
levou a que a curvatura do espaço-tempo, a energia em busca de mais energia,
impedisse que até a luz, o objeto mais rápido existente, escapasse de si.
FIM E MEIO
Em Hegel, na
Lógica, a teleologia é apenas subjetiva, que usa o objetivo, o objeto, como
meio e tem-se na realização da finalidade, do fim, o subjetivo dentro do novo
objeto, uma unidade do subjetivo e do objetivo. Exemplo: o escultor usa
ferramentas, ou objetos, para agir sobre outros objetos e assim realizar um
fim, a sua ideia de escultura - o resultado final tem o subjetivo no resultado
objetivo.
Há outra
consideração: o fim não está apenas no fim, mas no próprio meio. O fim vai-se
realizando no meio, no seu processo, rumo a si mesmo. Esta é uma forma de
unidade de fim e meio.
Existe ainda
o fato de o meio, que deve ser apenas meio, que, por suas propriedades e
circunstâncias, torna-se fim – a degeneração do meio em fim, em fim em si
mesmo.
Para evitar
interpretações racistas, a ciência comum afirma que a teoria da evolução seria,
na verdade, teoria da diversificação apenas. Uma galinha é “inferior” aos
antigos e poderosos dinossauros, mas bem adaptada ao meio. Há aí certa
confusão, entre parte e todo. Os animais individuais ou espécies podem mutar-se
das mais variadas formas, porém o todo, a biologia, caminha-se para produzir
seres cada vez mais capazes, como dos incapazes para os capazes de regular a
própria temperatura, teleologia relativamente realizada no homem.
POTÊNCIA
A relação de
potência é o quantitativo que retorna ao qualitativo, na medida. Se bem
observado, a potência na matemática revela a relação consigo mesmo, ou melhor,
a realidade é relação consigo própria.
PROCESSO E
CRISE
A lógica
deve elevar ao pensamento puro a lógica real dos ciclos empíricos na biologia,
no cosmos, no ser social. No capitalismo, temos crises de 10 em 10 anos, mais
ou menos, cíclicos – porém não apenas circular ou repetição, mas processo, desenvolvimento
contraditório. A Terra também com ciclos regulares de, mais ou menos, 27
milhões de anos. Os ciclos são, portanto, periódicos. São espiral ou
desenvolvimento embora apareçam apenas como repetição circular, regular; ou,
antes, o circular faz, dentro de si, o processual. Aqui, entra o conceito
central de crise; a crise, como destruição ou risco e oportunidade na sabedoria
comum, abre caminho para o desenvolvimento posterior, como novas espécies vivas
após uma grande extinção. O capitalismo não vai de equilíbrio em equilíbrio,
mas de crise em crise, como afirmou Elias Jabbour; talvez por Hegel ver apenas
o início de tal sistema, não tenha encontrado base material para seu grande
cérebro formular algo tipo, mais profundo do que este esboço em ensaio, além de
as ciências naturais estarem ainda engatinhando relativo ao que virá no século
XX. Assim, todo modo de produção entra em crise terminal após grande
desenvolvimento; assim, a psicologia tem suas fases e ciclos. A crise aparece
externamente como interrupção do processo, como apenas seu oposto, mas é, na
verdade, sua condição de autoelevação.
ENTRE O JUÍZO E O SILOGISMO
Hegel diz
que afirmações do tipo “ser é nada” ou “forma é conteúdo” são proposições impróprias,
imperfeitas, falhas e deformadoras. Pois bem; ao que parece, a formulação está,
apenas, em muitos casos, incompleta. Podemos dizer “nada é ser no devir” ou
“conteúdo é forma com matéria”; assim, mais do que apenas o simples “sujeito é
predicado”. Tal fórmula nem cai no juízo puro nem no silogismo completo, mas se
aproxima bastante da verdade. De modo cru, quer dizer “A = BC” ou “A é BC”.
Na fórmula
de fundo e de começo, temos “nada é ser no devir”. Isso permite várias
interpretações (assim como certas equações na física permitem diferentes
interpretações),
mas reforçamos o inicial de que o ser, em seu movimento, põe o nada relativo no
ente de si. Bem observado, rima com F=ma, ou seja, força é igual massa vezes a
aceleração; como força foi suprassumida pelo conceito energia, temos, no nível
superior, E=mc², energia é igual à massa vezes a velocidade da luz ao quadrado.
Serve bem para expor a substituição proposta de nada e força por energia, além
da referência ao espaço-tempo.
No mais,
tema lateral, elaboramos que nas determinações de desenvolvimento ainda temos
A=A e não-A com o acréscimo proposto de A=A e… não-A, pois incluímos o
movimento, ou seja, o tempo, este que está na própria coisa, na forma.
CONCEITO
Para Hegel, como
para Aristóteles, a vida tem seu impulso no conceito. Ele, assim, erra ao
acertar pela metade. O que há na ideia de vida, no interior, é energia – em
busca de mais energia. Sua escolha do conceito acerta apenas ao ser a
antecipação lógica, idealista, da realidade do DNA, materialista, o bloco de
informação da vida, que se reproduz.
Com a
unidade e a identidade de energia, em busca de mais de si, com o espaço-tempo,
que se condensa em matéria, temos a Arké, o absoluto, ou seja, uma nova
dialética, uma nova ontologia, uma nova metafísica. A ciência chega,
inevitavelmente, a um estágio em que é possível apenas grandes reformas
científicas, não mais revoluções do pensamento. Tal parece ser o caso da
Ciência da Lógica de Hegel; porém, torna-se possível uma reinterpretação
completa, que tem a dialética hegeliana como sua base inevitável por tanto ter
avançado – mas base ainda limitada, sem correto fundamento.
Hegel
pensou, por limite de seu tempo, que a Ciência da Lógica poderia sustentar-se
apenas, em seu início, na forma. Mas demostramos aqui que há um conteúdo,
conteúdo lógico-ontológico, fundamental. Quando ele diz, por exemplo, que o
devir, como unidade de ser e nada, desaba no ser aí, nunca oferece a base desse
desabamento, que nós oferecemos. Afirma ainda que no ser aí, ainda nada há do
espaço e do tempo, quando demonstramos que existem no próprio ser aí (na física
atual, tanto espaço quanto o próprio tempo estão apenas do lado de fora da
coisa, nãos e sabe como). Assim, acolhemos a forma da dialética hegeliana como
nossa, como nosso início e base, embora incompleta e sem base própria. A
categoria energia, por exemplo, perpassa e pervade as três modalidades do Ser –
ser inorgânico, ser biológico, ser social; além disso, na psicologia, a ideia
de Freud do sexo como pulsão elementar da psique,
tem dentro de si o conceito puro energia. O quase-materialismo de Hegel agora é
de fato materialismo dialético.
SISTEMÁTICO
Hegel diz do
método sistemático, para pesquisa e para exposição, com a analogia do
aprendizado da escrita, em sequência: começamos com as vogais, as consoantes,
as sílabas, as palavras, as frases e, enfim, o todo do texto. Ora, isso também
é diacrônico, no tempo: o homem primitivo teve de evoluir sua fala nesta mesma
sequência. As duas formas de serem sistemáticas são juntos e apenas um, mesmo
que ocorram, aqui e ali, certas incorrespondências. Hegel diz que o mais
simples e abstrato é o mais geral (hidrogênio, mercadoria, células etc.), logo
o começo da exposição, mas também é isso porque é o primeiro na história.
UNIDADE DE
PRODUÇÃO
Hoje sabemos
que o Ser é produção. As estrelas, por gravidade, produzem elementos novos,
cada vez mais pesados, perdendo energia em forma de fótons e neutrinos. A célula
é uma unidade produtiva que produz mais energia do que aquela exigida em sua
produção. O homem teve, por exemplo, o campo de trabalho escravo, o feudo, a fábrica
com trabalho manual e, agora, a fábrica sem trabalho manual.
