terça-feira, 13 de abril de 2021

O erro de Marx quanto ao salário por peça

 

SOBRE O ERRO DE MARX QUANTO AO “SALÁRIO POR PEÇA” N’O CAPITAL

 

Neste esboço, debatemos a defesa de Marx sobre a prioridade capitalista do salário por peça. Como sabemos, o diagnóstico está errado, pois o salário por tempo, não por peça, predomina no capitalismo consolidado. Com o trabalho por aplicativo, o salário por peça ganha algum destaque, porém permanece marginal na indústria de conjunto. Aqui, usaremos a própria letra de Marx para apontar o motivo de seu erro. Comecemos por sua afirmação:

 

Da exposição precedente resulta que o salário por peça é a forma de salário mais adequada ao modo de produção capitalista. (Marx, O capital I, Boitempo, 2013, p. 627.)

 

Está clara aí a posição do velho alemão. Vejamos elementos da “exposição precedente” que parecem sustentar suas afirmações:

 

Como a qualidade e a intensidade do trabalhado são, aqui, controladas pela própria forma-salário, esta torna supérflua grande parte da supervisão do trabalho. (Idem, p. 624.)

 

Porém, a supervisão do trabalho – capatazes, etc. – é um custo improdutivo pequeno em si mesmo na indústria moderna. O salário por tempo não causa um desperdício de recursos especial.

Ele continua:

 

Dado o salário por peça, é natural que o interesse pessoal do trabalhador seja o de empregar sua força de trabalho o mais intensamente possível, o que facilita ao capitalista a elevação do grau normal de intensidade. (Idem, p. 624.)

 

Um ponto para o salário por peça! Tem mais:

 

É igualmente do interesse pessoal do trabalhador prolongar a jornada de trabalho, pois assim aumenta seu salário diário ou semanal. (Idem, p. 625.)

 

Se possível, o salário por tempo também estimula ampliar a jornada de trabalho. Mas o argumento anterior a este, a citação antecedente, ainda não foi refutado por nós. Vejamos o elogio e a ambiguidade de Marx:

 

Mas o maior espaço de ação que o salário por peça proporciona à individualidade tende a desenvolver, por um lado, tal individualidade e, com ela, o sentimento de liberdade, a independência e o autocontrole dos trabalhadores; por outro lado, sua concorrência uns contra os outros. O salário por peça tem, assim, uma tendência a aumentar os salários individuais acima do nível médio e, ao mesmo tempo, a baixar esse nível. Mas onde um determinado salário por peça já se encontra a muito tempo consolidado de maneira tradicional – o que cria enormes dificuldades para sua rebaixa –, os patrões também recorreram, EXCEPCIONALMENTE, ao procedimento  de transformar forçadamente o salário por peça em salário por tempo. (Idem, p. 626, destaques nossos.)

 

Onde Marx coloca a palavra “excepcionalmente”, aconteceu como nada sutil regra… O salário por tempo se impôs. Qual, então, o motivo? Eis, conclui-se: a luta de classes estimulada pela citada “tradição”!

Marx diz que o salário por peça é o método para explorar mais (idem, p 627). Mas quase diz que isso valeu somente durante a manufatura, mas nada garantia que seria o mesmo na grande indústria, no sistema de maquinaria.

Mostremos mais uma citação do próprio Marx, no mesmo capítulo, onde fica cristalina a luta de classes gerada pelo salário por peça:

 

Essa variação do salário por peça, ainda que puramente nominal, provoca lutas constantes entre o capitalista e os trabalhadores. Ou porque o capitalista aproveita o pretexto para reduzir efetivamente o preço do trabalho, ou porque o incremento da força produtiva do trabalho é acompanhado de uma maior intensidade deste último. Ou, então, porque o trabalhador leva a sério a APARÊNCIA DO SALÁRIO POR PEÇA, COMO SE LHE FOSSE PAGO SEU PRODUTO, e não sua força de trabalho, e se rebela, portanto, contra o rebaixamento do salário, que não corresponde ao rebaixamento do preço de venda da mercadoria. (Idem, p. 629, destaque nosso.)

 

Concluímos pela comparação das citações que o salário por tempo é melhor ao capitalismo porque melhor produz uma aparência que esconde o real estado das coisas. O salário por tempo gera menos problemas classistas, menos luta de classes aberta. Marx conclui o capítulo sobre o salário por peça de modo, no mínimo, esclarecedor:

 

“os trabalhadores vigiam cuidadosamente o preço da matéria-prima e dos bens fabricados e são, assim, capazes de calcular com precisão os lucros de seus patrões.”

O capital, com razão, descarta tal sentença como um erro crasso acerca da natureza do trabalho assalariado. Ele roga contra a pretensão de impor obstáculos ao progresso da indústria e declara rotundamente que a produtividade do trabalhador é algo que não concerne de modo algum ao trabalhador. (Idem, p. 629.)

 

É preciso, portanto, uma forma de salário que menos estimule desconcertantes vigilâncias por parte do operariado…

Por fim, Marx quase ofereceu o fato de que o salário por tempo tem prioridade em relação ao salário por peça nesta citação com a qual concluímos este esboço:

 

O salário por peça, portanto, não é mais do que uma forma modificada do salário por tempo. (Idem, p. 623.)

 

Até gênios erram.