SOBRE HIPÓTESES DA FÍSICA
Tal ontologia
e lógica têm relação imediata com a não vida, em especial a física. Fugindo de
premissas, hipóteses, princípios e postulados como da peste, devemos ao menos
esboçar sua relação com tal ciência.
1.
A ideia de
sobreposição de estados, de ser partícula e onda como se ao mesmo tempo, parece
encontrar boa saída na ideia de espaço-tempo condensado. Talvez, algumas
partículas não se rompam com o tecido espaço-temporal, ou apenas relativamente.
Assim, o elétron como onda, com o espaço enquanto meio, e como o si, carrega-se
a si mesmo como partícula – explica-se, assim, o experimento da fenda dupla.
2.
Tomemos este
dado: as galáxias mais distantes afastam-se mais rapidamente – por causa da
energia escura. Ora, se a gravidade é o típico do macro, logo tal afastamento
pode ser fruto de outros universos, mais condensados, atraindo, fazendo este
expandir. Em causalidade recíproca, uns expandem-se ou contraem-se exato porque
outros universos locais expandem-se ou contraem-se. O cosmos é união dos
universos em quatro dimensões espaciais (a última manifesta-se como tempo –
dizemos: ele percorreu certo espaço de tempo –, sendo o infinito, o para
dentro, o colateral dentro e fora das demais dimensões). Mas a gravidade é
muito fraca, exceção se os universos em contração passaram ao ponto de sugar
até o tecido do espaço.
3.
Ao que
parece, inexiste resposta sobre o motivo de o elétron não cair, já que é o
oposto, dentro do próton. O fato de o espaço curvar, e ser o autocurvar dele
cada matéria, causa a atração; mas exato por ser espaço condensado, tem
resistência à união. Ademais a “força” forte é o mesmo que a “força”
gravitacional, mas não em relação gradual, e sim por salto de concentração. Os
objetos se aproximam, entram nos “poros” ou espaços vazios, pressionam o outro
a se aglutinar em si mesmo e, enfim, fundem-se porque são o mesmo no fundo, no
fundamento, energia ou espaço-tempo concentrados. É como se o próton e o
elétron fossem cada um, algo incompleto,
algo que se dividiu e busca reunir-se novamente, cair um no outro; como a matéria
e antimatéria que deveria reunir-se e anular-se no passado.
A física
atual ainda considera o positivo e o negativo como algo dado, sem qualquer
explicação. Sequer trata o problema. Ou seja, ainda não sabemos o que é
positivo e negativo. Que o elétron seja negativo e o pósitron, antielétron,
antipartícula daquele, seja positivo, nada diz de si. Colocar tal propriedade
como algo da quarta dimensão seria uma resposta fácil, sem provas empíricas ou
matemáticas. É um desafio gigante nessa simplicidade. Portanto, uma explicação
digna disso deve explicar vários fenômenos ao mesmo tempo, como o spin do
elétron. Esperamos que a ontologia aqui posta ajude a encontra o caminho exato.
4.
Mostrei
minha ontologia ao físico Marcelo Gleiser por meio da internet, em seu grupo
“Ilha do conhecimento”. Algum tempo depois, soube que ele elaborou a tese de
que a matéria escura são bolhas transparentes de espaço. Não creio que seja
plágio, talvez inspiração. De qualquer forma, para mim, tanto a matéria escura
como toda a matéria e a luz são espaço condensado. Vale notar que ele fez um
comentário crítico: assim, deveria ser derivado todas as propriedades da
matéria do espaço, algo improvável. Ora, a diferença qualitativa dos átomos da
tabela periódica tem por debaixo uma diferença apenas quantitativa de prótons e
elétrons (e nêutrons); logo a diferença qualitativa do mundo e suas
propriedades é por diferentes níveis de energia-espaço-tempo concentrado e suas
interrelações.
5.
A teoria do
espaço da gravidade quântica em loop, com o tecido do espaço-tempo como uma
corrente, bem combina com nossa concepção de que tal objeto é tanto contínuo
quanto discreto – mostra que nossa base filosófica pode ter correspondentes
científicos. Há alguns anos, soube da teoria de que o universo primordial era
formado por partículas que entraram em forte interação, tornando-se
interligadas, ou seja, a “ação fantasmagórica à distância” ou entrelaçamento
quântico, formando o próprio espaço nessa “liga”. Isso combina com nossa
ontologia de que tudo é espaço-tempo condensado. Complementamos que o espaço,
podendo ser linhas de campo maleáveis, é o meio de tal ação, como a gravidade é
o próprio espaço. Outro caminho, mais intuitivo, mas talvez não novo, é a
quarta dimensão enquanto “caminho” da ligação entre partículas.
Lembremos
que, se temos apenas este universo, o espaço surgiu e expandiu-se desde o big
ban, o que indica um decaimento progressivo da matéria em espaço, já que são o
mesmo.
A esperança
é que nossa ontologia permita descobrir a unidade do micro e do macro (e do
meso),
a grande unificação da física quântica com a física cosmológica – insistimos:
tudo como espaço tempo condensado, energia em busca de mais de si. Isso também
indica que a pluralidade ou diversidade de campos, se confirmados, são, no
fundo, um.
Como ensaio,
este texto tem a liberdade necessária para arriscar. Mas, claro, cientistas da
área podem avaliar com imensa maior precisão o que está aqui escrito, se há
algo de fato útil. Além disso, se estamos corretos em geral, eles podem ir
muito mais longe numa pesquisa profunda a qual estou ainda apenas em seu
começo.
ALGO SOBRE O
ESPAÇO
Nossa lógica
e ontologia, nossa física metafísica, guarda dentro de si a dialética de Hegel,
mas não para nela. O espaço é o mais vazio, o sem determinações, sem
qualidades, o puro, a transparência transparente. Ao mesmo tempo, trata-se do exato
oposto disso, e isso leva a mistificações:
Esta
extensão infinita e imóvel (que é percebida tão seguramente na natureza das
coisas) não tem só a aparência de algo real (que comentaremos adiante), mas
também de algo divino, quando enumeramos os Nomes divinos ou atributos que lhes
convém exatamente, os quais darão ainda mais razões para crer que ela, com
tantos atributos notáveis, não pode ser nada. Tantos são os que pensam assim,
que os Metafísicos a assimilam ao Primeiro Ser: Uno, Simples, Imóvel, Eterno,
Completo, Independente, Existente por Si, Subsistente por Si, Incorruptível,
Onipresente, Incorpóreo, Aquele que Penetra e Envolve Tudo, Ser por Essência,
Ser em Ato, Ato Puro. Pelo menos vinte atributos existem para designar
habitualmente a Potência Divina, e todos convêm perfeitamente a esse Lugar
infinito interior que demostramos existir na natureza das coisas; sem esquecer
que ela, a Potência Divina, é chamada pelos cabalistas de “makom”, ou seja,
lugar. (More apud Jammer, Conceitos de espaço,
2009, p. 73)
Tal citação
erra e acerta ao mesmo tempo, pois mistifica. Além disso, o movimento, incluso
do espaço, é eterno, nada de imóvel – Ser é movimento, em geral, contraditório.
Também notamos que há uma interdependência e unidade íntima de matéria e
espaço, embora este, por ser o mais simples, além das demais características,
seja como a verdadeira base.
DESAFIOS DO MARXISMO
Apenas
podemos dedicar tempo e esforço
para assuntos secundários se os centrais estão resolvidos, mas não é assim que
os intelectuais marxistas têm operado. Vejamos as urgentes demandas teóricas e
práticas de nossa ciência:
1)
Teoria da
crise sistêmica.
É o mais
importante. Penso que este livro cumpriu tal tarefa ao menos nos seus aspectos
centrais.
2)
Sistematizar
a dialética materialista, marxista.
Aqui, também
temos a base de tal construção. Mas é necessário um trabalho crítico sobre as
modernas lógicas de modo a ter uma formulação quase inteira do tema. Minha
formulação do método “empírico-dedutivo”, onde se deduz o não empírico, incluso
conclusões, do – e da crítica do – empírico, é uma das contribuições concretas,
entre outras, desta obra sobre. Em meu livro de introdução ao marxismo – 50
ideias sobre marxismo – também exponho uma concepção de método dialético ao
qual indico leitura.
O debate é
difícil. O marxismo acadêmico da classe média nega a dialética, às vezes põe
“Marx contra a dialética”. Assim, falsificam a história. Em público e cartas
pessoais, Marx sempre deixou cristalino
que seu método era o dialético. Os falsificadores agem como os professores
medievais, que, diante da lógica da tradição, sempre diziam que suas próprias
ideias eram, na verdade, de algum pensador antigo com prestígio. Sem qualquer
conhecimento geral das ciências, dizem também que a dialética é apenas algo
sobre o capitalismo; ora, o próprio Marx diz em O Capital que é uma contradição
um planeta ao redor de sua estrela tender, ao mesmo tempo, a se afastar e a se
aproximar dela – a contradição dialética está em toda parte, em cada coisa. O
próprio Marx apoiou o Anti-Dühring de Engels e seu projeto de dialética da
natureza.
Para Hegel,
a contradição era externa, com a unidade interna. Para o marxismo, a
contradição também é essencial, interna. Por isso, formulei há pouco que
quantidade e qualidade, intensidade e extensidade, forma e conteúdo, energia e
espaço são transitoriamente contraditórios, não só opostos em unidade ou
identidade.
As
categorias centrais são, reforçamos: 1) totalidade; 2) contradição; 3)
movimento (mudança, desenvolvimento). Elas pressupõem: 1) integração; 2)
(auto)relação; 3) pulsão ou movimento.
Minha
dialética difere-se da de Hegel, além de ser materialista de fato, no seguinte:
1) Hegel, em geral, pensa apenas a passagem de umas categorias para as outras,
mas não o movimento e evolver interno delas – em muitos casos, bastou colocar
as determinações de sua Lógica em evolver, em passagem interna; 2) ele põe a
oposição e a unidade das categorias, mas não foca na contradição delas; 3) na
sua concepção de fim da história, pensa ter esgotado as determinações, as
categorias, mas, como vimos, havia – e há – muito a desenvolver ainda (ordem e
caos etc.); 4) ele foca no “isto e aquilo” enquanto acrescento, junto, dentro
um do outro, o “nem isto nem aquilo” (a URSS era socialista e capitalista, mas
também, por isso, nem socialista nem capitalista – verdadeiro e falso com, no,
nem verdadeiro nem falso); 5) dou um conteúdo à dialética, o espaço-matéria ou
energia; 6) elevo o movimento ao seu caráter absoluto, como fez Engels; 7)
demonstro e desenvolvo o “procedimento” dialético com precisa clareza, o
empírico-dedutivo, ao apresentar a fusão de empirismo e racionalismo, como o
caminho do Ser para a Essência, do externo para o interno, da diversidade para
a unidade, da aparência para a essência etc.
Vejamos um
exemplo. Segundo muitos intérpretes de Hegel, como Safatle, o que parece ser
correto sobre como o alemão pensava, a passagem da identidade para a diferença,
para a diversidade, para a oposição, para a contradição – é lógica, não
temporal. Ao ver o idêntico, A=A, logo percebemos que há a diferença aí, a
diversidade etc. Mas demostrei antes, com exemplos da ciência, que essa
passagem, mesmo se imperfeita e incompleta, é movimento de fato, no tempo.
Quando há a fecundação, por exemplo, a célula única, igual a si própria,
multiplica-se em células iguais a si, mas que vão se diversificando, se
especializando, se diferenciando… rumo ao feto maduro. Isso, o movimento,
ocorre por energia-matéria-espaço em busca de mais de si. Portanto, pensar que
a última palavra foi dada sobre o assunto é render-se, erro, castração ou
preguiça intelectual. A tarefa não está em negar a dialética de Hegel, mas em
suprassumir suas formulações.
Aqui, foram resolvidos,
enfim, as antinomias de Kant contra o materialismo. O universo é infinito ou
finito? A matéria é divisível ao infinito ou indivisível? Há uma causa primeira
ou não? Apenas uma dentre elas não resolvi, pois Hegel e Marx já ofereceram as
respostas necessárias: há determinismo da necessidade e das leis ou também liberdade
humana? A
causalidade foi bem resolvida por Hegel, complementada por nós aqui, mais a
concepção de substância, de causa sui,
causa de si mesma, para o espaço, o espaço-matéria.
Em capítulo
anterior, apresentei uma alternativa à dialética de Hegel, onde uma categoria é
real enquanto sua oposta é fictícia, como o vazio ou o nada, ou Deus e seu
reino em oposição ao mundo. Assim, existe a constituição, não a determinação;
existe o infinito, não o finito; existe a essência, não a aparência; existem as
propriedades ou matérias, não a coisa em si etc. Mas, embora interessante,
descartamos tal formulação, pois ela é menos, não mais.
O método
dialético é ontológico, não gnosiológico, por isso as provas da teoria estão na
própria realidade; mas permite alguma gnosiologia possível. Primeiro, uma teoria
correta deve ser sistemática, ou seja, cada conclusão deve derivas as outras, e
vice-versa, formando um todo artístico; segundo, de modo algum deve estar ao lado
das demais teorias e explicações, pois deve ser capaz de dizer porque elas estão
erradas, porque parecem corretas. Reforçamos que tais critérios continuam
secundários e subordinados.
3)
Refundar a
ontologia e a metafísica.
Para acusar
alguma ideia, basta nomeá-la metafísica. Mas: quem é contra saber a natureza
essencial da realidade? Ninguém são seria adversário de tal meta. Tal eixo está
junto ao ponto 2, inseparáveis. A concepção energia em busca de mais de si e
espaço-tempo condensado permite tal unificação e desenvolvimento. A ontologia
do ser social de Lukács abriu o caminho, mas ainda há estrada por percorrer,
incluso nos seres inorgânico e biológico, além do Ser em geral.
4)
Teoria
unificada da psicologia.
Wallon,
Vigotsky e Freud devem ser a principal base de uma teoria segura da psique. De
modo algum é admissível uma pluralidade teórica, um apenas ao lado do outro. A
ciência dialética tem a prova de sua teoria na realidade, ontologicamente, mas
há possíveis critérios gnosiológicos secundários, como a capacidade de mostrar
porque outras teorias, ao mesmo tempo, acertam e erram. O caminho é facilitado
porque as construções teóricas caíram em duras oposições, em geral unilaterais,
abrindo espaço para, ao mesmo tempo, o “nem isto nem aquilo”, como com o nem
verdadeiro nem falso, e o “isto e aquilo”, como com o verdadeiro-falso – a
crítica movente.
5)
Ética ou
Moral marxista.
Como
dissemos, Trotsky e Lukács esboçaram o assunto. A contribuição trotskista é
suficiente para a prática militante, mas incompleta. Dialética e teoria da
alienação, como na contribuição esboçada por mim antes, são a base de tal
trabalho.
6)
Balanço
crítico da história das revoluções e contrarrevoluções.
É necessário
um trabalho profundo, que alcance leis e padrões, lições, da história de
situações revolucionárias no mundo. Isso se une, por exemplo, com a lei, aqui
exposta, de que a história opera por ensaios gerais antes da consolidação plena
das condições para o novo.
7)
Manual
militar completo.
Trotsky
propôs que os militares do Exército Vermelho elaborassem um manual inteiro, com
todos os cenários e situações possíveis, para que os comunistas soubessem
liderar. O projeto nunca veio à prática. Com as muitas mudanças no mundo
militar hoje, com as dificuldades imensas atuais, precisamos, para ontem, de um
manual completo e didático.
8)
A dialética
da natureza.
A ciência
moderna é um mar de revoluções e de incompletudes. Engels, por outro lado,
deixou inacabado seu projeto de uma dialética natural. É tarefa urgente; por
isso, tendo já dado pelo menos a base aos demais, será alvo de meu foco nas
próximas décadas. A física, em especial, pôde ampliar-se por muito tempo focada
quase apenas no “como”, próprio do uso industrial de tal conhecimento, mas é
chegada a hora de saber o motivo, o “porquê”.
A NOVA DIALÉTICA
O método
dialético de Marx ainda falta a uma sistematização rigorosa em uma obra. Tal
projeto exigirá, para fins de atualização, estudo crítico de toda a ciência
moderna. Ademais, a última grande contribuição categorial foi feita no início
do século XX com a lei do desenvolvimento desigual e combinado descoberta por
Leon Trotsky. Aqui, iremos oferecer alguns possíveis aportes ao sistema lógico;
para este objetivo, tentaremos dispor exemplos de como a dialética das
categorias propostas está na própria realidade.
CONCRETO E ABSTRATO
Temos quatro definições comuns sobre as
categorias concreto e abstrato:
1.
Abstrato: elevar em conceitos mentais a
realidade, fazendo uso de generalizações, de modo a reproduzir a natureza deste
último no pensamento.
Concreto: a realidade mesma,
independente de uma reflexão, e sua dinâmica.
2.
Abstrato: um elemento separado de sua
totalidade.
Concreto: síntese de múltiplas determinações.
3.
Abstrato: descrever a realidade, o
objeto, em sua generalidade, em seus aspectos gerais, retirado as
particularidades, as irregularidades acidentais e fatores externos.
Concreto: descrever a realidade, o
objeto, em seus aspectos específicos, particulares e conjunturais, agregando
fatores externos e irregulares.
4.
Abstrato: geral, indiferenciado. O
trabalho abstrato, ligado ao tempo é exemplo do abstrato existente na
realidade.
Concreto: específico. O trabalho
concreto, que produz valor de uso, é exemplo.
No entanto parece existir outra
interpretação, outra forma de tratar duas categorias íntimas e próprias da
realidade. Antes de expressá-la, convido o leitor a ler este trecho de Marx,
Introdução Para a Crítica da Economia Política (1857):
“Os economistas do século XVII [que],
por exemplo, começam sempre pelo todo vivo: a população, a nação, o Estado,
vários Estados etc.; mas terminam sempre por descobrir, por meio da análise,
certo número de relações gerais abstratas
que são determinantes, tais como a divisão do trabalho, o dinheiro, o valor
etc. Esses elementos isolados, uma
vez mais ou menos fixados e abstraídos, dão origem aos sistemas econômicos, que
se elevam do simples, tal como trabalho, divisão do trabalho, necessidade,
valor de troca, até o Estado, a troca entre as nações e o mercado mundial. O
último método é manifestamente o método cientificamente exato. O concreto é concreto porque é a síntese de múltiplas determinações,
isto é, unidade do diverso. Por
isso, o concreto aparece no pensamento
como processo de síntese, como
resultado, não como ponto de partida, ainda que seja o ponto de partida efetivo
e, portanto, o ponto de partida também da intuição e da representação.” (Marx, O Método da Economia Política, 2019, grifos
nossos.)
Como observamos, está de acordo com os
quatro critérios acima apontados. Porém, Marx trata aí de um método do
pensamento, de fazer ciência, não da realidade por si mesma; digamos que, de
maneira indireta, trata-se apenas de uma dialética do pensamento ao reconstruir
a estrutura dialética do real. Muito mais que isso, temos percebido que esse
processo de pesquisa, “mental”, também ocorre como lei geral do próprio
movimento da matéria, como fenômeno material em si. Observemos: a citação segue
a seguinte sequência: 1) concreto “amorfo”; 2) abstrato, as partes, o adentrar
cada vez mais nas partes de um todo; 3) reconexão das partes, retorno ao
concreto de modo superior.
Demonstraremos que este movimento é o
próprio movimento da realidade. Vejamos esse movimento por meio de uma citação
de outro dos meus textos:
Os Estados Unidos Socialistas da Europa
são mais necessários do que nunca. Na Idade Média a Europa desconhecia
fronteiras, nações, nacionalidades, etc. Os habitantes desse continente viam-se
como “o mundo cristão” e tinham em comum a história, o Latim, a Igreja Romana,
o sistema feudal, etc. De fato, era uma massa única, homogênea e de
particularidades internas pouco definidas – chamemos concreto ou concreto
simples (ou podemos tomar por referência o grande Império romano).
Imediatamente após, a burguesia inicia sua tarefa de formar países,
Estados-nacionais, exércitos, fronteiras definidas, nacionalismo, identidade,
impostos unificados, etc.: a Europa continua Europa, entretanto suas partes
separam-se em uma “relação alienada” ou “relação, porém alienada” e isto foi
vital para desenvolvimento das partes e do todo; chamemos abstrato. Este
processo desenvolveu as partes, os países do mundo europeu, assim como suas interconexões, a tal
ponto que amadureceram e agora (!) pedem fusão, integração, união e superação
dos limites nacionais; este é o concreto complexo em latência, ou seja, o
desenvolvimento econômico-social avisa-nos que deseja voltar ao começo, ao
negado, ao antes do abstrato, ao concreto só que de modo diferente, superior,
superante. Isso aponta a revolução socialista europeia: o Euro e a União
Europeia são mediações, deformantes, propostas pelo capital e pelo
imperialismo, para essa necessidade objetiva.
Na história das ciências essa tendência
também se revela: todas as ciências eram, em estado inferior, reunidas na
filosofia; depois, foi necessário separá-las e desenvolvê-las individualmente;
agora, a tendência é reuni-las na físico-química, na psicologia (ciências
sociais somadas à biologia), no marxismo (fusão de todas as chamadas ciências
humanas em uma única ciência – a ciência humana –, incluindo influência de base
da biologia, etc.). A atual fragmentação das ciências sociais em áreas
particulares, com muito peso pós-moderno, excluídas umas das outras será
reconciliada com a renovação marxista das universidades no socialismo.
O movimento concreto-abstrato-concreto
revela-se em um novo significado; temos, então, um suporte categorial a mais
para auxiliar o trabalho científico e o treinamento dialético do raciocínio.
Agora, vejamos um trecho de O Capital I
onde observamos um exemplo específico do concreto-abstrato-concreto tal como
destacamos:
O que é válido para a divisão manufatureira do
trabalho na oficina vale também para a divisão do trabalho na sociedade.
Enquanto artesanato e manufatura constituem a base geral da produção social, a
subsunção do produtor a um ramo exclusivo da produção, a supressão da
diversidade original de suas ocupações é um momento necessário do
desenvolvimento. Sobre essa base, cada ramo particular da produção encontra
empiricamente a configuração técnica que lhe corresponde, aperfeiçoa-a
lentamente e, num certo grau de maturidade, cristaliza-a rapidamente. Além dos
novos materiais de trabalho fornecidos pelo comércio, a única coisa que provoca
modificações aqui e ali é a variação gradual do meio de trabalho. Uma vez
alcançada a forma adequada à experiência, também ela se ossifica, como o
comprova sua transmissão, muitas vezes milenar, de uma geração a outra. É
característico que, no século XVIII, ainda se denominassem mysteries (mystères)
[mistérios] os diversos ofícios em cujos arcanos só podia penetrar o iniciado
por experiência e por profissão. A grande indústria rasgou o véu que ocultava
aos homens seu próprio processo social de produção e que convertia os diversos
ramos da produção, que se haviam particularizado de modo natural-espontâneo, em
enigmas uns em relação aos outros, e inclusive para o iniciado em cada um
desses ramos. O princípio da grande indústria, a saber, o de dissolver cada
processo de produção propriamente dito em seus elementos constitutivos, e,
antes de tudo, fazê-lo sem nenhuma consideração para com a mão humana, criou a
mais moderna ciência da tecnologia. As formas variegadas, aparentemente desconexas
e ossificadas do processo social de produção se dissolveram, de acordo com o
efeito útil almejado, nas aplicações conscientemente planificadas e
sistematicamente particularizadas das ciências naturais.
[Nota de rodapé 304] Segundo o
Statistical Account, em algumas partes montanhosas da Escócia [...] havia
muitos pastores de ovelhas e cotters [Camponeses parceleiros nas terras altas
escocesas], com suas mulheres e seus filhos, calçando sapatos feitos por eles
mesmos, de couro curtido por eles mesmos, com roupas que não haviam sido
tocadas exceto por suas próprias mãos e cuja matéria-prima era a lã e o linho
que eles mesmos haviam respectivamente tosquiado e plantado. Na confecção de
suas vestimentas dificilmente entrava algum artigo comprado, exceto a sovela, a
agulha, o dedal e algumas peças de ferro utilizadas para tecer. As tinturas
eram obtidas, pelas próprias mulheres, de árvores, arbustos e ervas”, Dugal
Stewart, em Works, cit., v. VIII, p. 327-8. (Marx, O capital I, 2013, p. 556)
Na primeira citação de Marx, o concreto-abstrato
está expresso numa relação sincrônica do objeto. Por exemplo: o corpo humano
(totalidade), complexo de complexos, é dissecado pelo anatomista; este estuda a
natureza e função de cada órgão, nervo, osso e pedaço do corpo (abstrato); com
isso, procura e percebe as ligações, as interconexões e interdependências de
cada parte, umas com as outras; daí, cada vez mais ele vai construindo uma
compreensão profunda do todo, do corpo (concreto) (exemplo bastante parcial,
pois o marxismo teoriza o sistema orgânico e vivo, em devir). Já a segunda
citação do mouro demonstra uma relação também temporal, do objeto no tempo,
diacrônico. Por exemplo: primeiro, produção artesanal ou primitiva (concreto);
depois, cooperação e manufatura (abstrato); em seguida, grande indústria (cada
vez mais concreto). Quando Marx afirma que o abstrato não forma o concreto, ao
contrário do que pensava Hegel, ele acerta quanto aos modos sincrônicos, as
estruturas, porém deixa de observar que a relação categorial ainda assim é útil
no diacrônico, como um processo.
As diferentes formas de arte encontravam-se
misturadas em seus inícios. Depois, ocorreu o desenvolvimento das artes
particulares, a especialização, a separação (a poesia da música, o romance da
poesia, etc.). Hoje, o cinema e os jogos de vídeo game fundem artes separadas
na mesma obra.
Padrão da geologia. Do concreto amorfo,
surgiram progressivamente os continentes iniciais, proto-continentes elevados
no período Arqueano, que, após processo longo, fundiram-se no Pangeia; este,
por suas vez, separou-se nos atuais continentes do planeta. O atual afastar
aproxima.
Com o desenvolvimento do mundo das
mercadorias, desenvolveu-se o comércio de dinheiro e a produção de mercadorias.
Na época do capital, novas empresas comerciais, industriais, bancárias, de
serviços surgiram, cresceram, ampliaram-se. Ainda hoje surgem novas empresas,
porém a tendência geral é a fusão de setores produtivos, da indústria com os
bancos, do comércio com os demais setores, a formação de oligopólios que tratam
desde a extração da matéria-prima necessária até a venda final, a formação de
conglomerados, etc. Se vencer, o socialismo conclui tal tendência à fusão e
centralização unificando todas as grandes fábricas, os comércios e os bancos em
um só corpo a partir de um planejamento centralizado e democrático geral;
surgirá o banco único do Estado, por exemplo, antes da extinção ou quase
extinção do dinheiro (após certa maior unificação deste); o socialismo, assim, supera
o próprio capital no processo de sua unificação.
Sem confundir especulação com ciência
propriamente dita, podemos fazer algumas observações, sob risco de dizer
absurdos. Primeiro, após expandir-se, o universo passará a contrair-se, as
partes unindo-se após o desenvolvimento dos abstratos, como teorizam alguns
físicos, com os buracos negros cumprindo papel central. Em segundo, lembremos
que o bom infinito é o infinito qualitativo, não quantitativo, que funciona
como se um círculo, sem começo nem fim – considerado isso, podemos pensar que
há uma quantidade finita de universos que estão conectados, mais do que apenas
um ao lado do outro, com autonomia apenas relativa em relação aos demais, como
um hipercubo em automovimento, em que a expansão de alguns universos
corresponde, por interação, por influência recíproca, à contração de outros, e
(ou) vice-versa, a contração de uns expande outros. Desse modo, fundimos as
hipóteses, opostas, do multiverso no tempo e no espaço.
No movimento concreto-abstrato-concreto
é importante ter em conta que o abstrato é por si próprio a formação processual
do concreto, interno, na parte, e externo, no todo. Também destacamos o
processo de transição a partir do concreto
em latência, quando o desenvolvimento do abstrato, que também é o da
inter-relações, tem alto avanço sob suas bases; exemplo é a concorrência de
monopólio atual entre a concorrência capitalista, cada vez mais superada, e o
monopólio social no socialismo, cada vez mais latente.
O primeiro concreto é o mais relativo
de modo que o abstrato, rumo ao concreto, aparece como início e base do
movimento.
Hegel quase alcançou tal conclusão ao
afirmar que o entendimento, separar e fixar conceitos, e a razão, ver a unidade
dos conceitos, estão também na própria realidade; mas ficou apenas aí como um
ótimo idealista. Expomos em primeira forma acaba o que é intuição no hegelianismo.
Tal modo de ver o abstrato-concreto está, também, intimamente ligado à
dialética da repulsão-atração.
TRÍADE E COLATERAL
A lógica dialética de Hegel e, de modo
materialista, de Marx apresenta a relação de tríade. Tais relações em trio, que
são relações categoriais, também ocorrem no real. Para exemplificarmos, algumas
inter-relações de tríade: a) infraestrutura, estrutura, superestrutura; b) ID, ego,
superego; c) inconsciente, subconsciente, consciente; d) proletariado, setores
médios, burguesia; f) indústria de bens de produção, indústria de bens de
consumo, indústria bélica; g) prótons, elétrons, nêutrons; i) forças produtivas
natureza, técnica, homem; j) matéria-prima, maquinário, trabalhador; etc. Quando
e se há, um quarto elemento ou o que destoa chamemos colateral, o que está ao mesmo tempo dentro e fora, separado e
integrado.
Nessa obra, essa dialética, manifestada
no inchaço do colateral, se apresenta em especial na hiperinflação do capital
fictício, no alto desenvolvimento do setor de serviços e aumento da subclasse
dos desempregados. Esses inchaços colaterais
são expressões e consequências do alto amadurecimento e definhar do sistema
capitalista.
Na física, podemos expressar nos quatro
estados típicos da matéria: sólido, líquido, gasoso e plasma. Também observamos nas forças fundamentais: força nuclear
forte, força nuclear fraca, eletromagnetismo – e a gravidade. Mas a gravidade
está “dentro e fora”, pois desde Einstein sabe-se que esta não é uma força mas
curvatura do espaço-tempo. Dai a dificuldade dos cientistas de, após unificar
as três primeiras, fazer a unificação matemática das quatro forças
consideradas.
Continuemos com exemplo de tríade na
química, em forma de organização estrutural (abstraído, na formulação retirada,
o movimento). Ao tentar classificar – método aristotélico, lógica formal – os
elementos químicos, agrupando-os de modo lógico, o químico alemão Johann Wolfgang
Dobereiner, em 1817, percebeu que no agrupar de elementos de propriedades
semelhantes, tomando a forma de grupos de três, um deles tinha a massa atômica
(MA) como média aritmética dos outros dois… Chamou “lei das tríades”. Exemplo:
Cloro (Cl), Z 25,5; Bromo (Br), Z 80; Iodo (I), Z 137. Seu modelo foi rejeitado
por considerem limitado para classificação simples dos elementos em geral,
reunindo-os. Em versão hoje aceita, na tabela periódica, onde há o avanço do
mais simples ao mais complexo na formação de elementos: entre metais e não
metais, há os semimetais ou metaloides, de características parciais de um e
outro – e os gases nobres ou raros (colateral).
Utilizando tal ferramenta, Hegel
afirmou existir três macroclimas: muito úmido e frio, muito seco e quente e o rico
intermediário entre ambos (tríade). Leitor disciplinado da produção hegeliana,
Euclides da Cunha, afirmou na obra Os Sertões (Cunha, 2002)
que o filósofo alemão deixou de notar o perfil de alguns climas brasileiros –
cap. V, em A Terra, subcap. “Uma Categoria Geográfica que Hegel não Citou” –,
em especial o sertão (no livro citado, faz comentários sobre este fator sui
generis de norte a sul da nação, em diferentes paisagens), onde as chuvas em
excesso por meses ocorrem após secas por maior período, onde o calor violento
do dia contrasta com o frio agressivo da noite, etc. Isto é: colateral.
Relativo aos anteriores sistemas – o
primitivo, o escravista ou o asiático e o feudal –, o capitalismo cumpre a
função histórica de colateral. Abre transição para o fim das classes no lugar
de novas formas, baseia-se nas crises de superprodução substituta das de
subprodução, sistema social de dominação disfarçado por uma liberdade geral
formal, a mais laica das formas de controle, o lado mais dinâmico da economia
ocorre na grande produção não rural, as fontes “paralelas” e secundárias de
riqueza em outros sistemas – artesanato, comércio e comércio de dinheiro –
tornam-se centrais (e, para reforçar o argumento da próxima nota de rodapé, são
elementos de dissolução de sociedades), apenas pode existir generalizando-se e
destruindo as antigas atividades, recruta para as forças armadas do Estado
membros das classes subordinadas, necessitou de uma classe à época
revolucionária para consolidar-se, expulsa o princípio da tradição e da rotina,
a produção de riqueza em valores de uso é secundário em relação à produção de
valor e sua acumulação na forma de dinheiro. Por esse ponto de vista, ainda
sendo um modo de vida, uma época inteira, ao mesmo tempo, o capitalismo nada
mais é do que a forma de transição e transitória entre as sociedades classistas
e a sociedade comunista.
No capitalismo, os capitais a juros,
industrial e comercial, inflando-se, dão suporte ao setor de serviços e ao
capital fictício.
Temos três modalidades do Ser:
inorgânico, orgânico e social – e objetal (falso ser correspondente à
alienação).
O
desenvolvimento de uma tríade forma também o colateral e, em conjunto, são
parte de um todo que se forma.
Hegel
apreciava exemplos da mitologia cristã para tratar das categorias. Tomemos tal
metáfora: a Santíssima Trindade é trina e una ao mesmo tempo; mas, e mais, saiu
de si o externo, o anjo Lúcifer, cuja existência reforça seu oposto.
Para
encerramos as observações e os exemplos, faremos um último destaque. É comum na
tríade que aquilo “entre” seja o “menos igual a si próprio” em sua variedade ao
ser transição entre um e outro. Ex.: entre o proletariado e a burguesia há uma
miríade de setores médios – a subclasse de desempregados e o lupemproletariado
(mendigos, ladrões, prostitutas, etc.) são colaterais.
REAL E
FICTÍCIO
O movimento do real ou verdadeiro rumo
ao fictício ou falso e o inverso – pois este desenvolve aquele em si – ocorre
na materialidade. Exemplo: o desenvolvimento do valor-capital, realização,
desenvolve o capital fictício. Veja-se que em sua própria origem o capital já se
estimula, no capital mobiliário, à concentração e ao desenvolver do capital
imobiliário, a terra, que tem preço, mas não valor. Na economia vulgar, há o
instinto de contrapor a superestrutura financeira, incluso o capital fictício,
à nomeada economia real. Um lucro especulativo, por exemplo, é em si e em
aparência real, mas fictício visto na totalidade e na essência (Carcanholo & Sabadini, 2011).
O real produz dentro de si sua própria
ficção. Este é meio que tem em si o próprio processo de realização. A própria
formação humana, sua realização, produziu o fictício: a arte, ficção do e
dentro do real. O fictício, existente, aparece como simulação do real. A ficção
é e não é; por ser vazio dentro de si, opõe-se ao seu não ser, o real. No
lastro lógico, o real corresponde ao ser enquanto o fictício corresponde ao
nada; neste último, a ficção, fica mais evidente a unidade de nada e ser.
A categoria fictício deve ser afastada
da pura palavra falso no sentido puro de erro, sendo diferentes; o fictício
está dentro do real e é autodesenvolvimento deste. A relação entre verdadeiro e
falso na lógica formal é correta em seu nível, trata de especificidades
externas, parciais e estáticas. Na dialética, o falso, o fictício, o pseudo, o
imaginário, o artificial ou o virtual tem a realidade desenvolvendo-se dentro
de si. Também se diferencia da relação dialética real e irreal.
Em matemática, a teoria dos conjuntos
numéricos, por meio da evolução social da humanidade, desenvolveu o conjunto
dos números reais (naturais, inteiros, racionais e irracionais) até alcançar os
números imaginários, fictícios.
Marx trata de grandes fatos da história
que se repetem acontecendo primeiro como tragédia e depois como farsa. A
palavra – e o evento – farsa tem duplo sentido, duplo caráter: significa uma
comédia e, além disso, o teatralismo ao imitar símbolos históricos passados.
Em psicologia, Lacan, inspirado em
Hegel, trata do real, do simbólico e do imaginário. Além do Eu ou Self, Winnicott descobre a existência do
falso Eu ou falso Self. Podemos arriscar ao dizer que o pensamento é uma
ficção, uma alucinação relativa (a esquizofrenia seria, assim, sua inflação
desregulada como luta contra a realidade estressante).
O atual desenvolvimento
técnico-científico, precisando de novas relações de produção, produz, nesta
forma de sociedade, fenômenos sociais fictícios. É o caso do capital fictício
produtivo, valorização do capital sem exploração direta do trabalhador, na
automação, que nada terá de ficção no modo de vida próximo; e da onda de falsas
notícias, as fake news, permitidas tecnologicamente e sob – por razão das –
atuais bases das relações sociais. Numa sociedade cooperada, a falsificação da
informação será algo raro e marginal, sendo hoje consequência da luta de
classes com sua forma de luta política mais os meios para falsificar (que não
são causa, apenas meios e possibilidades).
O real encaminha-se ao fictício; e este
é, por isso, ficção real. É o caso das partículas fictícias ou quasipartículas
em física. Em biologia, os pseudofrutos são bons exemplos. Outros casos, mais
abstratos, são a força centrífuga como pseudoforça e as falsas espirais na
matemática. Em geral, a própria nomeação científica, embora partindo do sujeito,
revela a natureza; nosso trabalho aqui, portanto, é perceber e destacar sua
unidade interna.
A unidade do real e do fictício é o real
efetivo ou completo.
Notemos que é preciso evitar a
vulgarização do uso da categoria ficção.
É o caso de Karl Polanyi ao afirmar que o dinheiro, o trabalho (a força de
trabalho) e a terra (natureza) são mercadorias fictícias.
Marx demonstrou que o dinheiro é a mercadoria por excelência, que o capitalismo
surge transformando a força de trabalho em importante mercadoria por ser capaz
de produzir um valor maior do que custa ao capitalista, que a natureza é a
fonte de toda riqueza junto ao trabalho em qualquer sistema econômico. Há aí,
em Polanyi, apenas um erro teórico e um erro categorial. Outro exemplo: dizer
que teorias são ficções esquece que a verdade é aproximativa, por aproximações,
que a ciência evolui, chegando a verdades estáveis o bastante. Mas vamos,
agora, ao extremo: “atualizando” Hume e Kant, um filósofo vulgar e apressado
nas generalizações pode criticar Hegel, preso ao entendimento, usando a navalha
de Ockham como um açougueiro, dizendo isto: o nada é a ficção do ser,
a negação é a ficção da determinação, o outro é a ficção do algo, o finito é a
ficção do infinito (ou o inverso), a determinação é a ficção da constituição, a
barreira é a ficção do dever ser, a aparência é a ficção da essência (ou o
contrário), o contínuo é a ficção do discreto, a identidade é a ficção da
diferença, a coisa em si é a ficção da matéria ou propriedade, a causa é a
ficção da consequência, o fundamento é a ficção do fundamentado, o acaso é a
ficção da necessidade (ou o inverso), o universal é a ficção do singular (ou o
inverso). Esse mau raciocínio, do uso indiscriminado do conceito ficcional, uma
filosofia fácil de fazer sem muito esforço, ocorre por não perceber que a
ciência vai fundo, percebe aquilo que não se revela ao cientista imediatamente,
aquilo que tem de ser descoberto (a causa, o fundamento, a essência, o geral, a
determinação, etc.) – daí a dialética, a Ciência da Lógica.
***
O leitor
acostumado com a dialética pode observar que, desde caos-ordem, a relação
categorial abstrato-concreto passa-se para a tríade-colateral e, em sequência,
passa-se este para real-fictício. O desenvolvimento de si do abstrato dá a base
para a tríade-colateral e, por outro ângulo, para real-fictício; além disso, da
abstração, na medida em que há concentração e centralização, tem-se o central-orbitante (que trataremos a
seguir). Há, assim, uma passagem lógica
dos conceitos, uns para os outros, em uma sequência não arbitrária (que
quebraremos propositadamente). No entanto, concordamos com Engels e Lukács
sobre que tais passagens, tais derivações, são artificiais na Ciência da Lógica
de Hegel e, complementamos, também aqui. Dito isso, avancemos.
CONCEITOS
NECESSÁRIOS SUBJETIVOS E OBJETIVOS
A dialética
trata dos aspectos gerais do movimento da realidade. Nesta concepção, expõe o
desenvolvimento do saber científico. O método dialético afirma que os conceitos
necessários são objetivos, reais, em oposição ao idealismo, como o de Kant, que
os considera subjetivos, externos ao objeto, para fins de organização mental.
O conceito
de campo avançou de uma consideração “metafórica” para uma verdade objetiva. O
mesmo ocorre na biologia com o conceito gene quando Morgan demonstrou em 1910
que a conceituação tinha uma forma física. Algo semelhante acontece, ainda sob
larga resistência, com o conceito de energia em física e química. Nas ciências
humanas, o conceito de valor ganha sua validade plena com Marx.
Percebemos o
movimento do pensamento científico. O conceito subjetivo necessário revela-se,
no segundo momento, objetivo. Na objetividade do conceito necessário está a sua
verdade. O conceito necessário subjetivo só se realiza quando se torna seu
outro, quando se demonstra completamente necessário porque real. O conceito
ainda subjetivo é necessário porque em verdade é objetivo.
O exemplo
mais destacável é a do espaço-tempo, isto é, quando Einstein deu forma à
concepção do materialismo dialético. O espaço e o tempo existem, são objetivos,
diferente do que afirmava a anterior concepção subjetiva, idealista.
Há, porém,
uma consideração minoritária. O tempo existe ou é a medida do movimento? O
conceito filosófico de movimento estende-se em 1) deslocamento, 2) mudança e 3)
mudança por deslocamento. Se levamos a concepção anterior a Einstein às últimas
consequências, o que altera é a massa, o volume, o tamanho do objeto segundo
sua velocidade, ou seja, reduz ou aumenta, altera-se, a perecibilidade e as
dimensões. Assim, as provas práticas da objetividade do tempo seriam
demonstrações da alteração do corpo (satélite, relógio atômico, etc.) captadas
pela medida. Nessa concepção, o espaço-tempo seria substituído pelo espaço-movimento.
Mas a medida, para Hegel, tem presença no mundo objetivo; “o movimento” é
“unidade do espaço e do tempo” (Hegel F. G., 1995, p. 339).
ETAPISMO E
SUBLIMAÇÃO
Ser contra o etapismo é diferente de desconhecer
a existência de etapas de desenvolvimento. O processo é mais dinâmico, pelo
grau das contradições, que a visão linear de evolução. A consideração
unilateral dos opostos, etapismo e sublimação, encontra unidade interna no
condicionamento recíproco de um no outro.
A crítica ao
etapismo na política, existente entre os antigos partidos social-democratas e
os estalinistas, também criou a posição oposta ao negar etapas necessárias, a
que chamamos, nessa vulgarização da negação do etapismo, concepção de sublimação.
É evidente que muitas sociedades passaram direta e violentamente do
primitivismo ao capitalismo comercial, que há saltos, que há não evolução
linear, há recuos que resguardam parte do avanço, etc. Também evidente que no
todo a humanidade seguiu etapas: primitivismo, escravismo, feudalismo,
capitalismo, no desenvolver histórico geral da produtividade social do
trabalho, no evoluir contraditório dos modos de produção.
Na
cosmologia, a aparente contradição de surgir buracos negros primordiais na fase
inicial do cosmos foi resolvida considerando tanto o processo da dinâmica de
formação quanto, por meio da simulação computacional, descobrir que o próprio
processo geral obrigou a formação direta, por salto, de buracos negros. Ainda
assim, o universo tem eras próprias e o caminho comum foi da concentração de
hidrogênio e de hélio por meio da gravidade, formação posterior de estrelas e,
apenas aí, formação de buracos negros.
É preciso
considerar a existência real de etapas necessárias para então considerar os
saltos. Porque há etapas é que pode haver negação – ou combinação – delas.
Enfim, a totalidade segue etapas ainda que as partes, por razão das
interinfluências, operem saltos.
CENTRAL E
ORBITANTE
Lucáks
critica Hegel por este deixar de perceber que as categorias de A Ciência da
Lógica nos livros Doutrina do Ser e Doutrina do Conceito deveriam seguir a
forma de determinações de reflexão do livro A Doutrina da Essência (Lukács,
Prolegômenos e para ontologia do ser social, 2018). Assim, por exemplo,
pôr o qualitativo põe o quantitativo. Pois bem; a obra de Hegel trata do centro
apenas, sem colocar aí seu oposto com o qual “mistura-se”. Propomos, então, a
relação central e orbitante. O centro é “mais”, naquilo que é central, do que
aquilo que o orbita. O central apenas é central com e em relação ao orbitante,
e vice-versa; daí a unidade deles.
Em minha
experiência política, o uso de tais conceitos foi-me bastante útil para
traduzir a realidade e saber como agir. Assim, pode ser positivo a uma corrente
política orbitar ao redor de outra por algum tempo para crescer e
posteriormente adquirir mais autonomia. Marx trata da “mudança do centro de
gravidade” da economia internacional com a descoberta do ouro na Califórnia, o
que sugere naturalmente nações orbitantes.
A DIALÉTICA
DA DIALÉTICA
Se pudermos
definir qual a categoria central da dialética, digamos quais, no plural:
totalidade, contradição e movimento. Então,
por que não uma somente? Porque uma apenas é incapaz de expressar o objeto.
O capitalismo, por exemplo, é uma totalidade real – não falsa ou formal –
autocontraditória (logo, a luta de classes pode passar de reformista para
revolucionária) em movimento (constrói as contradições e é, também, ao mesmo
tempo, construída por estas – além disso, por superação, formam-se novas
totalidades).
Como a
realidade, social ou cósmica, temos de observar as categorias e leis
dialéticas, expressões abstratas, tal como os processos que estas representam –
interligadas. As categorias possuem, assim, vasos comunicantes e
interdependência. Quando se desconsidera essa multiplicidade, ao se eleger um
subordinador conceito-síntese, surgem premissas a atuar como ferramentas falhas
para o estudo.
Terceiro
aspecto a destacar; na medida em que temos de procurar no próprio objeto de
pesquisa a natureza empírica de seu processo, o próprio raciocínio dialético
tende-nos a um método de escrita teórica circular, polêmico e reconstrutor
do processo estudado .
A quarta
observação destina-se ao sujeito, cientista ou político. Leon Trotsky melhor
desenvolve:
Exigir que
todo membro do partido esteja familiarizado com a filosofia da dialética,
seria, naturalmente, inerte pedantismo. Porém um operário que tenha passado
pela escola da luta de classes, obtém a partir de sua própria experiência uma
inclinação para o pensamento dialético.
Ainda que não conheça esta palavra, está pronto a aceitar o próprio método e
suas conclusões. Com um pequeno-burguês é pior. Naturalmente, existem elementos
pequeno-burgueses ligados organicamente aos operários, que passam para o ponto
de vista proletário sem uma revolução interior. Porém, constituem uma
insignificante minoria. A coisa é muito diferente com a pequena-burguesia
educada academicamente. Seus preconceitos teóricos já tomaram uma forma
acabada, desde os bancos da escola. Por conseguirem aprender uma grande
quantidade de conhecimentos, tanto úteis como inúteis, sem ajuda da dialética,
acreditam que podem continuar, sem problemas, a viver sem ela. Na verdade,
prescindem da dialética somente à medida que não conseguem afiar, polir ou
agudizar teoricamente seus instrumentos de pensamento, e na medida em que não
conseguem romper com o estreito círculo de suas relações diárias. Quando se vêm
confrontados com grandes acontecimentos, perdem-se facilmente e reincidem em
seus hábitos pequeno-burgueses de pensamento. (Trotsky, Uma
Oposição Pequeno-Burguesa no Socialist Workers Party, 2019)
Em resumo, a
dialética materialista é potencialmente mais ou menos acessível a depender do
modo material de vida dos indivíduos. O triunfo do comunismo, dando razão
histórica a Marx e Engels, permitirá a superação do platonismo e da lógica
aristotélica tão comuns de maneira menos ou mais inconsciente entre nós; e fará
erguer-se de modo natural uma saudável dialética materialista vulgar e cotidiana acompanhada pela elevadíssima
educação científica da humanidade.
SOBRE A LÓGICA
PARACONSISTENTE
A lógica
paraconsistente afirma, em geral, que duas afirmações podem ser opostas e ambas
igualmente verdadeiras (quase-verdades). De imediato, soa um raciocínio muito
dialético. Mas ambas são verdadeiras e igualmente falsas porque unilaterais. O
erro e o acerto estão em ambos os lados, cabendo a correção numa terceira
resposta que suprassuma as duas afirmações. Exemplo: Marx descobre as
unilateralidades na ciência econômica sobre o dinheiro; este ser não é, como
afirmavam alguns economistas, os metalistas, sua forma material (ouro), embora
a sua matéria seja a necessária; por outro lado, concepção oposta, os
cartalistas, o dinheiro é uma “convenção” social, mas não é uma escolha
arbitrária, uma decisão livre das pessoas ou do governante – o dinheiro é
expressão autônoma do valor (Marx). Outro caso: a luz é partícula ou onda? É
uma sobreposição de estados. A polêmica sobre se a obra O Capital é “uma crítica
ao capitalismo do ponto de vista do trabalho” (Marxismo clássico) ou “uma
crítica ao caráter historicamente determinado do trabalho no capitalismo” (Postone,
2014, p. 62)
é resolvida com a afirmação de que é uma “crítica do (ponto de vista do)
trabalho ao trabalho no capitalismo”.
A resposta
está, portanto, numa terceira visão, que supera as duas anteriores, quando
estas têm algum grau de acerto, e são devidamente medidas, criticadas e
corrigidas. Por um típico jogo
hegeliano, se “uma sentença e sua negação são ambas verdadeiras”, então o
oposto, a negação, também é verdadeiro, ou seja, que “a mesma sentença e sua
negação são falsas”. A inconsistência resolve-se na dialética, na superação da
oposição.
Vejamos um
último caso. Conta-se que o grande lógico Newton da Costa, um dos fundadores da
lógica paraconsistente, procurou hegelianos para saber se há relação de sua
concepção com a dialética de Hegel, e obteve duas respostas opostas, sim e não.
Aqui, procuramos demonstrar por qual motivo um sim e ao mesmo tempo um não, ou
seja, que as duas afirmações estão tanto corretas quanto erradas.
O trabalho
científico inclui, portanto, revisar toda a produção sobre o tema em questão e
descobrir as posições opostas e unilaterais em que caem as elaborações teóricas
e filosóficas.
Pode-se, assim, dar um passo para solucionar os conflitos em que cai o
pensamento. Esta obra desenvolveu-se resolvendo “inconscientemente”, por meio
da própria pesquisa, sem trato lógico a priori, as diferentes oposições em que
caiu o marxismo:
se o socialismo é o caminho histórico inevitável ou o capitalismo só pode ser
derrubado por ação consciente, se há crise crônica ou as crises regulares, se há
fim do trabalho ou sua manutenção, se o centro é crise do valor ou a queda da
taxa de lucro, se a revolução socialista será de base operária ou popular, se
as sociedades revolucionadas eram (transição ao) socialismo ou capitalismo de
Estado, se situações revolucionárias têm presente consciência socialista ou
burguesa entre as massas, se a essência humana é histórica ou natural, etc.
A verdade,
que pode estar no meio, frequentemente está na fusão, mais precisamente na
fusão superante, que suprassume.
SUJEITO E
OBJETO
A ciência
conheceu toda uma etapa burguesa, que foi progressiva para a humanidade em
essência, pois ofereceu bases ao socialismo. A ciência será socialista – mais
do que de forma latente ou oculta como com a III Revolução Industrial – quando
der base ao desenvolvimento da nova forma social, suas tecnologias, etc.
Entre as
condições para a revolução mundial encontra-se um alto desenvolvimento da
ciência e da técnica. É preciso grande conhecimento das propriedades do mundo,
de suas possibilidades, de sua natureza e de sua história para revolucionar a
sociedade. Enfim, é preciso que o homem tenha produzido as condições para
perceber que “somos uma forma do cosmos conhecer a si mesmo” (Sagan). Tal
identidade entre sujeito e objeto deve estar latente, ainda exigindo uma nova
revolução científica, para sua realização socialista.
Bibliografia
Carcanholo,
R. A., & Sabadini, M. d. (08 de 02 de 2011). Capital fictício e lucros
fictícios. Acesso em 27 de 09 de 2020, disponível em Calameo:
https://pt.calameo.com/read/0001407496d6f221bb9b0
Cunha, E. (2002). Os Sertões (Campanha de
Canudos). São Paulo: Martin Claret Ltda.
Hegel, F. G. (1995). Enciclopédia das ciências
filosóficas em compêndio. São Paulo: Loyola.
Jammer, M. (2011). Conceitos de Força - Estudo
sobre os fundamentos da dinâmica. Rio de Janeiro: Contraponto : Ed. PUC
Rio.
Lukács, G. (2018). Prolegômenos e para ontologia
do ser social. Maceió: Coletivo Veredas.
Marx, K. (2013). O capital I. São Paulo:
Boitempo.
Postone, M. (2014). Tempo, trabalho e dominação
social: uma reinterpretação da teoria crítica de Marx. São Paulo:
Boitempo.
Trotsky, L. (15 de 05 de 2019). Uma Oposição
Pequeno-Burguesa no Socialist Workers Party. Acesso em 11 de 02 de 2020,
disponível em Mia - arquivo marxista na internet:
https://www.marxists.org/portugues/trotsky/1939/12/15_01.htm